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domingo, 28 de agosto de 2011

Sociedade moderna, técnica ou passional?

O direito como técnica tenta mediar questões conflituosas na sociedade, com base na razão. Com a especialização das funções na sociedade moderna, esta não é mais guiada pela consciência coletiva, pois com a diferenciação é preciso de formas distintas de compreensão, sendo assim essa é a sociedade do contrato, o qual traz harmonia, contribuindo para a solidariedade orgânica, fazendo com que os limites sejam respeitados, haja coesão social, conflitos sejam evitados e cada indivíduo realize sua função, cumprindo os contratos feitos.
A complexidade dessa sociedade pressupõe a mediação pelo direito, para impedir a ocorrência de anomia. Dessa forma, em uma sociedade guiada pela razão, o direito se faz restitutivo: tenta restituir o individuo, para que ele continue realizando sua função na sociedade. Devido a diferenciação social, o direito necessita de sanções e interpretações especializadas, por isso ele deve se fazer através de técnica, para que assim atenda a essa racionalidade e evite decisões passionais, típicas de sociedades primitivas.
Porém a técnica não sacia a vontade da maioria, pois muitas vezes contraria a consciência coletiva, que defende um direito passional, assim como nas sociedades primitivas, nas quais a pena tem como agravante envergonhar o individuo e causar um sofrimento proporcional ao que ele gerou, uma punição de caráter moral, nestas sociedades o juiz realiza sua sentença após uma análise de paixões contrárias.
Embora a sociedade e a mídia façam com que muitas vezes as paixões prevaleçam sobre a razão, influenciando nas decisões judiciais, de forma antagônica deveria ocorrer na modernidade, pois em uma sociedade racional, o direito como técnica deve prevalecer sobre as paixões, deve ser questionado, não é dogmático e sim passível de modificações, discussão, novas interpretações e aperfeiçoamento.
Portanto, o direito, expressando a razão moderna, media as relações sociais, para que dessa forma as paixões não prevaleçam e os compromissos firmados nos contratos sejam honrados, garantindo, dessa forma, o bom funcionamento da sociedade e afastando a perspectiva da anomia.


Tema: A mediação do direio como expressão da razão moderna.

Unidade Passional

Em toda a história da civilização ela buscou que os seus semelhantes permanecessem unidos. Os povos mais antigos se uniam conforme suas crenças e costumes que resultavam em fim em seus ordenamentos. Com a maior especialização social, o aumento das crises, a maior complexidade das relações e o crescimento populacional a teia de conexões entre os indivíduos torna-se cada vez mais indecifrável. Entretanto, mesmo após tantas transformações o fundamento dessa reciprocidade é o mesmo. As afinidades passionais da sociedade permanecem sobre a discrepância de funções.
Émile Durkheim diz que os indivíduos são unidos pela individualidade de seus ofícios, de seu trabalho. Há um solidariedade vinculada à complementaridade das funções. Todavia, acredito que a sociedade não é construída apenas por consequência de uma necessidade física ou profissional. Se apenas os elemento racionais edificassem um grupo então os povos não seriam tão heterogêneos.
O elemento chave da coesão é a união passional. As paixões surgem do âmago dos indivíduos e são influenciadas por suas crenças mais remotas e vivências históricas. Um país pode ser laico oficialmente, mas poderá lutar arduamente com uma sociedade religiosa e conservadora ao lutar por determinadas mudanças jurídicas, por exemplo, mas não podendo ignorar o fato de que condutas e opiniões estão aptos a permanente processo de construção.
A expressão viva da existência de paixões comuns é o Direito. O ordenamento jurídico é basicamente a manifestação da consciência comum da sociedade contra crimes, a favor das penas, e em direção a um significado justiça abundantemente disseminado em meio à sociedade em questão. O operador do direito expressa a técnica de lidar racionalmente com a alma comum da sociedade.
Uma sociedade consegue ser coesa em sistema de pouca diferenciação de funções e também em casos de extrema individualidade, mas jamais será unificada se a consciência não for comum. As paixões surgem durante toda a elaboração e evolução social e devem ser guardadas pela ordem jurídica que nada mais é do que a admiração maestral dos instintos e afetos.

(Tema 1: a razão das paixões)

"Ubi jus, ibi societas. Ubi societas, ibi jus"

O Iluminismo operou uma revolução no ponto de vista filosófico e político, e consequentemente atingiu também o direito. Muitos pensadores começaram a criticar os abusos sofridos pelos criminosos e a própria validade e eficácia lei. Nessas época nasceu umas das maiores obra-primas do direito, o livro "Dos Delitos e das Penas", de Cesare Bonesana, o Marquês de Beccaria. Esse pequeno livro investe contra o uso das leis em favor de minorias; a falta de proporcionalidade entre a pena e o delito; a tortura para obtenção de confissões; as sanções cruéis e a pena capital. Beccaria defende em sua obra a moderação das penas, o princípio da legalidade (nullum crimen, nulla poena sine lege), sendo, em suma, a obra que fundou um novo pensamento penalista, o direito perde muito o caráter punitivo e nasce a ideia do direito restitutivo. Durkheim explica essa transição defendendo a expressão técnica do direito, pois não é um estado emocional da sociedade, e sua sanção objetivará a reposição da ordem social, ele usa uma analogia do direito como sendo o sistema nervoso e a sociedade um corpo, a tarefa desse sistema é de regulação do corpo.

