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segunda-feira, 7 de abril de 2025

Para quem o mundo está fora de ordem?

 Jojo Rabbit conta a história de um menino que viveu no período da Alemanha nazista e descobre que sua mãe escondia uma judia no porão de sua casa, pois ela era contra qualquer ideologia que pregava o ódio. O filme traz uma contraposição interessante entre os valores ensinados pela mãe do menino ao tratar outro ser humano e os valores passados pelas autoridades alemãs sobre como abordar um judeu, então o garoto luta contra seus próprios ensinamentos para tomar uma decisão, tendo um vista que por um lado aprendeu a ser generoso e cuidadoso com outra pessoa, no entanto, por outro lado aprendeu que, por se tratar de uma judia, deveria avisar as autoridades imediatamente e entregar essa criatura perigosa e traiçoeira. 

Sob a ótica dos nazistas, o tratamento daqueles indivíduos deveria ser daquela forma, pois eles eram os responsáveis pela crise econômica que a Alemanha passava, então, ao depositar os problemas da população em cima de um grupo, torna-se fácil o processo de desumanização que valida, para as pessoas revoltadas com a crise, o assassinato desses indivíduos. Em outras palavras, para manutenção de uma ordem social, já que os judeus foram culpados pelos problemas recorrentes dos alemães, foi aceito e até incentivado o massacre de um povo. 

Por causa disso, cria-se o questionamento do que se enquadra como ordem. Na visão do povo alemão, eles queriam o seu país de volta, livre dos judeus e os problemas que, em tese, trouxeram, ou seja, a manutenção da sociedade do jeito que ela era. Entretanto, a sociedade é flexível, mutável, porque as pessoas mudam, novas tradições surgem e novos grupos aparecem, e, nessa concepção de ordem, essas alterações são problemas que causam desordem no corpo social.  

Dessa forma, entende-se que a ascensão de grupos que antes se mantinham escondidos, isolados e amedrontados é uma situação de desordem para as pessoas que prezam pela manutenção de uma sociedade estática e, devido a isso, devem ser exterminados. Por isso, para as pessoas marginalizadas, as minorias, existe uma ordem fora do mundo, pois essa ordem não condiz com a existência dessas pessoas no mundo, enquanto isso, para a elite privilegiada, essa luta das minorias por um mundo diferente é a causa de um mundo fora de ordem. 


Matheus Góes Rosella 1º Direito - Noturno

(Obs: Estou seguindo o calendário de postagens do matutino)

Um mundo fora da ordem ou uma ordem fora do mundo?

 A música Que País é Esse?, da Legião Urbana, critica a corrupção e o caos social no Brasil. O trecho:


"Terceiro mundo se for

Piada no exterior

Mas o Brasil vai ficar rico

Vamos faturar um milhão

Quando vendermos todas as almas

Dos nossos índios num leilão

Que país é esse?"


Mostra uma realidade que ainda se repete. Hoje, vemos a violência aumentar, a extrema-direita crescer, direitos sendo retirados e conflitos como a guerra na Palestina se intensificarem. Isso faz muitos se perguntarem se estamos caminhando para o fim do mundo.


Por outro lado, a história já passou por momentos difíceis e sempre encontrou formas de seguir em frente. O maior problema talvez seja a falta de esperança da geração atual. Muitos jovens enfrentam dificuldades para conseguir emprego, sentem-se desmotivados e preferem se afastar da política. Ao mesmo tempo, os movimentos sociais perdem força, e a polarização política só aumenta.


Mas o caos não significa que não haja resistência. Ainda existem pessoas lutando por mudanças, defendendo direitos e tentando construir um futuro melhor. A guerra em Gaza, por exemplo, não é só um conflito territorial, mas uma disputa histórica e religiosa que reflete as desigualdades do mundo. Além da destruição física, há também um apagamento cultural e identitário dos povos oprimidos.


Talvez a questão não seja se estamos no fim do mundo, mas sim que mundo queremos construir. A música da Legião Urbana continua atual porque as injustiças ainda existem. Mas, se o futuro é incerto, a mudança depende da organização política, da educação e da união das pessoas para criar um caminho diferente.



Isabelle Moulin Gonçalves - 1 ano de Direito (Matutino)

Positivismo x Senso comum

Carlos tem crescido e aprendido com o mundo o que pensou que já sabia sobre o próprio mundo. Curioso como alguns conceitos podem mudar tão rápido na mente manipulável de um jovem. Curioso que a única coisa que é preciso para aprender a usar a lógica, é o próprio pensamento lógico.

Afinal, quem nunca ouviu de algum familiar que comer manga com leite faz mal? Ou qual a criança que não foi repreendida por deixar os chinelos de cabeça pra baixo? “Não olhe para o espelho depois de comer, ou sua boca vai entortar!” sua mãe dizia.  O senso comum é esse conhecimento que vem dos costumes, das vivências cotidianas, é passado pelas gerações quase como regra. Mas também, assim como as superstições, é superficial e não deriva de uma grande reflexão. E Carlos não precisou de muito tempo para aprender isso.

Bastou uma simples aula de filosofia... ou sociologia? Ele não se lembrava exatamente qual disciplina era, o mesmo professor lecionava as duas, as duas em uma. Uma carga de horário reduzida atrapalha, e muito, a compreensão do que era dito naquele breve momento, no qual com maestria, estudantes de 16 anos eram persuadidos a pensar com as próprias cabeças. O jovem não se lembrava qual a corrente filosófica estudada, ou quem era o seu pensador. Não sabia exatamente a origem ou os conceitos desse tal positivismo. Apesar de ser muito relevante dar nomes aos bois, não seria melhor primeiro entender sobre esses animais? Talvez essa tenha sido uma escolha imprudente por parte do professor. Essa, de não os fazer decorar termos e conceitos por ele também decorados. Essa, genuína, para não dizer ingênua, decisão de acreditar que mais importa criar neles a capacidade de refletir e obter conclusões a partir da sua própria observação do mundo. Num curto tempo, ensinar a aprender sobre o mundo com o próprio mundo.

Carlos não focou nos termos, mas conheceu uma doutrina que tenta buscar a razão e que se afasta de crenças e tradições para estudar e compreender a sociedade. Definir que sociedade se estuda com método e não com achismos. Muitos naquela classe podem não ter tido o mesmo sentimento de epifania e realização que ele teve. Talvez outra criança inspirada, assim como ele, tenha chegado em casa e finalmente perguntado para a mãe, por que manga com leite faz mal, se a manga é rica em vitaminas e nutrientes, e o leite fonte de carboidratos e proteínas. Talvez essa criança tenha cessado as perguntas quando ouviu um “por que sim” ou um “foi o que sua avó me ensinou”. Mas existe uma pequena possibilidade, de que na próxima vez que for enfrentar uma chuva, Carlos abra guarda-chuva ainda dentro de casa. Caso acabe quebrando um espelho, apenas irá a recolher os cacos e comprar um novo, sem se preocupar com o azar. Talvez ele não dê mais soquinhos na madeira. E talvez, goste de vitamina de manga com leite.

 

“Todos os bons intelectos têm repetido, desde o tempo de Bacon, que não pode haver qualquer conhecimento real senão aquele baseado em fatos observáveis.”

—  Auguste Comte, livro Curso de filosofia positiva

 

Evelly Alonso Lopes - 1º Direito Noturno

O mundo já esteve em ordem ?

