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segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

A transgressão da hegemonia nos tribunais à luz de Sara Araújo

 

Ao longo da humanidade, criaram-se identidades binárias com certo grau de hierarquia, na qual uma representava a superioridade e o desenvolvimento, enquanto outra, o retrocesso e a inferioridade. O ideal citado, elaborado pelo filósofo francês Jacques Derrida (1930 - 2004), dialoga devidamente com o conceito de “norte e sul” elaborado pela jurista Sara Araújo em seu texto “O primado do direito e as exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone” (2016). Segundo a autora, as epistemologias do norte representam perspectivas hegemônicas e convencionais, tanto no âmbito social quanto no jurídico. Por outro lado, as epistemologias do sul correspondem ao pensamento não-hegemônico e não convencional.

Nesse ínterim, o norte estabelece paradigmas dentro de uma concepção de universalidade, porém, essa universalidade é excludente, restrita, sendo o sul silenciado inúmeras vezes. Desenvolve-se, assim, uma relação de dominação entre tais grupos, já que o norte reprime o pensamento do sul, impedindo que movimentos não tradicionais tenham relevância no cenário mundial. Em suma, formas de pensamento não convencionais são impedidas de emergir, e movimentos contra-hegemônicos deixam de existir numa lógica de simultaneidade, silenciados dentro de doutrinas, legislações e do próprio judiciário.

Com isso, recai sobre o Direito a necessidade de conceber o mundo fora da essencialidade do pensamento hegemônico e transgredir essa linha abissal. Urge refletir nos tribunais a perspectiva não-hegemônica de inúmeras óticas - até então silenciadas -, tais como a etnico-racial, de gênero e da sexualidade. Nesse contexto, é passível de análise o Julgado da Medida Cautelar na Suspensão de Liminar n° 1.248-RJ, pelo Ministro Presidente Dias Toffoli, acerca do caso da proibição de obras na Bienal do Livro que tratam do homossexualismo. 

A autorização do recolhimento de tais obras que tratam da temática LGBTQIA+ refletem a opressão que as epistemologias do sul sofrem e o silenciamento de pautas não convencionais no cenário mundial. A heterossexualidade, imposta como norma pela perspectiva hegemônica, contribui para a invisibilidade de pautas não tradicionais importantes para o combate de preconceitos. 

Por outro lado, a decisão do STF em derrubar tal decisão, deixa evidente a emergência do pensamento de Sara Araújo nos tribunais hodiernamente. A necessidade de debater e colocar evidência pautas, que até então foram invisibilizadas pela epistemologia nortista, pelo Direito representam o início da transgressão de preconceitos e de ideologias unicamente hegemônicas, caminhando em prol de uma sociedade mais justa.

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