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sábado, 12 de abril de 2025

A Ordem Social e suas nuances no Positivismo


    A sociedade, em sua complexidade, é alvo de tentativas de compreensão há tempos por estudiosos. Uma das abordagens mais influentes nesse esforço foi o positivismo, que surgiu como uma tentativa de aplicar o método científico à vida social, propondo que, assim como os fenômenos da natureza, os fenômenos sociais pudessem ser observados, analisados e explicados por leis gerais e imutáveis. A partir dessa visão, o conhecimento científico seria a chave para promover a ordem (valor central) e o progresso (consequência direta) na sociedade.

    Essa proposta conferiu à ciência um papel de autoridade normativa sobre a sociedade. O cientista social passou a ser visto como alguém capaz de diagnosticar os problemas sociais e prescrever soluções eficazes, tal como um médico trata um paciente. Com base nessa ideia, a sociedade foi comparada a um organismo, em que cada parte deveria cumprir uma função específica para manter todo o equilíbrio. A falta de ordem, assim sendo, é vista como uma anomalia, e o conflito como algo a ser retificado ou neutralizado.

    No entanto, essa ideia ignora aspectos fundamentais da vida social. Ao reduzir a sociedade a um sistema funcional e previsível, o positivismo tende a desvalorizar (esvaziar) o conflito, a diversidade cultural e o papel transformador dos movimentos sociais. Essa racionalidade, quando aplicada à política e ao Direito, pode findar-se em uma forma de autoritarismo disfarçado de neutralidade científica.

    O que parece ser uma gestão objetiva da sociedade visando ordenamento pode, na prática, significar a imposição de uma determinada perspectiva, muitas vezes excludente, elitista ou com viés discriminatório. Tanto que, como é possível observar em alguns casos, como as passeatas bolsonaristas, a desordem para certos grupos como esses é a formação familiar diferente da que eles acreditam ser a “correta”: um homem com uma mulher, ambos cisgênero.

 

Nicole Sthefany Calabrezi – 1º ano – Matutino

A importância do direito restitutivo

 

Hodiernamente, em oposição ao que Émile Durkheim preconizava, a solidariedade mecânica aumenta exponencialmente, manifestando-se de forma automática, por impulso, como, por exemplo, através de crenças. Embora não esteja na consciência individual, ela se encontra na consciência coletiva, já que, ao contrário da solidariedade orgânica, o indivíduo não está vinculado à sociedade, mas sim ao hábito e ao costume. Esse aumento é preocupante, pois tal visão entorpece a sociedade, intensificando a desconfiança no direito como técnica e nos legisladores, gerando uma afinidade crescente com o direito punitivo e repressivo, o que acaba por retomar os padrões de uma sociedade pré-moderna, que busca eliminar o indivíduo que descumpre a norma.

Em contraste com a solidariedade mecânica, a solidariedade orgânica não se manifesta apenas por uma pulsão da tradição ou crença, mas sim quando o indivíduo reconhece sua função social em prol do coletivo, sendo algo realizado em nome do funcionamento do todo. A coercitividade do direito pode criar a solidariedade orgânica, mesmo que de maneira artificial. Essa solidariedade é a ligação do indivíduo ao todo, permitindo que a sociedade continue a funcionar. Nesse contexto, Durkheim defende o direito técnico como elemento restitutivo, argumentando que, em uma organização social tão complexa e interligada como a atual, não é possível eliminar todos aqueles que cometem um crime, já que ainda haveriam funções sociais a serem cumpridas. Além disso, o direito, como elemento central da sociedade, também oferece um horizonte de conduta para os indivíduos, e, por meio de suas punições, pode fazer com que o infrator se torne o instrumento de ressonância que reitera para o restante da sociedade a reafirmação constante da moral e da norma.

Nesse contexto, o caso de Malcolm X, um americano preso por assalto à mão armada, condenado a 10 anos de prisão (dos quais cumpriu 6), e, após sua soltura, tornou-se um dos maiores ativistas pelos direitos dos negros nos Estados Unidos, exemplifica a importância do direito restitutivo. Durante seu encarceramento, Malcolm X se dedicou a aprender a ler e escrever, estudando história e filosofia para embasar suas reivindicações, o que lhe permitiu se tornar uma figura central na luta pelos direitos civis e pela cultura negra. Esse caso ilustra a importância do direito restitutivo, pois suas contribuições para a sociedade reverberam até os dias de hoje, influenciando movimentos de direitos civis, ativismo racial e até mesmo questões de justiça social. Caso o direito punitivo tivesse prevalecido, eliminando-o, o importante papel social de Malcolm X, juntamente com suas lutas e conquistas, não teria se concretizado.

Ademais, cabe enfatizar que, ao contrário do positivismo preconizado por Comte, que condena as mudanças, o funcionalismo as compreende como necessárias. Em uma sociedade funcional, o indivíduo nasce com uma função pré-estabelecida e, a partir da solidariedade, renuncia às suas vontades em favor do bem comum, ou seja, a sociedade prevalece sobre o individual. Assim, quando necessário, a sociedade cria novas funções sociais para cada um, visando à integridade do coletivo. A força que une os indivíduos, mesmo quando estes negam a si mesmos e seus impulsos, para cumprir as normas e sua função social, é a solidariedade, que se expressa por meio da consciência coletiva. O indivíduo cumpre essas normas mesmo sem perceber, razão pela qual, para Durkheim, o individual não existe como uma entidade isolada, pois cada pessoa é a expressão constante do que a sociedade espera dela.

Nesse contexto, ao analisarmos casos como a criação da "Americans with Disabilities Act" (ADA), em 1990, que garante direitos às pessoas com deficiência, pela ótica funcionalista, percebemos como a sociedade se adequa às reivindicações sociais, considerando essa mudança como necessária. Para evitar o declínio, a desintegração da sociedade, ou seja, a anomia que poderia surgir a partir do menoscabo estatal frente à movimentos como o "Independent Living", que defendiam a criação de leis para garantir a igualdade de oportunidades e acesso, ficou claro que a sociedade precisava abraçar essas reivindicações e se adaptar a elas. Não seria possível cerceá-las, como defendia a lógica positivista. Assim, a lei foi sancionada, garantindo que pessoas com deficiência tivessem os mesmos direitos que os demais cidadãos nos diferentes âmbitos sociais, tornando-se uma das leis mais impactantes de direitos civis dos Estados Unidos, promovendo a acessibilidade e a igualdade de oportunidades para pessoas que, antes, não possuíam amparo legal.

Gustavo Zoca Goulart de Andrade – primeiro ano de direito noturno