 Para diversos pensadores, filósofos, sociólogos e analistas da contemporaneidade, a realidade atual em que vivemos é marcada por uma forte intolerância, desavenças, guerras, e um caos no geral, demonstrando na prática que apesar de vivermos o nosso auge na tecnologia, as relações humanas muito tem a mudar e evoluir, em um contexto em que se faz necessário o questionamento se estamos em um mundo fora de ordem, ou vivendo numa ordem fora do mundo.

Para responder a pergunta, é válido analisar o passado das relações humanas de que se tem registros históricos. Começando pela Roma antiga, que entre outras características ficou conhecida por sucessivos golpes de Estado, e era movida a base de guerras militares expansionistas e da mão de obra escravizada. Seguindo, a Idade Média, marcada pela banalização da vida humana, na qual ocorreram diversos casos de tortura, perseguição religiosa, golpes e guerras, ficando conhecida posteriormente como "Idade das Trevas". Um pouco adiante temos o Imperialismo, no qual países dominaram outras regiões, as exploraram, causaram danos irreversíveis as sociedades que já viviam nelas, e com o apoio de diversas outras nações. Adiante, temos as Guerras Mundiais, nas quais diversas atrocidades contra a vida foram cometidas, destacando o Nazismo e o Holocausto, seguidos, após as guerras, por uma onda terrorismos, como o atentado as torres gêmeas, entre outras crueldades ao longo de toda história da humanidade.

Portanto, após a analise, é evidente que a ordem em que uns vivem, é a desordem e o caos para outros, representando, no entanto, uma falta de ordem. Voltando a pergunta, nenhuma das opções se enquadra como resposta completamente verdadeira, sendo que de acordo com as analises, o Mundo nunca esteve plenamente em ordem ao longo da história humana.



Lucas Bessa Sanchez-Direito Noturno

As perspectivas da ordem na contemporaneidade

Vivemos em um período em que a humanidade enfrenta inúmeras crises, seja no âmbito político, econômico, ambiental ou social. Esse cenário nos provoca a refletir sobre a maneira como organizamos nossa sociedade e as consequências dela para o planeta e para o futuro. Essa reflexão pode ser vista de duas perspectivas: a de um mundo desorganizado, sem rumo e caótico, e a de uma ordem utópica, imposta sem levar em consideração as necessidades reais do ser humano e do meio ambiente. 

De um lado, é inegável que o mundo parece cada vez mais fora de ordem. A globalização e a revolução tecnológica, embora tenha aproximado as culturas e facilitado a comunicação, também intensificou desigualdades, provocou crises econômicas e ampliou o impacto ambiental. As mudanças climáticas, por exemplo, são um reflexo claro de uma desorganização crescente no uso dos recursos naturais. As queimadas, o desmatamento e a poluição se alastram pelo planeta, ameaçando a biodiversidade e colocando em risco os ecossistemas necessários para a manutenção da própria vida humana (o que é contraditório, já que os responsáveis pela destruição são os mais necessitados, a longo prazo). Além disso, assistimos a crises políticas em vários países, onde a extrema direita com seus ideais desumanos ganha força. Nesse cenário, o caos parece tomar conta do nosso cotidiano, com o sentimento de que as soluções para os problemas globais são cada vez mais difíceis de serem alcançadas. 

Por outro lado, há quem defenda que, na verdade, estamos vivendo uma "ordem fora de mundo". Ou seja, a maneira como a sociedade se organiza atualmente não condiz com as necessidades reais das pessoas e do planeta. A lógica capitalista, com seu foco no lucro e no consumo desenfreado, impõe uma ordem que ignora os limites ambientais e sociais. As grandes corporações, por exemplo, ditam as regras do mercado e, indiretamente, das dinâmicas sociais. A pressão por resultados imediatos, leva ao esgotamento dos recursos naturais e à exploração de mão de obra em condições sub-humanas. Esse tipo de "ordem" prejudica as relações humanas, criando uma sociedade individualista, desigual e desumana. 

Nesse contexto, é fundamental refletirmos sobre qual tipo de ordem estamos citando e buscando. Não podemos continuar ignorando os sinais de que a ordem atual está desajustada, mas também não podemos acreditar que a ausência de uma estrutura idealizada possa ser a solução. A verdadeira mudança não virá da imposição de uma ordem rígida sobre o caos, mas, precisa ser pautada na realidade vigente, que respeite os limites do ambientais, que promova a justiça social e que busque o bem-estar coletivo.  

Laís Alves de Queiroz. 1º Direito- Noturno.

Positivismo no Brasil - A ordem realmente levou ao progresso?

 Tirinha do estudante Yuri Chagas Gomes Maranha - 1º Direito Noturno 


O Mundo é uma Desordem.

 

Ao meu derredor tenho observado que algumas pessoas andam insatisfeitas por pensarem que o mundo em que vivem está uma desordem. No entanto, ouvindo isso, me questiono: “O que seria um mundo em ordem?”. Pensando que “colocar algo em ordem” possa ganhar o sentido de organizar, deixar agradável para todos, me atrevo a dizer que tal situação é uma utopia, pois sempre haverão grupos insatisfeitos com a realidade em que vivem. De mesmo modo, utilizando de um dos conceitos de Zygmunt Bauman “modernidade líquida”, temos que a realidade em um contexto geral é instável e está sempre sujeita a mudanças, sendo impossível manter uma “ordem” no mundo.

Portanto, o mundo, naturalmente, está e sempre estará em desordem. Entretanto, faz-se mister lembrar que a palavra “desordem” aparenta ser utilizada quando sentimos que nossos direitos estão sendo feridos, visto que o estabelecimento de direitos e deveres deveriam compor uma “ordem social”. Nesse caso, é importante que analisemos o que ou que situações ameaçam o pleno exercício de nossos direitos humanos para que possamos agir contra os causadores desse “desornamento”. Cita-se como um agente destrutivo para a ordem social as incessantes guerras por motivos econômicos, políticos e ideológicos, como o conflito entre Ucrânia e Rússia, no qual a população ucraniana é constantemente bombardeada por ataques promovidos pelo governo russo, causando um morticínio dos civis atacados e, consequentemente, ferindo o seu direito fundamental, o direito à vida.

Desse modo, concluo que o mundo sempre viverá uma desordem natural. Porém, devemos nos voltar para os responsáveis da desordem que é destrutiva para o meio social.

Mundo inabitável, Ordem inadmissível

 A sensação de colapso atravessa o debate público global. A intensificação de crises políticas, sociais e ambientais evidencia os limites da ordem internacional vigente. Esta reflexão parte da provocação: “estamos diante de um mundo fora de ordem ou de uma ordem que já não comporta mais nenhum mundo possível?” feita após a palestra promovida pelo movimento estudantil Afronte! a qual foi designada: Estamos no fim do mundo? Trump, Palestina, Ecossocialismo e Cotas trans.


 Através da análise de quatro eixos interligados — o avanço do trumpismo, a urgência ecossocialista, as ações afirmativas trans e a luta do povo palestino — busca-se compreender como tais fenômenos expressam não apenas crises setoriais, mas um colapso sistêmico. Proponho assim, uma leitura interseccional que aponta para a necessidade de ruptura e reinvenção.


O trumpismo como projeto global de desdemocratização


 O mandato de Donald Trump representou de 2017 a 2021 e voltou a representar em 2025 a consolidação de um projeto autoritário global, que ultrapassa o cenário estadunidense e inspira movimentos de extrema direita em diversas regiões. Ao assinalar em suas ordens executivas: “Pela autoridade investida em mim como Presidente pela Constituição dos Estados Unidos da América…” Trump traduziu, constitucionalizou e globalizou sua retórica racista, misógina, antidemocrática, xenofóbica e anticientífica, a transformando em políticas que atacam direitos civis, ambientais e sociais, ao mesmo tempo em que normalizam o uso da violência simbólica e institucional (BROWN, 2019; GIRARDET, 2021).


