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sábado, 5 de setembro de 2020

Sociologia compreensiva e os desdobramentos da ação na expressão dos conservadores


        Max Weber foi um importante sociólogo, jurista e economista alemão responsável pela estruturação da sociologia compreensiva fundamentada, em muitos aspectos, na crítica ao marxismo de Karl Marx e Friedrich Engels e que, ainda na contemporaneidade, os seus estudos têm relevância no desenvolvimento das ciências que serviram como alicerce para a compreensão objetiva da sociologia. Desse modo, concentra suas análises na ação social interpretadas a partir da criação de tipos ideias como recurso metodológico, além de demonstrar as manifestações de poder e dominação vinculadas as ordens jurídicas intrínsecas a todas as relações sociais.

Nesse sentido, a ação da qual trata o sociólogo vincula-se a ideia de modo de condução da vida de cada indivíduo, e na qual manifestam as relações sociais diante da convergência dessas ações a partir da reprodução de valores morais, culturais, entre outros que encaminham a ação. Assim, ao considerar-se aspectos da esfera contemporânea pode-se mencionar, por exemplo, o caso que aconteceu no Espírito Santo da criança de apenas dez anos grávida, abusada sexualmente pelo próprio tio desde os seis anos de idade, e que teve o direito consolidado pela justiça a interrupção da gravidez, visto as complicações psicológicas e físicas acarretadas diante do prosseguimento da gestação.

Entretanto, grupos conservadores e, em sua maioria, vinculados a instituições de caráter religioso, movimentaram as redes sociais e se agruparam em protesto em frente ao hospital em que seria realizado o procedimento de aborto em manifestações contra a interrupção da gravidez e em “prol da vida”. Sob esse viés, evidencia-se a cosmovisão pessoal de cada indivíduo fundada na adoção de determinados valores conservadores construídos historicamente sob aspectos religiosos e machistas, na qual conferem sentido a ação desses agentes sociais, em que se espelham em uma resposta expectável e correspondente na ação dos outros indivíduos. Portanto, segundo Weber, essas ações determinam as relações sociais, ao orientar-se a partir da resposta do outro, na consolidação desses valores socialmente incorporados que justificam a conexão da ação desses manifestantes por um mesmo objetivo.

Outrossim, nessa esfera, a sociologia estruturada por Weber determina-se como uma ciência crítica de reflexão e explicação da realidade ao conferir sentido a essas ações dos agentes sociais a partir da construção do tipo ideal, na qual desenvolve relações objetivamente possíveis motivadas para a nossa imaginação mas que não existem de fato, pois, assim como defendeu Max Weber, “uma ciência empírica não pode ensinar a ninguém o que deve fazer, só lhe é dado – em certas circunstâncias – o que quer fazer” (WEBER, p. 111, 1993).

Ainda, os conceitos de poder e dominação e seus desdobramentos nas relações sociais foram importantes tópicos nas análises de Max Weber. Portanto, para o sociólogo, essas concepções de poder e dominação permeiam todas as formas de interação entre indivíduos e não são exclusivas as relações de trabalho produzidas no contexto de exploração capitalista da qual defendeu Karl Marx, sendo o poder, nas próprias palavras do autor, “toda a probabilidade de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade”, enquanto a dominação implica na aceitação dessas imposições.

Desse modo, percebe-se tais afirmações de Max Weber ao analisar a tentativa de boicote promovida por Silas Malafaia a empresa Natura após a propaganda de Dia dos Pais estrelada por Thammy Miranda. Assim, o importante líder de uma instituição religiosa de grande representatividade no Brasil e que acumula uma legião de fiéis, mobilizou seus seguidores na manifestação em repúdio a empresa. Portanto, essas ações evidenciam a aceitação de modos de condução da vida estipulados na imposição da vontade desse líder, como formas de exercício de poder, a partir da reprodução de seus valores morais e culturais difundidos.

Ademais, o direito nesse cenário insere-se como instrumento na forma de dominação e poder ao moldar as condutas dos indivíduos em sociedade. Assim, as expressões das ordens jurídicas apresentam-se através da racionalidade formal e material, na qual tem-se, por exemplo, os movimentos antirracistas do Black Lives Matter, de manifestações da vida cotidiana frente a garantia de igualdades perante a lei a todo e qualquer cidadão, independente de raça, princípio inserido na representação formal do direito, mas que, infelizmente, não reproduz a realidade contemporânea apoiada na manutenção de privilégios de classes detentoras do poder que consolidam seus interesses nas ordens jurídicas formais.

