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segunda-feira, 2 de setembro de 2019


A autora da vez é a Sara Araújo que aborda o tema sobre a divisão das Ciências/Direito em dois "pólos": epistemologias do Norte e epistemologias do Sul.  Nesse sentido, tenta mostrar como a sociedade atual foi moldada por certos preceitos. O pensamento moderno ocidental se expressa em um pensamento abissal, que assenta em distinções visíveis e invisíveis. Estas distinções invisíveis são estabelecidas através de linhas, que impedem a conexão do universo “lado de cá” com o “lado de lá”. Estas manifestações de pensamento se consolidam no âmbito do Direito e tem a visão de uma linha abissal que separa o legal e o ilegal, consideradas as únicas medidas de existência perante a lei.
A partir da concepção da pluralidade de conhecimentos heterogêneos, uma diversidade epistemológica do mundo, o pensamento pós abissal compreende a ecologia de saberes sendo essa uma multiplicidade de conhecimentos. Através do exercício das ecologias que englobam a visibilidade, copresença, a horizontalidade e a recuperação de ordenamentos jurídicos que regulam sistemas produtivos, visa aprender outros conhecimentos sem esquecer os próprios. A ecologia de saberes se faz presente, como um meio de intervenção no real e um diálogo na sociedade, se consolidando em um aspecto pragmático e epistemológico. A partir dessa caracterização tem como objetivo dar vozes a diversos conhecimentos que possibilite a inserção e a maior participação dos grupos sociais.
O caso/julgado discutido em sala, trata-se de agravo de instrumento interposto por PLÍNIO FORMIGUIERI e VALÉRIA DREYER FORMIGHIERI, contra a decisão judicial que, nos autos da ação de reintegração de posse endereçada contra LOIVO DAL AGNOLL e OUTROS. Os autores buscam reformar a decisão proferida pelo juízo de Passo Fundo, que indeferiu liminar de reintegração de posse, ao fundamento de que os autores, ora agravantes, deixaram de demonstrar o adequado exercício do direito de propriedade, pelo atendimento de sua função social. A situação apresentada nos remete a separação das epistemologias dos saberes entre o Norte através dos proprietários que seriam legitimados pelo direito, e do outro lado o Sul representado pelo MST e retratados como invisíveis e sem amparo do estado necessitando ir à luta para ter sua causa reconhecida.
Quando se trata do direito de propriedade, entre defender o valor individual e defender o valor social, o direito brasileiro fez uma opção clara: defendeu o valor social. É por isso que a Constituição Federal, artigo 5º, no inciso XXII, garante o direito de propriedade, mas no inciso em seguida, o XXIII diz que "a propriedade atenderá a sua função social". Portanto, a propriedade contém, em si mesma, carga obrigacional, e não apenas o efeito de fruir.
A problemática da distribuição de terras no Brasil, sempre se configurou como uma situação conflituosa, sendo que desigualdade na distribuição uma constante questão a ser resolvida no nosso cenário desde a colonização. Assim, os desembargadores tiveram como meio lícito interpretar a partir dos termos da Constituição que, o direito de posse e propriedade existem e devem ser garantidos e protegidos. Contudo, somente quando é atendida a função social a garantia e a proteção serão merecidas.

Gabriela Sá Freire Paulino - Direito Noturno


O contexto histórico e a péssima divisão de terras no Brasil já é algo histórico, desde a lei de terras, essa lei que restringia a compra de propriedades para evitar que pobres e escravos conseguissem chegassem a ser proprietários, assim restringindo as terras somente aos “homens bons”. Dentro do âmbito do livro As bifurcações da ordem” Com uma inicial analogia a Gandhi, o autor leva à tona a formação jurídica como forma de manipulação populacional, sendo assim, ele adentra o assunto com uma temática de que o sistema judicial é utilizado para legitimar regimes injustos. Contudo esses regimes políticos ao invés de aplicar a justiça de forma que possa amenizar ou mudar os problemas sociais, eles nada fazem, por estarem dentro de um conflito de interesses.
Assim, agravo n° 70003434388, votado pelo Relator Des. Carlos Rafael dos Santos Junior e demais magistrados leva em conta um pedido judicial para a reintegração de posse de uma área improdutiva ocupada pelo Movimento dos Sem Terra. Entretanto respeitando a constituição, a votação e não aprovação da reintegração foi votada dentro de um contexto humanitário. Desse modo vê-se que essa votação da não concessão da reintegração, foi votada a partir de um contexto no qual não se deveria analisar mecanicamente e sim de forma critica, de acordo com o contexto social da região e a quantidade de famílias ali acampadas.
 Essa forma de analise foi tirada de base no trabalho da “Sara Araújo: a Ecologia Jurídica”  para tanto, a função social das terra é algo que deve ser sempre levado em conta no Brasil. De modo que a quantidade de problemas sociais e o agravo da marginalização gerado pela falta de moradia é algo que poderia ser resolvido com a analise jurídica feita no caso discutido


