O
intelectual Maximilian Karl Emil Weber (1864 – 1920), mais conhecido
simplesmente como Max Weber, é uma das figuras mais importantes para a fundação
da Sociologia. De acordo com ele, o objetivo dessa ciência não é o de modificar
o mundo, como os marxistas defendiam, mas sim compreender o mundo através da
análise das ações dos indivíduos. Dessa forma, é perceptível que o indivíduo
ocupe um lugar centra na análise weberiana, já que a subjetividade é a ação
última da ação social, que nada mais é do que o modo como alguém conduz sua
vida, sempre orientada em relação ao outro, e que “esconde” nele as
interpretações do coletivo. Ao entendermos o fundamento da ação social,
entendemos a sociedade em que ele se insere, já que esse conceito está muito
ligado à cultura.
Além da ação social, Weber desenvolve outros conceitos
como o de dominação e poder. Em sua obra “Conceitos Básicos de Sociologia”, ele
as define: dominação implica na probabilidade de “ter o comando de um dado
conteúdo específico, obedecido por um dado de pessoas” e poder é “a
oportunidade existente dentro de uma relação social que permite a alguém impor
a sua própria vontade mesmo contra a resistência e independentemente da base na
qual essa oportunidade se fundamenta”. Nessa mesma obra, Weber defende um ponto
muito interessante: na modernidade, o exercício do poder e da dominação no
capitalismo se dá predominantemente por meio de dinâmicas de racionalização,
que tratam da calculabilidade dos fenômenos como pressuposto da vida econômica,
que é inclusive observado no Direito. Por mais que essa obra tenha vindo a
público no início do século XX, atualmente podemos dizer que essa
racionalização expressa no Direito continua extremamente relevante e cada vez
mais desafiadora na contemporaneidade.
O
fenômeno que desafia o Direito se chama 4ª Revolução Industrial: "Estamos
a bordo de uma revolução tecnológica que transformará fundamentalmente a forma
como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos. Em sua escala, alcance e
complexidade, a transformação será diferente de qualquer coisa que o ser humano
tenha experimentado antes", diz Klaus Schwab, autor do livro A
Quarta Revolução Industrial. Essa revolução está relacionada com o
desenvolvimento de tecnologias como nanotecnologia, neurotecnologia,
biotecnologia, robótica, inteligência
artificial e diferentes formas de armazenamento de
energia. Essas mudanças cada vez mais rápidas desafiam o Direito na medida em
que elas se fazem cada vez mais presentes no dia-a-dia das pessoas e as normas
para regulamentá-las não são elaboradas na mesma velocidade. Juridicamente,
essas novidades criam situações muito delicadas, pois a previsibilidade delas
cada vez diminuem mais, trazendo um clima de insegurança jurídica.
A
dificuldade em racionalizar o Direito atualmente não está vinculada
exclusivamente às novidades tecnológicas, podemos sentir impactos no setor
empresarial também, mas especificamente nas startups. De acordo com Steve Blank
e Bob Dorf, na obra “Startup: Manual do Empreendedor”, startup é uma
“organização temporária constituída para buscar por respostas que levem a um
modelo de negócios que seja recorrente e escalável”. Em outras palavras, uma startup
é um modelo de negócios que ainda não foi validado e, portanto, tem na sua
essência a disruptividade, já que ela sempre busca uma solução que o mercado
ainda não viu para problemas que já existem. Dessa forma, o desafio da ciência
do Direito frente à atualidade é justamente casar previsibilidade e segurança
para as relações sociais com imprevisibilidade, uma tarefa delicada e, que
muitas vezes, deságua em uma espécie de “limbo jurídico”. Um dos exemplos mais
importantes na relação delicada entre lei e um modelo de negócio inédito
ocorreu com a Uber em diversos países do mundo, em que muito se discutiu a
respeito de maneiras de regulamentar esse novo serviço, sendo cogitado, em
diversas ocasiões, até mesmo seu banimento em diferentes locais. No Brasil,
esse imbróglio só foi resolvido no ano de 2019 quando o Supremo Tribunal
Federal decidiu que plataformas tecnológicas de mobilidade urbana como a Uber
não podem ser proibidas e que os municípios que optarem pela regulamentação não
podem contrariar ou estabelecer requisitos adicionais àqueles estabelecidos
na Lei Federal 13.640, que regulamenta o transporte individual privado por
aplicativo.
É
possível concluir, portanto, que a racionalização formal do direito para Weber
é extremamente importante para o mundo capitalista. No entanto, a 4ª Revolução
Industrial e as novas tecnologias advindas dela trazem novos desafios para o
universo jurídico quase diariamente. Se a adequação da Uber a legislação
brasileira demorou 5 anos – a Uber chegou por aqui em 2014 – e cada vez mais
modelos de negócios disruptivos – startups – estão disponíveis para as pessoas
experimentarem, é fácil perceber que temos um grande problema à caminho. O
Primeiro Círculo do Inferno se aproxima de nós cada vez mais, só que desta vez,
não há Virgílio nem Beatriz para nos guiar.