Ocorreu há alguns anos na cidade de Jales, no estado de São Paulo, o caso judicial em que a parte autora, um transexual, que embora tenha nascido biologicamente do sexo masculino, apresentava mentalidade feminina, reivindicava a cirurgia de transgenitalização (“mudança de sexo”) gratuitamente pelo SUS e a mudança de seu prenome nos registros, justificada pelo constrangimento que sofria. Tal reivindicação foi aceita pelo juiz, pois o transexual possui o direito fundamental implícito à identidade, derivado dos princípios da liberdade, intimidade, e acima de tudo, do Princípio da dignidade da Pessoa Humana – o princípio que protege todo ser humano de qualquer discriminação odiosa e de todo tratamento degradante.
O
caso não só deveria ser como foi julgado de acordo com a jurisprudência do STJ,
que vem autorizando a modificação do nome que consta do registro civil, assim
como a alteração do sexo. Alguns juízes, porem, negam o pedido com base no
critério biológico – o que não deve ser aceito, pois atualmente outros
critérios são indicadores de gênero além do sexo aparente.
Sob
uma perspectiva das ideias de Max Weber, pode-se analisar o caso descrito com
base em suas definições de racionalidade formal e racionalidade material.
Segundo Weber, o direito baseado na racionalidade formal é a expressão máxima
da racionalidade, um direito sem lacunas e que prevê todo valor e toda
possibilidade de fatos – um direito utópico; já o direito material seria aquele
que escapa de tanta exatidão, que se baseia na realidade social atual e em
valores que se modificam.
O
caso demonstra a impossibilidade do julgamento de casos como o da cidade de
Jales somente a partir do direito positivado, do direito formal, o qual foi
julgado a partir de uma lacuna da lei – não há legislação que prevê a conduta
correta em relação aos casos de transexuais, e, por isso, o juiz teve que
recorrer a outros princípios previstos na Constituição Federal e em outras
legislações de menor hierarquia. Apesar da possibilidade de o Direito baseado
na racionalidade formal ser, de fato, o auge da racionalidade, ele não pode
existir na realidade, pois não é possível que o legislador consiga abarcar
todas as possibilidades de casos, pois a sociedade e a humanidade estão em
constante transformação - a vida, segundo Friedrich Hebbel, é uma eterna
transformação. Deve ser utilizado, então, o Direito material, que, no caso
analisado, foi aquele capaz de trazer um julgamento eficaz, que respeitou a
Dignidade da Pessoa Humana e a própria ideia de justiça.
Alexandre Bastos
1º ano Direito - Diurno