O direito à propriedade, a razão metonímia e a ecologia de saberes

O conceito de propriedade é o pilar que sustenta todo o sistema capitalista, nos países subdesenvolvidos a propriedade de terras é o mais importante visto que está inserido no capitalismo como produtor de commodities e, no Brasil, o agronegócio é a base de quase toda a economia, como ocorre desde a colonização.
A valorização da posse, do objeto em detrimento do indivíduo estabelece todas as relações sociais e econômicas e o direito participa desse fenômeno ao normatizá-lo e legitimá-lo.
Segundo Boaventura de Sousa Santos as monoculturas que proporcionam a manutenção da razão metonímia baseiam-se em conceitos como a universalização, padronização do conhecimento e das pensamentos e racionalização da sociedade e do saber. Esses conceitos tornam possível a total exclusão de valores e formas de organização distintas, impondo o padrão em sociedades originalmente totalmente diferentes da modernidade eurocentrica. Tal fenômeno ocorre na sociedade brasileira e já a domina, pois o conceito da posse de terras que os povos originários é completamente excluído da sociedade, prevalescendo sempre a propriedade baseada no capitalismo.
 O direito, ao servir de ferramenta para legitimar todo esse processo, também é baseado nas monoculturas e, portanto, ignora as exceções, o individual ou o local, impossibilitando uma visão social da própria sociedade.
O caso discutido em aula é um dentre muitos que acontecem em todo o território brasleiro devido à distribuição extremamente desigual da terra. 600 famílias lutavam na justiça para a apropriação de uma terra improdutiva para a prática da subsistência. Na maioria dos casos semelhantes, a decisão seria a expulsão dessas famílias para reestabelecer a posse do proprietário, visto que o ordenamento jurídico com visões baseadas nas monoculturas tem como intuito proteger todo o sistema capitalista, mas no caso discutido, a decisão foi favorável às famílias membros do MST. Tal mudança de valores só é possível através da superação da razão metonímia e a utilização de uma ecologia de saberes e jurídica, que leva em consideração todas as diferentes formas de organizações sociais e culturais que proporcionam valores distintos entre si, essa tendência é visível mo próprio ordenameto com a modificação do conceito de função social da terra na Constituição Federal de 1988. O direito, a partir da ecologia de saberes, não ignora os acontecimentos locais e focaliza mais no indivíduo e seus direitos e menos na propriedade de terra.
Com isso, foi possível equlibrar as partes opostas e manter a segurança jurídica visto que houve a desapropriação da terra apenas pelo fato de estar improdutiva, ou seja, também não estava sendo utilizada para a manutenção do capitalismo.
Desse modo, é possível perceber a sucessiva e gradativa superação do direito e da sociedade em geral no pensamento abissal.

A função social da terra subordinada ao primado do direito.

O Agravo de Instrumento n° 70003434388 – TJRS expõe o caso do latifundiário Loivo Agnoll que teve sua terra ocupada pelos membros do Movimento dos Sem Terra. Dessa forma, por meio da análise desse acordão e utilizando o tal latifundiário como exemplo, é possível perceber como os grandes proprietários de terra possuem privilégios em meio do direito no país, visto que o poder e a influência política e social dos latifundiários do Brasil é uma legado histórico, que iniciou-se no período colonial com a repartição territorial demasiadamente grande e desigual das capitanias hereditárias e sesmarias.
Portanto, com nessa problemática o artigo 5°, inciso XXIII da Constituição Federal brasileira, que firma a função social da terra, não é estabelecida para os sem terras em grande parte dos acórdãos como esse, pois o direito não é cego, contudo sempre pende para o lado daqueles que são mais privilegiados socioeconomicamente, que nesse caso são os latifundiários.
Por conseguinte, Toda essa ideia exposta, pode ser sintetizada com o ideal do “primado do direito” defendido por Sara Araújo, o qual alega a existência de um direito de determinados povos que é superior aos daqueles que são dados como povos primitivos. Logo com essa ideia explicitada, é possível refletir sobre a questão das terras no Brasil, já que o direito daqueles que visam ocupar e obter posse das terras que são à muito tempo ociosas e que também objetivam gozar de seus direitos constitucionais, são dados como inferiores socialmente, além de tais figuras serem vistas como marginalizadas pela sociedade e a mídia. Essa problemática ocorre, pois os latifundiários por serem, desde 1.530, um modelo de poder paralelo no Brasil, faz com que o direito o que os beneficiam e as normatizações que os protegem sejam mais relevantes e superiores aos desses sem terras.
Desse modo, é indubitável que as ideias levantadas por Sara Araújo pode ser percebida até mesmo dentro do âmbito brasileiro, pois de uma maneira singular, a tese da “epistemologia do sul” também está presente no país, pois em todos os casos polêmicos que envolvem a questão da terra, assim como em nesse acordão, os latifundiários tentam impor aos sem terras as normatizações que os beneficiam, e assim esses sujeitos que sofrem com os diversos tipos de abssalidades, são vistos como indivíduos oportunistas e aproveitadores, que visam de auto beneficiar as custas de outrem. Ademais, o próprio sistema capitalista faz com que o direito e as ações jurídicas beneficiem mais os grandes donos de terra, pois haverá mais lucro se tais terras forem para o agronegócios ou destinadas à exportação, e com isso colaborando com a prosperidade da economia brasileira, a qual é alicerceada no 1° setor.