 Mais do que um sintoma, o trumpismo opera como modelo internacional de erosão democrática — deslegitimando instituições, desinformando deliberadamente a população e promovendo um imaginário político regressivo.


Ecossocialismo : A Primavera que o Capital Não Previu


 A emergência climática atual não pode ser dissociada da lógica capitalista de produção e consumo. Propostas como o capitalismo verde se revelam insuficientes frente à urgência ecológica, pois mantêm intacta a estrutura extrativista e excludente que produz a devastação ambiental (KLEIN, 2016).


 O ecossocialismo, nesse contexto, propõe uma transição radical: é necessário substituir a lógica do lucro pela da vida, garantindo soberania popular sobre os recursos naturais, justiça climática e revalorização dos saberes dos povos originários e tradicionais (LOWY, 2020).


Cotas trans como instrumento de justiça redistributiva e epistêmica


 A transfobia estrutural no Brasil e em outros países se manifesta em desigualdades profundas no acesso à educação, trabalho e cidadania. As ações afirmativas para pessoas trans, como as cotas em universidades e concursos, são respostas a esse apagamento histórico.

 Mais do que medidas compensatórias, as cotas trans desafiam a normatividade cisgênera institucional, propondo a transformação das estruturas que produzem desigualdade (BENTO, 2017). Elas operam tanto no plano redistributivo quanto no reconhecimento epistêmico de existências historicamente silenciadas.


Palestina: Entre o Direito Internacional, Indiferença Estrutural e Resistência


 A ocupação da Palestina pelo Estado de Israel constitui uma violação sistemática dos direitos humanos, configurando um regime de apartheid segundo organizações internacionais e pesquisadores/as (PAPPE, 2016;

BUTLER, 2020). A seletividade da comunidade internacional em relação à Palestina expõe a hipocrisia de uma ordem baseada em interesses geopolíticos e econômicos, e não em valores universais.

 A resistência palestina conecta-se, simbolicamente e politicamente, às lutas contra o colonialismo, o racismo e o imperialismo em escala global, sendo parte fundamental de uma cartografia planetária de emancipação (DAVIS, 2016).


Convergência das lutas como reinvenção do mundo


 Ecossocialismo, cotas trans, Palestina e resistência ao trumpismo não são agendas isoladas. Elas representam fissuras em um mesmo sistema de opressão e apontam para possibilidades de mundos alternativos.

 Em comum, essas lutas denunciam a necropolítica contemporânea

(MBEMBE, 2018) e reivindicam a centralidade da vida — humana e não humana - como horizonte político.

Convergir essas pautas não é apenas estratégia, mas imperativo ético. Em tempos de colapso, a solidariedade entre as lutas é a única forma possível de reconstrução. A única forma, assim como proposto pelo festival, de demonstrar que a vida ainda presta.


                              -Elisama S. Braga, 1º ano Direito Matutino.

Entre Números e Realidade: A Crítica ao Positivismo e suas Implicações nas Desigualdades Sociais

    Desde o século XIX, o positivismo se consolidou como uma das bases do pensamento moderno, ao defender a primazia da razão, da ciência e da ordem como fundamentos do progresso social. Essa filosofia, desenvolvida por pensadores como Auguste Comte, influenciou profundamente a forma como os Estados modernos se organizaram, especialmente no que se refere à administração pública e à formulação de políticas baseadas em dados objetivos. Contudo, ao desconsiderar aspectos subjetivos, históricos e culturais das populações, o positivismo ainda hoje colabora para a manutenção — e, por vezes, o agravamento — das desigualdades sociais em contextos políticos marcados por exclusões estruturais.

    A crítica ao positivismo parte do entendimento de que a realidade social não pode ser reduzida a números ou tratados como problemas meramente técnicos. A busca por uma suposta neutralidade e racionalidade absoluta frequentemente ignora as subjetividades, os afetos, as identidades e as condições históricas que moldam a vida de grupos sociais marginalizados. Nas políticas públicas atuais, isso se reflete, por exemplo, em programas que visam apenas a eficiência administrativa ou o equilíbrio fiscal, sem considerar os impactos humanos e sociais dessas medidas sobre populações vulneráveis.

    Um exemplo claro disso é a maneira como muitos governos tratam a pobreza e a desigualdade de renda. Ao se basearem exclusivamente em indicadores macroeconômicos, como o PIB ou o índice de produtividade, sem analisar as realidades vividas nas periferias e comunidades marginalizadas, tais políticas fracassam em promover justiça social. No Brasil, por exemplo, cortes em programas sociais, como o Bolsa Família, ou na verba destinada à saúde e à educação pública, são frequentemente justificados com argumentos técnicos e econômicos. No entanto, essa racionalidade positivista desconsidera os efeitos dessas decisões na vida de milhões de pessoas que dependem desses serviços para viver com dignidade.

    Além disso, o positivismo contribui para um modelo de Estado tecnocrático, que afasta o cidadão comum do processo decisório e deslegitima saberes populares e experiências subjetivas. Essa lógica reforça desigualdades epistêmicas: ou seja, apenas o saber técnico é valorizado, enquanto as vozes dos movimentos sociais, dos povos tradicionais, das mulheres negras, da população LGBTQIA+ e de outros grupos historicamente excluídos são ignoradas ou tratadas como “não científicas”. Assim, a promessa de “ordem e progresso” — lema positivista estampado na bandeira brasileira — não se realiza para todos, mas apenas para uma parcela da população privilegiada.

    O combate às desigualdades sociais exige uma abordagem que una dados objetivos com escuta ativa, participação popular e reconhecimento da diversidade de experiências humanas. Valorizar os saberes plurais, promover políticas sensíveis às realidades locais e garantir espaços democráticos de construção coletiva são caminhos para superar os limites de uma visão positivista.


Geisa Vitória Monteiro Pereira, 1º Ano - Direito (Noturno)

Racionalidade em Excesso, Liberdade em Falta

O positivismo, corrente filosófica do século XIX, surgiu no contexto da Revolução Industrial e do Iluminismo com a intenção de identificar os diversos problemas sociais presentes por meio de um conhecimento baseado em fatos e dados verificáveis, excluindo explicações metafísicas ou religiosas. Nesse cenário, o positivismo influenciou diversas áreas do saber, como a sociologia, a educação, o direito e, especialmente, o entendimento sobre o comportamento desviante, incluindo a criminalidade.


Para Comte, a humanidade evolui em três estágios: o teológico, o metafísico e o positivo, no qual a razão e a ciência substituem crenças sobrenaturais na explicação da realidade. A criminalidade, nesse último estágio, passa a ser compreendida não mais como um pecado ou uma falha moral, mas como consequência de fatores sociais ou biológicos, que podem ser analisados e tratados. Essa visão influenciou diretamente o surgimento da sociologia e da criminologia modernas, propondo que a organização social deve se basear na ordem, no progresso e na racionalidade.