Por fim, os estudos de Max Weber a partir da sociologia compreensiva permanecem constantes na análise da ação social dos indivíduos na esfera contemporânea ao evidenciar a cosmovisão pessoal, principalmente no que tange a reprodução de valores sociais, culturais, econômicos e entre outros de modo a conduzi-las a uma determinada resposta convergente de outros agentes sociais, além das formas de poder e dominação muito presentes em um contexto de manutenção de privilégio de classes e de poder nas mãos de determinados grupos, em face, também, da racionalização do direito.

 

Ana Carolina de Campos Ribeiro – 1º ano Direito Matutino

 

Referências bibliográficas

 

 

ISTO É. Malafaia pede boicote a Natura após campanha com Thammy. Isto É, 2020. Disponível em: https://istoe.com.br/pastor-silas-malafaia-pede-boicote-a-natura-apos-campanha-com-thammy/. Acesso em: 3 set. 2020.

 

JOVEM PAN. Aborto de menina de 10 anos gera bate-boca e protestos em frente a hospital. Jovem Pan, 2020. Disponível em: https://jovempan.com.br/noticias/brasil/aborto-de-menina-de-10-anos-gera-bate-boca-e-protestos-em-frente-a-hospital.html. Acesso em: 3 set. 2020.

 

WEBER, Max. A objetividade do conhecimento na ciência social e na ciência política. In: A metodologia das Ciências Sociais. São Paulo: Cortez; Campinas: Ed. Da UNICAMP, 1993, p. 107-154.

 

WEBER, Max. Economia e Sociedade – Fundamentos da Sociologia Compreensiva. Vol. 2. Brasília: Ed. da UnB: Imprensa Oficial, 2004. 

A Desvalorização da Ação

A sociologia compreensiva tem como um dos objetivos, o pensamento de Max Weber que visa refletir a motivação (valor) que as pessoas ou grupos levam em consideração nas suas ações sociais. Dessa maneira, observa-se a presença do valor na cultura, já que ela gera valores nos quais o ser humano não deve ultrapassar, pois está imposta em certas partes da sociedade e podemos ver ações absurdas como os comentários sobre o aborto legal que a menina de 10 anos teve que fazer no mês de agosto desse ano.

Frequentemente, ouve-se notícias sobre ataques de homens bombas nas áreas de disputa de forças militares com os extremistas do Estado Islâmico. Sendo assim, se fizermos uma análise dessa ação, veremos que um dos valores religiosos deles é morrer pela religião para garantir um lugar no paraíso. Assim, vemos também na Índia, onde religiosamente a vaca é sagrada. Porém, este valor se integrou na cultura indiana e fez com que todos daquele território olhem este animal como algo sagrado. Desse modo, podemos ver uma diferença da dimensão dos valores ao analisarmos esses dois exemplos, porque um toma uma dimensão daqueles que seguem uma religião, mas no outro foi um valor religioso que foi anexado ao cultural daquele território

No Brasil, vemos ações atuais que demonstram valores de grupos extremistas, conservadores e religiosos no país. Por exemplo, uma menina de 10 anos engravidou do homem que a estuprou por 4 anos e decidiu fazer um aborto legal da criança, pois o aborto para vítimas de estupro é previsto em lei na Constituição Federal Brasileira. Porém, esse grupo citado a cima, começou a atacá-la na internet com comentários que davam a entender que ela gostava da violência e que não tinha mais aquela inocência das crianças, não contente com ataques virtuais eles foram na frente do hospital que realizava o aborto legal e começaram a gritar para a criança “ASSASSINA!”. Dessa maneira, vemos que muitas vezes os valores de algumas pessoas podem gerar uma ação social absurda, que é prejudicial a outra pessoa ou um grupo, pois tudo que a garota fez foi algo que era permitido e mesmo assim foi atacada.