Assim como o corpo humano está à mercê da ação de centenas de doenças causadas por fatores externos, mas com mais ênfase as mutações do próprio corpo gerando anomalias. É dessa forma que podemos explicar os conflitos internos da sociedade, movidos pelas suas próprias paixões e as individuais, que podem gerar um câncer. Um criminoso ou corrupto lesa a sociedade e também a ele mesmo por uma consequência, mas como uma célula desse organismo que é a sociedade, poderá perceber que sua ação é danosa a ele próprio?

A função suprema do direito, defendida por Durkheim, é o controle social das paixões, que as emoções humanas podem gerar. Há um agregamento de opiniões diversas que unem as pessoas, para Durkheim uma espécie de consciência coletiva, que cria a solidariedade coletiva. E, na modernidade, não são crenças que unem os indivíduos, mas uma ideia de interdependência criada pela diferenciação crescente do trabalho. Somos todos nós dependentes de profissões que desconhecemos parcialmente ou total, pois é uma espécie de exigência de mercado nos especializarmos, exemplo: um cirurgião, que apesar de ter estudado todo o corpo humano, tem como especialidade só a cirurgia cardíaca. É exatamente por isso que o direito é tão importante, ele deve ajudar de todas as formas na manutenção social. Uma forma de concepção do direito é como sendo uma coisa social e não como apenas uma defesa de interesses individuais, mostrado por Durkheim no seguinte trecho: "Conquanto o casamento seja um contrato, os esposos não podem nem estabelecê-lo, nem rescindi-lo a seu bel-prazer".

Caso o direito não existisse, não existiria a sociedade. O que levou os legisladores romanos a criarem o brocardo "Ubi jus, ibi societas. Ubi societas, ibi jus". Por isso, mesmo nos casos que mais inflam a opinião pública, como tantos homicídios que podemos citar, o direito se mostrará técnico e não emocional. Por fim, o direito pode ser visto como uma força criada pela própria sociedade, para organizar e fazer com que a própria sociedade o cumpra.

Arcaicos e modernos.

Durkheim em seu capítulo três trata, desta vez, da solidariedade orgânica. Se a mecânica é tipica das sociedades pré-modernas como uma expressão colérica, passional da consciência coletiva, ao contrário, a solidariedade orgânica que se manifesta - em tese - em comunidades de maior racionalidade, nestas, o autor diz ser característico a maneira como a restituitividade das penas contribui para a divisão do trabalho capaz de manter a ordem.

De fato e com efeito, no cenário mundial estão presentes diversos exemplos cabíveis à Durkheim. Países onde o arcaico e o moderno convivem ou em outros quais o arcaicaismo se supera e vice-versa.

Serra Leoa, país africano cuja instabilidade é marcante, vive em constante desagregação, com diversas guerras civis, devido à falta de um governo estável e eficaz. "Tal situação foi favorável ao surgimento ou aumento de atos de violência, de corrupção, de desmandos, de práticas clientelistas ou de favoritismos, problemas fiscais, roubos, saques, criminalidade, tortura, enfim, uma situação insustentável" (fonte) a qual, acrescento, beira à anomia. O Direito nos moldes como o conhecemos, não vigora em tal lugar a medida que não consegue atingir a população que vive numa situação tão complexa de desordem que só o que resta pra se defender é o que consegue encontrar. É a completa lei de talião.

Ao contrário, nos países nórdicos - que rankeiam as pesquisas de IDH - temas básicos como saúde, alimentação, segurança, analfabetismo já foram há anos superados ou encontraram uma estabilidade; o Direito também, como fenômeno dinâmico, têm acompanhado tais aclamações. São países que estão partindo para discussões ditas supérfluas para a maioria dos outros e que exportam até a maneira de se fazer o Direito. Pois, estão em outro estágio de desenvolvimento aproximando - se de índices zero.

O Direito pois, como fenômeno social que descansa numa aceitação voluntária humana, se encontra difuso, e consolidado a depender do estágio moral, ético e religioso em diferentes locais.

Paixão, lei, direito, sanção

Na obra ''A Divisão Social do trabalho'', mais precisamente no capítulo ''A Solidariedade devido à divisão do trabalho ou orgânica'', Durkheim explicita dois tipo de solidariedade: uma negativa e outra positiva.A primeira tem como traço a vida privada de cada um, não interferência de estranhos para garantir a função social de cada indivíduo na sociedade.Já a segunda se baseia na boa vontade, na solidariedade e no cooperativismo entre pessoas para garantir o funcionamento de determinada sociedade.

Essa solidariedade negativa nos remete ao Direito Penal ou Repressivo, porquanto uma vez que haja a violação da esfera particular deve-se existir também uma sanção a essa violação.Dessa maneira o Direito atua refreando emoções humanas, limitando a convivência ao se negar ou desrespeitar condições humanas básicas, como a liberdade, a vida, o livre arbítrio.

Não só a solidariedade negativa refreia paixões humanas, como também uma ameaça à paz coletiva, por exemplo ao se dirigir embriagado, fato que acarretará sanções.Nesse aspecto há de se levar em conta também como agente refreador o descaso público em algumas áreas sociais e a corrupção na política.

