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terça-feira, 30 de abril de 2024

Influência do fato social sobre o indivíduo


 

A indubitável influência de Marx para as noções do direito contemporâneo

    Inicialmente é válido pontuar a importância dos ideais marxistas para toda a construção do mundo do direito contemporâneo. Na medida em que foi a partir das ideias de Marx e Engels, que foi possível analisar o direito de uma perspectiva mais crítica. Baseando-se na superestrutura, Marx colocou o direito como integrante desse conceito, sendo ele, também objeto da influência ideológica da classe dominante, a burguesia, e usado como instrumento de alienação e dominação dos proletariados.

   Essa crítica está amparada em diversos aspectos da ideologia de Marx, que auxiliam na explicação dessa perspectiva. Segundo Marx, a infraestrutura é a base material de uma sociedade, sendo ela responsável por integrar noções como o modo de produção e consequentemente, as relações de produção. Esta, com base na corrente marxista, é onde está integrado as leis, valores e ideais. É a base material que determina quais leis e valores tendem a se formar na mentalidade social das pessoas.

   Outra compreensão importante para compreender o filósofo-economista é a superestrutura. Nesse sentido, o conceito representa o aspecto ideológico da sociedade. O qual deriva a política e as instruções normativas. Essa definição estaria ligada ao conceito de alienação, em que a classe dominante usa seu poder advindo das relações de produção para perpetuar a sua ideologia e manter a exploração do proletariado, a mais-valia. Sendo as leis burguesas e a política exemplos dessa alienação.

   São ligações interdependentes: enquanto a infraestrutura é o ponto de partida para formar a ideologia dos indivíduos, é a superestrutura que perpetua as relações de produção da infraestrutura.

   Segundo Marx, seria a partir do ponto em que os proletariados tomassem consciência dessa relação de produção exploratória, de mais valia, e tivessem a ciência de que estavam sendo alienados, é que seria possível reformular as relações de produção e interromper a alienação. O que criaria uma sociedade em que os próprios indivíduos reconhecem sua igualdade e conseguem criar um ordenamento jurídico condizente com a nova organização social.

   Evidencia-se, portanto, a importância da ideologia marxista para as bases do direito contemporâneo e da crítica que é feita aos sistemas legais burgueses. Sendo possível afirmar, que sim, existe lugar para as ideias marxistas na formação e atuação do jurista.

Samuel Jeronimo dos Santos – 1° ano – Direito (Noturno)

Nem tudo deveria ser natural

 O positivismo é uma corrente sociológica que tem por fim o estudo dos fatos concretos, em uma abordagem que os observa como fatores naturais a evolução social. Já a física social busca estudar os fenômenos sociais da mesma maneira que as outras ciências como a astronomia ou a física, por exemplo, ou seja através do método cientifico.

    A partir desta análise, é possível notar que a perspectiva de abordar certos fatores como naturais é um tanto quanto perigosa. Na medida, que seria válido ressaltar teses absurdas como a superioridade ariana, que poderia vista como algo natural, e, portanto, seria legitimo baseando-se no meio de compreensão meramente positivista. Logo, é necessário pontuar que uma ideologia que poderia chancelar algo como a eugenia factualmente não é a melhor maneira de observar o mundo.

    Já no Brasil o positivismo está presente na história e ainda se mantém atualmente. Acerca disso, é importante ressaltar a presença dos dizeres positivistas “Ordem e Progresso” na bandeira do Brasil, essa frase se origina do fato dos militares seguirem a doutrina positivista, e por conta do protagonismo do grupo durante a Proclamação da República e dos dois primeiros presidentes terem sido militares a frase chegou à bandeira da nação. 

    Desse modo, é evidente a importância do positivismo para as ciências humanas, haja visto sua contribuição de incluir o método cientifico e colocar os fatores sociais como passiveis de crítica racional e de comprovação empírica. No entanto, é válido ressaltar que, sua aplicação no estudo do direito possui seus questionamentos. O respeito as normas legais, fundamentadas do ponto de vista racional e na preservação de um Estado de direito, ao não considerar os direitos naturais ou inerentes ao ser humano, tem como consequência a abertura para a criação de leis, que do ponto de vista ético, seriam consideradas absurdas, sendo apenas legitimadas pela existência de certa legislação.

 

Samuel Jeronimo dos Santos – 1° ano – Direito (Noturno)

 

O Funcionalismo e o encarceramento em massa no Brasil: A “resistência” como mecanismo de controle social.

Concessões e negações

A Queda da Bastilha no contexto da Revolução Francesa do século XVIII representou a quebra de paradigmas associados ao encarceramento físico e metafórico de uma população. Analogamente, no âmbito hodierno, o sistema prisional atua como mecanismo de controle social à medida em que marca o monopólio de uma classe sobre a outra. Ademais, a evolução dos sistemas de punição ao longo da História da humanidade carrega estigmas no que tange à sua finalidade. Logo, a restrição da liberdade de forma isolada não auxilia na maior segurança da sociedade e está pautada em uma dinâmica social dominante.