Portanto, devemos analisar situação delicadas ou que envolva outros valores de uma maneira neutra, pois se olhar com os parâmetros que fomos criados, provavelmente, será uma visão cheia de preconceitos e discriminações. Além disso, a situação da garota foi absurda, pois ela era a vítima da história e as pessoas contra o aborto fizeram com que ela se tornasse a criminosa. Dessa forma, Weber e seus ensinamentos faz com que possamos analisar todo esse processo e entendermos porque ocorre e como eles influenciam na nossa vida cotidiana.

 

 

Murilo Augusto Cremonini       1°Ano      Direito Matutino

Praia lotada de gente e valores.

 

Nunca foi tão expressivo o conceito ação social, de Max Weber, como no Brasil contemporâneo. Nunca foi tão visível a influência dos valores, da cultura na conduta da pessoa. No dia 05/09/2020 faz calor, Sol e é feriado, ou seja, situação perfeita para ir à praia. Seria perfeita, na verdade, se não estivesse ocorrendo no mundo uma Pandemia.

 O sociólogo, ao utilizar um tipo ideal de conduta humana perante uma pandemia, em que são necessárias diversas medidas sanitárias, para analisar o Brasil muito se surpreenderia ao ver o quanto a realidade brasileira é diferente da teoria. Sol, calor e feriado são o suficiente para as pessoas esquecerem, ignorarem ou até mesmo, no caso em que nunca mesmo acreditaram nessa pandemia, confirmar sua descrença. Nesse exemplo da praia, onde milhares de pessoas se reuniram – muitas sem máscara ou respeitando quaisquer medidas sanitárias -, nota-se uma verdadeira ação social racional com relação a valores, já que muitos, acreditando em conspirações acerca da pandemia do coronavírus, foram a praia para confirmar, juntos com pessoas que pensam o mesmo, suas crenças e seus valores contra essa, segundo eles, farsa, e nisso achando um sentido, uma conexão em suas ações recíprocas e complementares. 

Nesse caso, parece que mesmo o sistema, fortalecido pelo direito como forma de poder e dominação, não teve forças contra os valores individuais, que completamente ignoraram suas normas e, ao mesmo tempo, foram ignorados pelo sistema, não tendo ele força para fazer aqueles cessarem sua conduta. Nesse caso, portanto, a norma do direito, como poder e dominação, de não fazer aglomerações e utilizar devidamente a máscara, só funcionou às pessoas que ou realizaram uma conduta racional relacionada a fins – sendo o fim não ser multado ou não adoecer – ou realizaram, como no caso das pessoas da praia, uma conduta racional relacionada a valores – contudo, nesse caso os valores são de respeito ao próximo, à vida e na crença de ser o certo abster-se de certos prazeres para não piorar a situação de saúde do país. 

Dessa forma, percebe-se que, mesmo que normas, ou o próprio direito em toda sua extensão, possuam sim grande influência sobre a conduta das pessoas e a vida em geral, os reais protagonistas das condutas humanas são os próprios indivíduos que, a partir de valores que possuam, adquiridos principalmente devido à cultura, realizam ações, sempre em relação a outro indivíduo, para achar um sentido nesses valores que possuem, encontrando assim toda uma conexão. Por isso que, na situação atual que passamos no Brasil que é o caso do crescimento do individualismo, do egoísmo e do desprezo ao coletivo em geral, devido a diversas razões, como governamentais e culturais, as pessoas agiram da maneira pela qual o fizeram na praia, porque seus valores mais egoístas as fizeram encontrar, na praia, um sentido de existir ao se conectar com “cocredores” no local. 

O Brasil, portanto, é explicitamente e talvez o melhor exemplo da frase que diz que o tipo ideal muitas vezes não corresponde à realidade efetiva. Nesse caso, sendo o tipo ideal um que espere que as pessoas temam por suas vidas e realizem condutas de acordo, a realidade brasileira realmente está longe de corresponder.


Vitor Nakao Tersigni - 1° Ano Direito - Período Diurno

A Utopia da Igualdade

 

Max Weber, sociólogo, filósofo e jurista alemão, muito estudou e escreveu sobre a sociedade e a forma como esta interage e age. Para ele a sociologia é uma ciência da realidade, de crítica do mundo., a qual explica as ações sociais dos indivíduos na história, em determinada realidade social.