Por fim, por ser algo científico, o Direito cada vez mais se utiliza da técnica e não da emoção/paixão para julgar, decidir...Por isso atualmente cresce a limitação das emoções humanas como prova desse fato e em conjunto com a solidariedade negativa e as ameaças coletivas.

A racionalidade e as emoções no Direito

O direito surge na sociedade a partir da necessidade de um controle social, ou seja, tem a função de resolver conflitos e choques de interesses entre as pessoas além de tornar possível uma boa convivência entre os indivíduos. A moral, religião e a consciência, nenhum desses fatores, foi capaz de frear os comportamentos defeituosos e solucionar os problemas originados dos conflitos. Vê-se dai, que o Direito surge como fruto de vários fatores sociais e serve de intermédio entre dois mundos, o jurídico e o social.

Para Durkheim, nas sociedades primitivas a coesão social é mais assegurada por uma consciência coletiva que possui as mesmas crenças, os mesmo valores sociais. Porém, nas sociedades orgânicas, característica das sociedades mais complexas, há uma maior diferenciação individual e social. Além dos indivíduos não compartilharem de mesmos valores e crenças seus interesses pessoais são bastante distintos. Durkheim entende essas sociedades complexas como grandes organismos vivos, onde os órgãos são diferente entre si, porém todos dependem um do outro para um bom funcionamento. Visto isso, percebe-se que o aumento da divisão social do trabalho aumenta, também, a interdependência entre os indivíduos.

O Direito, nas sociedades em que predomina a solidariedade orgânica, tem como uma de suas funções garantir a coesão social, qual não esta assentada em crenças, valores sociais ou religiosos, mas sim nos códigos e regras de conduta que são expressos nas normas jurídicas. Vê-se que o direito é assentando, principalmente na racionalidade, porém na tomada das decisões humanas, as suas paixões, como a religião, moral, influem. Um exemplo claro é na diferença de condenação, por parte da população, entre um homicídio e um crime de sonegação de imposto. O homicídio é capaz de movimentar grandes massas em prol da justiça, da condenação do autor do crime e essa pressão popular influirá na decisão que o juíz tomará em relação ao caso, fazendo com que este não se baseia, somente, nas frias normas do código penal.

Portanto, apesar do direito, atualmente, ser uma grande expressão da racionalidade humana, este ainda sofre, e deve sofrer, influencia das paixões humanas. Assim este representará de maneira mais efetiva a consciência coletiva, a qual deve sempre basear-se para formular novas normas.




































































Direito: tutela de paixões


Segundo Durkheim, com a maior especialização e divisão do trabalho, cresce também a interdependência junto com a personalidade.

O direito surge então para assegurar duas formas de solidariedade: a negativa (que delimita e protege a distância entre as pessoas para evitar conflitos, não havendo cooperação) e a positiva (que regula as ações de interdependência e cooperação).

Além da solidariedade positiva, a Consciência Social, ou seja, as paixões comuns, também é instrumento da coesão e unidade social. O direito não tem a função de refrear as paixões, mas sim de sistematizá-las, delimita-las, positivá-las nos Códigos.

Para explicar a influência das paixões, utilizarei dois crimes como exemplo: 1 – Um assassinato: causa grande comoção popular e é tido como um dos mais graves delitos e merecedor das maiores penas. 2 – Sonegação de Impostos: Não desperta sentimentos muito intensos na população. Do ponto de vista racional, um assassinato, ou seja, a eliminação de uma célula dentre bilhões das pertencentes ao corpo social, não compromete o funcionamento do organismo como um todo; Já uma questão tributária, econômica pode levar um Estado à miséria, uma crise mundial. O motivo pelo qual a mídia fica em cima de casos como o dos “Nardoni” ou “Richthofen” ao mesmo tempo em que não se procura criminalizar ou ao mesmo identificar os bancos que deram início à crise imobiliária nos EUA em 2008 é o mesmo: o que toca e o que não toca as paixões dos homens.

Com exceções, pode-se até dizer que os atos reprovados fortemente pelos indivíduos, em geral, têm origens na nossa ancestralidade, ou seja os atos que comprometiam o bom funcionamento tribal: crimes contra a vida, tortura, incesto, etc. são ainda hoje os que causam as maiores comoções. Como disse Durkheim, a consistência e pouca flexibilidade da Consciência social é o motivo pelo qual o direito penal avança tão lentamente.

As paixões são, em alguns aspectos, positivas e úteis (como na exigência popular de que criminosos não fiquem impunes); e em outros campos as paixões podem ser sinal de atraso e irracionalidade (como exemplo têm-se os Estados religiosos, ou até mesmo a repressão ligada ao gênero ou condutas sexuais nos Estados ocidentais).

O direito, portanto, deve tentar livrar-se das paixões inúteis e retrógradas para proteger minorias discriminadas e atender a direitos fundamentais e, ao mesmo tempo, tutelar e acatar a alguns sentimentos imprescindíveis à manutenção da coesão social sob um viés racional e humanitário.

Alcançando a harmonia

É possível analisar as sociedades modernas a partir de sua característica marcante, rotulada por Durkheim como solidariedade orgânica. Nesta prevalece à união dos indivíduos a partir do complemento de suas funções sociais, de seus trabalhos com aspectos particulares, não mais ligados e guiados apenas pela consciência coletiva. As nossas diferenças nos permitem adquirir aspectos que fortalecem o meio em que vivemos. Estas vêm ganhando importância e funcionam como em um corpo, cujo cada órgão cumpre sua função, e no meio social são unidas por uma força superficial cujo respeito gera a harmonia.

