A Adf número 56 do STF foi extremamente importante e controversa, isso por tratar sobre um dos maiores temas tabu no nosso país, o aborto. Nesse caso, discutiu-se o aborto de anencéfalos, visando instituir como inconstitucional os artigos que criminalizam o aborto para este caso. Trata-se de tema extremamente belicoso por, aparentemente, ferir um direito fundamental, o direito à vida, frisa-se o aparentemente, pois neste caso em específico, considerou se que como o anencéfalo não teria possibilidade de vir a viver, não se feriria nenhum direito no caso do aborto.
Conforme afirma Bordieu em "O Poder Simbólico", o poder simbólico e a independência do direito se baseiam nas suas estrutura e forma própria, ambas construídas historicamente. No julgado em tela, é sancionado,parcialmente, um direito social muito requisitado pelas mulheres, sendo segundo o sociólogo uma decorrência da mudança na relação das forças existentes, ou seja, devido ao aumento da força política dos movimentos feministas, muito embora o direito se esforce para parecer independente dessas forças exteriores. Não se pode simplesmente conceder este direito, ou ceder a uma pressão, é preciso dar uma justificativa, isto é, esta mudança, no que tange a casos tratados no judiciário, deve advir da lógica interna do direito.
Por fim, frisa-se a importância do judiciário na conquista e na expansão dos direitos sociais no Brasil, conforme evidenciado em diversos julgados em que houve omissão do Legislativo. Sobre essa atuação cada vez mais crucial do STF, cabe a ideia de Bordieu que defende que um corpo de intérpretes do Direito possibilita melhores decisões, pois conforme o autor, pois existe "um corpo hierarquizado o qual põe em prática procedimentos codificados de resolução de conflitos entre os profissionais de resolução regulada dos conflitos".
Este é um espaço para as discussões da disciplina de Sociologia Geral e Jurídica do curso de Direito da UNESP/Franca. É um espaço dedicado à iniciação à "ciência da sociedade". Os textos e visões de mundo aqui presentes não representam a opinião do professor da disciplina e coordenador do blog. Refletem, com efeito, a diversidade de opiniões que devem caracterizar o "fazer científico" e a Universidade. (Coordenação: Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa)
Total de visualizações de página (desde out/2009)
segunda-feira, 7 de dezembro de 2015
A criminalização do aborto sob a ótica de Bordieu
É fato que a religião Cristã, influenciou
e influência, em muito, os países do ocidente. Essa influência tem efeito em muitos
aspectos, um exemplo é o caso da criminalização do aborto. A imensa maioria da
população Brasileira se diz contra a legalização do aborto, e na maior parte
das vezes, por motivos que remetem à ética e à moral, ou seja, uma minoria da
população (a que apoia a legalização do aborto) fica submetida a escolha da
maioria que é baseada em princípios fundados no argumento religioso. Sabe-se
que alguns casos específicos de abortos são permitidos, e que a proibição do aborto de feto anencéfalo foi
considerado descumprimento de preceito fundamental, ou seja, inconstitucional (ADPF
54).
A partir desse panorama, é possível aplicar o pensamento de Bodieu à realidade que vivemos no Brasil: primeiramente, é importante notar que para o autor, o Direito em momento algum é visto como uma ciência separada de todas as outras ou independente, pelo contrário, o Direito deve (deveria?) dialogar com outras áreas do conhecimento, para que isso acrescente no seu estudo. No caso do aborto, grupos da ciência médica, a sociologia e filosofia já indicam que a vida não é iniciada junto à existência do embrião, e sim desenvolvida aos poucos, até certa maturidade do feto. Ou seja, o argumento que coloca o aborto como o fim de uma vida é infundado e ainda assim não deixa de ser utilizado por diversas pessoas, órgãos e instituições, já que o peso do senso comum cristão e o seu filial, o moralismo, o reafirmam a partir de seus poderes simbólicos.
Em segundo lugar Bordieu crítica o instrumentalismo e o formalismo dentro do Direito. Essas duas expressões se referem ao Direito estando à disposição da classe dominante, visto com uma força que pode negar ou ignorar as pressões sociais. No caso da criminalização do aborto, esse aspecto é muito visível quando se faz o recorte de gênero. O feto até certo tempo de existência, faz parte do corpo da mulher e não sobrevive sem ele, portanto, negar aborto seguro a uma mulher é privá-la do controle do seu corpo e do poder de escolha sobre ele. Se pensarmos que o moralismo que ronda essa questão é fundado em preceitos religiosos, é fácil concluir que a mulher sempre foi subjugada nesse âmbito. Até hoje muitas igrejas cristãs não têm espaços de fala para mulher como agente principal, condenam a mãe solteira enquanto valorizam o “bom pai” que o filho dela tem, têm como líderes sempre homens e mulheres em posição de submissão e subversão a eles. Não seria diferente com o aborto, esse diz respeito somente a mulher e sua autonomia sobre seu corpo, coisa que o Cristianismo sempre reprimiu, portanto procuram demonizar a prática do aborto e isso se refletiu no moralismo que está impregnado no Brasil. A Igreja como órgão dominante, vulgo seus líderes homens, não se importam com a vida ou com os direitos fundamentais da mulher (gravidez de risco, filho indesejado, depressão pós parto, etc), se importam em historicamente controla-la e seu corpo, e em ignorar a minoria delas que luta por equidade realizando uma opressão legalizada mascarada de tradicionalismo e cumprimento da moral/ética.
Em terceiro e último lugar, o autor
salienta a importância do Direito fundamentado na realidade para atender
verdadeiramente as demandas sociais, dessa forma, é necessário identificar e
lidar com os problemas sociais que a sociedade apresenta, para legislar sobre
eles e ter êxito como um instrumento de emancipação. No caso analisado nesse
texto, quase sempre a realidade social de muitas mulheres não é levada em
conta, e não é considerada um problema, já que é muito mais fácil taxar como
crime o aborto e como criminosa quem o realizou. Ou ainda, segmentar as pessoas
que buscam um direito, para dá-lo apenas a “quem mais precisa”, como se fosse
uma dádiva ou um favor, assim como acontece no aborto de feto que foi fruto de
estupro. Assim, você deve ser estuprada para ter direito a realizar um aborto, procedimento
que deveria ser direito de todas as mulheres, e não um “favor do estado” à
pessoas específicas, essa segmentação de direitos leva à uma emancipação
parcial, feita de forma injusta e sob requisitos absurdos. Assim, a realidade
de muitas mulheres, principalmente aquelas da classe baixa, é ignorada pelo
sistema jurídico.
Analisando o caso da criminalização do
aborto sob análise de Bordieu, percebemos o quanto nossa democracia é imatura ao
passo em que concede direitos como fundamentais para a maioria mas restringe o
espaço do possível quando diz respeito a uma minoria por quê diminui ou
disfarça seus problemas sociais reais. A força religiosa com seu poder
simbólico reitera essa desigualdade, e contribui para que o direito seja cada
vez mais inalcançável por quem não faz parte da maioria influenciada por ela. A ADPF 54 foi extremamente específica e não
teve como foco o aborto em si, mas sim os problemas de um feto anencéfalo,
mostrando como ainda é difícil ampliar a atuação do Direito nesse assunto.