    Para se realizar tal estudo social, Weber fala da criação de um ‘tipo ideal’, o qual possibilitaria a realização da análise social baseada nele, assim com base naquele ‘tipo ideal’ poderia se explicar determinada ação dentro de uma certa realidade histórico social, e fazer-se compreender até mesmo por pessoas de fora. Mesmo que o ouvinte seja de uma realidade sócio-cultural totalmente diferente este compreenderá o porquê de tal ato ter se concretizado.

    O tipo ideal de Weber nada mais é do que uma ferramenta metodológica para se realizar um análise social, um meio para tal. Esse tipo ideal não é absoluto, sendo que ao compreendermos o objeto de análise este se dissolve, já não se faz mais necessário. A partir da construção desse tipo ideal podemos criar uma certa organização dentro do caos e complexidade da realidade para que esta possa ser analisada.

    Passando para uma análise do direito, onde fica evidente a utopia do ‘Tipo Ideal”, pois é impossível que se pense uma forma em que este abranja toda a complexidade dos fatos concretos e as diferentes realidades sociais onde os diferentes indivíduos estão inseridos. Mesmo que todos sejam iguais perante a lei, sua realidade social não o é. Aqui entra o princípio constitucional da igualdade que pressupõe que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual. “Devemos tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade”.

    Para Weber o direito é o instrumento que exerce maior força dentro do exercício do poder, o qual se daria predominantemente mediante dinâmicas de racionalização, formal e material. A primeira se estabelece no direito positivado, e a segunda seria uma sistematização de interesses que levaria em conta os valores, políticas e exigências ético-sociais, uma busca por direitos que não descanse apenas na forma jurídica ou normativa sem que se concretizem de fato.

    A forma do direito representa um ‘tipo ideal’ das condutas desejadas. Um tipo ideal utópico por assim dizer, vez que dada a impossibilidade de se contemplar toda a complexidade dos casos concretos. Além de que, quando da criação de um tipo ideal pelo legislador para analisar, pensar e criar normas para a sociedade, este o faz com base em seu referencial cultural, social e econômico. Mesmo que inconscientemente o legislador usa do direito como um instrumento de dominação e poder, pois sua realidade social e seus interesses, ali refletem.

    Assim o direito que deveria "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de sua desigualdade", acaba por se transformar em uma ferramenta de controle e exercício de poder e dominação.

 

Lucas Santos de Oliveira - Diurno - RA 181220016

De “1984” ao governo chinês: uma análise das relações de poder e dominação sob a ótica da sociologia weberiana

    O escritor britânico George Orwell narrou, em sua obra “1984”, o cotidiano de uma sociedade fictícia mergulhada em uma completa distopia após o desenrolar de uma grande guerra. Na trama orwelliana, desenvolvida na cidade de Londres, todos os caminhos trilhados pela sociedade da fictícia Oceânia eram ditados por um monocrata totalitário, apelidado de “O Grande Irmão”. Nesse contexto, um dos principais mecanismos de dominação e controle social empregados pelo líder tirânico era o completo redesenho de toda a história mundial sob sua ótica de interesse, por meio do Ministério da Verdade, além da Polícia do Pensamento, um aparato de coerção por meio da violência. Desse modo, embora as circunstâncias saídas da imaginação do escritor britânico sejam parte de uma livro de ficção, as relações de poder e dominação contidas em “1984” podem ser associadas às políticas modernas de controle social aplicadas pelo governo chinês, as quais dialogam com as ideias do pensador alemão Max Weber sobre as dinâmicas das relações sociais. Assim, faz-se conveniente analisar esse quadro sob a luz dessa corrente sociológica.

    Primeiramente, deve-se pontuar que Max Weber, uma das personalidades mais notórias da sociologia moderna, desenvolveu um pensamento sociológico que, em muitos aspectos, contrastava com as ideias do funcionalismo, o qual tinha Durkheim como um de seus adeptos. Isso porque, consoante Weber, a investigação da sociedade tal como proposta pelo pensador francês - em que deveria-se aferir os elementos sociais de forma isenta, encarando-os como pequenas engrenagens - não era o método mais eficiente para compreender a complexidade das relações sociais, posto que estas seriam, na visão do alemão, partes fundamentais do motor da dinâmica social.