A partir do contrato os indivíduos se ligam e adquirem o conhecimento a respeito de seus limites na relação com os direitos de outrem. O Direito impede que as paixões prevaleçam e muda seu caráter que era predominantemente repressivo, para alcançar cunho restitutivo (ex: trabalho voluntário). Este passa a não mais punir os que estabelecem uma divergência no meio social, mas restituir e penalizar os que vão contra ou não cumprem sua função social, visando assim manter a coesão. Esse fator exige sanções mais especializadas, pois a normatividade não entra em concordância com a consciência coletiva, a sociedade não julga de maneira individual, justamente por causa de suas diferenças.

Para contornar os problemas sociais o Direito deve os atingir de modo cirúrgico, ou seja, tecnicamente, sem envolver a passionalidade. Ao se lidar com homicídios temos um exemplo claro da prevalência na utilização das técnicas ao invés das emoções. Durkheim reflete sobre essa racionalidade e analisa também o Direito em seu aspecto negativo em relação à solidariedade do indivíduo. No Direito Real não encontramos, por exemplo, a finalidade de vincular as pessoas (direito da propriedade, liga o indivíduo ao bem e não ao outro). E assim como no Direito Pessoal (que vincula um indivíduo ao outro) não promove nenhuma relação de cooperação. Porém, é a separação que evita discordância entre os seres, a fim de que haja coesão social, pois os espaços, ou limites são estritamente definidos, produzindo a solidariedade.

O Direito atualmente expressa a racionalidade ao refrear as paixões, promover o respeito, restituir os indivíduos e torna-los aptos ao cumprimento de seus papéis fundamentais na sociedade, promovendo a harmonia que nos torna capaz de atingir inúmeros avanços relevantes. Expressa- se a partir de seus contratos com seus sacrifícios mútuos, a caridade e o sentimento humano na força social.

O Romântico e o Parnasianista

Shakespeare já desafiava: "Mostre-me um homem que não seja escravo de suas paixões.".
Ele não o fazia à toa. É certo que na nossa condição de seres humanos já está incutido o agir do fator emocional. Em graus variáveis, mas inevitavelmente. Isso é bem claro em situações que envolvem o que está ligado afetivamente a alguém, como a perda de familiares, de bens com significado especial, o reencontro, etc. Essa é uma característica que distingue o homem dos outros seres vivos.

Pois é, engraçado como sempre nos vem à cabeça aquela mesma resposta para a pergunta "O que nos diferencia, seres humanos, dos outros seres vivos?". Prontamente e sem maiores dificuldades respondemos: "Somos seres racionais."
Talvez seja justamente devido a essa automaticidade que a gente se baste com essa afirmação. Mal paramos pra realmente pensar no que dizemos e então nos conformamos à ideia de que realmente o que nos difere dos outros é a racionalidade. De fato é, mas não somente. Somos seres "emocionais" eu diria. Choramos, sorrimos, ficamos apreensivos, aliviados, bravos, satisfeitos... e isso, de certa forma, é provocado pelo fato de sermos também racionais. Temos a capacidade de entender os fatos, interpretá-los e julgá-los. Prevemos consequências e as encaramos. E essa capacidade de raciocínio por vezes é o que provoca nossas emoções.
A família se entristece com a morte de um de seus membros, porque, racionalmente sabe que não o terá mais em seu meio.

Enfim, é impossível dissociar os seres humanos de suas paixões. Embora assim seja, isso não significa que elas devam concentrar o predomínio e o controle das nossas ações. Considera-se imprudente deixar-se levar pelos impulsos da emoção, pela ausência de reflexão sobre os efeitos que tais atitudes gerarão.

Semelhantemente, vemos no Direito esse conflito das paixões humanas e da sua racionalidade. Num mesmo caso, existe o juízo da lei, que exprime em suas letras o fruto da racionalidade concebida como a mais pura. E, por outro lado, o juízo de um povo, talvez indignado com determinada situação, desejando a condenação desse ato tamanhamente imoral. Ou até mesmo na posição dos juízes por profissão (afinal, por autoentitulação, todos o somos, não é mesmo?) podemos enxergar esse choque: por um lado, a consciência dele como pessoa, enxergando todas as complicações por trás do caso, por outro, sua postura como mero cumpridor da determinação do ordenamento jurídico, fria e impessoal. Que "padrão" de justiça adotar?
Um fator implicante é que, sendo cada um diferente dos outros, se nos deixássemos guiar unicamente pelas paixões, haveria uma enorme disparidade nos julgamentos mesmo em casos iguais, simplesmente por serem juízes diferentes, com manifestações passionais distintas. Assim já não atingiríamos a meta de "fazer justiça", principalmente aos olhos da igualdade. Portanto, faz-se necessário o uso da racionalidade, que funcionará como limitadora dessas emoções, agirá onde não couber àquela fazê-lo.

Contudo, reinando soberana e tão somente a racionalidade, perde-se o caráter humano. Cria-se um Direito totalmente frio, cego à característica de "seres emocionais". Inquestionável, negligente, insensível, indiferente. Como um Direito para robôs, acostumados a receber e acatar, sem pensar, sem sofrer, sem sentir falta, sem se importar consigo mesmos.

