Direito Emancipatório Dentro das Universidades
Boaventura Sousa Santos, em seu artigo "Poderá o Direito ser
Emancipatório?" define o período atual como um período de transição,
caracterizado pela disputa entre a minoria dominante e a maioria excluída. No
caso apresentado, em que um partido político entra na justiça contra o sistema
de cotas, é possível perceber essa luta entre dominantes e dominados.
O partido Democratas entra com ação de
arguição de descumprimento de preceito fundamental e com pedido de suspensão de
liminar dos atos que resultaram nas cotas raciais na Universidade de Brasília
UnB, alegando inconstitucionalidade baseada nos arts. da Constituição Federal:
·
1º, caput (princípio republicano) e
inciso III (dignidade da pessoa humana)
·
3º inciso IV (veda preconceito de cor e
raça)
·
4º inciso VIII (repúdio ao racismo)
·
5º
inciso I (igualdade), II (legalidade), XXXIII (direito a informação dos
órgãos públicos), XLII (combate ao racismo), LIV (devido processo legal -
princípio da proporcionalidade)
·
37 caput (princípios da legalidade, da
impessoalidade, da razoabilidade, da publicidade e da moralidade, corolários do
princípio republicano)
·
205 (direito universal a educação)
·
206 caput e inciso I (igualdade nas
condições de acesso ao ensino)
·
207 caput (autonomia universitária)
·
208, inciso V (princípio meritocrático)
Segundo os requerentes, a ação não
questiona o fato do Brasil adotar o modelo de Estado Social, nem a existência
de racismo e preconceito mas sim, se a adoção de um modelo de Estado
Racializado ou de um Racismo institucionalizado é a melhor maneira para
resolver as desigualdades.
A separação das pessoas em raças
definidas é impossível devido a ausência de critérios plausíveis e imparciais e
ao fato de o Brasil ser o segundo país com maior carga genética africana do
mundo (ficando atrás apenas da Nigéria). Além disso, segundo pesquisa genética
realizada por líderes negros brasileiros sobre a ancestralidade do brasileiro,
verificou-se que a genética não é determinante da aparência, sendo possível um
"negro na aparência" possuir maior ascendência genética europeia do
que africana. Para completar o Supremo Tribunal Federal nega da existência de
diferentes raças, raça é uma só, humana. Segundo o geneticista Craig Venter
"raça é um conceito social, e não científico"
O documento afirma que por mais que haja
minorias, nem todos os atos de inclusão se aplicam a todas elas, alguns podem
ser classificados como inconstitucionais, como inclusão de raças. Além disso, a arguição afirma que no Brasil, o
fator racial não é decisivo para a vedação do exercício do direito, entretanto
o fator econômico é. Segundo pesquisas, os negros são os que mais sofrem com a
exclusão econômica.
Os Democratas entram com um pedido
cautelar de suspensão da matrícula dos alunos, cotistas e não cotistas,
aprovados no último vestibular que, no caso, ocorreu no primeiro semestre de
2009 e aplicar a classificação universal.
A postura adotada pelo partido pode até
ser interpretada como de boa intenção, visto que aponta o princípio da compensação
como fator principal para as cotas raciais; todavia, a principal motivação da ação
movida contra a Universidade de Brasília UnB é o fascismo social, que exclui as
pessoas em "zonas" das quais não devem sair por questão de ordem
social.
O Supremo Tribunal Federal julgou
totalmente improcedente a arguição, baseado no princípio da igualdade material,
que é prestigiado com políticas de inclusão. Essas políticas tem por objetivo
incluir os membros da sociedade civil incivil e da sociedade civil estranha na sociedade civil íntima, garantindo assim a
diminuição da exclusão social.
O pedido de liminar também foi negado
pela Procuradoria Geral da República e a Advocacia Geral da União também se
manifestou a favor das cotas raciais para negros e índios.
Agindo dessa maneira, tanto o STF quanto
a Procuradoria Geral da República e a Advocacia Geral da União atuam a favor do
cosmopolitismo subalterno, que luta contra a exclusão social e para a
erradicação do fascismo social
A sociedade atual fragmentada, dividida
em muitos apartheid e polarizada em eixos econômicos, sociais, políticos e
culturais. O fascismo do apartheid social acontece na distinção entre áreas
urbanas "civilizadas" e "zonas selvagens", como por exemplo
um condomínio fechado e uma favela. A universidade nesse caso é compreendida
como uma zona de contato, em que "civilizados" e
"selvagens" se encontram. Segundo Boaventura, quando esses encontros
acontecem pode haver quatro diferentes situações:
·
Violência: quanto o encontro causa a
submissão de uma cultura e o domínio da outra
· Coexistência: quando cada cultura se
desenvolve separadamente e os contatos são desencorajados ou proibidos
(apartheid cultural)
·
Reconciliação: quando o objetivo é sanar
antigas ofensas( justiça restauradora). "Por esse motivo, deixa-se que os
desequilíbrios de poder herdados do passado continuem a reproduzir-se sob novas
capas" (p.45)
·
Convivialidade: reconciliação voltada
para o futuro, com o objetivo de sanar problemas passados e garantir o bem
estar e a boa convivência de ambos os lados no futuro
No caso da UnB, a
instauração do "tribunal racial" para determinar quem de fato seria
negro, somado ao requerimento de suspensão de matrícula dos ingressantes e
arguição de descumprimento de preceito fundamental do DEM são classificadas
como reações de coexistência pois apresentam uma divisão dos alunos entre
cotistas e não cotistas, negros e não negros.
Yeda Crescente Mela, 1º dir.diurno