Na cidade de Jales,
interior de São Paulo, um caso de tutela antecipada de transgenitalização foi
deferido em primeira instância pelo juiz Fernando Antônio de Lima da vara do
Juizado Especial da Fazenda Pública da Comarca de Jales. A requerente recorreu ao
judiciário para conseguir a cirurgia de mudança de sexo pelo SUS, bem como a
mudança do prenome e do gênero nos seus documentos de identificação. A
infelicidade, a não correspondência do gênero com o sexo biológico, o
constrangimento de por vezes ter de admitir a identidade masculina perante a
sociedade, o deslocamento e o não pertencer ao padrão coletivamente imposto
foram fatores que contribuíram para a debilidade da saúde mental e para a busca
da tutela referida pela autora. Ela se encontrava em quadro de depressão pelos
preconceitos e estresses vivenciados, só pelo fato de ser como é, que poderiam
levá-la ao suicídio, fez acompanhamento psicológico e psiquiátrico há anos, os
quais ratificaram a real necessidade da transgenitalização.
É inquestionável que a
sociedade pós-moderna vivencia uma padronização de comportamentos, valores,
culturas e pretende estabelecer uma racionalização universal causando
sofrimento em quem não se adequa a ela. Weber questiona justamente essa
padronização da razão, pois a realidade é formada por diferentes grupos com
particularidades distintas e consoante a sua sociologia compreensiva o
indivíduo deve ser compreendido por vários aspectos: sociais, políticos,
culturais, psicológicos, econômicos. O ser-humano é complexo e entendê-lo sob a
óptica de uma única razão seria podar a pluralidade social. E o Direito por ser
uma ciência social aplicada e solucionadora de problemas dos indivíduos que
formam essa sociedade multifacetada não pode negar a complexidade social e
individual.
A decisão favorável do
magistrado em questão ao pedido da transexual mostra-se baseado nas garantias
fundamentais constitucionalmente asseguradas (liberdade, igualdade, privacidade
e identidade), no Código Civil e no princípio da proporcionalidade do direito,
mas também perpassa o direito positivado e a racionalidade formal ao considerar
a racionalidade material confirmando a teoria weberiana de que nada é puramente
formal. Desejável seria não haver lacunas no Direito e este fosse para todos,
porém isso é mais difícil numa sociedade capitalista cada vez mais especifista
que segrega o não padronizado e, também, possui um Legislativo que desassiste as minorias, visando a concretização de uma racionalidade formal
fundamentada nos valores de quem o compõe. Contudo, a notoriedade dessa
jurisprudência é um começo para a modificação dessa situação e um insulto ao padrão social vigente. Para o Direito é
imprescindível a utilização de uma lógica multidisciplinar e interdisciplinar
afim de abarcar toda complexidade da realidade. Trabalhar com o Direito,
atualmente, é trabalhar com dimensões plurais e multifacetadas.
Discente: Juliana Furlan
de Carvalho – 1º Ano Direito Noturno