    Com isso em mente, Max Weber elaborou diversas teorias, sendo uma delas a da noção de dominação, em que determinado indivíduo ou organização exerce suas aspirações sobre os demais. Nesse âmbito, na ocasião de haver aceitação da dominação, esta passa a ser caracterizada como legítima, podendo, ainda, ser classificada em três níveis: tradicional; carismática; e legal. À vista disso, em uma primeira análise, pode-se constatar que a Polícia do Pensamento - aparato de violência para fins de coerção empregado pelo governo em “1984” - enquadra-se como uma forma ilegítima de dominação, uma vez que não seria oriunda de um acordo ou consenso, mas sim de um ato puramente belicoso. 

    Paralelamente, pode-se relacionar a Polícia do Pensamento da trama orwelliana com a política do governo chinês de detenção de minorias muçulmanas em campos de reeducação pela força, na região de Xinjiang. Isso porque, com o intuito de reprimir os não adeptos à filosofia oficial do Estado, o regime de Pequim os despacha para o noroeste do país, ensinando-lhes a ideologia chinesa de maneira compulsória. Desse modo, sob a ótica da sociologia weberiana, essa postura do governo asiático configura-se como uma quebra de todos os tipos de dominação legítimas, já que, assim como a Polícia do Grande Irmão, ela caracteriza-se por um viés violento.     

    Contudo, vale ressaltar que no caso específico da China existe também a presença da dominação carismática como um dos métodos de imposição da vontade dos líderes do Estado - assim como em diversos outros regimes ao longo da história, como Vargas, no Brasil. Esse fato torna-se nítido quando se analisa a propaganda de Estado largamente difundida que objetiva enaltecer a figura do ex-líder Mao Tse Tung, conferindo-lhe uma feição relacionada ao heroísmo e a generosidade, assegurando, assim, a devoção do povo chinês aos princípios do governo, tendo em vista que este seria a materialização contemporânea das atitudes defendidas pelo carismático Mao. 

    Portanto, fica nítido que as ideias trabalhadas por Max Weber são de grande importância para o entendimento da realidade. Ora, partindo-se da teoria de que as ações sociais são cruciais para o andar da sociedade, infere-se que analisar essas ações à luz da sociologia weberiana é indispensável para que tenha uma maior compreensão dos fenômenos sociais, como nos casos do exercício do poder e dominação na obra “1984” e no âmbito do governo chinês aqui analisados.  

Fábio Eduardo Belavenuto Silva - 1º ano de Direito - Matutino

A dominação e o poder a partir do íntimo das relações

   Max Weber representa uma figura fulcral no entendimento das ciências sociais, delimitando um método sociológico objetivo para apreender as relações e manifestações no seio da sociedade. Assim se delimita sua lógica compreensiva da realidade social, segundo a qual se observam as ações de acordo com os princípios em que se pautam, inseridas em um contexto cultural de valores, aspectos políticos, morais e econômicos, configurando uma rede que é essencialmente o seu objeto de estudo. É também importante destacar o papel do indivíduo, entendido no centro da análise, em constante contato com o outro, sendo as relações sociais um conjunto de conexões estabelecido pelos plurais movimentos das ações sociais – que cada um engendra a partir da subjetividade. Inserido nessa ótica e pautando-se nesse método, o sociólogo conceitua as relações de poder e dominação que definem inúmeros âmbitos da sociedade. Tais figuras se compreendem na imposição de vontades e determinação externa sobre o modo de conduzir a vida, portanto sobre a própria ação social. A experiência jurídica, nesse contexto, desdobra-se justamente como um coercitivo elemento de domínio, ocultando no seu cerne interesses materiais de uma classe dominante, e uma racionalidade que deturpa a pura ideia de justiça, trazendo os ideais particulares de um grupo como universais e corretos – o que inspira reflexões e críticas explícitas no tecido da sociedade contemporânea.