Essa tentativa de controlar o comportamento desviante com base na ciência e na razão também é explorada de forma crítica no filme Laranja Mecânica, dirigido por Stanley Kubrick. Na trama, o jovem delinquente Alex é submetido a um tratamento experimental chamado “método Ludovico”, que visa reprimir seu impulso violento por meio de condicionamento psicológico. A proposta é reabilitá-lo com técnicas científicas, eliminando sua capacidade de escolha moral. Essa abordagem reflete uma visão positivista extrema, que enxerga a criminalidade como algo a ser corrigido tecnicamente, desconsiderando a subjetividade e a complexidade do indivíduo. Ao transformar o protagonista em alguém incapaz de exercer sua liberdade, o filme questiona até que ponto a ciência pode ser usada para moldar o comportamento humano sem violar princípios éticos fundamentais. A pergunta que emerge, então, é: estaríamos diante de uma ordem fora do mundo, artificial e desumana, ou de um mundo fora de ordem, onde o controle total se impõe como solução? Essa dualidade revela os limites e as contradições do uso da racionalidade para controlar o desvio social.


Portanto, embora o positivismo tenha contribuído para o entendimento racional da criminalidade, sua aplicação rígida pode levar a práticas desumanas e autoritárias. O filme Laranja Mecânica evidencia esse risco ao mostrar os efeitos de um controle social baseado exclusivamente na técnica. Assim, frente à tensão entre uma ordem imposta e a complexidade do real, é necessário equilibrar ciência e ética ao lidar com comportamentos desviantes, reconhecendo que nenhuma sociedade se sustenta apenas na lógica da dominação racional.


Jessyca Pacheco Almeida - direito matutino 

ENTRE RATOS E HOMENS: A BUSCA POR DIGNIDADE EM UM SISTEMA DESIGUAL

 

A obra “ Os Ratos”, de Dionélio Machado, retrata a modesta odisseia vivenciada pelo personagem Naziazeno Barbosa que, ao adquirir uma dívida de 53 mil réis com o leiteiro, encontra-se perdido em um mundo hostil. Dessa forma, o autor ao evidenciar a figura do “pobre diabo” através de Naziazeno, demonstra a intensa alienação social que permeia a realidade do protagonista e, a qual reforça a dominação de classes imposta pelo capitalismo. Entretanto, nota-se que, na contemporaneidade, há diversos fatores que vão de encontro a ordem preconizada pela mentalidade capitalista, instaurando, assim, uma nova perspectiva social.

Em primeiro plano, é fulcral destacar que o “modus operandis” do sistema capitalista impede a consolidação de uma sociedade coesa. Nesse contexto, um dos princípios que justificam tal atribuição cedida ao capitalismo é sua capacidade de implementar uma significativa concentração de renda na estrutura do corpo social , dessa forma uma minoria ao deter o poder econômico, tende a priorizar o “EU” em detrimento da coletividade, ignorando, assim, o cenário de miséria e exclusão enfrentado por amplos segmentos da população, postura essa que compromete o desenvolvimento de uma mentalidade revolucionária e auxilia na perpetuação do status quo vigente.

Perante os fatos apresentados, é perceptível que a luta dos movimentos sociais pela consolidação de um Estado de Direito pleno, encontra-se fora da ordem estabelecida pelo sistema, já que incita a formação de uma realidade paralela. Em outras palavras, esses movimentos ao agirem como atores fundamentais para efetivação de uma sociedade justa e igualitária, incentivam a elaboração de dispositivos de proteção mais abrangentes, constituindo-se, dessa forma, como resistência ativa às contradições e falhas do capitalismo.

Infere-se, pois, que o Estado de Direito é mais que uma formalidade jurídica, trata-se de uma condição indispensável para garantia da justiça, liberdade e convivência democrática entre os indivíduos, sendo necessário para consolidação efetiva desses princípios o esforço coletivo e a vigilância permanente, para que, assim, a sociedade contemporânea afaste-se da realidade descrita pela obra “ Os Ratos”.

LIVIA POCOBELLO ZACARITTO, 1º SEMESTRE, DIREITO MATUTINO 

Um mundo fora de ordem ou apenas a desordem capitalista?

O título "Um mundo fora de ordem ou uma ordem fora de mundo?" do evento promovido pelo “Afronte!” convida à reflexão sobre as disfunções contemporâneas, questionando se o caos atual é uma consequência de um mundo desajustado ou se é a própria ordem imposta que não corresponde às reais necessidades do planeta e de seus habitantes. A partir de temas como a ascensão do populismo, as crises ambientais, o conflito entre Israel e Palestina e a luta por direitos das pessoas trans, é possível perceber que as instituições e estruturas que regem o mundo contemporâneo estão em desacordo com os princípios de justiça social, igualdade e sustentabilidade. Dessa forma, torna-se urgente repensar a ordem estabelecida, que muitas vezes promove desigualdades e destruição, em vez de garantir o bem-estar coletivo.

A ascensão de líderes populistas, como Donald Trump, ilustra a desordem política contemporânea, onde políticas como a retirada dos EUA do Acordo de Paris evidenciam a negligência dos acordos internacionais e do meio ambiente. O nacionalismo e a rejeição da ciência ambiental revelam uma crise na ordem política, motivada por um capitalismo neoliberal que prioriza lucros em detrimento da sustentabilidade. Essa crise ambiental é parte de uma falha estrutural na economia global, com a exploração insustentável dos recursos naturais e o aumento das desigualdades sociais. Assim, o desprezo pelos limites ecológicos agrava problemas como aquecimento global e escassez de água, refletindo um modelo econômico insustentável e distante das necessidades reais da sociedade.

A questão geopolítica também revela a incoerência de uma ordem mundial que ignora os direitos humanos e perpetua conflitos. O caso da Palestina é um exemplo de como a comunidade internacional tem falhado em buscar uma solução justa para as disputas territoriais, permitindo que a ocupação de territórios e a violação de direitos básicos se perpetuem ao longo dos anos. A falta de uma resolução definitiva para o conflito entre Israel e Palestina demonstra como a ordem política internacional frequentemente ignora as demandas por paz e justiça, priorizando interesses estratégicos e geopolíticos que pouco consideram as vítimas desse conflito.

No mais, a luta por direitos das pessoas trans, por meio de políticas como as cotas, também reflete um sistema social desajustado, porque, embora as cotas busquem corrigir desigualdades históricas, elas ainda enfrentam resistência de setores que preferem manter a ordem existente, que marginaliza a diversidade e perpetua a discriminação.

Em suma, o mundo vive uma crise multifacetada, onde a ordem estabelecida não responde às necessidades urgentes do presente. Se a "ordem" que temos é insustentável, discriminatória e destrutiva, seria está de fato uma ordem ou apenas a desordem mascarada? Em vez de um sistema que favorece poucos e prejudica muitos, é preciso buscar uma nova ordem, mais inclusiva, justa e sustentável, capaz de restabelecer o equilíbrio entre as pessoas e o planeta. A desordem que vemos é, portanto, um reflexo de uma ordem que precisa ser urgentemente reavaliada e transformada.


Anna Lívia Izidoro Ferreira, 1° Direito Matutino

A desordem mundial e ordem religiosa

 A polarização ideológica do mundo é um dos principais fatos da contemporaneidade, seja em âmbito político, quanto no religioso, a causa disso é a atual situação geopolítica e social do planeta, com guerras e conflitos acontecendo e crises econômicas, ambientais e sociais por todos os lados, essa desordem mundial fortalece grupos fundamentalistas, uma vez que em momentos de instabilidade, os seres humanos se tornam mais vulneráveis a esses domínios.

