Este é um espaço para as discussões da disciplina de Sociologia Geral e Jurídica do curso de Direito da UNESP/Franca. É um espaço dedicado à iniciação à "ciência da sociedade". Os textos e visões de mundo aqui presentes não representam a opinião do professor da disciplina e coordenador do blog. Refletem, com efeito, a diversidade de opiniões que devem caracterizar o "fazer científico" e a Universidade. (Coordenação: Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa)
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sexta-feira, 7 de agosto de 2020
A contramão da solidariedade mecânica e social
Batman e o fato social
A Sociologia passou a ser formalmente considerada como uma ciência após as contribuições do pesador francês Émile Durkheim, responsável pelo desenvolvimento de uma teoria sociológica que continua sendo estudada na atualidade. Um dos temas abordados no pensamento de Durkheim é o estudo do conceito chamado “fato social”, o qual diz respeito sobre a maneira de agir das pessoas, ele possui três características, a generalidade, ou seja, se aplica a todos, a exterioridade, logo ele está fora dos indivíduos e por fim, a coercitividade, isto é, a imposição de um certo padrão por parte da sociedade aos indivíduos que nela se encontram. Além disso, Durkheim também discorre sobre o conceito de solidariedade orgânica, que corresponde as sociedades atuais e complexas marcadas pela divisão de tarefas e tem seu funcionamento próximo ao de um organismo vivo, por isso orgânica.
O conceito do
fato social pode ser percebido não só em análises sobre a realidade, mas também
em elementos artísticos, os quais não deixam de ser análises do mundo real. A
exemplo disso temos o filme Batman o Cavaleiro das Trevas, que ao olhar menos
atento de muitos se resume a simples trama envolvendo a fórmula quase secular
dos super-heróis, do mocinho simbolizado pelo batman tentando prender o vilão,
que no caso é do filme é o coringa.
O Fato e a Solidariedade Para o Organismo Social
O
Fato e a Solidariedade Para o Organismo Social
No mundo contemporâneo, as pessoas vivem segundo
regras. Essas regras podem ser tanto positivadas, como legislações, ou no
imaginário e no ser popular, como crenças e costumes. Um indivíduo não pode roubar:
se o fizer, segundo a lei, sofrerá sanções o transgressor, e a vítima terá seu
objeto restituído ou alguma compensação. Dessa forma, nota-se que a sociedade
contemporânea busca impedir qualquer ato que possa causar – ou cause – uma destruição
do funcionamento contínuo e “normal” da sociedade. Não só se pune o
transgressor da norma, como também se restitui o “algo perdido”, ou seja, se
faz com que o momento de ordem vivido anteriormente pela sociedade volte ao
estado em que se encontrava – de “paz”, harmonia, de correto funcionamento
segundo os padrões sociais. Não pode, também, um indivíduo de certa religião
agir contrariamente aos padrões estabelecidos por ela: se assim o fizer, sua
vida cotidiana se tornará muito difícil, já que ele sofrerá consequências por desviar
do “normal funcionamento” dessa sociedade, tornando-se, desse modo, algo não
pertencente ao social. Assim, percebe-se que essas regras, positivadas ou não,
se tratam de fatos sociais, já que são exteriores ao indivíduo – antes mesmo da
pessoa nascer, instituições que determinam seu modo de viver já existem -,
gerais – todos os “socialmente corretos” seguem e obedecem os fatos – e coercitivos
– o indivíduo pode até desviar das normas estabelecidas pelo fato social,
porém, ao fazê-lo, sofre tantas sanções ou dificuldades em sua vida que é
levado a agir de forma concordante aos fatos. Vários são os exemplos de ocorrências
desse tipo na sociedade brasileira, como o caso de Geisy Arruda: ao comparecer
a faculdade em que estudava vestindo uma mini saia, foi hostilizada por quase
que o edifício inteiro – inclusive por professores -, o que mostra que, ao desviar
da conduta considerada correta nas mentes das pessoas daquela faculdade, Geisy foi
de encontro a um fato social, o que causou um estado de anomia naquele espaço, levando
assim a aqueles atos absurdos de hostilização contra a, na época, estudante.