Em uma análise primordial, é claro que a integridade moral do meio coletivo está em defasagem ao passo que o aprisionamento no Brasil visa a reclusão das minorias em detrimento da restituição dos encarcerados à sociedade. Em viés histórico, essa dinâmica foi replicada na Revolta da Chibata durante a República Oligárquica por meio do castigo físico extenuante infligido ao marinheiro negro João Cândido. Infelizmente, esse episódio escancara as heranças da escravidão na sociedade brasileira ao demonstrar as marcas deixadas por ela na mecânica das punições que remetem à época, na qual as minorias são as mais atingidas em virtude de um modelo social consolidado.

Ademais, a lotação das cadeias atua como forma de dominância social. Conforme elucida o filósofo pós-moderno Michel Foucault, em sua obra “Vigiar e Punir”, a transmutação das principais formas de punir conforme a evolução da história consagrou o modelo coletivo no qual aqueles que detém o monopólio do corpo social exercem seu poder por meio do sistema penitenciário. Sob essa ótica, fica claro que o papel da restrição da liberdade em uma sociedade cristalizada denota o caráter tendencioso da justiça brasileira, na qual a classe social dominante é privilegiada com concessões e abrandamento nas penas, enquanto os dominados vivem as deficiências do ambiente carcerário perpetuadas pelo modelo de “resistência” engendrado na sociedade, que legitima a exploração dos menos favorecidos.

Portanto, o encarceramento em massa no Brasil não tem tornado a sociedade mais segura, mas sim reforçado a condição estratificada do coletivo brasileiro. Certamente assim como João Cândido muitos sofrem as consequências do passado escravocrata nacional que mantém suas impressões no sistema judiciário. Para mais, o modelo construído por Foucault em “Vigiar e Punir” demonstra o engessamento social no que tange à manutenção das estruturas de poder. Sob tal viés, é necessário derrubar a “Bastilha” contemporânea revolucionando o ideal estamental implantando no cerne do sistema punitivo.

A ideologia alemã visível dentro da corrosão do caráter

 

    Na obra “ A corrosão do caráter” escrita por Richard Sennett, o autor explora a esfera moderna e os impactos que o capitalismo gera no senso de integridade e objetivos pessoais que antes eram encarados como fundamentais para forjar o caráter pessoal.

   Nesse mundo capitalista onde houve modificações no que se refere ao trabalho, também houve na classe dominante, que segundo Marx e Engels no livro “A ideologia alemã”, está dividida entre duas categorias de indivíduos dessa mesma classe, que são os pensadores, ideólogos ativos que teorizam e elaboram ilusões que essa classe tem de si mesma e os que recebem esses pensamentos de forma receptiva mas que na verdade são os membros ativos dessa classe.

   Associando esse conceito com a obra de Sennett, no primeiro capítulo, denominado ‘’Deriva’’, duas figuras são mencionadas como exemplos para auxiliar o autor a desenvolver seu argumento de que as pessoas estavam famintas por mudanças e que a origem dessa fome de mudança seria o desejo por retornos rápidos. Essas figuras são James Champy e Bennett Harrison. E é intrigante porque Champy é conhecido por prestar consultorias a executivos de empresas multinacionais que buscam melhorar o desempenho dos negócios, enquanto Harrison é favor de um maior envolvimento do governo na economia dos EUA, e até elaborou planos de desenvolvimento econômico para o senador Fred Harris de Oklahoma em 1972.

   Neste cenário, pode-se afirmar que os tais pensadores anteriormente mencionados por Marx e Engels, incluídos dentro da classe dominante, seriam alguém como essas duas personas, pois vivem dentro deste ambiente de pessoas com alta renda e as aconselham intelectualmente a tomarem certas decisões. E os que recebem de forma receptiva e que na realidade são os membros ativos dessa classe seriam justamente os executivos dessas empresas que posteriormente geram empregos para outras pessoas e o senador que possui um papel crucial dentro da política.

   Portanto, utilizando dois nomes da perspicaz obra de Sennett, fica evidente como os indivíduos que influenciam decisões e direções dentro do sistema econômico capitalista desempenham um papel essencial na moldagem do curso dos eventos. No entanto, ao final, emerge a observação de que a verdadeira ativação desse poder reside naqueles que de fato tomam as decisões e implementam as políticas, como os executivos corporativos e os políticos. Esses indivíduos não apenas moldam o rumo de um sistema, mas também influenciam diretamente a vida de inúmeras pessoas.

 

O MARXISMO E O ÂMBITO JURÍDICO

 

   Na concepção de Marx, o movimento social passa a existir quando as ações práticas começam a ser executadas, trazendo esse conceito para um ambiente estudantil, durante a formação acadêmica, os alunos que futuramente irão atuar em determinada área se deparam com algumas questões que necessitam da mobilização para que a diferença seja feita dentro da faculdade, um exemplo seria a luta dos estudantes da UNESP Franca para conseguir que o Restaurante Universitário esteja disponível no período noturno, algo que se efetivou devido a persistência dos mesmos. 