Notamos isso ao analisarmos a história: Com o fim do Império Romano do Ocidente, o início da Idade Média e consequentemente o surgimento do feudalismo, a Europa se encontrava dividida politicamente e territorialmente em diversos feudos, controlados por senhores feudais. Essa separação política e territorial foi contida pela unidade de poder religioso exercido pela Igreja Católica, que nesse momento de “crise política” e guerras, conseguiu a conversão de diversos fiéis devido a vulnerabilidade social das pessoas da época, o que garantiu a expansão da fé católica e a garantia dos interesses das autoridades religiosas. Esse aproveitamento da Igreja para instaurar sua supremacia na Europa só foi possível graças a vulnerabilidade que o a sociedade europeia estava, em um periodo de incertezas e inseguranças, o surgimento de uma força capaz de conter e proteger o povo ganha força e consegue instaurar sua soberania.

Tendo isso em mente, notamos que com a desordem no mundo físico, recorremos a ordens extraterrenas, espirituais, através da religião; Notando que não temos controle da situação, recorremos a deuses e santidades na esperança de encontrar um propósito e uma razão para tudo. É nesse sentido que Gabriel O Pensador canta: “Astronauta, tá sentindo falta da Terra? Que falta que essa Terra te faz? A gente aqui embaixo continua em guerra, olhando aí pra lua implorando por paz” Nesse caso, o ato de olhar para a lua e implorar por paz, remete justamente a ação de recorrer ao sagrado nos momentos de tensão.

Sendo assim, podemos concluir que o mundo está sim fora de ordem, o que consequentemente faz com que a ordem fora do mundo ganhe força, essa ordem sendo de caráter religioso e sagrado, isso é justificado pela natureza do ser humano de recorrer ao divino em momentos de instabilidade e tensão,  características essas que se enquadram exatamente no atual contexto mundial.


Entre Darwinismo e Desigualdade: A Crítica de Machado de Assis à Ordem Natural da Sociedade

    Machado de Assis em sua obra “Quincas Borba” elabora uma pseudoteoria intitulada Humanitismo, em que consiste em uma paródia sobre o Darwinismo Social. Sua crítica parte do princípio da popularização de teorias científicas do século XIX, que, junto à Segunda Revolução Industrial e a corrida imperialista por recursos na África e na Ásia, ofereceu instrumentos para as potências da época colonizarem povos, usando como justificativa bases eugenistas. O autor demonstra durante a ascensão e decadência de Rubião, personagem principal, a concretização de sua tese, em que expõe a brutalidade de uma sociedade predatória pelo dinheiro e para ocupar papéis sociais de notoriedade, naturalizando desigualdades e legitimando privilégios, afinal, para a população daquele tempo, existia uma ordem natural para se entender a sociedade, e segui-la era o objetivo para se atingir o progresso. 

    Nesse sentido, o positivismo negligencia as dimensões subjetivas e culturais da experiência humana, como a moral, a religião e a arte ao focar em fatos observáveis, deixando de lado aspectos importantes da vida social. Além disso a teoria se afasta da realidade ao elaborar teses deterministas e uma visão linear da história da sociedade, ignorando a imprevisibilidade e complexidade dos eventos históricos bem como retrocessos e crises. Casos como o que vivemos no governo de Jair Messias Bolsonaro exemplificam a predominância desse pensamento quando o ex ministro da economia Paulo Guedes comentou a vantagem da alto no valor do dólar, uma vez que “empregadas domésticas estavam indo muito para a Disney”. Esse tipo de discurso é reproduzido por instâncias de poder já que não veem problemas em usar lógicas discriminatórias para excluir pessoas de seus direitos e dignidades, como a possibilidade de ter um espaço de lazer e diversão, usando para isso a justificativa de elas não pertencerem naturalmente a esses espaços. 

    Assim, a corrente sociológica discutida encontra dificuldade em explicar a individualidade humana e a realidade social. Ela retrocede nosso pensamento e desenvolvimento como seres humanos justamente por não seguirmos uma ordem natural. Construímos e transformamos a sociedade que vivemos com nosso esclarecimento e experiências, não nos devendo limitar por simples regras naturais, já que a experiência humana é pautada na subjetividade que não pode ser captada totalmente por métodos objetivos.

Sophia Rossato Ferro, 1º Ano - Direito (Noturno)

Ordem e Regresso (Positivismo)



Nome: Júlia Aguiar Silva, 1º ano - Direito (Noturno)






Cotas Raciais e o Positivismo: Quando a Ordem se Torna um Obstáculo ao Progresso

𝐃𝐮𝐫𝐚𝐧𝐭𝐞 𝐚𝐧𝐨𝐬, 𝐭𝐨𝐝𝐚 𝐯𝐞𝐳 𝐪𝐮𝐞 𝐨 𝐚𝐬𝐬𝐮𝐧𝐭𝐨 “𝐜𝐨𝐭𝐚𝐬 𝐫𝐚𝐜𝐢𝐚𝐢𝐬” 𝐞𝐧𝐭𝐫𝐚 𝐞𝐦 𝐩𝐚𝐮𝐭𝐚 𝐧𝐨 𝐁𝐫𝐚𝐬𝐢𝐥, 𝐬𝐮𝐫𝐠𝐞 𝐮𝐦 𝐯𝐞𝐥𝐡𝐨 𝐝𝐢𝐬𝐜𝐮𝐫𝐬𝐨 — 𝐚𝐪𝐮𝐞𝐥𝐞 𝐪𝐮𝐞 𝐟𝐚𝐥𝐚 𝐞𝐦 “𝐦𝐞𝐫𝐢𝐭𝐨𝐜𝐫𝐚𝐜𝐢𝐚”, 𝐞𝐦 “𝐜𝐢ê𝐧𝐜𝐢𝐚”, 𝐞𝐦 “𝐧𝐞𝐮𝐭𝐫𝐚𝐥𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞”. 𝐄𝐬𝐬𝐞𝐬 𝐭𝐞𝐫𝐦𝐨𝐬 𝐯ê𝐦 𝐜𝐚𝐫𝐫𝐞𝐠𝐚𝐝𝐨𝐬 𝐝𝐞 𝐮𝐦𝐚 𝐚𝐮𝐭𝐨𝐫𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞 𝐪𝐮𝐚𝐬𝐞 𝐫𝐞𝐥𝐢𝐠𝐢𝐨𝐬𝐚, 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐬𝐞 𝐟𝐨𝐬𝐬𝐞𝐦 𝐯𝐞𝐫𝐝𝐚𝐝𝐞𝐬 𝐚𝐛𝐬𝐨𝐥𝐮𝐭𝐚𝐬, 𝐢𝐦𝐮𝐧𝐞𝐬 𝐚𝐨 𝐭𝐞𝐦𝐩𝐨 𝐞 à 𝐜𝐫í𝐭𝐢𝐜𝐚. 𝐌𝐚𝐬 𝐬𝐞𝐫á 𝐪𝐮𝐞 𝐣á 𝐩𝐚𝐫𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐩𝐫𝐚 𝐩𝐞𝐧𝐬𝐚𝐫 𝐝𝐞 𝐨𝐧𝐝𝐞 𝐯𝐞𝐦 𝐞𝐬𝐬𝐚 𝐟𝐨𝐫𝐦𝐚 𝐝𝐞 𝐯𝐞𝐫 𝐨 𝐦𝐮𝐧𝐝𝐨? 𝐄 𝐦𝐚𝐢𝐬 𝐢𝐦𝐩𝐨𝐫𝐭𝐚𝐧𝐭𝐞: 𝐪𝐮𝐞𝐦 𝐬𝐞 𝐛𝐞𝐧𝐞𝐟𝐢𝐜𝐢𝐚 𝐝𝐞𝐥𝐚?