Um fato importante de salientar-se nesse
acontecimento foi o de que, mesmo as pessoas que não compartilhavam do
sentimento de ódio a Geisy Arruda por vestir aquela vestimenta na faculdade, deixaram-se
levar pelo sentimento da multidão, do grupo, e acabaram agindo da mesma forma.
Isso mostra que o ser humano, justamente por ser um ser social, tem a
necessidade de fazer parte da sociedade – no caso, aqueles que não compartilhavam
o sentimento de raiva, por estarem em minoria, sentiram-se excluídos do grupo
e, assim, começaram a agir da mesma forma odiosa que a maioria, a fim de “socializar-se”
– por mais absurda que a socialização nesse caso seja - com os demais.
Também, a partir desse fato, nota-se que a
sociedade é, na verdade, todo um corpo social. As pessoas, para manterem o
funcionamento desse corpo, agem de forma solidária, muitas vezes abdicando de
seus próprios interesses – de forma consciente, individual – e fazendo sua
parte na sociedade, como o correto agir em relação a conduta de um trabalhador
do metrô da Cidade de São Paulo. Esse tipo de solidariedade, em que os
indivíduos de forma autônoma e individual tomam iniciativas para a boa convivência
social é, segundo Durkheim, a solidariedade orgânica. Exemplos dessa
solidariedade orgânica no Brasil hoje em dia é o ato de as pessoas, ao saírem
de casa, utilizarem as máscaras para evitar a transmissão do coronavírus, por
mais que esse utilizar a máscara as cause desconforto. É claro que existem
desviantes dessa norma, como o caso conhecido do desembargador em Santos,
porém, como visto, a sociedade – pelo menos grande parte – voltou-se contra
ele, tanto na questão da sanção legal por ele sofrida, quanto pela questão do
desprezo popular a ele direcionado. Assim, no Brasil contemporâneo, as pessoas,
consoante o pensamento de Émile Durkheim, seriam nada mais do que órgãos – cuja
individualidade existe – trabalhando para o bom funcionamento do corpo social. Esse
pensamento, independentemente de estar totalmente correto ou não, mostra como
que no mundo contemporâneo as pessoas agem, influenciadas por diversos fatos sociais,
para manter a sociedade em sua mais possível forma harmoniosa.
Vitor
Nakao Tersigni – 1° Ano Direito – Período Diurno
Visão Durkheimiana do direito: a sociedade brasileira é uma sociedade moderna?
Em seu livro “Da divisão do
trabalho social”, o sociólogo francês Émile Durkheim expõe e argumenta sobre a
função do direito na sociedade. Para estabelecer essa função, o escritor
diferencia o direito nas sociedades “pré-modernas” e “modernas”. Segundo
Durkheim, o direito pré-moderno assume um papel de direito punitivo, punindo de
maneira passional o desrespeito a norma que está inserida na consciência
coletiva daquela sociedade. A natureza da pena atravessa o próprio impacto
social causado pelo crime. Já nas sociedades modernas, o direito assume um
papel restitutivo, regulando as funções daquela sociedade. Dessa forma, o
direito e a penalização se torna técnica, e não mais emocional, buscando
instituir e reparar os limites de atuação, prezando pela manutenção da
solidariedade (ou seja, promover a coesão social e a segurança jurídica, de
modo a que todos cumpram suas funções na sociedade sem prejudicar os demais).
Todavia, ao fazer essa analise Durkheimiana, é possível dizer que o direito
brasileiro condiz com esse que se identifica nas sociedades modernas?
A verdade é que a justiça brasileira é arbitrária na
criminalização e punição. Apesar de contar com toda a tecnicidade do direito, o
caráter restitutivo do mesmo só se mostra presente em determinadas situações:
quando aqueles que ferem a norma e a coesão social ocupam posições de
prestígio, ou são privilegiados economicamente e socialmente. Entretanto, qual
a ordem social é afetada por membros da sociedade de camadas mais populares e
menos influentes, o direito brasileiro assume um caráter extremamente punitivo,
institucionalizado e não institucionalizado.