   O direito é uma poderosa ferramenta de domínio. Em seu essencial papel de estabelecer normas e instituições que fundamentem o bem estar social (ou um mínimo ponto de equilíbrio), faz-se um contexto que delimita as ações humanas e o contato estabelecido entre o homem e o outro, em suas consequências ao mundo de relações estabelecido no capitalismo. Justamente nesse contexto em que a economia se torna a base dos laços humanos, o fenômeno jurídico engolfa um papel político, exercendo a dominação e poder em um sentido que agride e segrega. Perdem-se no instantâneo os ideais líquidos de justiça e igualdade, em alcance da legitimidade desse sistema pragmático. Tomada essa ideia como base, tantas seriam as reflexões possíveis no plural cenário brasileiro, em que a complexa rede de ações sociais se entende em sentidos de perversa dominação, perdendo-se os valores humanísticos em análises distanciadas da condição humana pura e completamente indeterminável.

   Limita-se, nesse breve texto, a delinear a contemporaneidade da dominação e poder a partir da literatura de Lygia Fagundes Telles, em sua obra “As meninas”. Nesse romance, aborda-se de maneira íntima e direta um episódio que marca o Brasil de forma profunda e abrangente: a ditadura. Movimento inserido na série de governos ditatoriais latino-americanos, fundamenta um processo de desumanização e agressões explícitas à dignidade da pessoa humana e às liberdades individuais. Não se superaram até hoje os ecos desse trágico passado, o que revela o direito inserido na perpetuação de valores de uma classe dominante excludente. Prova disso são os reflexos ainda visíveis nos caminhos do tempo, sendo o atual governo, em muitos aspectos, alinhado a esses ideais de poder e domínio. É ainda complexo e tortuoso o caminho para a plena superação dessas agressões, o que é cada vez mais retrasado com as declarações antiéticas do grupo dominante, que acaba por influir externamente sobre as ações sociais. 

   Sobre essas conceituações ainda atuais, reflete a escritora do livro por meio de suas personagens, três jovens inseridas politicamente em lutas sociais pela emancipação feminina e pela libertação de um regime que as oprime, com resultados visíveis no seu conjunto de relações e estudos. Ao trazer as consequências do regime a um caráter intimista e subjetivo, que discute a relação com o outro e com o contexto político, facilmente se transpõe essa análise à construção weberiana e à contemporaneidade, em que o direito ainda adquire um papel coercitivo de grande expressividade à sociedade e às relações individuais. Diante de um Brasil polarizado e afligido pelas suas mais cruéis experiências, vê-se o crescimento de um absurdo discurso que abarca os ideais mais materiais de quem domina, legitimados pela segregação e agressão com que concordam vários grupos. Mostra-se um caminho à plena ética barrado por irrefletidas construções, ecos de um passado histórico que se perpetua através do tempo, atingindo intimamente o laço entre o outro e o eu. Isso se evidencia criticamente pela escritora a partir de tantos aspectos sociais, na análise da dominação e do poder que alcançam as classes sob a roupagem do direito.

Lucas Rodrigues Moreira – 1º semestre – Matutino

A manutenção da pena como meio de tortura.

 

O sistema punitivo brasileiro é marcado pela ausência de intuito para os sujeitos que estão cumprindo as penas. Tendo como uma de suas mais famosas penas a reclusão temporária de liberdade.

            Um ponto curioso de tal sistema é como ele é visto pela população em geral. Uma instituição que em teoria deveria trabalhar na ressocialização dos indivíduos que cometeram algum delito, tende a trabalhar de forma contraria, sendo vista como uma pena que castiga o corpo do que a cumpre e em nada empenha-se para reintroduzir os indivíduos na sociedade.

            Outro fato interessante sobre tal tipo de pena, é quem ela busca punir, ou melhor dizendo, que camada da população acaba sendo punida em grande maioria. Segundo o levantamento publicado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), 75% da população carcerária brasileira só frequentou a escola até o ensino fundamental [1] o que segundo o Depen é um indicativo de possível baixa renda. Outro ponto a ser analisado é que 33% da população carcerária ainda não foi sentenciada, mas tal parcela da população já cumpre pena.

            Tais dados recordam a realidade dos moradores da Pasárgada[2] de Boaventura de Sousa Santos, que olhavam os advogados como profissionais praticamente inacessíveis, seja pelo Juridiquês, pelos altos valores praticados por tais profissionais ou então pelo simples fato de que tais advogados são de uma classe economicamente mais privilegiada e buscam firmar acordos com os juízes e demais advogados, colocando os interesses dos mais vulneráveis em segundo plano.