Lívia Ribeiro                                                                                  Direito-noturno


Direito como instrumento de manutenção do capitalismo


Sara Araújo aborda em seu estudo o fato do direito ser usado como um instrumento do capitalismo, que serve para favorecer as classes mais ricas e privilegiadas, e ela ainda fala que sempre foi assim, desde sua origem, pois ele é uma invenção ocidental, feito a partir de um etnocentrismo jurídico, e imposto por via da colonialidade jurídica. A partir disso, Sara propõe uma ecologia jurídica que é um direito baseado no reconhecimento da pluralidade jurídica e dos seus significados políticos sem sobrepor diferença e desigualdade.
 O julgado trabalhado essa semana aborda essencialmente esse tema, integrantes do Movimento Sem Terra invadiram e ocuparam uma propriedade improdutiva chama Fazenda Primavera, e a partir disso fizeram do local sua moradia. Os reais proprietários desse território não aceitaram a ação do MST e entraram com um processo de reintegração de posse, isso exemplifica o tema abordado pela autora, pois para os ricos proprietários daquela terra não era importante que sendo moradia de um grupo de pessoas ela cumpria mais sua função social do que sendo apenas uma terra improdutiva e parada, no viés capitalista o bem social não parece ser tão importante quanto o bem próprio, e nesse caso o que importava para o proprietário era garantir que a terra fosse sua e estivesse no seu controle, mesmo não tendo nenhuma função, já que o poder do capitalismo se baseia em posses e capital.
Dessa forma, vemos como o direito foi usado como um instrumento pelo proprietário para manutenção da ordem capitalista, e que se fosse aprovada a reintegração de posse como iria privilegiar uma classe já privilegiada. Mas felizmente, no especifico caso, o proprietário não foi contemplado pelo processo e não obteve sua terra de volta, que passou a ser oficialmente do MST e finalmente cumpriu a devida função social.



Isabella Stevanato Frolini - direito noturno

Desnortear

Octavio Deiroz Neto- 1º ano direito noturno

Concomitante às milhares de diferenças entre os países desenvolvidos, os países do “norte”, há uma semelhança crucialmente necessária para que se mantenha o status quo, bem como a ordem vigente que endeusa o material, o individual, em detrimento do coletivo. Todos os países, salvas raríssimas execeções possuem no âmago de seu código de normas e leis, princípios pautados na manutenção do sistema capitalista, mesmo que essa manutenção se apresente travestida de preceitos nobres, como uma suposta igualdade.
A autora, socióloga Sara Araújo, disserta em suas obras, acerca da diferença gritante entre o que ela chama de países do norte e países do sul, os que são servidos e os que servem, os ricos e os pobres. Ambos exercem seus papéis, um de detentor de poder e o outro subordinado, sendo todos servos do sistema capitalista.
Em outubro de 2001 foi julgado um caso de reintegração de posse, no qual integrantes do MST ocuparam terras as quais foram, posteriormente, alvo de disputas judiciais para que fossem reocupadas e devolvidas para seus respectivos donos. Nos processos, decidiu-se a legalidade das ocupações, usando sobretudo o princípio da função social das propriedades, indo na contramão da manutenção do sistema, demonstrando certa inversão do sistema “norte-sul”, privilegiando agora não mais o individual, mas o coletivo, a generalidade da sociedade e não só um grupo seleto, dono dos lugares mais altos da pirâmide social.



