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quinta-feira, 17 de abril de 2025

Funcionalismo Durkheimiano: Ordem, Coerção e Mudança Social

O funcionalismo de Émile Durkheim é uma vertente sociológica que entende a sociedade como um sistema complexo, análogo a um organismo vivo, sob a qual cada um dos grupos e instituições, sejam elas privadas e governamentais ou individuais e coletivas, possuem funções específicas que corroboram para a manutenção da ordem e da estabilidade estatal, de modo que assim, a sociedade fomente um todo coeso que garante o equilíbrio do sistema em questão. Sob essa perspectiva, salienta-se que uma das ferramentas sociológicas utilizadas por essa vertente para a compreensão do todo social se trata dos fatos sociais, isto é, maneiras de agir, pensar e sentir que existem fora das consciências individuais e que exercem poder coercitivo sobre as pessoas, de modo que a coerção social sobre as vontades subjetivas exerça predominância.

Nessa linha de raciocínio, observa-se, portanto, que os fatos sociais exercem uma pressão sobre o indivíduo para que este aja de acordo com as normas morais e legais estabelecidas, podendo ser esta uma coerção sutil ou formal. Além disso, Durkheim ainda ressalta a necessidade de se observar os fatos sociais como coisas, tendo em vista que essa análise permitiria uma compreensão de uma realidade objetiva, sob a qual existe independentemente da vontade ou percepção de cada indivíduo, fazendo com que assim o caráter subjetivista presentes em outras sociologias, como o positivismo, fosse afastado, haja vista que para Durkheim os fenômenos sociais deveriam ser explicados por outros fenômenos sociais, e não por características individuais, já que somente assim poderíamos chegar a um cenário voltado a mudança, e não a resistência.

Isto posto, nota-se que a coercitividade dos fatos sociais sobre os indivíduos, juntamente com a prevalência da percepção social sobre a individual geram como consequência um atual óbice nas formas de agir dos indivíduos, sob o qual destacam-se a constante necessidade de pertencer a determinado grupo social, a internalização de normas, valores, crenças e práticas da sociedade em que vivem e a constituição de uma uniformidade de comportamentos. A título de exemplo de tal problemática, salienta-se a constante pressão exercida pelos fatos sociais através do uso das tecnologias e das redes sociais no cenário hodierno, tendo em vista que os indivíduos passam a agir através dessas redes conforme os padrões estabelecidos por influenciadores, grupos ou etiquetas sociais, sob as quais uniformizam um comportamento, do qual em caso de divergência comportamental do indivíduo geram como consequência o seu isolamento e exclusão digital, de modo que o medo do cancelamento e isolamento faz com que as pessoas ajam de maneira reiterada, ainda que acreditem estarem agindo conforme suas vontades idividuais.

Em contrapartida, a observação dos fatos sociais como coisas, e a eventual separação das percepções subjetivistas, fazem com que a análise das ideais passe a ser mais coesa, tendo em vista que ao nos atentarmos primeiramente para as coisas, passamos a compreendê-las melhor em seu ponto de vista empírico e metódico, para que dessa maneira possamos chegar a uma determinada ideia coerente, diferentemente do pensamento positivista subjetivo, sob o qual estabelece uma pré-noção de determinado conteúdo para que somente após isso este se atente para a coisa de fato.

Dessarte, é justamente por esse tipo de análise objetivista dos fatos sociais que o funcionalismo se demonstra eficiente, tendo em vista que diferentemente do positivismo, ele se mostra como um contribuinte a mudança social, sob a qual engloba na utilização do Direito e de uma vasta gama de outros mecanismos para que a inclusão social, a constante diversidade e os direitos de todos, sem exceção, sejam prontamente estabelecidos, não sendo, portanto, uma vertente resistente quanto a mudança, tendo em vista que o funcionalismo considera a mudança social como um requisito para a manutenção da ordem, e não como um entrave. Tal característica pode ser observada, por exemplo, no tocante a discussão, e até mesmo aprovação, em diversas universidades a respeito da implementação de cotas trans, para que cada vez mais a inclusão social seja atingida, com o escopo de manter uma ordem social concreta e significativa.