Os exemplos dessa diferenciação são frequentes: o atual
ministro da cidadania Onyx Lorenzoni recentemente admitiu participação em um
esquema de caixa 2 onde recebeu mais de 300 mil reais. Contudo, o ministro
entrou em um acordo de não persecução penal com a PGR e vai pagar uma multa de
189 mil reais. Essa situação jamais ocorreria caso o crime fosse cometido por
alguém de menor prestígio social que o ministro. Foi o caso Cristiane Ferreira
Pinto, presa em 2018 por roubar alimento para dar de comer a seus dois filhos,
tendo o pedido de liberdade provisória negado apesar de grávida de 9 meses por
“evidente risco à ordem pública”. Teria o crime de Cristiane um efeito negativo
maior sob a coesão social e a ordem pública do que o crime do ministro Onyx? As
penas são claramente desproporcionais.
Além disso, há no Brasil a questão do direito “popular”, ‘feito com as próprias mãos”, que fere todo o aspecto de modernidade e técnica na aplicação do direito. O professor e sociólogo José de Souza Martins fez pesquisas sobre a cultura do linchamento no Brasil, afirmando que a frequência de linchamentos no país é uma das mais altas do mundo, e as vítimas são quase sempre pertencentes a grupos sociais marginalizados, com crimes que não fazem jus a intensidade de sua “pena” ou mesmo que não cometeram crime, sem chance de defesa.
Conclui-se que, sob a ótica de Durkheim, o Brasil não seria uma sociedade moderna no que diz respeito a aplicação do direito. Outro ponto de vista seria de que a analise de Durkheim foi demasiadamente generalista, sem consideras as nuances presentes nas sociedades reais. De qualquer modo, o direito brasileiro possui sérias deficiências no que diz respeito a aplicabilidade prática dos princípios que deveriam regê-lo.
Fontes:
https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/acordo-de-onyx-abre-precedente-especifico-e-mostra-peso-da-avaliacao-do-ministerio-publico-avaliam-juristas/
https://exame.com/brasil/gravida-de-9-meses-esta-em-presidio-de-sp-por-furto-de-comida/
MARTINS. José de Souza. Linchamentos:
a Justiça Popular no Brasil. São Paulo: Contexto, 2015.
DURKHEIM. Émile. Da divisão
do trabalho social. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
Matheus Guimarães Ferrete - 1º ano Direito (noturno).
O Algoritmo da Coerção.
Com o avanço da tecnologia, e por consequência a popularização do acesso à internet, a sociedade vivenciou uma intensa reformulação na dinâmica das relações sociais. As novas ferramentas de comunicação, possibilitaram que o local de encontro das pessoas deixasse o mundo físico e ocupasse o espaço digital.
A pandemia do Covid acelerou o processo de digitalização das interações mediadas por ferramentas digitais, promovendo uma quase que total imersão das relações no meio virtual, fortificando a construção de uma “sociedade virtualizada”. Embora a sociedade tenha mudado seu ambiente de interação, ela trouxe consigo os seus agentes, mesmo que superficialmente remodelados.
Um dos agentes que operam as “web relações”, é o fato social, que agora além de ser fruto de construções sociais, é operacionalizado pelos algoritmos com o intuito de coagir os usuários das plataformas. Tal coação é feita através do emprego de códigos que fecham os indivíduos em determinadas bolhas sociais, com o intuito de induzir o mesmo através da ideia de que tal ato é replicado por todos a sua volta.
A indústria do marketing sabe muito bem como aplicar, calibrar e vender tal ferramenta de controle social. Replicando os métodos de coerção empregados na sociedade “analógica”, e através desses estruturando e perpetuando vários pequenos universos que proporcionam ao usuário uma ideia de protagonismo, mesmo que tais universos sejam anteriores e independentes dos seres que ali interagem.
Por fim, é notável que a aplicação dos fatos sociais remodelados para a dinâmica das redes sociais, é um fenômeno que busca submeter os seres a uma ordenação social “universal”, que é fruto do controle de engajamento feito pelos algoritmos das plataformas e também do direcionamento de conteúdo de acordo com o perfil do usuário.
Corpo Social na Visão de Émile Durkheim
Durkheim buscou superar o positivismo de
Augusto Comte, delineando os aspectos básicos para criar uma metodologia, institucionalizar
a sociologia para que a mesma fosse considerada uma ciência da sociedade, tornando-se
uma disciplina universitária. Dessa forma, Durkheim, em sua análise, faz analogias
com o corpo humano, de modo que cada instituição (como por exemplo o Estado, a
Escola, a Igreja, o Trabalho, a Família, entre outras), cada fato social, cumpre
determinada função dentro da sociedade, assim como cada órgão, cada célula,
cumpre sua determinada função no corpo humano. Por esse motivo, coube chamar a
Sociologia Durkheiminiana de Funcionalismo ou até mesmo Organicismo.