Mas há a opção, embora talvez seja a mais desafiadora, de somar a razão e as paixões. Paradoxalmente, são opostas e complementares. Esse equilíbrio seria como a formulação de Durkheim para se produzir a coesão: através da definição de espaços, estabelecendo linhas de atuação específicas; onde começa um e termina o outro. Balanceando as emoções através da sensatez e do controle da racionalidade, é possível obter-se um Direito verdadeiramente humano, que leva em conta aqueles à cuja harmonização se destina.

Direito como mediador das relações

Na modernidade, para Durkheim, os indivíduos não estão unidos por conta das crenças comuns, mas pela individualidade de seus ofícios de seu trabalho. Portanto pode-se dizer que nas relações contratuais entre os indivíduos há uma característica da modernidade, dessa forma é possível dizer ainda que o direito funciona como mediador entra as expressões da razão moderna.

O direito também se torna a expressão da modernidade porque a especialização que decorre da modernização do trabalho faz com que as pessoas percam parte da consciência que possuem de outros temas, já que estão acostumadas, e foram levadas a fazer tarefas específicas. O direito como uma matéria bastante abrangente e intimamente ligada aos contratos que são formados entre as pessoas no trabalho passa então a mediar essas relações da modernidade.

As Emoções no Direito

O Direito tenta refrear as paixões humanas por meio de suas codificações e teorias, mas não é um sistema predominantemente racional, pois consiste em decisões sobre as diferentes condutas humanas, de acordo com a ordenação social. Os atores, aqueles que tomam as decisões jurisdicionais não são plenamente racionalistas mesmo que o afirmem, pois respondem às suas experiências, seus valores, as influências que já sofreram e suas memórias.

Tendo isso em vista, o direito se configura como uma mistura dos dois mundos; o racionalismo normatiza as condutas e as emoções contribuem na tomada de decisões. A razão permite aos operadores do direito perceber e compreender fatos e situações do mundo para interpretar e aplicar o direito, porém aliam-se a isso as emoções, como as emoções morais, que são capazes de orientar esse processo de julgamento e aplicação.

De fato, as emoções ocupam um posto dominante na vida do homem, alterando sua maneira de pensar, de agir, de perceber o mundo; mas esta é a razão pela qual interessa aos juristas estudá-las e levá-las em conta na hora de julgar para que possa perceber com exatidão os antecedentes das condutas das pessoas.

Um ponto importante a ser destacado nesse tema é o fato de as emoções e sentimentos serem levados em consideração na hora de atribuir a responsabilidade de nossas ações. Um exemplo recente encontramos na absolvição de Severina Maria da Silva, acusada de mandar matar o próprio pai, com quem teve 12 filhos. O pai a submetia a abuso sexual desde que ela tinha 9 anos e ela admitiu ter mandado matá-lo diante do temor de que suas filhas viessem a sofrer o mesmo tipo de abuso. Os sentimentos de compaixão e de compreensão atenuam a censura que fazemos ao assassinato encomendado. Percebe-se, pois, por essas circunstâncias que a intervenção das emoções altera a responsabilidade penal.

Assim, o Direito, embora tente manter-se plenamente racional, refreando as emoções humanas, ainda é aplicado com o auxílio delas. Do contrário, a atuação do direito, por meio do juiz principalmente, seria insuficiente e deficiente, não levando em conta os processos emocionais que se desenvolvem naturalmente em todos os seres humanos.

Razoabilidade e Proporcionalidade

Émile Durkheim defende a ideia de que a divisão do trabalho tem como papel fundamental criar um sentimento de solidariedade entre os indivíduos. Desse modo, a especialização das funções exercidas pelos indivíduos, diferencia-os, contribuindo para uma maior interdependência, resultando, por conseguinte, na coesão social.

Todavia, há de se ressaltar que, segundo Durkheim, há dois tipos de solidariedade: a mecânica e a orgânica. Na sociedade mecânica, característica das sociedades primitivas em que há menor diferenciação social, haja vista que os indivíduos compartilham dos mesmos valores sociais. Além disso, a manutenção dessa igualdade é assegurada pela coerção social repressiva, visto que a ruptura da solidariedade social constitui crime. Já na sociedade orgânica, característica das sociedades mais complexas, há maior diferenciação individual e social. Desse modo, a coesão é garantida através de mecanismos de coerção formalizados, ou seja, através das normas jurídicas que estabelecem direitos e obrigações, sendo, sobretudo, o direito aplicado de forma racional, não mais movido pelas paixões. E mais, nesta sociedade há o predomínio das sanções restitutivas com a finalidade de reposição da ordem. Frise-se que esse tipo de sanção não reflete a consciência coletiva, tendo em vista que nem todos os atos impactam sobre a totalidade da sociedade.

Nota-se, portanto, que nas sociedades modernas predomina uma maior diferenciação dos indivíduos, cujo resultado é coesão social decorrente dessa interdependência dos indivíduos. Ademais, a presença do direito, como intermediário das relações sociais, restitui a coesão social de forma racional.

Todavia, não se pode olvidar que embora haja a presença de normas que garantam a racionalidade do julgamento dos atos que desequilibram a harmonia da sociedade e contrários à consciência coletiva, há de se ressaltar que o ser humano não se abstém completamente da influência de suas emoções, decorrentes dos sentimentos coletivos e de suas paixões.

