O julgamento da ADI 4.277 prevê o reconhecimento de direitos na união homoafetiva, já que, conforme o entendimento do STF, a união homoafetiva é entidade familiar e, desse modo, decorrem direitos e deveres de igual maneira às uniões estáveis entre homem e mulher. A ação foi julgada procedente por unanimidade.
Apesar de um julgamento uniforme, o litígio apresenta um conflito que já é bastante comum no debate judiciário brasileiro, já que a legislação vigente prevê apenas a união estável - e o casamento civil - entre um homem e uma mulher, com essa literalidade. Dessa maneira, caso se utilize uma interpretação hermenêutica a partir do método clássico que preza pelos elementos gramaticais e textuais, uma corrente que têm ganhado cada vez menos importância, não obstante alguns juízes norte-americanos, como Antonin Scalia, ainda utilizem tal corrente, haveria um conflito no julgamento, já que a legislação prevê literalmente a união estável entre homem e mulher.
Contudo, caso se utilize de uma interpretação hermenêutica que preze ou pelo elemento sistemática da norma - ou seja, a constituição deve ser interpretada como um todo por meio de princípio de unidade, concordância prática e efeito integrador - ou pelo elemento teleológico - ou seja, buscar a ratio legis, a finalidade última da norma. No primeiro método interpretação segue grande parte dos Ministros, que acompanharam o juridicamente preciso voto do Ministro Relator Carlos Ayres Britto, que ressaltou a postura da Corte contra a discriminação e o preconceito, baseados no princípio da dignidade humana balizado pelo art. 1.º, inciso III, da Constituição Federal, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Sendo assim, a partir da perspectiva de Pierre Bourdieu, que caracteriza o espaço dos possíveis, a legislação anterior a decisão do Supremo Tribunal caracteriza um espaço possível para os casais homoafetivos, que era marcado pelo preconceito e pela discriminação. Agora, com a decisão unânime, garante-se um espaço possível para essa minoria de maior amplitude e menor marginalização, embora diversos avanços devem ainda ser feitos para garantir plenitude jurídica e social a esses grupos.
A historicização de normas que garantem a união estável de pessoas do mesmo sexo data, pela primeira vez, dos Países Baixos, que, em 2001, balizou essa norma. Outros países europeus, seguindo essa mesma perspectiva, também fundamentaram a vigência de uma norma que garanta o casamento de pessoas homoafetivas, decisão que agora foi unânime no STF.
Isto posto, a situação expressa revela alguma forma limítrofe de ativismo judicial que, entretanto, segundo a perspectiva do atual Ministro Luís Roberto Barroso, não é necessariamente ruim, já que se utiliza do judiciário para garantir direitos que já deveriam estar previstos na Constituição, sendo, portanto, o STF o “guardião da Constituição” e, logo, utilizar elementos de hermenêutica sistemática e teleológica para tal, a fim de garantir o bem-estar da sociedade, como ocorreu no litígio em questão.
O direito tutelado em questão é o da união homoafetiva e, sendo assim, seria dificilmente adquirido por vias legislativas e políticas, já que existem diversos movimentos conservadores que tomaram tais lugares durante o governo do atual presidente. Logo, percebe-se que existe uma antecipação na decisão expressa do julgado, de que, por ser uma garantia de dignidade humana, deve ser balizada pela Constituição e efetivada pelo judiciário por meio do STF.
Portanto, conclui-se que o ativismo judicial é realizado por meio de hermenêuticas sistemáticas e teleológicas a fim de apresentar um maior aprofundamento à democracia com a decisão baseada na dignidade humana de casais homoafetivas se unirem tais quais casais entre homens e mulheres.
Cauan Eduardo Elias Schettini - Turma XXXIX - Direito matutino