𝐄𝐬𝐬𝐞 𝐦𝐨𝐝𝐨 𝐝𝐞 𝐩𝐞𝐧𝐬𝐚𝐫 𝐭𝐞𝐦 𝐫𝐚í𝐳𝐞𝐬 𝐥á 𝐧𝐨 𝐬é𝐜𝐮𝐥𝐨 𝐗𝐈𝐗, 𝐜𝐨𝐦 𝐀𝐮𝐠𝐮𝐬𝐭𝐞 𝐂𝐨𝐦𝐭𝐞, 𝐨 𝐩𝐚𝐢 𝐝𝐨 𝐏𝐨𝐬𝐢𝐭𝐢𝐯𝐢𝐬𝐦𝐨. 𝐄𝐥𝐞 𝐚𝐜𝐫𝐞𝐝𝐢𝐭𝐚𝐯𝐚 𝐪𝐮𝐞 𝐚 𝐬𝐨𝐜𝐢𝐞𝐝𝐚𝐝𝐞 𝐩𝐨𝐝𝐞𝐫𝐢𝐚 𝐬𝐞𝐫 𝐞𝐧𝐭𝐞𝐧𝐝𝐢𝐝𝐚 𝐞 𝐨𝐫𝐠𝐚𝐧𝐢𝐳𝐚𝐝𝐚 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐮𝐦𝐚 𝐦á𝐪𝐮𝐢𝐧𝐚, 𝐨𝐧𝐝𝐞 𝐭𝐮𝐝𝐨 𝐟𝐮𝐧𝐜𝐢𝐨𝐧𝐚𝐫𝐢𝐚 𝐬𝐞𝐠𝐮𝐧𝐝𝐨 𝐥𝐞𝐢𝐬 𝐟𝐢𝐱𝐚𝐬, 𝐩𝐫𝐞𝐯𝐢𝐬í𝐯𝐞𝐢𝐬 — 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐧𝐚 𝐅í𝐬𝐢𝐜𝐚. 𝐀 𝐩𝐫𝐨𝐩𝐨𝐬𝐭𝐚 𝐞𝐫𝐚 𝐮𝐬𝐚𝐫 𝐚 𝐥ó𝐠𝐢𝐜𝐚 𝐝𝐚𝐬 𝐜𝐢ê𝐧𝐜𝐢𝐚𝐬 𝐧𝐚𝐭𝐮𝐫𝐚𝐢𝐬 𝐩𝐫𝐚 𝐞𝐧𝐭𝐞𝐧𝐝𝐞𝐫 𝐨𝐬 𝐬𝐞𝐫𝐞𝐬 𝐡𝐮𝐦𝐚𝐧𝐨𝐬, 𝐚𝐜𝐫𝐞𝐝𝐢𝐭𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐢𝐬𝐬𝐨 𝐭𝐫𝐚𝐫𝐢𝐚 𝐨𝐫𝐝𝐞𝐦 𝐞 𝐩𝐫𝐨𝐠𝐫𝐞𝐬𝐬𝐨. 𝐌𝐚𝐬 𝐧ã𝐨 𝐪𝐮𝐚𝐥𝐪𝐮𝐞𝐫 𝐨𝐫𝐝𝐞𝐦, 𝐧𝐞𝐦 𝐪𝐮𝐚𝐥𝐪𝐮𝐞𝐫 𝐩𝐫𝐨𝐠𝐫𝐞𝐬𝐬𝐨. 𝐀 𝐨𝐫𝐝𝐞𝐦 𝐝𝐞 𝐂𝐨𝐦𝐭𝐞 𝐞𝐫𝐚 𝐮𝐦𝐚 𝐬ó, 𝐞 𝐬𝐞𝐦𝐩𝐫𝐞 𝐭𝐞𝐯𝐞 𝐞𝐧𝐝𝐞𝐫𝐞ç𝐨 𝐜𝐞𝐫𝐭𝐨.

 E𝐬𝐬𝐚 𝐭𝐚𝐥 “𝐧𝐞𝐮𝐭𝐫𝐚𝐥𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞” 𝐜𝐢𝐞𝐧𝐭í𝐟𝐢𝐜𝐚 𝐪𝐮𝐚𝐬𝐞 𝐬𝐞𝐦𝐩𝐫𝐞 𝐞𝐱𝐜𝐥𝐮𝐢𝐮 — 𝐞 𝐚𝐢𝐧𝐝𝐚 𝐞𝐱𝐜𝐥𝐮𝐢 — 𝐪𝐮𝐞𝐦 𝐟𝐨𝐠𝐞 𝐝𝐨 𝐩𝐚𝐝𝐫ã𝐨 𝐛𝐫𝐚𝐧𝐜𝐨, 𝐜𝐢𝐬, 𝐡é𝐭𝐞𝐫𝐨 𝐞 𝐝𝐞 𝐜𝐥𝐚𝐬𝐬𝐞 𝐦é𝐝𝐢𝐚. 𝐎𝐮 𝐬𝐞𝐣𝐚, 𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐬𝐞 𝐯𝐞𝐧𝐝𝐞 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐢𝐦𝐩𝐚𝐫𝐜𝐢𝐚𝐥𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞 é, 𝐧𝐚 𝐩𝐫á𝐭𝐢𝐜𝐚, 𝐮𝐦𝐚 𝐟𝐨𝐫𝐦𝐚 𝐝𝐞 𝐦𝐚𝐧𝐭𝐞𝐫 𝐨 𝐬𝐭𝐚𝐭𝐮𝐬 𝐪𝐮o. 𝐐𝐮𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐚 𝐜𝐢ê𝐧𝐜𝐢𝐚 𝐭𝐫𝐚𝐭𝐚 𝐚𝐬 𝐝𝐞𝐬𝐢𝐠𝐮𝐚𝐥𝐝𝐚𝐝𝐞𝐬 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐚𝐥𝐠𝐨 𝐧𝐚𝐭𝐮𝐫𝐚𝐥 𝐨𝐮 𝐛𝐢𝐨𝐥ó𝐠𝐢𝐜𝐨, 𝐞𝐥𝐚 𝐟𝐞𝐜𝐡𝐚 𝐨𝐬 𝐨𝐥𝐡𝐨𝐬 𝐩𝐚𝐫𝐚 𝐚 𝐫𝐞𝐚𝐥𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞 𝐬𝐨𝐜𝐢𝐚𝐥, 𝐡𝐢𝐬𝐭ó𝐫𝐢𝐜𝐚 𝐞 𝐩𝐨𝐥í𝐭𝐢𝐜𝐚 𝐪𝐮𝐞 𝐫𝐞𝐚𝐥𝐦𝐞𝐧𝐭𝐞 𝐦𝐨𝐥𝐝𝐚 𝐚𝐬 𝐨𝐩𝐨𝐫𝐭𝐮𝐧𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞𝐬 𝐝𝐚𝐬 𝐩𝐞𝐬𝐬𝐨𝐚𝐬.