Verifica-se, hodiernamente, a forte presença, no direito, de um equilíbrio envolvendo a racionalidade e a passionalidade humanas, como é o caso dos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. Faz-se mister, para a compreensão e aplicação desses conceitos, a reflexão do julgador, ou seja, sua discricionariedade, baseada tanto no seu conhecimento jurídico quanto em suas concepções particulares. É imprescindível, pois, que se estabeleça uma correspondência entre o fim a ser alcançado por uma disposição normativa e o meio empregado além da correlação entre os meios-fins. Desse modo, por exemplo, quando do julgamento, é imprescindível que a autoridade, pautada nas provas apresentadas, delimite, dentro das penas previstas em lei, qual é a mais adequada ao caso em questão. Por esse motivo é que o código penal brasileiro prevê, em seus dispositivos, faixas de prazos de penas, justamente para que haja uma ponderação da aplicação da sanção.

Nota-se, pois, uma complementação na relação de antinomia existente entre a razão e a emoção. A existência de ambas contribui para a manutenção da coesão social.

A sociedade e o direito moderno.

O direito sempre teve como uma de suas funções absorver a reação da sociedade a crimes e delitos e institucionaliza-las sob forma de punições.
Nas sociedades primitivas ou de organização sob a solidariedade mecânica essas punições demonstram exatamente a consciencia coletiva do povo,e a influencia de instiuições religiosas interferindo não só nas punições mas inclusive no que deve ou não ser considerado como crime

Em nossa sociedade contemporânea é possível observar um distanciamento do direito repressivo ou primitivo e uma aproximação com o direito restitutivo.
Ainda que isso aconteça concomitantemente com uma certa resistência de uma parcela, às vezes maior ou menor da população que, ainda no século XXI, demonstram reações hostis,passionais e até mesmo conservadoras diante da modernização do direito; o fato é que recorrer ao direito restitutivo é mais uma técnica,uma racionalização do direito com o objetivo resolver de forma mais lógica os problemas da sociedade do que uma revolução onde se degradam os principios como muitos costumam imaginar.
Enquanto o direito repressivo está difuso na sociedade,porque é possível observar no povo sempre uma opinião comum e generalizada sobre um assunto impressa na consciencia coletiva,o direito restitutivo se apresenta muito mais sofisticado com a presença de todo um aparato normativo e de instituições que formulam leis e resoluções para problemas modernos,portanto são soluções modernas também,e que procuram acompanhar a evolução e as mudanças.
Porém ainda com todos esses recursos o direito encontra problemas ao tomar decisões que tentam organizar melhor a sociedade,ora , como sempre a consciencia coletiva ou (de maneira grosseira) os setores conservadores que ao tentar preservar seus interesses acabam por criar empecilhos a racionalização do direito moderno.

Direito e o refreamento das paixões humanas

No Capítulo "A Solidariedade devida à divisão do trabalho ou orgânica",da obra "A divisão do trabalho social", Émile Durkheim sustenta que na divisão do trabalho social existem duas formas de solidariedade:uma positiva e outra negativa. A primeira se manifesta sob a forma de cooperação entre os indivíduos, cada um dos quais estaria encarregado de uma determinada função em meio à sociedade. Já a segunda é caracterizada pela abstenção, isto é, a não interferência de um indivíduo na esfera particular de outro, objetivando assim evitar o choque entre as funções dos indivíduos e a violação de direitos. Portanto, esta última forma de solidariedade tem como papel a delimitação das esferas particulares de cada indivíduo.
A solidariedade negativa, assim como o Direito repressivo, pode servir para refrear as paixões humanas, em particular aquelas cuja satisfação pressupõe que um indivíduo extrapole sua esfera particular, invadindo a de outro. A forma de solidariedade em questão pode ser observada nas diversas sanções, como a indenização e reclusão, particularmente para os casos em que os direitos de uma pessoa são violados. A exemplo desses direitos podem ser citados os direitos pessoais, tais como o direito à vida, à liberdade, à propriedade, à imagem, entre outros.
Além do princípio da solidariedade negativa, algumas paixões humanas também podem ser refreadas por meio do estabelecimento de sanções para os casos que representem um risco à uma coletividade(tais como o excesso de velocidade em rodovias) bem como para ações de improbidade(como é o caso do peculato e da corrupção na política).
Examinado a referida obra de Durkheim, é possível sustentar que a tarefa de controle da manifestação de algumas paixões humanas foi delegada ao direito desde as origens deste, fase em que o direito era caracteristicamente repressivo. Posteriormente, com o surgimento do direito restitutivo, essa tarefa não deixou de se fazer presente na ciência jurídica. Entretanto para que essa tarefa seja cumprida de maneira satisfatória, é necessário que as penas sejam efetivas e que haja fiscalização do cumprimento das leis, caso contrário algumas paixões humanas podem comprometer a convivência em sociedade.