O sociólogo desenvolve o conceito de fato
social como “toda maneira de agir fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo
uma coerção exterior” e defende, ainda, que esses fatos sociais devem ser
observados e analisados como “coisas”. Essa análise dos indivíduos, da
sociedade, como objetos inanimados, foi o método desenvolvido por Durkheim para
tentar desvencilhar esse objeto dos sentimentos e valores do sociólogo
pesquisador. Somente assim, poderia haver um distanciamento entre o analista
social e o objeto de estudo, já que a sociologia é uma ciência peculiar, pois o
sociólogo tem a mesma natureza orgânica e social do objeto que ele estuda.
A importância da análise dos fatos sociais
como “coisas” se dá, também, para romper com as análises ideológicas que haviam
sido propostas até então, que partem das ideias para as coisas e não das coisas
para as ideias, o que permite que os sentimentos e valores do analista
influencie em seus resultados. Na análise ideológica, o estudo social já é iniciado
com pressupostos, aos quais Francis Bacon chama de pré-noções, “ídolos da mente”.
Por esse motivo, Durkheim critica o positivismo de Augusto Comte e o marxismo de
Karl Marx e Friedrich Engels, pois ele visa que a sociologia seja uma ciência
da realidade e não de pressupostos. O positivismo já concebe o sentido da história
como sendo o estabelecimento da ordem com a manutenção das instituições para
que, posteriormente, a sociedade possa caminhar rumo ao progresso. À vista
disso, Durkheim acredita que Comte se distancia da verdade sociológica ao
valorizar a ideia que o analista tem da história e não os fatos em si. Já no
marxismo, temos a pressuposição de que todas as sociedades tendem ao colapso do
capitalismo, toda história é a luta de classes, seja no passado ou no presente,
e o que buscamos para o futuro é a correção das distorções causadas por essas
lutas, visando o equilíbrio dentro do socialismo. Logo, Durkheim defende que o
motor da história não é a luta de classes, mas sim a busca da sociedade em
evitar a anomia, ou seja, a deterioração das regras que mantém a coesão social.
Podemos perceber que a sociologia de
Durkheim vai servir de inspiração para a Antropologia, buscando compreender as sociedades
mais remotas do planeta a partir de sua funcionalidade própria. Desse modo,
entende-se que os indivíduos não necessariamente vão se organizar e se relacionar
para, no futuro, chegar ao progresso técnico e científico, evitando, assim, a
análise das sociedades consideradas primitivas a partir de uma visão
eurocêntrica e desenvolvida de mundo, e sim considerando as singularidades de
cada sociedade.
Para Durkheim, a partir do momento em que um
indivíduo é inserido na sociedade, torna-se impossível que o mesmo se desvencilhe
dos fatos sociais. Isso ocorre justamente pela força coercitiva que os mesmos
exercem sobre os indivíduos, de modo que uma possível tentativa de fuga das instituições
poderia gerar um sentimento de reprovação coletiva, a fim de preservar o
equilíbrio da sociedade e evitar a anomia. Cabe destacar, que os fatos sociais
não são estáticos, eles se modificam na medida que as sociedades desenvolvem
novas necessidades.
Com isso, surge o papel da educação de
forjar o ser social e lhe incutir as regras, os fatos sociais, uma imposição de
visões e comportamentos. Essa educação, não parte apenas da escola, mas também
da família, dos grupos coletivos aos quais os indivíduos se inserem, entre outras
instituições. Assim, as formas de comportamento, mesmo que se expressem no indivíduo,
traduzem hábitos forjados na dimensão do coletivo.