É 𝐩𝐨𝐫 𝐢𝐬𝐬𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐚𝐬 𝐜𝐨𝐭𝐚𝐬 𝐫𝐚𝐜𝐢𝐚𝐢𝐬 𝐢𝐧𝐜𝐨𝐦𝐨𝐝𝐚𝐦 𝐭𝐚𝐧𝐭𝐨 𝐜𝐞𝐫𝐭𝐨𝐬 𝐬𝐞𝐭𝐨𝐫𝐞𝐬. 𝐄𝐥𝐚𝐬 𝐧ã𝐨 𝐭𝐞𝐧𝐭𝐚𝐦 𝐚𝐝𝐚𝐩𝐭𝐚𝐫 𝐨𝐬 𝐬𝐮𝐣𝐞𝐢𝐭𝐨𝐬 à 𝐥ó𝐠𝐢𝐜𝐚 𝐝𝐚 𝐦á𝐪𝐮𝐢𝐧𝐚 𝐬𝐨𝐜𝐢𝐚𝐥; 𝐞𝐥𝐚𝐬 𝐪𝐮𝐞𝐬𝐭𝐢𝐨𝐧𝐚𝐦 𝐨 𝐩𝐫ó𝐩𝐫𝐢𝐨 𝐟𝐮𝐧𝐜𝐢𝐨𝐧𝐚𝐦𝐞𝐧𝐭𝐨 𝐝𝐞𝐬𝐬𝐚 𝐦á𝐪𝐮𝐢𝐧𝐚. 𝐀𝐨 𝐫𝐞𝐜𝐨𝐧𝐡𝐞𝐜𝐞𝐫 𝐪𝐮𝐞 𝐧𝐞𝐦 𝐭𝐨𝐝𝐨 𝐦𝐮𝐧𝐝𝐨 𝐩𝐚𝐫𝐭𝐞 𝐝𝐨 𝐦𝐞𝐬𝐦𝐨 𝐥𝐮𝐠𝐚𝐫, 𝐚𝐬 𝐜𝐨𝐭𝐚𝐬 𝐩𝐫𝐨𝐩õ𝐞𝐦 𝐮𝐦𝐚 𝐫𝐞𝐩𝐚𝐫𝐚çã𝐨. 𝐄, 𝐩𝐚𝐫𝐚 𝐪𝐮𝐞𝐦 𝐬𝐞𝐦𝐩𝐫𝐞 𝐬𝐞 𝐛𝐞𝐧𝐞𝐟𝐢𝐜𝐢𝐨𝐮 𝐝𝐚 𝐟𝐚𝐥𝐬𝐚 𝐢𝐝𝐞𝐢𝐚 𝐝𝐞 𝐪𝐮𝐞 𝐨 𝐦é𝐫𝐢𝐭𝐨 é 𝐩𝐮𝐫𝐚𝐦𝐞𝐧𝐭𝐞 𝐢𝐧𝐝𝐢𝐯𝐢𝐝𝐮𝐚𝐥, 𝐢𝐬𝐬𝐨 𝐬𝐨𝐚 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐚𝐦𝐞𝐚ç𝐚.

𝐌𝐚𝐬 𝐬𝐞𝐣𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐬𝐢𝐧𝐜𝐞𝐫𝐨𝐬: 𝐨 𝐩𝐫𝐨𝐛𝐥𝐞𝐦𝐚 𝐧𝐮𝐧𝐜𝐚 𝐟𝐨𝐢 𝐚 𝐪𝐮𝐞𝐛𝐫𝐚 𝐝𝐚 “𝐨𝐫𝐝𝐞𝐦”, 𝐞 𝐬𝐢𝐦 𝐨 𝐦𝐞𝐝𝐨 𝐝𝐞 𝐯𝐞𝐫 𝐚 𝐮𝐧𝐢𝐯𝐞𝐫𝐬𝐢𝐝𝐚𝐝𝐞 𝐨𝐜𝐮𝐩𝐚𝐝𝐚 𝐩𝐨𝐫 𝐯𝐨𝐳𝐞𝐬 𝐡𝐢𝐬𝐭𝐨𝐫𝐢𝐜𝐚𝐦𝐞𝐧𝐭𝐞 𝐬𝐢𝐥𝐞𝐧𝐜𝐢𝐚𝐝𝐚𝐬. 𝐍ã𝐨 𝐬𝐞 𝐭𝐫𝐚𝐭𝐚 𝐝𝐞 𝐢𝐧𝐣𝐮𝐬𝐭𝐢ç𝐚, 𝐦𝐚𝐬 𝐝𝐚 𝐝𝐞𝐬𝐜𝐨𝐧𝐬𝐭𝐫𝐮çã𝐨 𝐝𝐞 𝐮𝐦 𝐞𝐬𝐩𝐚ç𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐩𝐨𝐫 𝐦𝐮𝐢𝐭𝐨 𝐭𝐞𝐦𝐩𝐨 𝐟𝐨𝐢 𝐫𝐞𝐬𝐞𝐫𝐯𝐚𝐝𝐨 𝐚 𝐩𝐨𝐮𝐜𝐨𝐬. 𝐀 𝐫𝐞𝐬𝐢𝐬𝐭ê𝐧𝐜𝐢𝐚 à𝐬 𝐜𝐨𝐭𝐚𝐬 𝐧ã𝐨 é 𝐬𝐨𝐛𝐫𝐞 𝐜𝐢ê𝐧𝐜𝐢𝐚 — é 𝐬𝐨𝐛𝐫𝐞 𝐩𝐨𝐝𝐞𝐫.

𝐒𝐞 𝐨 𝐜𝐨𝐧𝐡𝐞𝐜𝐢𝐦𝐞𝐧𝐭𝐨 é 𝐩𝐫𝐨𝐝𝐮𝐳𝐢𝐝𝐨 𝐝𝐞𝐧𝐭𝐫𝐨 𝐝𝐞 𝐜𝐨𝐧𝐭𝐞𝐱𝐭𝐨𝐬 𝐬𝐨𝐜𝐢𝐚𝐢𝐬 𝐞 𝐡𝐢𝐬𝐭ó𝐫𝐢𝐜𝐨𝐬, 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐧𝐞𝐠𝐚𝐫 𝐪𝐮𝐞 𝐞𝐥𝐞 𝐭𝐚𝐦𝐛é𝐦 é 𝐚𝐭𝐫𝐚𝐯𝐞𝐬𝐬𝐚𝐝𝐨 𝐩𝐨𝐫 𝐝𝐢𝐬𝐩𝐮𝐭𝐚𝐬? 𝐐𝐮𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐟𝐚𝐥𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐞𝐦 𝐢𝐧𝐜𝐥𝐮𝐬ã𝐨 𝐧𝐨 𝐞𝐧𝐬𝐢𝐧𝐨 𝐬𝐮𝐩𝐞𝐫𝐢𝐨𝐫, 𝐧ã𝐨 𝐞𝐬𝐭𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐚𝐭𝐚𝐜𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐨 𝐦é𝐫𝐢𝐭𝐨. 𝐄𝐬𝐭𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐫𝐞𝐜𝐨𝐧𝐡𝐞𝐜𝐞𝐧𝐝𝐨 𝐪𝐮𝐞 𝐞𝐥𝐞, 𝐬𝐨𝐳𝐢𝐧𝐡𝐨, 𝐧ã𝐨 𝐛𝐚𝐬𝐭𝐚 𝐪𝐮𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐞𝐱𝐢𝐬𝐭𝐞 𝐮𝐦𝐚 𝐡𝐞𝐫𝐚𝐧ç𝐚 𝐝𝐞 𝐝𝐞𝐬𝐢𝐠𝐮𝐚𝐥𝐝𝐚𝐝𝐞 𝐭ã𝐨 𝐩𝐫𝐨𝐟𝐮𝐧𝐝𝐚 𝐧𝐨 𝐩𝐚í𝐬.