A Solidariedade Orgânica E O Direito Racional

''Em resumo, as relações que o direito cooperativo com sanções restitutivas regula e a solidariedade que elas exprimem resultam da divisão do trabalho social.É fácil entender, aliás, que, em geral, as relações cooperativas não comportam outras sanções.De fato, pertence à natureza das tarefas especiais escapar da ação da consciência coletiva; porque, para que uma coisa seja objeto de sentimentos comuns, a primeira condição é que seja comum, isto é, que esteja presente em todas as consciências e que todas possam representá-la de um só e mesmo ponto de vista.Sem dúvida, enquanto as funções têm certa generalidade, todo o mundo pode ter algum sentimento a seu respeito; no entanto, quanto mais se especializam, mais também se circunscreve o número dos que têm consciência de cada uma delas; e mais, por consegüinte, elas vão além da consciência comum.As regras que as determinam não podem, pois, ter essa força superior, essa autoridade transcendente que, quando é ofendida, reclama uma expiação.É também da opinião pública que lhes vem sua autoridade, do mesmo modo que a das regras penais, mas de uma opinião localizada em regiões restritas da sociedade''.
Na obra ''De La Division Du Travail Social'' ( Da Divisão Do Trabalho Social ), mais precisamente no capítulo III do Livro I, ''A Solidariedade Devida À Divisão Do Trabalho Ou Orgânica'', David Émile Durkheim apresenta a mediação do Direito em sociedades complexas como a expressão da racionalidade moderna.Na mesma obra e livro, na altura do capítulo I ( ''Método Para Determinar Esta Função'' ), o sociólogo francês subdivide, alicerçando-se no Funcionalismo, as sociedades humanas em primitivas ou pré-modernas e em complexas ou modernas.Estas últimas, são caracterizadas pela racionalidade que engendra uma maior divisão do trabalho social.Tal divisão é a geratriz da solidariedade orgânica, que a todos vincula na sociedade moderna, bem como é também a gênese do Direito Restitutivo, próprio desta sociedade.A idéia de expiação, tão essencial no Direito Repressivo das sociedades primitivas, é permutada pela idéia de reparação, imprescindível ao Direito Racional : ''A própria natureza da sanção restitutiva basta para mostrar que a solidariedade social a que esse direito corresponde é uma espécie de bem diferente.O que distingüe essa sanção é que ela não é expiatória, mas se reduz a uma simples restauração''.Para Durkheim, o Direito nas sociedades complexas, impregnado de racionalismo e de repúdio à passionalidade, não anela ministrar sanção à altura do delito; tão pouco busca humilhar o delinqüente ou puní-lo via pena difusa; antes, é técnico e operacional; é o direito das indenizações : ''Um sofrimento proporcional a seu malefício não é inflingido a quem violou o direito ou o menospreza; este é simplesmente condenado a submeter-se a ele.Se já há fatos consumados, o juiz os restabelece tal como deveriam ter sido.Ele enuncia o direito, não enuncia as penas.As indenizações por perdas e danos não têm caráter penal, são somente um meio de voltar ao passado para restituí-lo, na medida do possível, sob sua forma normal.A inobservância dessas regras sequer é punida por pena difusa.O pleiteante que perdeu seu processo não é humilhado, sua honra não é enodoada.A violação dessas regras não atinge, pois, em suas partes vivas, nem a alma comum da sociedade, nem mesmo, pelo menos em geral, a desses grupos especiais e , por consegüinte, só pode determinar uma reação muito moderada.Tudo de que necessitamos é que as funções concorram de maneira regular; portanto, se essa regularidade for perturbada, basta-nos que seja restabelecida''.O Direito Racional, uma vez que a divisão do trabalho social se intensifica, não corresponde a um dispositivo inerte ou estático, não se identifica com um sistema imutável ou incontestável, nem está assentado na passionalidade; ao contrário, é passível de alterações e mutações e rejeita veementemente o não-científico : ''Podemos até imaginar que essas regras sejam diferentes do que são, sem que isso nos revolte.A idéia de que o assassinato possa ser tolerado nos indigna, mas aceitamos muito bem que o direito sucessório seja modificado, e muitos até concebem que ele possa ser suprimido.É pelo menos um problema que não nos recusamos a discutir.Do mesmo modo, admitimos sem dificuldade que o direito das servidões ou o direito dos usufrutos seja organizado de outra maneira, que as obrigações do vendedor e do comprador sejam determinadas de outro modo, qua as funções administrativas sejam distribuídas de acordo com outros princípios.Como essas prescrições não correspondem, em nós, a nenhum sentimento e como, em geral, não conhecemos cientificamente suas razões de ser, pois essa ciência não é feita, elas não têm raízes na maioria de nós''.O autor defende que o Direito Restitutivo é consideravelmente distinto do Direito Repressivo das sociedades pré-modernas, quer na sua interação com a sociedade e com a consciência coletiva, quer na diplomacia do conflito de interesses privados : ''É a prova de que as regras com sanção restitutiva ou não fazem em absoluto parte da consciência coletiva, ou são apenas estados fracos desta.O direito repressivo corresponde ao que é o cerne, o centro da consciência comum; as regras puramente morais já são uma parte menos central; enfim, o direito restitutivo tem origem em regiões bastante excêntricas se estente muiti além daí.Quanto mais se torna ele mesmo, mais se afasta.Essa característica, aliás, é tornada manifesta pela maneira como funciona.Enquanto o direito repressivo tende a permanecer difuso na sociedade, o direito restitutivo cria órgãos cada vez mais especiais : tribunais consulares, tribunais trabalhistas, tribunais administrativos de toda sorte.Mesmo em sua parte mais geral, a saber o direito civil, ele só entra em exercício graças a funcionários perticulares : magistrados, advogados, etc., que se tornaram aptos a esse papel graças a uma cultura toda especial.Mas, conquanto estejam mais ou menos fora da consciência coletiva, essas regras não dizem respeito apenas aos perticulares.Se assim fosse, o direito restitutivo nada teria em comum com a solidariedade social, pois as relações que regula ligariam os indivíduos uns aos outros sem vinculá-los á sociedade.Seriam simples acontecimentos da vida privada, como são, por exemplo, as relações de amizade.Mas a sociedade não está ausente dessa esfera da vida jurídica, muito ao contrário.É verdade que, em geral, ela não intervém por si mesma e por sua iniciativa; ela tem de ser solicitada pelos interessados.Mas por ser provocada, sua intervenção não deixa de ser uma engrenagem essencial do mecanismo, pois é apenas ela que o faz funcionar.É ela que diz o direito por intermédio de seus representantes.Sustentou-se, contudo, que esse papel nada tinha de propriamente social, mas se reduzia ao de conciliador dos interesses privados; que, por consegüinte, qualquer particular poderia desenpenhá-lo e que, se a sociedade dele se encarregava, era unicamente por motivos de comodidade.No entanto, nada é mais inexato do que fazer da sociedade uma espécie de árbitro entre as partes.Quando ela é chamada a intervir, não é para acordar interesses individuais; ela não procura a solução mais vantajosa para os adversários e não lhes propõe compromissos, mas aplica ao caso particular que lhe é submetido as regras gerais e tradicionais do direito.Ora, o direito é uma coisa social por excelência e tem um objeto bem diferente do interesse dos litigantes''.

