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quarta-feira, 2 de abril de 2025

Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora do mundo?

             Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora do mundo?

     Se alguém fosse instado a descrever e definir a noção de ordem, a imaginação, de imediato, evocaria um cenário de equilíbrio e harmonia, no qual o poder se exerce de maneira equânime e legítima, assegurando o pleno funcionamento do tecido social. A palavra "ordem", tão amplamente discutida e, em certa medida, enaltecida em todo o mundo, encontra-se, inclusive, escrita na bandeira nacional do Brasil, enfatizando seu caráter de base para a estrutura e os princípios da nação. Contudo, ao se proceder a uma análise crítica da veracidade do ideal de "ordem e progresso" no contexto da federação e da conjuntura global, seria possível, de fato, afirmar que essa ordem se concretiza na realidade contemporânea? A configuração hodierna da ordem integra, de maneira efetiva, a sociedade, ou se revela um conceito meramente utópico, distanciado da realidade concreta do mundo?

     Ao observar os inegáveis avanços que se verificam cotidianamente no domínio da tecnologia, nos progressos da medicina e nas curas alternativas, no desenvolvimento de vacinas e nas iniciativas que promovem a inclusão de minorias nos espaços acadêmicos, laborais e na esfera social mais ampla, pode-se inferir que a ordem encontra-se estabelecida e consolidada no presente contexto. Sob essa perspectiva conclui-se que o exercício do poder manifesta-se de forma eficiente e, em grande medida, eficaz.

     Entretanto, ao analisar as mazelas sociais, os inúmeros conflitos bélicos — como o persistente embate entre Palestina e Israel —, os elevados índices de analfabetismo, a insegurança alimentar e o alarmante número de indivíduos em situação de vulnerabilidade extrema, a conclusão poderia ser completamente oposta: a esse ponto, a própria existência de ordem se tornaria questionável. Como sustentar a noção de ordem quando, diariamente, milhares de pessoas são assassinadas em razão de sua cor de pele, de sua identidade de gênero, de sua filiação religiosa ou, até mesmo, pelo simples fato de serem mulheres? É assustador constatar que preconceitos, supostamente extinguidos do corpo social, persistem de maneira incessante e, por vezes, recrudescem.

     Diante dessa realidade, a indagação que inaugura o presente excerto revela-se uma incógnita cuja resposta se molda conforme as lentes pelas quais se observa o mundo. A depender do prisma adotado, as respostas podem se revelar totalmente antagônicas. Sem que se considere a influência das convicções individuais, do meio sociocultural em que o sujeito está inserido e de suas crenças pessoais, a questão levantada dificilmente encontraria uma resposta definitiva.




Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora do mundo? - Texto Palestra "Estamos no fim do mundo?"

O “Humanitismo”, filosofia desenvolvida por Machado de Assis no livro "Quincas Borba", possui como máxima: “Ao vencedor, as batatas. Ao perdedor, o ódio ou a compaixão”. Tal princípio, além de exemplificar a obra, é uma dura crítica do autor à organização social que se perpetua até hoje: a instauração de uma competição constante entre os indivíduos, na qual os perdedores são excluídos e subjugados e os vencedores, como forma de realçar sua vitória, ganham prêmios como forma de se vangloriarem. É possível observar que tal premissa perfura o âmbito ficcional e se aplica também a realidade, uma vez que possuímos um mundo completamente desigual, vivendo uma disputa acirrada a todo tempo, permeado de desigualdade e caos. Todas essas características são advindas do sistema socioeconômico vigente: o capitalismo.

Com a sua consolidação no século XVIII, a partir Revolução Industrial, esse modo de gerir o mundo causou diversos problemas, calcificando a desigualdade social, os desastres naturais, as péssimas condições de trabalho, crises políticas e territoriais. Contudo, na contemporaneidade tais problemas se agravaram e, como uma forma de não mostrar as fragilidades desse sistema regido pelo capital, os indivíduos compram a ideia vendida de que o mundo está acabando e não há nada a ser feito.