Débora Rayane Brandão Filadelfo - 1º ano Noturno
Débora Rayane Brandão Filadelfo - 1º ano Noturno
Considerações sobre a ADPF nº 54 acerca
da gravidez de feto anencéfalo.
Não resta dúvida de que o direto à vida é um dos princípios basilares
da humanidade e de que, por esse prisma, o assunto “aborto” é um ponto de muita
controvérsia. Mesmo considerando a questão em situações mais restritas, não se
foge à polêmica e aos tradicionais argumentos prós e contra a interrupção da
gravidez. Isso ocorreu, por exemplo, no caso da ADPF nº 54/DF, que analisou a
inconstitucionalidade da interpretação de dispositivos do Código Penal que tipificam
como crime o aborto quando se está diante de gestação de feto anencéfalo. Para
este caso específico, em 12/04/2012, o Plenário do STF, por maioria de votos e
não sem certa discussão, julgou procedente o pedido da Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que procurava proteger os profissionais de
saúde (que enfrentam essa difícil situação in
loco, e se veem obrigados a sopesar diversos aspectos, além dos
jurídicos-penais) de eventuais punições impostas pelos tribunais.
O referido julgado é emblemático, pois representa, por um ângulo
racional e jurídico, mais uma etapa em um lento processo de expansão do direito
no sentido de olhar suas normas e sua produção normativa com uma lente
polarizada pela premissa do indivíduo, vivendo situações concretas. Seria
possível dizer que se está diante de uma verdadeira expansão do espaço dos
possíveis, teorizado por Bourdieu, ou seja, uma ampliação da hermenêutica, de
forma a abarcar novas soluções jurídicas. Veja que o Código Penal (cujos
artigos 124, 126 e 128 tratam do aborto) é de 1940, e de lá para cá, o campo
jurídico tem incluído em sua estrutura novos valores, práticas, discursos,
obras jurídicas, enfim, o produto das forças que se desenvolvem nesse campo.
Por exemplo, desde 1948 a comunidade internacional reforça o princípio da
dignidade da pessoa humana; o desenvolvimento tecnológico tem permitido uma maior
precisão nos diagnósticos médicos; a psicologia também tem se aprofundado na
compreensão do espírito humano; a liberdade sexual e a melhora da condição social
feminina têm tido progressos significativos; a Constituição Federal de 1988
passou a tutelar uma ampla gama de direitos fundamentais.
Todos esses avanços têm fornecido fundamentos importantes para que os
agentes do campo jurídico possam construir novos caminhos e novas teses na
estrutura do Direito. Contudo, para que se proceda a uma modificação do corpus
jurídico, ou seja, para se possa se valer do jogo do poder simbólico para produzir
uma alteração do espaço dos possíveis em determinado sentido é preciso atuar de
forma eficaz, armando-se o agente de produção doutrinária, de linguagem jurídica
correta e atendo-se aos rituais jurídicos. E, nesse sentido, é interessante observar
alguns pontos que foram habilmente trabalhados na ADPF nº 54/DF. Primeiramente,
nota-se que o advogado da requerente, Luís Roberto Barroso, reconhecidamente um
agente de prestígio no Direito Constitucional, procurou afastar de pronto a
visão religiosa sobre o assunto, cravando a laicidade do Estado brasileiro. Tratou
ele também de delimitar bastante bem o objeto da ação, deixando claro que se
pleiteava a declaração de inconstitucionalidade da interpretação que
considerava crime a interrupção da gravidez de feto anencéfalo, e não a
constitucionalidade dos aludidos dispositivos penais. Aliás, acentua uma
mudança importante de paradigma, colocando em foco, não a questão da
interrupção em si, mas a da inviabilidade da vida extra-uterina, conforme
doutrina de Nelson Hungria, e reforçando o uso de um termo mais adequado: “antecipação
terapêutica do parto”. Trabalhou ainda os princípios da liberdade, da autonomia
da vontade, da dignidade da pessoa humana; salientou o direito à saúde e fez o consensual
repúdio a qualquer forma de tortura. Sem esse trabalho, bem fundamentado
juridicamente, talvez o pleito tivesse outra decisão, o que mostra a
dificuldade em se alargar o espaço dos possíveis e, por consequência, promover
a própria expansão social.
Fernando –
1º Ano Direito Noturno (texto sobre o Direito entre o instrumentalismo e o
formalismo - Bourdieu)
Por uma visão de mundo mais progressista
A
sentença emitida pelo STF acerca da descriminalização do aborto de anencéfalos se trata de um progresso para as mulheres, pois nesse caso, garantiu a
integridade delas. Mas ainda deixa a desejar em termos de emancipação frente ao
moralismo cristão presente nos textos legais: abortar em outras situações ainda
penaliza mulheres e profissionais da saúde.
Os
magistrados da referida corte no julgamento se utilizaram de conhecimentos da
Biologia para determinar quando se dá o início da vida humana; e aplicaram a
subsunção legal, em parte como preconizado por Hans Kelsen em sua “Teoria Pura
do Direito”, ao considerar a anencefalia do feto uma causa de excludente de
ilicitude.
De
acordo com o explanado pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu no capítulo VIII
do “Poder Simbólico”, a independência do campo jurídico e o seu poder simbólico
se derivam das estruturas construídas historicamente e que o permeiam. O juiz
não cria propriamente o direito como o legislador, mas de acordo com a
autonomia que detém, promove uma historicização da norma, ou seja, adapta a regra jurídica a uma possibilidade de sentido coerente com a ética do seu grupo social.
Assim,
o veredicto se vincula a luta simbólica – doutrinadores versus operadores - no campo
jurídico, sendo produto de um ethos especifico. Por meio disso, Bourdieu afirma
no campo jurídico a predominância de certos valores, que advêm dos agentes do
direito e são comuns entre eles, dado a maioria deles, receberam capital social
similar. Por isso, esses valores impedem a legitimação de outros que concebam
uma visão de mundo diferente.
Mediante
isso, há de se afirmar a necessidade de que haja pensadores do direito que não
propaguem apenas valores conservadores, mas atuantes com uma visão totalizadora
e crítica sobre as necessidades sociais do indivíduo, sempre respeitando a
dignidade da pessoa humana.
João
Victor M. Ruiz
Aula
3.1
Direito
(Noturno)
Direito, um Poder Simbólico Inicial. Direito, um Poder Simbólico Social
A existência de uma ciência
que a distingue daquela caracterizada como jurídica, desloca o objeto do
direito – do moralismo – para a compreensão normativa como um meio de relações
sociais, sem ser concebido como mero reflexo dos poderes dominantes. Concepção
internalizada do direito, de que este se reduz à si próprio quando não
considera os fatores sociais, tendo um fundamento específico, “Não passa do esforço
de todo o corpo de juristas para construir um corpo de doutrinas e regras
completamente independentes dos constrangimentos e das pressões sociais, tendo
nele mesmo o seu próprio fundamento” (BOURDIE, 1989, p. 209). Logo, a crítica
apontada é a de considerar a setorização ideológica como não possível da
influência, limitação ou determinação de quaisquer outra força externa como,
por exemplo, quando se considera a historicização das normas, em que a
atividade interpretativa representa o embate ideológico de um interesse
específico, interesse esse que coexiste com a fluência de outros interesses
externos. Quando se determina o interesse jurídico, há a percepção de que:
(...)