   Refletindo mais a fundo, o marxismo pode ser levado em consideração na formação de um jurista no que se refere ao lado crítico, visto que vivemos dentro de uma sociedade desigualmente econômica e social e que dentro do direito merece ser analisado criticamente. No livro ‘’Karl Marx e o Direito’’ escrito por Francisco Pereira, o autor diz que o direito é um campo tão dominado por ideias conservadoras que os juristas de visão crítica, muitas vezes até muito moderada, são encarados pela dogmática jurídica de forma desconfiada. E estudar a relação entre o Estado, o direito e a luta de classes é fundamental porque em teoria, no geral, os indivíduos tem a imagem de que o Estado é uma instituição que supostamente representa a vontade geral e nem sempre os grupos oprimidos e marginalizados são amparados por esse organismo. 

   Além disso, é interessante um jurista que está atuando em seu cargo ter a consciência de como as decisões jurídicas podem impactar as condições de vida de tantas pessoas. Portanto, há a possibilidade da abordagem de Marx ser considerada na vida acadêmica e profissional de um jurista, uma vez que as estruturas socioeconômicas e as relações de poder são elementos que contornam o âmbito jurídico. 

 

Trabalho e identidade

 

Marx, em seu livro “A Ideologia Alemã”, discute como os métodos de produção influenciam não apenas a vida prática das pessoas, mas também suas identidades. Essa visão é contemporaneamente ilustrada por Sennett em "A Corrosão do Caráter", onde temas como tempo, mobilidade social e fraquezas de caráter são abordados.

Na história de Rico e Enrico, pai e filho, vemos dois modos de vida contrastantes. Enrico adota um ritmo mais lento e estável, buscando equilíbrio e consistência em suas atividades. Por outro lado, Rico, em sua busca pelo sucesso rápido, sacrifica tempo pessoal e enfrenta um ritmo frenético de trabalho, representando a pressão do novo capitalismo, onde a ascensão social é associada ao comprometimento extremo. Esses exemplos evidenciam como a forma como as pessoas constroem suas vidas está ligada à sua identidade e qualidade de vida. O estilo de vida acelerado de Rico reflete as pressões do mundo contemporâneo, onde a busca pelo sucesso muitas vezes leva ao esgotamento e à perda de conexões sociais.

Essa dinâmica entre os personagens ilustra a precarização e insegurança presentes nas relações de trabalho contemporâneas. Rico está imerso em um ambiente onde a busca pelo sucesso muitas vezes leva à alienação e à desconexão das próprias necessidades pessoais e emocionais. As preocupações levantadas por Sennett e Marx ecoam o contexto atual de alta competitividade e pressão por desempenho. Muitos trabalhadores enfrentam demandas excessivas, o que pode resultar em fadiga e esgotamento, afetando negativamente sua saúde física e mental. Em suma, a relação entre produção material e identidade continua sendo uma questão relevante e atual. É fundamental repensar as práticas de trabalho e promover um equilíbrio saudável entre vida profissional e pessoal, visando o bem-estar e a realização das pessoas em suas múltiplas dimensões.

O Papel do Marxismo na Formação e Atuação do Jurista: A Importância da Luta Contínua

No dia 11 de Abril, em comemoração aos 30 anos do CADir (Centro Acadêmico de Direito da Unesp de Franca), foi realizada uma palestra com pessoas que passaram pelo movimento estudantil em diferentes períodos.  Durante o evento, uma palavra ecoou de forma constante e enfática: luta. Falou-se muito sobre as batalhas do centro acadêmico em prol das reivindicações dos estudantes, sobre a necessidade de lutar pelos direitos conquistados de forma contínua e sobre como, se não houver uma constante vigilância, é fácil retroceder e perder o que foi conquistado.

Diante dessa discussão podemos nos perguntar: existe espaço para o marxismo na formação e atuação do jurista? O pensamento marxista, tem suas raízes na análise crítica das relações sociais, econômicas e políticas. Enfatiza a importância da luta de classes e da transformação social para alcançar uma sociedade mais justa e igualitária. Para um jurista, o marxismo pode ser uma ferramenta poderosa para entender as estruturas de poder, as desigualdades e as injustiças presentes no sistema legal, questionando as relações de dominação e exploração, buscando promover uma prática jurídica mais consciente e comprometida com a justiça social.

Assim como o centro acadêmico defende a importância da luta para manter e expandir os direitos dos estudantes, o jurista engajado também deve estar disposto a lutar pelos direitos e pela justiça dos cidadãos. O marxismo, nesse contexto, pode oferecer uma visão crítica e transformadora para a atuação jurídica, incentivando-os a questionar as estruturas de poder, a defender os direitos dos mais vulneráveis e a buscar um direito mais inclusivo e democrático. Portanto, sim, existe lugar para o marxismo na formação e atuação do jurista, especialmente no que diz respeito à luta contínua na busca por uma sociedade mais justa e igualitária.