Direito já!

Com a grande interação entre diferentes culturas, podemos sim afirmar vivermos na época das diferenças, da mistura de ideias. Não somos mais todos iguais, as mesmas peças que compõem a engrenagem histórica. Há complementação, por exemplo na distinção das funções (solidariedade orgânica), permitindo a coexistência dessas diferenças.

Por isso a atualidade das questões de Durkheim: não precisamos mais nos mover condicionados aos outros ou sermos guiados pela consciência coletiva. Somos muito diferentes um dos outros, acarretando em diferentes entendimentos e opiniões. Somos, portanto, unidos não pela igualdade, mas pela diferença. Nesse contexto, a Igreja vai perdendo seu espaço social, cultural e político. A união, como mencionado no início do texto, pode ser percebida na individualidade do trabalho e na sua divisão em diferentes cargos.

Para oferecer segurança e definir os direitos assegurados, contamos com os contratos. Podem estabelecer as mais diferentes condições, referir-se às mais variadas pessoas físicas ou jurídicas, porém contam com o ponto comum de estabelecer e limitar uma certa realação nos moldes das leis. Durkheim acreditava que a sociedade orgânica seria contratual, e assim o é.

Se cada um teria seu papel na função social, são passíveis de questionamento discrepâncias salarias com relação ao trabalho desempenhado. Discutido pelo próprio autor no tema "Divisão do Trabalho", volto a ponderar: por que um funcionário responsável pela limpeza, tarefa indispensável e pouco valorizada (o que deveria contribuir para o aumento do salário se pensarmos na relação oferta/procura) ganha uma quantia irrisória quando comparada aos ganhos de um jogador de futebol, cuja finalidade não acarreta melhor qualidade no ambiente de trabalho ou qualquer desenvolvimento social além de um sentimento momentâneo de alegria ou raiva decorrente de um mero jogo de 2h?

Nisso, percebemos novamente a ainda influente consciência coletiva. Esses jogadores são "mitos", representando os elementos da paixão como o nacionalismo (nacionalismo, aliás, de falsidade extrema quando pensamos no cinismo de incontáveis bandeiras brasileiras na época de Copa do Mundo e como estas somem misteriosamente após a época dos jogos. Sem falar na ridícula paralisação do país para esses mesmos jogos que nada contém de útil; comércio fechado em plena tarde, hospitais com atendimento prejudicado durante o jogo).

Parece muito retrocesso no meio de tantos avanços, não? Por isso, respondo à indagação de sala de aula a respeito do que levaria mais facilmente à anomia: as liberalidades ou as paixões? Volto a responder que as paixões. Paixões principalmente representadas por essa consciência coletiva e questionadas no quesito das sanções. Em "A solidariedade devida à divisão do trabalho ou orgânica", explica-se o a racional sanção restitutiva proposta pelo Direito ("[...] um meio de voltar ao passado para restituí-lo, na medida do possível"), harmonizando o funcionamento do corpo social.

Justamente devido a essa divisão do trabalho, deve-se a necessidade de sanções especializadas, para que o julgamento seja feito no nível mais adequado (civil, penal, de família, agrário, ...). O Direito, pois, na modernidade é cada vez mais expressão da técniva ao invés de algo passional. Mesmo nos casos de comoção social, ainda há normas regulativas tentando sobreposição à essa passionalidade e a proposta de penas alternativas. Além do dito anteriormente de estabelecer condições para que aqueles que se encontram em choque possam viver com respeito e sem discordância: Direito como mediador das situações, sem a necessidade de um agente religioso ou fisicamente mais forte impondo um modo de agir. Não pensemos, contudo, que o Direito está indo contra a consciência coletiva, é apenas a expressão racional desta; um freio às emoções dessa sociedade civilizada e moderna evitando desagregação e anomia.



tema 2: a mediação do Direito como expressão da razão moderna