𝐍𝐚 á𝐫𝐞𝐚 𝐝𝐨 𝐃𝐢𝐫𝐞𝐢𝐭𝐨, 𝐢𝐬𝐬𝐨 é 𝐚𝐢𝐧𝐝𝐚 𝐦𝐚𝐢𝐬 𝐯𝐢𝐬í𝐯𝐞𝐥. 𝐀𝐬 𝐧𝐨𝐫𝐦𝐚𝐬, 𝐚𝐬 𝐥𝐞𝐢𝐬, 𝐚𝐬 𝐝𝐨𝐮𝐭𝐫𝐢𝐧𝐚𝐬 — 𝐧𝐚𝐝𝐚 𝐝𝐢𝐬𝐬𝐨 𝐧𝐚𝐬𝐜𝐞 𝐝𝐨 𝐧𝐚𝐝𝐚. 𝐓𝐮𝐝𝐨 é 𝐟𝐫𝐮𝐭𝐨 𝐝𝐞 𝐮𝐦𝐚 𝐜𝐨𝐧𝐬𝐭𝐫𝐮çã𝐨 𝐡𝐢𝐬𝐭ó𝐫𝐢𝐜𝐚. 𝐄 𝐬𝐞 𝐨 𝐃𝐢𝐫𝐞𝐢𝐭𝐨 𝐭𝐞𝐦 𝐜𝐨𝐦𝐨 𝐦𝐢𝐬𝐬ã𝐨 𝐩𝐫𝐨𝐦𝐨𝐯𝐞𝐫 𝐣𝐮𝐬𝐭𝐢ç𝐚, 𝐞𝐧𝐭ã𝐨 é 𝐩𝐫𝐞𝐜𝐢𝐬𝐨 𝐪𝐮𝐞𝐬𝐭𝐢𝐨𝐧𝐚𝐫 𝐪𝐮𝐞 𝐭𝐢𝐩𝐨 𝐝𝐞 𝐣𝐮𝐬𝐭𝐢ç𝐚 𝐞𝐬𝐭𝐚𝐦𝐨𝐬 𝐛𝐮𝐬𝐜𝐚𝐧𝐝𝐨: 𝐮𝐦𝐚 𝐪𝐮𝐞 𝐚𝐩𝐞𝐧𝐚𝐬 𝐦𝐚𝐧𝐭é𝐦 𝐚𝐬 𝐞𝐬𝐭𝐫𝐮𝐭𝐮𝐫𝐚𝐬, 𝐨𝐮 𝐮𝐦𝐚 𝐪𝐮𝐞 𝐫𝐨𝐦𝐩𝐞 𝐜𝐨𝐦 𝐞𝐥𝐚𝐬 𝐩𝐚𝐫𝐚 𝐢𝐧𝐜𝐥𝐮𝐢𝐫 𝐪𝐮𝐞𝐦 𝐬𝐞𝐦𝐩𝐫𝐞 𝐟𝐢𝐜𝐨𝐮 𝐝𝐞 𝐟𝐨𝐫𝐚?

𝐓𝐚𝐥𝐯𝐞𝐳 𝐬𝐞𝐣𝐚 𝐡𝐨𝐫𝐚 𝐝𝐞 𝐩𝐚𝐫𝐚𝐫 𝐝𝐞 𝐭𝐞𝐦𝐞𝐫 𝐚 𝐫𝐮𝐩𝐭𝐮𝐫𝐚. À𝐬 𝐯𝐞𝐳𝐞𝐬, 𝐬ó é 𝐩𝐨𝐬𝐬í𝐯𝐞𝐥 𝐚𝐯𝐚𝐧ç𝐚𝐫 𝐪𝐮𝐚𝐧𝐝𝐨 𝐚 𝐨𝐫𝐝𝐞𝐦 é, 𝐞𝐧𝐟𝐢𝐦, 𝐝𝐞𝐬𝐚𝐟𝐢𝐚𝐝𝐚.

O retorno em massa dos ideais positivistas

O positivismo, ideal desenvolvido pelo filósofo Auguste Comte no século XIX, é uma corrente filosófica e sociológica que defende a primazia da ciência e da razão como base para a organização da sociedade e a resolução dos problemas humanos. Segundo o escritor francês, a sociedade humana deveria passar por três estágios para o seu desenvolvimento e para a construção do conhecimento: o estágio teológico, o metafísico e, por fim, o científico no qual a sociedade alcançaria a verdadeira ordem, com uma organização social baseada em leis naturais. Para ele, a ordem era um valor essencial e, só seria possível se as instituições sociais e políticas fossem fundamentadas no conhecimento científico e no entendimento das leis que regem o comportamento humano e a natureza. Dessa forma, o positivismo visava à construção de uma coletividade estável, harmoniosa e equilibrava, sem contradições e instabilidades.

Idealizada em um contexto de grandes mudanças políticas e sociais na Europa, marcado pela busca de hegemonia política da burguesia, das Revoluções de 1830 e da Primavera do Povos, com o proletário começando a reivindicar participação e direitos, ou seja, em um momento de desordem e crise, a ideia de ordem proposta por Comte e sua visão sobre a organização política e social surgem como um meio de garantir estabilidade e o progresso da sociedade. Para o autor, as instituições deveriam ser conduzidas por cientistas, engenheiros e especialistas, isto é, pela elite intelectual do período, os quais eram os únicos indivíduos capazes de aplicar os conhecimentos de maneira racional e designar os papéis sociais de cada cidadão, afim de controlar o caos da revolução e as transformações políticas e sociais contrárias ao paradigma vigente.

Posto isto, mesmo em um momento histórico posterior e distinto, é vislumbrado a empregabilidade, mesmo que de forma distorcida, dos ideias positivistas na realidade hodierna brasileira. Fato este é exemplificado no caso envolvendo uma estudante de medicina da Universidade Do Oeste Paulista, no Guarujá, a qual, caracterizando-se como uma mulher preta e de baixa renda, foi vítima de linchamento moral e injúrias raciais por outras quatro estudantes devido ao fato de ser cotista e frequentar uma universidade particular. Desse modo, é notório a tentativa dessas estudantes de manter a "ordem" social vigente, caracterizada pela exclusão e segregação de indivíduos de pouca renda e pretos, os quais não deveriam estar frequentando uma instituição particular pois esta não corresponde ao lugar social previamente estabelecido pela elite intelectual.

Ademais, vale ressaltar que, diante das transformações sociopolíticas, muitos desses indivíduos recorrem a atos de vandalismo e a violência para manter o paradigma social vigente, como o episódio de ataques ocorrido em 8 de Janeiro de 2023 no Brasil, quando, descontentes com o resultado das eleições e com a vontade da maioria, apoiadores do Ex-presidente Bolsonaro invadiram instituições governamentais, depredaram patrimônios públicos e realizaram crimes contra a democracia com o intuito de tentar manter a ordem antes estabelecida.

Em suma, portanto, embora o positivismo de Comte tenha contribuído significativamente para a valorização do conhecimento científico e para a reflexão sobre a organização da sociedade, a ideia de ordem proposta pelo filósofo precisa ser revisitada à luz das questões contemporâneas, visto que, muitas vezes suas ideias foram mal interpretadas ou aplicadas de maneira distorcida ao longo da história, gerando efeitos prejudiciais e antidemocráticos como os citados anteriormente. Desse modo, a aplicação do pensamento positivista, especialmente envolvendo a centralização do poder e da exclusão de vozes dissonantes demonstrou que a tentativa de alcançar a ordem e o progresso pode, paradoxalmente, levar à repressão, marginalização e ao autoritarismo. Assim, a sociedade contemporânea exige uma reflexão mais profunda sobre como a ciência e a razão podem ser utilizadas para promover uma ordem que seja inclusiva e justa.

Letícia Dias dos Santos  - direito noturno