            Por fim, uma das forças que mais contribuem para a manutenção de tal sistema ineficiente, é o próprio sistema. Afinal, como esperar que uma administração que comemora o crescimento da população carcerária[3] possa buscar mudanças com o intuito de melhorar e humanizar tal sistema?  



[1]Sistema carcerário brasileiro negros e pobres na prisão. Comissão de Direito Humanos e Minorias. Brasília. 2018. Disponível em:  https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/noticias/sistema-carcerario-brasileiro-negros-e-pobres-na-prisao

 

[2] SANTOS, Boaventura de Sousa. Notas sobre a História Jurídico-Social de Pasárgada.

[3] Bolsonaro comemorando o aumento da população carcerária em 2020. https://www.gov.br/pt-br/noticias/justica-e-seguranca/2020/02/dados-sobre-populacao-carceraria-do-brasil-sao-atualizados

Rosa e Max e o bule

 

Chegada à porta do Supremo, lembrou-se repentinamente do bule de chá posto ao fogo pela manhã e inconsequentemente não retirado. Meu Deus, que descuido! Rosa se recordou até mesmo de levar consigo a CLT do fundo do armário, de passar com esmero a toga negra. Mas o fogaréu torrando o ferro da chaleira foi deixado ao léu. É necessário comunicar esse fato a alguém de casa. Rapidamente saca do celular e liga para o companheiro. Uma surpresa boa! O sagaz marido desligou o fogão logo após sua saída e enfrascou o chá do mesmo modo como ela gostaria. Como é bom ser correspondida! Passados os 5 minutos de pânico, voltou-se à porta da corte e nela entrou, como sempre.

Embora nada garanta que a Ministra Rosa Weber, do STF, não tenha o costume de se enrolar com bules de chá, a passagem descrita nas linhas do primeiro parágrafo é um mero produto da ficção, não correspondendo em nenhum momento com a realidade. No entanto, é possível retirar da inocente crônica uma série de pontos que ilustram um fenômeno frequentemente encarnado pelas ações de Rosa e de seus companheiros de corte: a ação social.

Max Weber (1864-1920) foi um sociólogo e economista alemão autor de muitas obras úteis ao estudo da realidade. O perdão à aproximação fácil ao nome da ministra é requerido. O termo ação social foi traçado para descrever um comportamento individual, calcado em formas específicas de comunicação, de relacionamentos e que exercem orientação em relação às ações dos outros. Além disso, o indivíduo que pratica a ação social aguarda da sociedade uma retribuição moral, isto é, algo como uma conexão de sentido entre os indivíduos. Um exemplo claro se dá na própria suprema corte: Quando Rosa vota favorável ou contrariamente em alguma decisão, ela aguarda que seus colegas votem segundo o mesmo jargão jurídico adotado por ela. Enquanto ao bule, não pode ser considerado em si uma ação social (quem sabe acidental) mas seu exemplo foi posto de modo a exemplificar a conexão de sentido entre Rosa e seu esposo quanto ao chá.

Weber também tratou com diligência das diferenças entre as definições de autoridade e de poder. Para o autor a autoridade seria a ação de se fazer obedecer por tradição ou por concordância de ideias e o poder, por sua vez, a possibilidade de se fazer obedecido com opiniões contrárias às da população. Um exemplo claríssimo de que o STF-  Rosa incluída- opta pela segunda opção em suas decisões é a votação sobre a prisão em segunda instância. Foi aprovada no âmbito da soltura do ex- presidente Lula e se opôs à maioria da população que, à época, gostaria da prisão em primeira instância, inclusive. Aqui, evidencia-se outra tese de Weber, que costumava dizer que a razoabilidade no Direito não representa o justo e sim o praticamente conveniente ( politicamente talvez para o STF).

Rosa talvez goste de chá, mas não se tem confirmação desse fato. Entretanto, quando se fala de incorporar comportamentos descritos por Weber, ela o faz com confirmações práticas. Seus colegas do STF, idem.

Fernando Camargo Siqueira- 1°ano de Direito Noturno- RA: 201220954