Durkheim, ainda, trata da solidariedade
mecânica, que é a presente, principalmente, em sociedades pré-modernas,
pré-capitalistas. Nessa, tem-se um ato tido como criminoso quando o mesmo
ofende a consciência coletiva, que corresponde a um conjunto de crenças e
sentimentos comuns à maioria dos membros de uma mesma sociedade, devendo,
portanto, ser punido. O direito aplicado nessa solidariedade era o repressivo,
que punia os atos que ameaçavam a coesão social, que, nessa época, eram aqueles
que contrariavam a força transcendental que rege o funcionamento da sociedade,
e as penas eram muito desproporcionais. O direito não era uma ciência, mas sim
uma força moral e a lei estava inscrita em todas as consciências e, por esse
motivo, o indivíduo age mecanicamente de acordo com a mesma, podendo participar,
também, da aplicação da pena. A pena era destinada ao coletivo e consistia em
uma reação passional, visando fazer com que os indivíduos da sociedade se
sentissem receosos em descumprir a lei, sendo que a mesma poderia ser agravada
pela vergonha (difamação) como, por exemplo, no apedrejamento de uma mulher
adúltera em praça pública.
Já na modernidade, que emerge com o
capitalismo, temos a solidariedade orgânica, na qual os indivíduos não estão
unidos por uma crença comum, mas pela individualidade de suas funções sociais
que faz com que haja uma dependência gerada pela divisão e especialização do
trabalho, de modo que a eliminação de um indivíduo iria criar uma lacuna dentro
da organicidade social. O direito é restitutivo (restitui as coisas ao seu
devido lugar), podendo ser feita uma analogia do mesmo com o sistema nervoso, já
que ambos tem a tarefa de regular harmonicamente as funções do corpo, seja
humano ou social. Nessa solidariedade, só são punidas ações que colocam em
risco a dimensão pública, de maneira que o adultério não precisa mais de pena,
pois apenas afeta a dimensão privada. Essa solidariedade acolhe condutas, seja da
luta LGBTQI+, do feminismo, dos movimentos antirracistas, entre outros, para
manter o equilíbrio, já que a eliminação de uma dessas partes poderia levar a
sociedade à anomia, ao colapso. A especialização é tão grande na modernidade
que observamos até mesmo a divisão do direito, desse modo, ele escapa das
consciências coletivas por ser muito específico, deixando de ser difuso e tornando-se
uma ciência, que passa a expressar técnica e não mais um estado emocional como
na solidariedade mecânica.
Com isso, surge uma dúvida com relação a qual
solidariedade o Brasil se encaixaria. Apesar de estarmos na modernidade e de
nosso país adotar toda essa divisão e especialização das áreas das ciências,
inclusive do direito, ainda observamos movimentos reacionários que afirmam que
a modernidade é incapaz de responder de modo a manter a coesão e isso reflete
no fato do Brasil, por exemplo, ser um dos países com o maior número de
linchamentos. Para eles, a manifestação de preferências sexuais equivaleria a
uma ameaça à família tradicional burguesa e, assim, tentam reprimir os
indivíduos que possuem uma preferência sexual diferente da heterossexual porém,
a sexualidade de uma pessoa se encontra no âmbito privado da sociedade, já que
em momento nenhum, afeta a coesão social da mesma. Outro exemplo, é a revolta
de grupos com a tentativa das mulheres de ressignificar os valores e padrões, questionando
o seu lugar e a sua visão “tradicional” pré-definida de “bela, recatada e do lar”.
Porém, como a sociedade ainda é baseada no patriarcado e no machismo, essa tentativa
de mudança é vista como um comportamento que ameaça o equilíbrio social. Por
último, temos essa mesma reação para com os movimentos negros, que lutam a favor
da igualdade e respeito, já que a sociedade ainda possui enraizado o racismo
estrutural.
Portanto, podemos observar, ainda, um sedimento do pré-moderno que anseia em se sobrepor na modernidade. Entretanto, utilizando a metáfora de comparação da sociedade com o corpo humano, percebemos que esses grupos reacionários que realizam linchamentos e visam a eliminação de outros grupos não devem ter voz na modernidade já que o total e eficiente funcionamento do corpo social (corpo humano) exige a participação e o envolvimento de todos os indivíduos (células) e grupos sociais (órgãos) na sociedade.
Júlia
Martins Amaral – 1º Ano – Direito Matutino
O antagonismo do ordenamento jurídico
Para Durkheim, o direito não é resultado da exclusiva vontade do homem, mas fruto da atividade social, da vida em sociedade. Seu estudo é, assim, produto condicionado e condicionador do comportamento social. O direito também é um fenômeno que podemos verificar na realidade, ou seja, um fato social. e como consequência, uma nova ciência emerge, a sociologia jurídica.
