A ideia de que os preconceitos, principalmente os raciais,
já foram superados é recorrente na sociedade atual. A criminalização do racismo com a
Constituição de 1988 pode ser considerada como uma faca de dois gumes, visto
que, ao mesmo tempo que dá um maior amparo judicial à população negra contra a
discriminação étnica, pode ser usada como um argumento para embasar uma nova
“democracia racial”. A vivencia da população negra é, entretanto, muito
diferente daquilo que se pensa nas bolhas mais privilegiadas.
Esse grupo continua
sendo marginalizado, e uma das formas discriminatórias mais prejudicial é o
racismo institucional enraizado em toda a estrutura do país, sendo a violência
policial especialmente problemática. Tal situação é identificada nas tirinhas
de Armandinho, do autor Alexandre Beck, nas quais dois garotos, um negro
(Camilo) e um branco (Armandinho) brincam, como duas crianças comuns: em uma
das artes, enquanto andam de bicicleta, são parados por um policial que pede as
notas fiscais do veículo; Armandinho fica chocado, indagando quem carregaria
consigo os registro de compra do objeto enquanto Camilo entrega o que foi
pedido ao policial. Dessa situação infere-se que esse, como uma pessoa negra,
precisa estar sempre preparado para a ação policial, para a possibilidade de
ser considerado ladrão; enquanto aquele nunca tinha pensado sobre o assunto.
Essa realidade não existe apenas na ficção, uma vez que não nos faltam exemplos
de excessos policiais contra a população negra: em setembro de 2018 um jovem
negro foi morto por policias no Rio de Janeiro por carregar um guarda-chuva que
foi confundido com um fuzil.
O racismo estrutural vigente na sociedade brasileira, uma
antecipação da mente (preconceito), segundo Francis Bacon, é baseado no senso
comum popular, englobando os Ídolos da Caverna e do Foro. O primeiro envolve o
indivíduo e o mundo à sua volta, ou seja, suas vivências e sua formação; já o
segundo diz respeito à vida e sociedade, às relações interpessoais.
Provavelmente, na vida profissional de um agente da segurança pública, este já
teve contato com muitas situações que embasem sua visão social, entretanto,
como a representação do Estado, não deveria, de forma alguma, deixar seus
julgamentos pessoais sem nenhuma comprovação científica (ou seja, seu senso
comum) guiarem sua conduta.
Julia Parreira Duarte Garcia; Direito Matutino