O conteúdo prático da lei que se revela no veredicto é o resultado de uma luta
simbólica entre profissionais dotados de competências técnicas e sociais
desiguais, portanto, capazes de mobilizar, embora de modo desigual, os meios ou
recursos jurídicos disponíveis, pela exploração das “regras possíveis”, e de os
utilizar eficazmente, quer dizer, como armas simbólicas, para fazerem triunfar
a sua causa; o efeito jurídico da regras, quer dizer, a sua significação real,
determina-se na relação de força específica entre os profissionais, podendo-se
pensar que essa relação tende a corresponder à relação de força entre os que
estão sujeitos à jurisdição respectiva (BOURDIE, 1989, p. 224-225)
O julgado é uma ADPF (Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental) nº54, que aborda a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal ao autorizar a interrupção da gestação de feto anencéfalo –
doença caracterizada pela malformação congênita do feto, com ausência de crânio
e de encéfalo. A questão da arguição consistia em considerar a interrupção da
gestação em crime de aborto – segundo previsto no art. 124 do CP – ou uma
alternativa em relação à baixa potencialidade de possibilidade de vida do feto.
O argumento do STF foi de que não se estaria praticando o crime de aborto, já
que o feto anencéfalo é considerado um natimorto cerebral, não se
problematizando a questão do aborto, mas se adequando a problemática na
estrutura do ordenamento jurídico.
Sendo de legitimidade do Congresso Nacional a análise do
caso, foi-se estendido a atuação do poder judiciário na apreciação do julgado
por ausência de ação determinada pelo legislativo, o qual, em prol da garantia
dos direitos fundamentais, se exige a intervenção judicial. Assim como coloca
Luís Roberto Barroso:
A
vida na democracia é feita pelo processo político majoritário, que se desenrola
no Congresso, e pela proteção e promoção dos direitos fundamentais via
Constituição e Supremo Tribunal Federal. Quando o processo majoritário está
azeitado, fluindo bem, com grande legitimidade, a jurisdição constitucional
recua. E quando o processo político majoritário emperra ou enfrenta dificuldade
para votar determinadas matérias, o STF tem seu papel ampliado (BARROSO, Entrevista concedida ao Jornal O Estado de
São Paulo (08/04/2012, p. A4)
Há de se comentar na pouca autoridade atribuída pelo
votantes do caso para a análise do mesmo, já que se encontravam em maioria
homens que, pelo acidente natural da vida, nunca seriam abrangidos pela sua
própria capacidade atribuída ao voto, ou seja, nunca estariam possivelmente em
risco de gerar um feto anencéfalo,o que os torna absolutamente legais, mas não
legítimos. No entanto, a consideração de que existe a liberdade individual da
mulher em não se submeter ao trauma, ou de escolher sua proteção individual ou
respeito de vontade, é um princípio Constitucional de sua dignidade, como
indivíduo e como ente que necessita de aparato jurídico, já que o tema se
insere numa problemática social de saúde pública.
Bourdie, em sua obra “O
Poder Simbólico”, ressalta que existe uma ambiguidade presente no debate
jurídico, de o reconhecer como uma consequência social mas se apresentar
descolado desta, ou seja, como uma “teoria
pura” que desconsidera as apreensões da realidade. Reconhecer a autonomia
da mulher e sua vontade em relação a interrupção da gestação de feto anencéfalo
pelo STF é uma aproximação da descriminalização do aborto como um crime contra
a vida do feto, para a percepção de que sua vigência é um crime contra a vida
da mulher que, na apreensão da realidade onde não existe a igualdade formal
pela qual a norma hipotética atribui mas, sim, uma desigualdade que tem raça,
classe e gênero, é reconhecer que o princípio fundamental é de garantia da
saúde pública, na realidade onde o aborto já existe, mas onde ele escolhe à
quem criminalizar. Quando Bourdie apresenta a existência de ideologias que se
coexistem numa fluência de interesses distintos entre si, ele apresenta que
determinação são impostas apenas por jogos de poder, sem fundamentos reais da necessidade
coletiva e, por isso, seria um erro tanto considerar o Direito como reduzido à
norma, assim como inocência acreditar em uma possível neutralidade ou não
interferência de fatores externos que, em relação ao caso, podem ser de ordem
religiosa, econômica, política ou de manutenção da estrutura, que se exala de
forma conservadora e patriarcal.
O Direito faz o mundo social, o mundo social que é plural
e real. A lei é somente um ponto de partida, um parâmetro estatal que não
determinada a linha de chegada, apenas demanda uma possibilidade de seu fim.
Logo, deve-se definir qual a ordem do Direito que vai se estabelecer, para que
se alcance uma ideologia firme frente aos demais poderes e seus respectivos
interesses específicos:
O Direito, então, neste enfoque sociológico, contribui para a
produção e reprodução de uma dada ordem social, proclamando e definindo aquela
ordem que será tida como exemplar. Assim, ao consagrar determinada
realidade, o Direito desconhece ou ignora as que
possam coexistir. Nesse contexto, a divisão da realidade leva à desconsideração
ou à negação das demais visões, decorrendo na força e a violência simbólica do
Direito, que, além de construir uma dada realidade social, impõe uma definição
ideológica que passa a ser legítima (KILIAN, 2014)
Karla Gabriella dos Santos Santana – 1º ano Direito Diurno
Referências Bibliográficas:
KILIAN, Katheleen Nicola. O Direito pela perspectiva
de Pierre Bourdieu: as ideologias e o poder simbólico. Maio de 2014. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-direito-pela-perspectiva-de-pierre-bourdieu-as-ideologias-e-o-poder-simbolico,48224.html>
Acesso em 07 de Dezembro de 2015, às 10:48.
BOURDIE, Pierre. O Poder Simbólico, Bertrand Brasil: Rio de
Janeiro, 1989.
Caso Julgado. ADPF nº 54, Disponível em:
Acesso em 07 de Dezembro de 2015, às 10:21.
A maleabilidade dos diversos espaços dos possíveis
O julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores de Saúde (CNTS) a qual alega inconstitucionalidade da hipótese da criminalização do aborto de fetos anencéfalos consistiu um processo analisado sob diversos pontos de vista de determinados grupos que constituem a sociedade. Desta forma é possível compreender que, segundo Bourdieu, a ciência do Direito evita o instrumentalismo, ou seja, impede que as camadas dominantes imponham sua ideologia, assim como o formalismo, que é o entendimento do Direito como força autônoma diante das pressões social.