A formação da sociologia jurídica como ramo autônomo da ciência ocorreu com a escola de pensadores liderada por Durkheim, a partir, especialmente, de seu livro "A Divisão do Trabalho Social". Na obra, se aperfeiçoam os estudos das influências da sociedade sobre a formação do direito, Durkheim estuda dois tipos de solidariedade social: a mecânica, em que a consciência coletiva abrange a maior parte das consciências individuais, e a orgânica, em que ocorre uma redução da esfera da existência que cobre a consciência coletiva e o enfraquecimento das reações coletivas, sobretudo, na interpretação individual dos imperativos sociais.
A priori, buscaremos entender os ensinamentos de Durkheim. Quando diz que o homem ao cumprir obrigações contraídas, como quando atende aos deveres de irmão, esposo, pai, por exemplo, realiza atos que estão fora dele próprio. Tais manifestações vêm de fora para dentro do indivíduo. Mesmo quando está de acordo, esta realidade objetiva, carregada de coercibilidade, é sentida pelo indivíduo. Cada um dos membros da sociedade submete-se a essas imposições, aceitando-as como válidas socialmente, é um fato social.
Nestas condições, diz o sociólogo, o indivíduo é colocado frente a uma ordem de fatos de características peculiares: "consistem em maneiras de agir, de pensar e de sentir exteriores ao indivíduo, dotadas de um poder de coerção em virtude do qual se lhe impõem. Por conseguinte, não poderiam se confundir com os fenômenos orgânicos, já que consistem em representações e ações, constituem então, uma espécie nova e é a eles que deve ser dada e reservada a qualificação de sociais".
A partir dessas colocações, Durkheim apresenta a seguinte definição de fato social: "É fato social toda maneira, de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o individuo uma coerção exterior, ou mais ainda, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais que possa ter."
Um exemplo comum de fato social é a educação imposta aos indivíduos (coercitividade), que já tem uma existência como instituição anterior aos membros da sociedade (exterioridade) e é um fenômeno que se verifica na totalidade (ou ao menos seguindo essa lógica, deveria ser) da sociedade (generalidade).
Extrai-se da lição de Durkheim que o direito é o fenômeno que se observa no meio social, como manifestação das realidades da sociedade. Não nasce da vontade individual, mas como manifestação de uma necessidade social. Sua origem decorre da existência da sociedade organizada, a qual serve-se do direito como instrumento eficaz de controle social.
O direito estabelece normas de conduta, às quais corresponde uma coerção. Estas normas são elaboradas pelas instituições que a sociedade cria e mantém com o fim de formular o direito, o qual refletirá a realidade axiológica daquele momento. A norma, a partir dessa visão, reflete uma realidade social, pois responde a uma necessidade que os indivíduos coletivamente apresentaram. O direito, neste plano, é estudado a partir da realidade que o condiciona, focalizando os fatores de sua transformação, desenvolvimento e declínio. A norma é apenas o resultado da realidade em que o direito está inserido, e desta forma é vista. O direito aqui não é a norma, mas sim o fato social, o fenômeno verificável a partir de condicionantes sociais.
Outro aspecto importante é o fato de que, por ser a realidade social condicionante da normatividade jurídica, o costume passa a ser elemento importante na formação do direito (direito consuetudinário, como vimos com a Professora Kelly). O costume que surge no meio social força a edição de normas regrando as novas situações apresentadas, as quais passam a integrar o ordenamento jurídico. O costume, como realidade social palpável supera o direito escrito e é aceito como válido.
Destarte, Durkheim entende que o indivíduo nasce da sociedade, e não a sociedade nasce do indivíduo. E para o sociólogo, o problema central das sociedades modernas são as relações conflituosas entre os indivíduos e o grupo social. O homem tornou-se por demais consciente de si mesmo para aceitar cegamente os imperativos sociais.
Fontes:
http://www.histedbr.fe.unicamp.br/revista/edicoes/40/art18_40.pdf
http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/seminasoc/article/view/8918/7872
Lucas Magalhães Franco 1° Período Noturno