Na política internacional, observamos a ascensão frequente da extrema direita em diversas potências mundiais. Nos Estados Unidos, o atual presidente Donald Trump ameaça constantemente os estudantes e as universidade, instaurando o desespero ao emitir a ordens de deportação de estudantes estrangeiros que não concordem com sua ideologia, como foi o caso de uma estudante turca, a qual foi abordada por homens mascarados e levada presa por ter defendido a Palestina em uma manifestação. Além disso, o presidente emitiu a proibição de quase 200 palavras, censurou trabalhos acadêmicos e fechou o Departamento de Educação com a justificativa de corte de gastos. Tais atos criam um ambiente angustiante não só nacional, mas mundial, e de muitas incertezas para que os indivíduos, que já sentem-se desesperançosos, acreditem que, de fato, o fim do mundo está próximo.

Ademais, segundo um estudo realizado na Alemanha e publicado na revista "Nature Climate Change", há a comprovação que o aumento de 1,6° do planeta pode ser um sinal de um mundo permanentemente mais quente e com a presença de diversos desastres climáticos, como enchentes, aumento da seca, tempestades mais fortes e frequentes, furacões, tornados dentre outras adversidades climáticas. Contudo, os cientistas afirmam que “se a humanidade agir rápido e reduzir drasticamente suas emissões, é possível manter o aquecimento de fato em 1,5°C ou pelo menos limitá-lo a 2°C”. Logo, nem tudo está perdido e o mundo pode "não acabar" se as medidas corretas forem tomadas.

Fato é que o capitalismo, como um modelo de gerir a economia e a sociedade, fracassou e devemos urgentemente lutar contra a falácia que o mundo está acabando, já que essa é a maneira mais fácil de alienar uma população desigual e sucumbida à pobreza extrema. Sendo assim, é nosso dever dar o passo inicial para o fim da competição e da espetacularização dos indivíduos – tanto dos vencedores que levaram as batatas, quanto dos perdedores que receberam o ódio – porque, no final, todos nós estamos juntos usando da esperança, da política, da sociologia e da educação pública como armas para promover o fim de um mundo baseado na competição e o surgimento de um mundo melhor.

"Para mim, é impossível existir sem sonho. A vida na sua totalidade me ensinou como grande lição que é impossível assumi-la sem risco" - Paulo Freire


Geovana Martins de Mori - 1° Ano - Direito Matutino

O mundo está fora de ordem ou a ordem está fora do mundo?

O mundo está fora de ordem ou a ordem está fora do mundo?


No livro A Cidade de Deus, Santo Agostinho faz uma distinção entre a ordem terrena (imperfeita) e a ordem divina (perfeita); para ele, a verdadeira ordem provém de Deus. Entretanto, ao observarmos as atividades humanas, vemos apenas a imperfeição, o caos e a destruição instaurados no mundo. Diante disso, para compreendermos a ordem em nosso contexto mundial, é necessário analisar a história da humanidade e os objetivos por trás da tecnologia.

Nesse viés, cabe refletir sobre o percurso histórico da humanidade e suas intenções para entender a aparente falta de ordem no mundo contemporâneo. Segundo C. Wright Mills, devemos considerar como nossas vidas estão conectadas ao contexto histórico e social para compreender o que estamos vivenciando. O mundo sempre esteve em guerra: desde a Antiguidade, com egípcios, gregos e persas, até os dias atuais, com os conflitos na Ucrânia e na Palestina. Governos e governantes, ao longo dos séculos, almejaram poder, riquezas, honra e glória para seus reinos e para si próprios, mesmo que isso custasse a destruição de culturas, povos e etnias. Nota-se, assim, a permanência dessas práticas e pensamentos nos governos atuais e a angústia que paira sobre os povos e nações envolvidos, levando-nos a questionar: até quando viveremos assim? Portanto, para que o sofrimento e as guerras cessem, é necessário que a transformação comece dentro de cada indivíduo. Não podemos esperar que os outros ajam primeiro, mas sim tomar atitudes firmes e conscientes por nós mesmos.