Para o caso de interrupção da gravidez de fetos anencéfalos, foi analisado os dizeres, em audiência públicalica das seguintes entidades: Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Católicas pelo Direito de Decidir, Associação Nacional Pró-vida e Pró-família e Associação de Desenvolvimento da Família, Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, Sociedade Brasileira de Genética Clínica, Sociedade Brasileira de Medicina Fetal, Conselho Federal de Medicina, Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sociais e Direitos Representativos, Escola de Gente, Igreja Universal, Instituto de Biotécnica, Direitos Humanos e Gênero bem como o hoje deputado federal José Aristodemo Pinotti, este último em razão da especialização em pediatria, ginecologia, cirurgia e obstetrícia e na qualidade de ex-Reitor da Unicamp.
É notório nessa discussão a forte influência da religião como instrumento que visa barrar a descriminalização do aborto, haja vista o seu poder simbólico na sociedade brasileira o qual é utilizado com mecanismo de imposição dos seus valores em detrimento de uma minoria que não concorda, ao passo que os sistemas simbólicos estão apenas submetidos a execução de um poder estruturante e individual. Bourdieu sugere que, em casos de imposição de interesses particulares como representação do interesse de toda a sociedade, consiste em uma forma de violência simbólica. Sendo assim, ocorre uma invasão do espaço dos possíveis do direito brasileiro cujo sistema caracteriza-se como laico.
Além disso, Bourdieu afirma que não é aceitável a compreensão do campo jurídico a interpretação livre das normas. Em relação ao caso de aborto de fetos anencéfalos, alguns profissionais da saúde alegaram a não realização do referido procedimento, pois não havia norma específica que permitisse ou negasse a prática, sendo então discutível a natureza do ato. Essa dicotomia ocorre, pois, sobre o aspecto humano e social, a persistência e levar uma gestação cuja certeza de morte nos casos de anencefalia é de 100%, caracterizando um sofrimento único e exclusivo da mulher, portanto, não é razoável impedir que sejam sanados maiores sofrimentos por parte da mãe, alegando o direito a vida de um ser sem perspectiva de vida. Em contrapartida, a moral religiosa não permite a decisão do momento da morte de uma pessoa, pois, dentro do espaço dos possíveis no que tange a moral religiosa, a interrupção da gravidez encontra-se fora de cogitação.
Em suma, a norma continuou a mesma, porém a interpretação foi modificada, permitindo o aborto, ampliando o espaço dos possíveis do direito a uma categoria específica de aborto: de fetos anencéfalos. Como alega Bourdieu, nesse caso, o direito não foi instrumento da classe dominante religiosa, ao passo que prevaleceu a ética dos magistrados capacitados para a interpretação das normas a qual não torna obrigatório, cabe a consciência da mulher em decidir. Portanto o espaço dos possíveis da moral religiosa foi respeitado, assim como o espaço das mulheres que não concordam com tal ideologia adquirindo a permissão de decidir sobre o próprio corpo.
Juliete Araujo Zambianco
1 ano - Direito Noturno
Aula 3.1 - Bourdieu
A religião e o senso comum
Na
constelação de diversas crenças que fazem parte da opinião
pública, existem aquelas que são dotadas de tamanha força, seja
por ser parte integrante da classe dominante, seja por simplesmente
fazer parte do senso comum, que conseguem submeter toda a população
às determinações dessas crenças. A crença cristã e seus
valores, por exemplo, submete o Estado laico e os cidadãos que não
fazem parte dessa religião aos seus valores pela enorme força de
seu poder simbólico. De certa forma, conviver em um Estado em que os
políticos eleitos representam não necessariamente as convicções e
desejos políticos da minoria e sim o da maioria acaba fazendo parte
da vida democrática. Essa condição se agrava ao perceber a
amplitude do enraizamento dos ensinamentos cristãos, que atinge
também a postura dos funcionários e representantes do poder
público.
O
problema do moralismo cristão e suas consequências na esfera
pública que afeta os que não compactuam com essa religião compõe
um cenário de difícil perspectiva de conciliação pela própria
natureza da gestão democrática que permite em certos níveis,
levemente atenuados pela constituição e sua aplicação pelos
tribunais superiores, a institucionalizada opressão da minoria pela
maioria. Discutir as implicações da doutrina cristã como problema
quando para a maior parte da população ela não é verdadeiramente
um problema acaba por dificultar ainda mais a emancipação de grupos
excluídos por esse ensinamentos.
A
ADPF 54 mostra um caso em que a maioria venceu. Em censo de 2014 foi
revelado que quase 80% da população é contra o aborto. E acredito
que diversos entrevistados, assim como o ministro, não se reportaram
diretamente à religião ao escolher o “não”, mas sim à valores
morais relacionados ao respeito a vida. Essa é imensa força
simbólica do moralismo cristão, que se difunde não apenas aos
seguidores de seus cultos. Esse caso revela a necessidade de se
discutir a democracia e os limites da vontade da maioria.
Bourdieu
fala da necessidade de um Direito que seja condizente com as
perspectivas da realidade social mas a identificação de um
“problema social” se torna seletiva ao colocar-se um “filtro”
religioso. Além disso, o espaço político, nas palavras de Safatle,
deve “não ser marcado pela afirmação da diferença, mas pela
indiferença absoluta em relação a qualquer exigência
identitária”.
Portanto,
levando em conta essas duas afirmações desses diferentes autores,
uma forma da realização dos anseios dessa minoria oprimida seria a
realização de uma prática de Estado “indiferente às
diferenças”, esvaziando assim qualquer afirmação de
diferenciação do espaço político e tornando-se livre de dogmas
religiosos. Sem isso, as questões que envolvem o pensamento cristão
que ainda encontram correspondentes morais sempre se encontrarão
força no senso comum, limitando assim o espaço dos possíveis da
emancipação social.
Lucas Aidar da Rosa
1º Ano de Direito, Noturno.
Direito: efetivação de seu formalismo
Em
2012, na ADPF 54, o STF delibera inconstitucional a criminalização do aborto de
anencéfalos, tal decisão foi tanto baseada na perspectiva do feto que teria
expectativa de vida ínfima, muitas vezes morrendo após o parto, como também das
mães que estariam sujeitas a dor e ao
sofrimento da perda do filho, além disso, o código penal que previa a criminalização
do aborto de anencéfalos já se encontra defasado em relação ao avanço da
medicina vigente que consegue provar que quadros de anencefalia são fatais.
A
grande repercussão do caso foi decorrente da forte formação conservadora e cristã
da sociedade brasileira que entrava processos, como no caso, referente a saúde pública,
devido as suas crenças, de forma que a moral crista seja hegemônica, e acabe,
muitas vezes, moldando o Direito. A descriminalização do aborto, passa a ser um
critério elitista de seletividade já que as mulheres ricas têm condições de
realizar abortos de forma segura, enquanto os restantes das mulheres
brasileiras serão submetidas a abortos clandestinos, em condições desumanas.
Assim,
transpondo tal realidade ao pensamento de Bordieu, o Direito que criminaliza aborto
tem um caráter instrumentalista, à medida que atua em função dos interesses e
necessidades da classe dominante, ou seja, das mulheres que tem condição de
abortar em meios alternativos daqueles oferecidos pelo serviço público, não serão prejudicadas.
Dessa forma, o direito perde todo seu formalismo -Direito como força autônoma diante
das pressões sociais - pois é moldado por preceitos religiosos e em função de
interesses de classes.
