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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Todo ano ...



Todo ano precisamos declarar nossa renda à Receita Federal.
Todo ano vemos políticos corruptos gastando dinheiro pertencente à União.
Todo ano os cidadãos brasileiros trabalham o quanto podem para ter uma vida digna.
Todo ano os políticos tiram meses de férias e a carga horária de trabalho é ridícula.
Todo ano assuntos públicos se misturam com privados, proporcionando atos imorais na política.
Todo ano famintos são presos por roubarem pão.
Todo ano políticos ficam ilesos por roubarem milhões de reais.
Todo ano centenas de pessoas pensam em entrar na política, afinal, é um lugar propício para enriquecer.
Todo ano ministros e mais ministros brasileiros são substituídos ou pedem demissão. Por que será?
Todo ano transporte públicos são utilizados para viagens particulares.
Todo ano o impostos aumentam.
Todo ano serviços públicos de qualidade diminuem.
Todo ano não conseguimos distinguir aquilo que é público e privado.
Todo ano o que é público se torna privado.
Todo ano o que é privado se torna público.
Todo ano convivemos com esse tumulto na política.

Privatização Da Esfera Pública

"Também hoje, portanto, não é unívoca por toda parte a delimitação das esferas do direito público e do privado. Muito menos ainda aconteceu isso no passado. Pode até faltar completamente a possibilidade de uma distinção. Isso acontece quando todo direito e todas as competências, especialmente todos os poderes de mando, têm o caráter de privilégios pessoais (na maioria das vezes, tratando-se do chefe do Estado), denominados 'prerrogativas'. Nesse caso, a faculdade de pronunciar o direito em determinada causa ou de chamar alguém às armas ou de exigir sua obediência noutras situações é tanto um direito subjetivo 'adquirido' e eventualmente também objeto de um acordo jurídico, de uma alienação ou de uma transmissão hereditária, quando, por exemplo, a faculdade de aproveitar determinado pedaço de terra. Nesse caso, o poder político, do ponto de vista jurídico, não tem estrutura de instituição, mas apresenta-se na forma de relações associativas e compromissos concretos dos diversos detentores e pretendentes de faculdades de mando subjetivas. Quanto à sua natureza, o poder de mando político, o do pai de família, o do senhor territorial ou o do senhor de servos não diferem neste caso : trata-se da situação de 'patrimonialismo'. Conforme a extenção, em cada caso, dessa estrutura do direito - e ela nunca foi realizada até as últimas conseqüências - tudo o que corresponde a nosso direito 'público' é juridicamente objeto de um direito subjetivo de detentores de poder concretos, exatamente como uma pretensão jurídica privada".
Na obra "Wirtschaft Und Gesellschaft" ( Economia E Sociedade ), no capítulo VII, "Sociologia Do Direito", particularmente no parágrafo primeiro, "A Diferenciação Das Áreas Jurídicas Objetivas", Max Weber observa, quando discorre acerca das fronteiras entre o Direito Público e o Direito Privado, que, não raro, ocorre a privatização da esfera pública. A obra de Weber, todavia, ainda que publicada em 1922, tem um tom de contemporaneidade. Tal tom manifesta-se com absoluta clareza na permeabilidade, por vezes constatada na história dos mais variados Estados, entre as fronteiras do público e do privado. Ao processo de dissolução destes limites, bem como o exercício de um poder paternal, através dos quais se considera patrimônio privado o público, dá-se o nome de patrimonialismo. Comum na Antigüidade Oriental, a exemplo dos Antigos Impérios Egípcio, Assírio, Caldeu, Persa, Hindu e Chinês, o patrimonialismo, entretanto, não se restringiu a eles : foi praticado entre os bárbaros germânicos e, posteriormente nas diversas monarquias do "Ancien Régime". É, aliás, durante este último período, que a privatização da esfera pública encontra expressão na máxima de Luís XIV : "L'État c'est moi". A França, porém, não foi o único Estado europeu a suportar o jugo da indiferenciação entre o público e o privado. Também a Inglaterra o suportou. Presente sobremaneira em Portugal, o patrimonialismo passou a integrar de forma marcante o funcionalismo público no Brasil. Prova suficiente foram as célebres críticas de Gregório de Matos no Brasil Colônia. A confusão entre o público e o privado permaneceu na República. Utilizaram-se dela os coronéis do café e todas as gerações de funcionários públicos seguintes a eles. O patrimonialismo ainda aflora na sociedade e governo brasileiros. A eliminação da separação entre o público e o privado, a exemplo do texto intróito, continua sobrevivendo. Para Weber, as suas origens, todavía, são arcaicas : "O portador original de toda 'administração' é a autoridade doméstica. Na ausência de limitações que primitivamente a caracterizam, não há direitos subjetivos dos submetidos ao poder perante o chefe da família, e, quanto ao comportamento deste diante daqueles, as normas subjetivas existem no máximo como reflexo heterônomo das limitações sacras de suas ações. Em consonância com isto, também é primitiva a coexistência da administração, em princípio totalmente ilimitada, do chefe da família dentro da comunidade doméstica, por um lado, e do processo arbitral, baseado em acordos sobre expiação e provas entre os clãs, por outro. somente nele se discutem 'pretensões' ( direitos subjetivos, portanto ) e pronuncia-se um veredicto; somente nele encontramos - e ainda veremos por que - formas fixas, prazos, regras referentes às provas; em suma, os inícios de um procedimento 'jurídico'. O procedimento do chefe da família no âmbito de seu poder desconhece tudo isso. É a forma primitiva do 'governo', do mesmo modo que aquele procedimento é a forma primitiva da aplicação do direito. Ambos distingüem-se também quanto às suas esferas. a soleira da casa era ainda, incondicionalmente, o limite da justiça da Antigüidade romana. Veremos adiante como o princípio da autoridade doméstica foi transferido, para além de seu âmbito primitivo, a certas formas do poder político : o principado patrimonial, e com isso também a certas formas da aplicação do direito. Onde quer que isso aconteça, rompem-se os limites entre a criação do direito, a aplicação do direito e o governo. A conseqüência pode ser dupla. A aplicação do direito adota formal e objetivamente o caráter de 'administração', realizando-se como esta sem formas e prazos fixos, segundo critérios de conveniência e eqüidade, mediante simples comunicados ou ordens do senhor aos submetidos. Em seu pleno desenvolvimento, essa situação existe apenas em casos-limite. Aproximam-se dela, no entanto, o processo 'inquisitorial' e toda aplicação do 'princípio da atuação oficial', ou, ao contrário : a administração adota a forma de um processo jurídico - isso ocorria em grande escala na Inglaterra e, em parte, ocorre ainda hoje. O Parlamento inglês discute os private bills, isto é, atos puramente administrativos ( concessões, etc. ), da mesma forma, em princípio, que discute os 'projetes de lei', e a falta de separação das duas esferas é própria do procedimento perlamentar mais antigo, sendo até decisiva para a posição do Parlamento, pois este nasceu como instituição judicial e, na França, chegou a assumir completamente este caráter. Essa dissolução dos limites foi condicionada por circunstâncias políticas. Mas também na Alemanha trata-se o orçamento, um assunto administrativo, como 'lei', seguindo-se o modelo inglês, e por motivos políticos. A oposição entre a 'administração' e o 'direito privado' também se torna indistinta quando a ação dos órgãos da associação como tais adota as mesmas formas que a relação associativa entre indivíduos, isto é, quando os órgãos da associação, em virtude de seus deveres, fazem com indivíduos, membros da associação ou não, um 'acordo' ( contrato ) sobre prestações e contraprestações entre o patrimônio da associação e o dos indivíduos".