Este breve texto
pretende realizar uma análise crítica relacionando o julgado da Ação Popular
n.º 0015215-83.2016.4.01.3300 e o texto de Sara Araújo intitulado “O primado do
direito e as exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone”.
Primeiramente, cumpre destacar que a discussão jurídica desse julgado consiste
no conflito entre os interesses de determinada comunidade local e a atividades
de uma empresa petroquímica na mesma localidade.
Segundo o autor
popular, a obtenção, pela a empresa
petroquímica, de licença ambiental para instalação de um porto na região violaria
o direito de lazer da comunidade local, direito fundamental assegurado pela
Constituição Federal. Não obstante, alega o autor que a possível instalação de
um porto naquela localidade estaria colocando em risco a saúde dos indivíduos
daquela comunidade, à medida que haveria intenso deslocamento de produtos
químicos e extremamente nocivos para a população. Analisados os autos, o juiz,
utilizando-se de um viés econômico, compreendeu que não havia, nesse caso,
qualquer violação de direito e julgou improcedente as pretensões do autor
popular.
Esse julgado ilustra
a premissa de Sara Araújo de que tudo o que é local ou particular é invisibilizado
pela lógica global. No caso em tela, é perceptível a prevalência da lógica
econômica-produtivista, aliada ao direito técnico, em detrimento dos interesses
e direitos fundamentais da comunidade local. Nessa perspectiva, não há espaço
para visualizar, compreender e proteger os direitos fundamentais dos indivíduos
locais, mas apenas para atender a lógica econômica da empresa petroquímica que
se sobrepõe à noção de localidade e, de certo modo, torna-se global.
Como enfatiza
Sara, “esse modelo jurídico, que se apresenta como técnico e não político,
respeita mais os mercados do que as pessoas, atropela ordenamentos jurídicos
que regem outras culturas e outras organizações políticas e cria uma sociedade
civil incivil”. Essa sociedade incivil se constitui pela impossibilidade de
compreender que, mesmo que se trate de interesse local e direitos de uma
minoria, para os indivíduos daquela localidade são aspectos sociais, como o
lazer e a saúde, fundamentais para a organização social tradicional e o
respeito à dignidade humano e aos preceitos constitucionais.
Por fim, cabe
ressaltar que, da mesma forma que conclui Sara em sua análise, o direito
técnico aplicado a esse caso em tela, ao assumir os interesses da empresa
petroquímica como tudo o que importa na resolução do caso, está sendo
responsável pela imensidão de experiência desperdiçada. Experiência essa que só
seria possível em um contexto de coexistência de interesses da comunidade local
e da empresa, de modo que um interesse não viole o outro, e, para isso, seria
necessária a aplicação de um direito não somente técnico, mas também político.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Sara. O primado do direito e
as exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone.
Sociologias, Porto Alegre, ano 18, n.º 43, set/dez 2016, p. 88-115.
Camila Marcelo de Toledo - 1º ano Direito Noturno
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