Dessa
forma, segundo o autor, é função dos operadores do Direito, em conectar a
teoria do Direito a realidade da sociedade, adequando as diversas mudanças da
sociedade, como também, suas necessidades. Assim, a descriminalização do
aborto de anecefalos por parte dos ministros do STF, revelam como os juristas,
servidores da coletividade, devem fazer um direito formal,
abrangendo as necessidades materiais da população.
Nome: Beatriz Santos Vieira Palma
Primeiro ano Direito Diurno
Moral pró-nascimento e direito à vida
"A maternidade é
plenamente humana quando resulta de uma escolha ética e não de uma imposição
genética" - Maria José Rosado
A maternidade é vista como uma benção divina. O ato de
dar a luz a um novo ser vivo é um momento idealizado pela grande maioria das
mulheres durante toda a vida, sendo estas condicionadas, já na infância, a amar
bonecas e reproduzir esse amor em uma criança que está prestes a nascer. É um
amor tão genuíno, profundo e arrebatador, que muito dizem ser ele o único
verdadeiro. Tamanha é a complexidade do sentimento da mãe pelo bebê vindouro. Por
isso, quando uma sentença de morte é dada a esse sonho, os efeitos sobre o
psicológico da mulher são devastadores. Ela não poderá criar expectativas para
a criança e quando perceber o crescimento de seu ventre saberá que o resultado
será apenas fatídico, porém será obrigada a planejar o enterro de seu sonho durante nove
meses, cada um deles desejando, criando esperanças de que algo seja diferente.
No desfecho, porém, as lágrimas e o desespero são os mesmos em todos os casos.
Em 2012, a decisão tomada pelo STF mudou essa
realidade. A ADPF 54 foi
aprovada, por maioria de votos, tornando inconstitucional o ato de criminalizar
(baseando-se no Código Penal brasileiro, já ultrapassado em muitos aspectos) o
aborto de anencéfalos, ou seja, de fetos que não possuem chance de ter uma vida
prolongada por muito tempo após o nascimento. Essa decisão gerou uma série de polêmicas,
não apenas sobre o fato de haver uma vida ou não dentro do útero, mas também
sobre a legitimidade da decisão e sobre a extensão do campo jurídico.
Para
Bourdieu, sociólogo Francês, o direito age de acordo com o “espaço dos
possíveis”, sendo este o campo em que as questões jurídicas podem adentrar a
outros campos científicos – como a medicina – e influenciá-los, resguardando o
direito certa independência. Com base nisso, o pensador faz uma análise sobre
como a moral e a razão podem modificar esse espaço. De fato, a igreja exerce um
poder simbólico dentro da nossa sociedade, infundindo a moral cristã até mesmo
em questões do ordenamento jurídico, impedindo que a razão prevaleça
completamente em questões técnico-científicas. Assim, em um Estado que tem como
pressuposto a laicidade, a questão do aborto de anencéfalos não deveria ser
sequer uma questão; porém, como a moral religiosa é demasiadamente forte, o
direito teve de mostrar sua autonomia, demonstrando que as soluções para os
problemas da sociedade estão dentro do próprio campo.
Abortamento e a moralidade seletiva
A questão do abortamento é, inegavelmente, uma questão rodeada de tabus morais e, principalmente religiosos. Ter um filho, significa passar, sozinha (pois mesmo em uma gestação com o pai presente - casos raros entre as mulheres que cogitam abortar - é, e sempre será, a mulher quem aguentará, pelo menos fisicamente, a gestação) durante 9 meses por inúmeros mudanças não desejadas em seu próprio corpo - perda de controle sobre si, extrema dor e sofrimento. Tudo isso, para gerar um ser que ela nunca quis e que será sua total responsabilidade após esse nascimento forçado. Além disso, o mesmo Estado que a obriga a passar por esse desgaste não lhe garante suporte para cuidar de tal criança.
Ou seja, o Estado, fundamentado em argumentos totalmente ultrapassados e absurdos obriga as mulheres a gerarem uma criança indesejada; a obrigam a criar esta criança, e a todo tempo a julgam e a marginalizam, pelo simples fato de ela ter engravidado. Isso mostra o quanto a sociedade é hipócrita, uma vez que, na verdade, quase ninguém deixa ter relações sexuais antes do casamento, mesmo isso sendo proibido pelos valores; mas, todos, não hesitam em rotular como promíscua, "puta", a mulher que engravidar. Esse fato revela também, a seletividade nos pecados aceitos pela entidade folclórica que chamam de deus. Se este deus predeterminou as ações humanas, por que os que se intitulam devotos cristãos infringem suas leis todos os dias, fazendo a barba, por exemplo, mas dizem que isso é aceitável, uma vez que os tempo mudaram, mas que a mulher abortar nunca será ? Por que a Igreja, usa da mulher para dar vazão a suas regras, a fim de a submeter.
Tudo isso, sem nem ao mesmo começarmos a discutir a seletividade da condenação moral da sociedade. Homens abortam todos os dias e muito mais do que as mulheres: quando deixam de assumir uma criança que eles conceberam, quando não apoiam em nada a mulher obrigada a carregar o fardo que eles também tem responsabilidade sobre, quando, estes "homens da lei" não fazem nada sobre isto. Estes mesmo homens, e qualquer outro homem, na verdade, (uma vez que nenhum deles tem legitimidade para falar de coisas que serão apenas vivenciadas pelas mulheres), ditam e "vomitam" regras, assim como a Igreja, para obrigá-las a agir conforme seu patriarcado deseja; ou seja, a serem oprimidas e sujeitadas ao silencio.
Falando agora do caso abordado pela Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54 de 12 de abril de 2002, que trata do abortamento de anencéfalos: todos os argumentos acima se encaixam perfeitamente nesse caso, porém, levando em conta a teoria de Bordieu, estudada, temos que destacar certos pontos. Sua teoria sobre os Espaços Possíveis, ou seja, sobre o local de debate e mudança de uma questão judicial; da reivindicação do direito pelo direito - é neste espaço que se encontra a discussão da arguição. Bordieu afirma que existe um campo jurídico, nem dependente, nem independente e que se utiliza de uma lógica interna; esta lógica interna é capaz de vincular o veredicto mais as atitudes éticas dos agentes do campo, os doutrinadores e os operadores, do que as normas pautados no direito, realmente - opinião esta que vai ao encontra com toda a moralidade seletiva discorrida anteriormente.
Dessa forma, o campo jurídico sai, infelizmente, prejudicado ante tanto conservadorismo da sociedade patriarcal e religiosa. Citar a bíblia para fundamentar decisões judiciais sérias (como faz, por exemplo, a bancada evangélica) referentes ao futuro da sociedade brasileira, por aqueles que supostamente a deveriam conduzir imparcialmente, segue a mesma linha de, para isto, nos utilizarmos do livro da Chapeuzinho Vermelho. Citar valores morais, também é insuficiente dada a relatividade desses valores e o significado que eles possuem para cada um, de acordo com o local, época e contexto de sua criação. Os princípio, assim como as regras da bíblia não são palpáveis e fixos. Assim, sobre estes um decisão jurídica jamais deveria se basear - e a simples cogitação de se pautar sobre estes deveria ser absurda ao ver de um jurista sério.