Além disso, o uso da tecnologia com intenções maléficas é outro fator que contribui para a desordem mundial e a perpetuação do caos. Sob essa ótica, a tecnologia tem desempenhado um papel fundamental na intensificação das guerras, aumentando a letalidade e facilitando o acesso de grupos não estatais, como terroristas e milícias, a armamentos poderosos. Com líderes soberanos focados apenas no poder político e econômico, somados ao domínio bélico de países e grupos rebeldes, vemos o cenário global mergulhar novamente na desordem e em conflitos potencialmente catastróficos. O filósofo Kant chegou a propor um “direito cosmopolita” para evitar guerras, mas a realidade permanece marcada por disputas de poder e pela falta de sensibilidade em relação ao próximo.

Depreende-se, portanto, a urgência de combater a falta de empatia e sensibilidade pelo outro. Em 2 Timóteo 3:1-3, lemos:
"Saiba disto: nos últimos dias sobrevirão tempos terríveis. Os homens serão egoístas, avarentos, presunçosos, arrogantes, blasfemos, desobedientes aos pais, ingratos, ímpios, sem amor pela família, irreconciliáveis, caluniadores, sem domínio próprio, cruéis, inimigos do bem..."
Dessa forma, observa-se que a desordem não é exclusiva da Antiguidade, mas também se manifesta, de maneira intensa, nos tempos atuais, como comprovam os inúmeros conflitos que presenciamos em nossa realidade contemporânea. A ordem no mundo não depende apenas de sistemas políticos ou avanços tecnológicos, mas do despertar de uma consciência coletiva e espiritual que valorize a dignidade humana, o amor ao próximo e a construção da paz como um ideal possível e urgente.



Felipe Kinzo Massuda Nascimento - 1° ano direito (matutino)

Os limites do pensamento de Comte na compreensão da sociedade

 

Auguste Comte desenvolveu a ideia de que as ciências sociais devem buscar o mesmo tratamento que as ciências naturais, ou seja, submeter-se a métodos científicos racionais, que têm como finalidade entender a sociologia de modo a prever os acontecimentos e controlá-los de forma pragmática. No entanto, essa visão limita consideravelmente o estudo da esfera social, uma vez que reduz a sociedade a modelos fixos, não permitindo entendê-la para além deles, o que impede a compreensão efetiva de sua complexidade. 

Para ilustrar a limitação da ideia de Comte, usaremos a crise climática atual, pois, além de um problema ambiental, é um problema que afeta a sociedade, logo, uma questão social:

Sob a perspectiva de Comte, a crise deveria ser gerida por meio do entendimento de suas causas - como a degradação ambiental- e, a partir disso, da criação de um planejamento pragmático para solucioná-la, como a criação de uma gestão ambiental que monitore as atividades que afetam o meio ambiente. Entretanto, é uma perspectiva até otimista da situação, pois pressupõe que um simples planejamento para restaurar o equilíbrio resolveria essa problemática tão complexa, que, na realidade, só se agravou ao longo dos anos.

Em uma visão mais realista, há forças estruturais que impedem a simples correlação entre problema e solução. Nesse sentido, a sociedade é regida por relações econômicas, e aqueles com recursos para de fato criarem um planejamento e colocá-lo em prática são, muitas vezes, aqueles que mais contribuem para a crise. Um exemplo disso são os Estados Unidos (EUA), a maior economia do mundo, com um PIB (Produto Interno Bruto) superior a 29 trilhões de dólares, ou seja, possuem recursos financeiros para implantar soluções lógicas para a crise climática. Todavia, o então presidente do país, Donald Trump, no início de 2025, assinou a retirada dos EUA do Acordo de Paris - tratado que visa controlar a crise – demonstrando que seus interesses políticos e econômicos são maiores do que a questão ambiental.

Assim, ao propor que as ciências sociais sejam estudadas da mesma forma que as ciências naturais, Comte desconsidera fatores subjetivos, políticos e econômicos que estruturam a sociedade. Por isso, sua visão se mostra insuficiente para analisar a complexidade das ciências sociais.