Sendo assim, conclui-se, portanto, que a corrente funcionalista é imprescindível para a evolução social, visto que sua coerção coletiva sobre a percepção individual já estabelece um comando imperativo quanto a manutenção da ordem, enquanto em consonância a isso, se analisados os fatos sociais provenientes dessa coerção como coisas antes de ideias, aumenta-se a noção de cada coisa e suas respectivas características, para que somente assim, possamos progredir rumo a uma sociedade mais organizada e inclusiva, sob a qual as percepções individuais e egoístas não prevalecem, e sob a qual a ordem e progresso podem definitivamente serem atingidos de modo definitivo.

Rafael Martins Araujo - 1° ano - Direito - Matutino

As ciências sociais são úteis (obrigatórias) ao jurista?

    O Direito, como ciência social aplicada que se manifesta por meio de um sistema de normas e tem como uma de suas principais funções a organização social, não pode se considerar uma ciência isolada, baseada apenas no que está codificado. Como afirmou Montesquieu em sua obra "Do Espírito das Leis": "As leis devem ser tão próprias ao povo para o qual são feitas, que é um grande acaso se as de uma nação podem convir a outra". Assim, o Direito precisa fundamentar-se nos estudos sociais, uma vez que está imerso em um contexto cultural, político e social. Daí a necessidade do estudo da Antropologia, Ciência Política e Sociologia, disciplinas que integram nosso currículo na Unesp.

    A Sociologia oferece ao jurista uma visão interpretativa do comportamento humano e das dinâmicas sociais que compõem o cenário de atuação da norma jurídica. A Sociologia do Direito, por exemplo, é fundamental por estudar como as leis são aplicadas na prática, revelando frequentes disparidades entre o texto legal e sua execução. Isso fica evidente nas políticas públicas de segurança, em que abordagens policiais seletivas afetam majoritariamente a população negra e periférica. Tal disparidade só pode ser compreendida a partir de uma análise social e histórica que considere as estruturas racistas que, infelizmente, ainda moldam nossa sociedade.

    Por sua vez, a Antropologia, remetendo novamente a frase de Montesquieu, traz a visão da diversidade cultural na aplicação da lei. A demarcação de terras indígenas é um tema jurídico que não pode ser dissociado das dimensões antropológicas, sociais, políticas e históricas que o permeiam. O debate em torno do marco temporal, tese que restringe os direitos territoriais indígenas às terras efetivamente ocupadas até 1988, não pode ser analisado sem o contexto histórico da expulsão dos indígenas de suas terras. Ignorar esse aspecto é perpetuar injustiças, assim comprovando como os Estudos Sociais são essenciais na interpretação, aplicação e formulação do Direito.

    A Ciência Política aprofunda a análise do Direito também como fruto da disputa de poder. A aprovação de leis não é um processo neutro e técnico, mas sim um processo advindo de interesses de forças econômicas e políticas. Exemplos recentes no Brasil são as tentativas de enfraquecer as leis ambientais para o fortalecimento do agronegócio, mostrando como o sistema jurídico é também moldado por pressões econômicas. A compreensão das dinâmicas de poder é essencial para uma atuação jurídica crítica, que saiba não apenas ler o código, mas também ter a noção de quem é o beneficiado e quem é o prejudicado em cada ação.

    Outro exemplo da importância do estudo social na aplicação de normas legislativas, é o fenômeno do “punitivismo”, muitas vezes impulsionado por discursos midiáticos e populistas, fenômeno que considera a punição severa como solução para frear o aumento da criminalidade no Brasil, ignorando as causas sociais que contribuem para o aumento da criminalidade. Por isso é dever do legislador conhecer a sociedade a qual ele legisla, pois o Direito sem Ciência Social resulta em perpetuação da desigualdade e violência.

    Sem uma base de estudos sociais, o Direito pode tornar-se uma disciplina puramente formal e idealista, além de distante da vida real. O jurista, sem essa base, ignora os contextos sociais e aplica a norma de forma mecânica, sem considerar o impacto concreto dessa aplicação. Portanto, sim, as Ciências Sociais não são apenas úteis ao jurista, são fundamentais para que o Direito cumpra sua função social de garantir igualdade e justiça.


Eduardo Cavalcante Seghese Neto - 1° Direito Noturno