OBS: Normalmente se designa o processo de interrupção da gravidez antes que o feto se torne viável por "aborto"; o termo correto para esse processo, porém, é "abortamento", uma vez que "aborto" designa o feto morto em consequência do processo de expulsão do útero.
Stephanie Bortolaso
1° ano - Direito (Noturno)
Bourdieu, o aborto de anencéfalos e a esperança no Ethos compartilhado
A ADPF analisada trata da
interrupção da gravidez quando o feto em questão é anencéfalo, isto é, portador
de uma má formação rara do tubo neural, diante da qual a expectativa de vida é
baixíssima e muitas vezes resulta na morte do feto antes mesmo do parto ou de
sua completa formação. Na legislação brasileira, à época do acórdão, o aborto
somente era permitido em casos de estupro ou para proteção da vida da mãe
sendo, portanto, a interrupção terapêutica da gravidez, decorrente da impossibilidade
de vida extrauterina, considerada também um aborto pelos ministros e pelos órgãos
investidos de oficio judicante, apesar de todos reconhecerem os malefícios
inquestionáveis à saúde mental da mulher em questão. Tal interpretação era extraída
do Código Penal, em artigos específicos, em detrimento da Constituição e toda
sua disposição à respeito de preceitos fundamentais, concernentes aos princípios
da dignidade da pessoa humana, da legalidade, da
liberdade e autonomia da vontade bem como os relacionados com a saúde.
Felizmente,
a relatoria decidiu por inconstitucional a interpretação de a interrupção da
gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada no Código Penal, respaldada
em alguns fundamentos tais como a não retirada dessa norma (determinados
artigos do CP) do sistema jurídico, nem a afirmação de que ela seja
inconstitucional em seu relato abstrato, permanecendo em vigor com a
interpretação que lhe venha dar a Corte; a noção de que apenas o feto com
capacidade potencial de ser pessoa pode ser sujeito passivo do crime de aborto,
o que não ocorre com os fetos anencéfalos com absoluta certeza médica; e a
concepção de que impor à mulher o dever de carregar por nove meses um feto que
certamente não sobreviverá, causa à gestante dor, angustia e frustação
irreparáveis, resultando em violência às vertentes da dignidade humana – a física,
a moral e a psicológica.
Contudo,
faz-se necessário interpretar e analisar com criticidade esse impasse ocorrido
no sistema jurídico brasileiro. Sob a teoria de Bourdieu, por exemplo,
verificamos, na peça em questão, a limitação desse debate complexo ao ‘espaço dos possíveis’. Isso significa
que, apesar de todo o alcance que o Direito pode ter – como recorrer à
sociologia, à filosofia, aos avanços e técnicas médicas e à ciência política,
construindo uma decisão consensual que servirá como jurisprudência em todos os
outros casos semelhantes, unificando a Justiça independentemente de classe
social – ele continua irreparavelmente restrito a um campo limitado, no espaço
dos possíveis, no qual a hermenêutica jurídica e a moral não possuem tanta
liberdade e amplitude assim. Assim, tais
decisões são sempre condicionadas a um sistema e a uma burocracia, de maneira
inflexível: é, afinal, legal o aborto de anencéfalos, entretanto, é
compulsoriamente necessário a apresentação de dois laudos médicos comprovando a
má formação, bem como era necessário também a autorização judicial prévia ou
qualquer outra forma de autorização específica do Estado.
Além
disso, é possível visualizar também a presença e atuação de um campo jurídico definido, em que imperam
valores, códigos e habitus específicos, conforme também preconizado por
Bourdieu. Isso porque, o Direito deve ser entendido como uma ciência rigorosa,
que tem por objeto de estudo a norma, mas que deve evitar tanto o
instrumentalismo, isto é, a ideia de que a interpretação do Direito está a
serviço somente da classe dominante, como também a ideia errônea do formalismo,
que seria o entendimento do Direito como força autônoma diante das pressões sociais.
Afinal, como mostrado na ADPF, a decisão de legalizar o aborto de anencéfalos
será acessível a qualquer gestante sob tal condição, passando-se pelos mesmos
processos instrumentais, mas também ocorreu nessa decisão uma luta simbólica do
campo jurídico formalista entre o código penal e os operadores do direito;
assim, o direito é capaz de estabelecer uma decisão importante para a qualidade
de vida das mulheres, mas não consegue se desvincular de outros campos como a
Medicina – por meio da apresentação dos laudos – e da própria moral cristã, que
ainda impera forte, apesar do Estado laico, reprimindo ações de liberdade sexual,
mesmo que legais.
Mais do que isso, por essa decisão também é possível analisar como vive-se em uma
sociedade que superestima o conhecimento científico e o exercício da razão: são
os ministros do Supremo Tribunal Federal, que supostamente exercem esse cargo
devido a uma superioridade de conhecimento escolar cientifico, que são constitucionalmente
autorizados a terem responsabilidade sobre acontecimentos importantes da vida
cotidiana de toda a população, os quais ela mesma também deveria ter total
conhecimento e influência sobre. Por fim, talvez o aspecto mais interessante e
produtivo dessa decisão, ao analisá-la sob a ótica de Bourdieu, é verificar a
presença enriquecedora de um Ethos compartilhado. No Direito, há um
habitus muito próximo entre os juristas e os magistrados, isto é, não há
diversificação alguma e, ser mulher dentro desse espaço, portanto, é de uma
liberdade e poder decisório restritos, quase inexistentes. Assim, esse processo
de Judicialização de questões em pauta na vida social faz emergir discussões
pontuais e fundamentais para o entendimento e regulação da sociedade complexa contemporânea,
tirando da invisibilidade personagens outrora oprimidos pelo sistema jurídico,
como a mulher e seu protagonismo sobre o aborto. Apesar das limitações sobre
tal discussão e impedimentos advindos principalmente de um Congresso e uma
Sociedade extremamente conservadores, pautados ainda na moral religiosa tão
mais forte do que qualquer movimento social feminista, tornar visível e
abertamente discutido - mesmo que minimamente - uma questão polêmica como o
aborto é um avanço social significativo, que merece a renovação das esperanças no
sistema jurídico brasileiro e a continuidade dessa luta.
A criminalização do aborto como violência do Direito
A
questão da descriminalização do aborto, mesmo que só nos três casos de risco de
vida para a mãe, anencefalia e gravidez decorrente de estupro, gera polêmica
até hoje na sociedade brasileira, mesmo que já aceita amplamente nos países
mais desenvolvidos. Pierre Bourdieu, em sua obra, demonstra alguns conceitos
que se encaixam na luta empreendida pelas mulheres no campo jurídico para fazer
valer o direito ao próprio corpo.
A
excessiva racionalização e universalização do Direito faz com os juízes
apliquem à lei sem considerar particularidades e circunstâncias específicas de cada
caso. É devido a essas características que o aborto é considerado assassinato
pelo senso comum, pois, como é esperado do senso comum, não se investiga além
da superfície. Como se pode considerar assassinato a interrupção do
desenvolvimento de algo que nem vida é ainda? Como se pode juridicamente considerar
vida sem nem recorrer a outros campos especializados como a medicina, a
filosofia, a ética.