Letícia Zanardo Morandi - Direito diurno 

As Contradições Entre o Positivismo e o Verdadeiro Mundo

 

   Um marco histórico de turbulência social essencial para a fundação da “Física Social” –posteriormente conhecido como a Sociologia- e do Positivismo foi, para Augusto Comte, a Revolução Francesa. Isto é, vivenciando esse contexto no qual estava inserido, marcado por transformações políticas e pela ascensão de ideias reacionárias, ele percebeu que os conceitos metafísicos e religiosos antigos já não seriam capazes de explicar tantas mudanças estruturais da sociedade. Dessa forma, a partir desse momento, a ordem tradicional – baseada em uma visão teológica e aristocrática- começou a se desmoronar, criando espaços para novas formas de pensar e de agir. Diante desse contexto, Comte compreendeu que ainda não existia uma ciência para o conhecimento sistematizado que pudesse explicar a fervura revolucionária e mais tantos outros conceitos sobre o imaginário social. Dessa forma, durante a sua vida, o filósofo se dedicou a apresentar o conceito de Sociologia e de positivismo e as suas aplicações no mundo real.                                                                                                                           

  A Sociologia é, em si, uma ciência que busca entender os movimentos da sociedade. Diferentemente de outras correntes de pensamento, essa não buscava ser especulativa, mas objetiva e útil, o que seria capaz de demonstrar que a sociedade estava progredindo linearmente. A fim de atingir seus objetivos, Comte entendia que era necessário um método para aplicar o conceito sociológico, desenvolvendo o método positivista. Ele defendia que esse ideal era o único capaz de ser verificado e testado empiricamente, podendo ser capaz de atestar e verificar fatos. Sob essa lógica, a Sociologia, na visão de Comte, serviria para explicar os acontecimentos sociais a partir de uma visão prática, fugindo de conceitos subjetivos. Além disso, seria uma forma de esclarecer as leis que regem a estrutura social e, também, o próprio comportamento humano diante das transformações. Por conta disso, pode ser conhecida como “Ciência Social”, já que é um estudo pragmático e racional sobre as pessoas e a relação entre elas.                                                                                                                                       

  Embora seja um método prático, não pode ser considerado totalmente certo. Isto é, Comte argumenta que a sociedade está sempre em progresso linear, ou seja, é uma teoria com uma visão muito otimista e racional. Entretanto, não são todas as vezes em que o ser humano age de maneira coerente e favorável, o que contraria o argumento do filósofo. Isso pode ser observado pelo ataque bolsonarista do dia 08 de Janeiro de 2023 em Brasília, o qual foi responsável por destruir e vandalizar o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal –espaços que simbolizam a democracia brasileira-. Tal atrocidade representou uma ruptura do sistema democrático, demonstrando ser uma atitude violenta, irracional e retrógrada. Partindo desse acontecimento, pode-se observar que o imaginário social nem sempre caminha em uma trajetória ordenada e civilizada, o que contraria a lógica positivista de Augusto Comte. Isso porque, de acordo com ele, a sociedade -acompanhada dos avanços tecnológicos e científicos- se tornaria cada vez mais justa e organizada conforme o passar do tempo, o que, na prática, não acontece. Por isso, não é possível afirmar que a ordem e a razão são capazes de resolver e explicar todas as mudanças e transformações estruturais da sociedade, pois, como exemplificado pela Intentona Bolsonarista, não são todas as vezes em que o homem é racional e otimista. Muito pelo contrário, pôde-se observar o retrocesso e a fragilidade do sistema democrático brasileiro. Assim, o positivismo tem uma visão idealista e restrita sobre a sociedade, não sendo suficiente para explicar verdadeiramente as mudanças e as transformações.                                                                     

 É possível elucidar, pois, que a Sociologia utilizou o método do positivismo para compreender os indivíduos e o mundo. Augusto Comte explicou que essa estratégia representaria uma forma de verificar e atestar os fatos, sendo um método científico eficaz, prático, otimista e racional. No entanto, tal método não é capaz de explicar todas as transformações sociais, pois a sociedade não segue uma trajetória linear de “ordem e progresso”, como observado no ataque de 08 de Janeiro. Portanto, tal método foi essencial para o surgimento da sociologia, mas não explica totalmente o funcionamento das estruturas sociais e dos seus desdobramentos.


Isabella de Souza Rodrigues Castanho- 1° ano Direito Noturno