A eterna condição dos excluídos
Uma sociedade fundada na escravidão, que o único projeto nacional foi extrair incansavelmente as riquezas naturais do país, que plantou uma cultura meritocrata e colheu uma casta de privilegiados nas costas de milhões de brasileiros miseráveis. Sempre privatizando os lucros e socializando as perdas, em um sistema que privilegia poucos e procura, de todas as formas, manter uma estrutura institucional de eterna repetição das mesmas dinâmicas.
Um processo de manipulação social - conforme identificamos na tese do sociólogo Jessé de Souza - a qual origina-se do conceito que acusa o patrimonialismo Estatal como o provedor de todos os males, seja econômicos ou sociais. Porém, tal pensamento trata-se de uma reprodução errônea da realidade, já que na sociedade capitalista, quem retêm o poder é o próprio mercado. Mesmo que o poder político oriundo do Estado desfrute de uma série de privilégios, a política acaba sendo usada como um intermédio daqueles que realmente possuem o poder. Uma cortina de fumaça que acaba por ignorar o mercado, expondo a culpa apenas aos seus lacaios políticos.
A partir desse pensamento, podemos enxergar como somos estimulados a compactuar com uma ideal de país que não visa abranger ou esclarecer seu povo, pelo contrário, nos guia por um caminho no qual não seja possível visualizar novas formas de sociedade. Uma desigualdade coletiva, fantasiada de uma vontade individual. Nesse sentido, a política brasileira abraça uma determinação econômica que serve para perpetuar, como uma condição imutável, concepções de uma suposta identidade nacional, além de negar que haja mazelas de um passado que insistimos em repeti-lo. Um comportamento que permeia o capitalismo moderno e propaga uma série de dogmas legitimadores de valores meritocráticos que, continuamente, ignora e exclui, geração após geração, grande parte da nossa população. Não interessa um sistema que desenvolva social e economicamente os milhões de excluídos, ao invés disso, insiste em reproduzir falsos ideais de diminuição da distância entre as classes.
Nesse sentido, a ideia de ação social de Max Weber se faz presente, pois determinamos aquilo que é historicamente construído a partir de referências culturais, uma processo constante de dominação.. Logo, uma cultura condicionada essencialmente nestes padrões, distingue os mesmos atos de acordo com a classe social do indivíduo. Quem nunca ouviu a máxima que no Brasil, quem pouco rouba é o ladrão, mas quem muito rouba é chamado de Barão. É o jeitinho brasileiro, do povo cordial e feliz, que vive na miséria porque não se esforçou o bastante. Visto que o mesmo jeitinho que culpa o Estado pela corrupção, para o mercado só projeta-o com muita perfeição. Nada é culpa do mercado, a culpa sempre é do trabalhador ou do Estado, são eles que sempre atrapalham aqueles que querem empreender. Portanto, leis trabalhistas precisam ser removidas, tudo para atender a lógica neoliberal, a lógica do mercado, a mesma que vende diariamente a ideia de provedora do progresso e que acusa o Estado como o grande culpado pela corrupção e pelos impostos mal gastos.
Deste modo, as próprias instituições de poder nos guiam por ideais meritocratas, os mesmos que negam a existência de um racismo estrutural e classista. Porém, mesmo que tentem esconder, demonstram invariavelmente uma luta de classes presente na sociedade brasileira. Conforme observamos facilmente nas palavras do ministro da economia do governo Bolsonaro, o maior lacaio da nossa República. Ao proferir a frase que de o dólar alto é bom para todo mundo, já que na época do câmbio baixo, até as empregadas domésticas estavam indo à Disney, o ministro demonstra - além de um ódio contra a classe mais pobre - um ideal de que uma parcela da sociedade exista unicamente com a função de servi-los por toda eternidade e nada mais.