Esses
dois últimos, na realidade, são amplamente utilizados sob a perspectiva que os
mescla com a religião e, consequentemente, traz a misoginia para a discussão.
Discute-se a ética a filosofia quando se fala em “se acabar com uma vida que
nem nasceu ainda” ou “a vida existe desde a concepção porque até mesmo uma só
célula é uma vida”. Mas não se discute a ética e a filosofia quando o Direito
se depara com a imensa quantidade de crianças em situação de rua, com 5,5
milhões de crianças que não têm o nome do pai na certidão de nascimento, com uma
mãe que sofre Depressão Pós-Parto por ter sido obrigada a levar adiante uma
gravidez indesejada, com o fato do aborto clandestino ser a quinta maior causa
da mortalidade materna.
Tais
ambiguidades fazem lembrar que esse embate é mais um exemplo da dominação de
uma classe pela outra: a classe das mulheres sendo dominada e subjugada pela
classe dos homens, com base na estruturação do gênero. Nós, mulheres, quando
nascemos já somos colocadas em roupas rosas, delicadas, furam nossas orelhas,
nos ensinam a não falar alto, não sermos agressivas, colocam-nos em saltos
altos que dificultam nossa locomoção, nos obrigam a mutilar nossos corpos
diariamente com a depilação e procedimentos estéticos para nos encaixar num
padrão frágil, submisso e infantilizado. Desde que nascemos nos dizem que nosso
corpo não é nosso e por isso o aborto até hoje no Brasil não aceito. O direito
ao aborto é o direito da mulher ao próprio corpo, e o patriarcado não admite
tal empoderamento.
O Direito vem para garantir as necessidades
reais da população, e não aquelas impostas pela classe dominante. O Direito
deve consultar especialistas para formar uma decisão, e não apenas as leis já
estabelecidas como universais pela classe dominante. O Direito não deve
reproduzir uma determinada ordem social que é considerada como exemplar, ele
deve considerar todas as realidades. Inclusive aquela da mulher periférica
semianalfabeta que não teve acesso a informação e que não deve carregar para o
resto da vida um fardo por causa de um acidente. O bebê é visto como uma
punição para as mulheres, quando ele deve ser visto como uma bênção para um
casal. O Direito exerce uma violência simbólica contra as mulheres, quando é
composto majoritariamente por homens, quando ignora nossas realidades, quando
não leva em conta nossas reivindicações e quando nos nega o direito aos nossos
corpos.
Discente: Gabriela Alves Fontenelle - noturno.
Aula 3.1
A estrutura jurídica, longe do extremo
formalismo – preconizado por Kelsen – encontra contato, como dito por Bourdieu,
na sociedade, representada por conjuntos de morais, valores que se interagem de
maneira a influenciar a concepção jurídica de maneira que este – o Direito –
não pode, assim, se encontrar livre de qualquer viés social. Portanto,
compreende-se que as transformações sociais – somadas às compreensões de mundo
e história de uma determinada sociedade – de fato corroboram a um Direito que,
por mais que busque uma neutralidade,
possuirá vestígios das relações de poderes.
Parte
1: Reflexão sobre “A dominação masculina”
Logo, o caráter patriarcal permeado na
humanidade terá seu correspondente no Direito, quando este – de qualquer
maneira tentando retirar esses elementos que beiram muitas vezes ao machismo –
teve sua evolução baseada em tais conceitos. De fato,
a dominação masculina está de tal maneira ancorada
em nosso inconsciente que não a percebemos mais, de tal maneira afinada com
nossas expectativas que dificilmente conseguimos repô-la em questão. A
descrição etnográfica da sociedade cabila, verdadeira depositária do
inconsciente mediterrâneo, oferece um instrumento realmente valioso para
dissolver as evidências e explorar as estruturas simbólicas deste inconsciente
androcêntrico, que sobrevive nos homens e mulheres de hoje.[1]
Bourdieu trabalha a
forma como os meios sociais e culturais reproduzem uma realidade, embasada
pelos seus princípios (“Quais os mecanismos
e instituições – Família, Igreja, Escola ou Estado –, que realizam o trabalho
de reprodução? É possível neutralizá-los para liberar as forças de
transformação que eles estão conseguindo entravar?”[2]), os quais, como
dito, são ramificações de uma evolução histórica. Os “mecanismos e instituições”, de maneira voluntária ou involuntária
– por isso, quase imperceptível quando não se coloca em uma postura crítica –
padronizam um comportamento, naturalizando-o e compondo um sistema reprodutor
de ideologias, valores, etc. (por vezes da “classe” dominante/ mais influente);
o que, atualmente, apesar de existirem aqueles cuja atuação é mais clara e
temos conhecimento de sua “política”, existem outros – como a Escola – que, ao
contrário do que se espera (produtora de alunos e futuros cidadãos de
posicionamento crítico), atuam, na maioria, da mesma maneira que os outros
sistemas – de modo que, por possuir esse filtro que esconde sua realidade, esta
influência no pensamento humano pode ser colocada como “às escuras”.
A composição ideológica aplicada por
estes meios reflete a presente – talvez mais influente – em nossa sociedade, de
claro caráter androcêntrico e
patriarcal, o que implica na crença em um papel “secundário” feminino. Como
adverte Bourdieu, alguns mecanismos que perpetuam esse comportamento perderam
força “e a dominação masculina tenha
perdido algo de sua evidência imediata”[3], porém, mesmo com
ligeiros avanços, “alguns dos mecanismos
que fundamentam essa dominação continuam a funcionar, como a relação de causalidade
circular que se estabelece entre as estruturas objetivas do espaço social e as
disposições que elas produzem, tanto nos homens quanto nas mulheres.”[4] Estes, como
tentativa de fundamentação revelam um sistema evidentemente preconceituoso.
As injunções continuadas, silenciosas e invisíveis,
que o mundo sexualmente hierarquizado no qual elas são lançadas lhes dirige,
preparam as mulheres, ao menos tanto quanto os explícitos apelos à ordem, a
aceitar como evidentes, naturais e inquestionáveis prescrições e proscrições
arbitrárias que, inscritas na ordem das coisas, imprimem-se insensivelmente na
ordem dos corpos.[5]
Parte 2:
Os símbolos
Sobre as aceitações,
destaca-se – no caso proposto – a invasão masculina na decisão acerca o aborto
de anencéfalos, parte específica de um assunto muito mais amplo: abortos.
Trata-se de uma questão envolvendo em primeira instância: o feto e a mulher.
Era de se esperar que a decisão fosse feita dentro desse círculo, ou seja,
partindo da mulher; mas, como segunda instância, surgem outros atores que não
deveriam se relacionar ao peso desta escolha. Surgem portanto, a força dos
símbolos e das instituições que os carregam.
Como poder simbólico, compreende-se como
aquele “poder de construção da realidade
que tende a estabelecer uma ordem gnoseológica: o sentido imediato do mundo (e,
em particular, do mundo social)”[6]. É, pois, devido
ao caráter estruturante que lhe é
intrínseco – por ser ele próprio estruturado
–, “uma concepção homogênea do tempo, do
espaço, do número, da causa, que torna possível a concordância entre as
inteligências.”[7]
O elemento
universalizante dos instrumentos simbólicos são claros quando se analisa
conjuntamente a estes, a ideologia. Estas servem interesses particulares
visando homogeneizar – universalizar –
os interesses.
“A
cultura dominante contribui para a integração real da classe dominante [...];
para a integração fictícia da sociedade no seu conjunto, portanto, à
desmobilização (falsa consciência) das classes dominadas; para legitimação da
ordem estabelecida por meio do estabelecimento das distinções (hierarquias) e
para a legitimação dessas distinções.”[8]
Tem-se, pois, que o
caráter simbólico de uma dominação objetiva tanto legitimar esta dominação
quanto fortificação de quem domina – pela integração
da classe dominante. O campo simbólico é um meio de lutas e tentativas de
imposição de um “modo de ver o mundo” – símbolos
– de cada classe. Assim, os instrumentos simbólicos, como
instrumentos de dominação, relacionam-se ao poder, às ideologias e à “classe”
dominante.
Sobre a dominação
masculina, um “fator determinante na
perpetuação das diferenças é a permanência que a economia dos bens simbólicos
(do qual o casamento é uma peça central) deve à sua autonomia relativa, que
permite à dominação masculina nela perpetuar-se.”[9] Tal dominação,
apoiada por sistemas diversos, estrutura um sistema
simbólico, que – como já explicado – visa construir e manter uma
organização baseada em uma legitimidade de violência simbólica. A família, como
peça dessa organização de dominação e tida como “guardiã do capital simbólico”[10], recebe tanto
apoio da Igreja quanto do Direito.
Retomando: o Direito –
assim como outras instituições – tem, como elementos estruturadores, certas
pulsões de instrumento simbólico; no
entanto, o avanço das conquistas sociais – as lutas no campo simbólico –
retiraram de sua substância parte de seu caráter androcêntrico; retirar este caráter significa desconstruir os
valores e ideais – símbolos – do Direito.
O
campo jurídico é o lugar de concorrência pelo monopólio do direito de dizer o
direito, quer dizer, a boa distribuição (nomos) ou a boa ordem, na qual se
defrontam agentes investidos de competência ao mesmo tempo social e técnica que
consiste essencialmente na capacidade reconhecida de interpretar [...] um
corpus de textos que consagram a visão legítima, justa, do mundo social.[11]
O Direito, pelo aspecto
ordenador – e principalmente pela rigidez normativa que este se aplica, muitas
vezes em face às transformações – carrega consigo uma visão – leitura – de sociedade
que dificilmente se altera; portanto, as tensões do mundo social forçam ao
máximo transformações no mundo normativo, visto que “no texto jurídico estão em jogo lutas, pois a leitura é uma maneira de
apropriação da força simbólica que nele se encontra em estado potencial”[12]. Porém, mesmo
contra certos textos normativos, o intérprete encontra-se diante de um sistema
duramente hierarquizado, em que “a
Justiça organiza [...] não só as instâncias judiciais e os seus poderes [...]
mas também as normas e as fontes que conferem a sua autoridade e essas
decisões.”[13].
Fica evidente portanto que a construção do Direito baseada nos símbolos – em sua
estruturação simbólica – influencia na maneira de como este constrói um sistema
normativo – estrutura as normas e a perspectiva de sociedade – de modo que esta
instituição se fecha diante à mudanças. Estas sendo possíveis sempre dentro de
um potencial, colocado normalmente entre a Razão e a Moral.
Parte 3:
A decisão
A ADPF 54/DF demonstra
o embate existente entre a Razão e a Moral existente no plano jurídico quando
relaciona o caso de extrema complicação e risco à mulher com o ato do aborto –
e as significações que este carrega, pelos símbolos que lhe são atribuídos pela
Igreja, pela família e pelo Estado.
Ao
sustentar a descriminalização da prática, o ministro e relator Marco Aurélio de
Mello afirmou: “A incolumidade física do feto anencéfalo, que, se
sobreviver ao parto, o será por poucas horas ou dias, não pode ser preservada a
qualquer custo, em detrimento dos direitos básicos da mulher”. Para ele, “é
inadmissível que o direito à vida de um feto que não tem chances de sobreviver
prevaleça em detrimento das garantias à dignidade da pessoa humana, à liberdade
no campo sexual, à autonomia, à privacidade, à saúde e à integridade física,
psicológica e moral da mãe, todas previstas na Constituição”[14]
Apesar da aprovação, alguns votos contra se destacaram, como são os casos
de:
Ricardo
Lewandowski votou contra a permissão do aborto, considerando que esse poderia
ser um precedente para a liberação da interrupção de gestações em outros tipos
de más-formações fetais. A sessão foi então encerrada com o segundo voto
negativo, do presidente do STF, Cezar Peluzo, que considerou a descriminalização
do aborto de anencéfalos um “massacre”.[15]
Por fim, “com a nova decisão, a anencefalia passa a ser equiparada à morte
encefálica e, portanto, permitida na legislação brasileira, que considera
atualmente o aborto como crime punível, exceto em condições de risco de vida
materna ou decorrente de estupro.”[16]
Direitos às mulheres foram garantidos com a nova decisão e, apesar de invisíveis,
grandes alterações podem ser deduzidas no campo simbólico, quando se prevalece
a integridade da mulher em detrimento da visão maternal que lhe é atribuída –
em conjunto com outros diversos papéis e símbolos.
Roan Dias - 1º ano Direito diurno
Bibliografia:
BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002 ed. 2
_____________ O poder simbólico. Rio de Janeira: Bertrand Brasil, 2004 ed. 7
OLIVEIRA, Flávia Ribeiro de; CAMARGOS, Aroldo Fernando. Descriminalização do aborto de anencéfalos: a conquista de um direito e o início de vários dilemas éticos Disponível em: http://files.bvs.br/upload/S/0100-7254/2012/v40n3/a3215.pdf; Acesso em 05/12/2015 as 17:52
[1] Comentário de Maria Helena Kühner
sobre a obra “A dominação masculina”, presente na contracapa.
BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002 ed. 2
BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002 ed. 2
[3] BOURDIEU, Pierre. Op. cit p. 71
[4] Ibidem
[5] Ibidem
[6] BOURDIEU, Pierre. O poder
simbólico. Rio de Janeira: Bertrand Brasil, 2004 ed. 7 p. 9
[8] BOURDIEU, Pierre. O Poder... p. 10
[9] BOURDIEU, Pierre. A dominação...
p. 115
[10] Ibidem
[12] BOURDIEU, Pierre. O Poder... p
213
[13] Idem, p. 214
[14] OLIVEIRA, Flávia Ribeiro de;
CAMARGOS, Aroldo Fernando. Descriminalização do aborto de anencéfalos: a
conquista de um direito e o início de vários dilemas éticos p. 1
[15] Ibidem
[16] Ibidem
Assinar:
Postagens (Atom)