Epistemologias do Sul

Desde a colonização brasileira o grande método de sustento foi a agricultura para fins de exportação, e devido a isto houve a concentração dos mais afortunados em latifúndios espalhados por todo o país. Latifúndios os quais nem sempre são sinônimo de produtividade, ocupando apenas território nacional com o propósito apenas de especulação imobiliária.
Devido a este fato muitos grupos de pessoas as quais não possuem terra para subsistência, invadem estes grandes campos e ali tomam posse e começam a produzir. O Agravo de Instrumento n° 70003434388 – TJRS acerca da Fazenda Primavera vem para demonstrar o quanto é rotineiro estas invasões e após as mesmas as brigas dentre o meio jurídico; sendo que no caso em questão se mostrando a improdutividade os proprietários das terras foram vencidos no embate pelo MST.
No texto apresentado por Sara Araújo ela parabenizaria ao tribunal do Rio Grande do Sul, e classificaria esta decisão como um caso singular que deve ser seguido por todos os magistrados. Já que a mesma defende que o direito atualmente está servindo de alicerce para o capitalismo desenfreado, em uma visão bastante humanista ela acredita que as minorias não tem voz no poder jurídico e quase sempre são oprimidas e ficam sem “voz”.
Fica então evidente que a decisão do TJRS traz o conceito da “Epistemologias do Sul” que nada mais é que um projeto jurídico apresentado por Sara, o qual busca sempre o pluralismo jurídico para diminuir as desigualdades e injustiças.
Leonardo Souza da Silva - Norturno

O direito singular

Na Modernidade em que vivemos, é visível a permanência do conceito da universalidade do direito. Firmado em alicerces eurocêntricos, o direito é visto como medida única para todos, baseado no uso primordial da razão. Toda forma de pensamento que contraria essa "ordem natural" criada pela racionalidade é ignorado totalmente, como se fosse invisível. É possível notarmos esses fatos ao analisarmos decisões judiciais e doutrinas que atribuem ao direito esse caráter singular, centralizado e universal. 
Enquanto cidadãos e sujeitos ligados à ciência jurídica, vemos a necessidade de desafiar e superar esse raciocínio. O direito deve ser deslocado do "centro", onde se prende ao pensamento citado anteriormente, para atingir as margens, periferias. Objetiva-se criar um pluralismo jurídico, onde são compreendidas outras e mais variadas linguagens jurídicas que possam integrar os interesses de todas as parcelas da sociedade. 
Como amostra importante dessa discussão, temos o Agravo de Instrumento n°70003434388 do TJRS, em que é requerida uma reintegração de posse de uma fazenda ocupada pelos trabalhadores do MST. Vê-se, portanto, que é um conflito relacionado à questão latifundiária, problema que há muito é responsável por gerar grandes desigualdades sociais no nosso país. Assim, torna-se mais importante ainda o fato do Tribunal ter negado o pedido de reintegração, favorecendo os trabalhadores com base no princípio constitucional da função social da propriedade. Isso evidencia uma nova linguagem presente no direito, um novo ponto de vista, expandindo os horizontes jurídicos e aumentando o suporte àqueles menos favorecidos. É dever dos juristas, mesmo em vista dessa conquista, renovarem a si mesmos e seus conceitos conforme os conflitos sociais manifestam-se na sociedade. Afinal, o direito só poderá ser igual para todos quando todos forem iguais.

Gustavo Felicíssimo - 1° matutino

                Desde o colonialismo no Brasil, o modelo adotado para exploração da terra foi o plantation, grandes propriedades voltadas para a monocultura. Fato que – juntamente com outros fatores como a escravidão – determinou características fundamentais dos problemas fundiários brasileiros: a constituição de latifúndios com a participação de trabalhadores rurais que não possuem acesso à terra, além da improdutividade em boa parte dessas propriedades.
            Diante desse contexto, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) vem desde 1981 promovendo uma luta, dentre tantas coisas, a favor da reforma agrária no país. Além do MST, existiram diversos movimentos sociais lutando e resistindo contra o latifúndio, a concentração de terras. A resistência do campo se manifesta de diversas maneiras, transformando a sociedade.
            De acordo com a socióloga Sara Araújo, o direito moderno eurocêntrico é utilizado como instrumento de propagação do colonialismo, fator que leva a exclusões abissais. Dessa forma, existe uma preponderância desse pensamento liberal europeu, marcado pela diminuição das formas de organização sociais provenientes do “Sul”.  
            O agravo nº 70003434388, votado em 2001 pelo Relator Des. Carlos Rafael dos Santos Junior, aborda um caso de pedido judicial para reintegração de posse de uma área ocupada pelo MST, vale ressaltar que a terra era improdutiva. É importante lembrar o artigo 186 da Constituição Federal que versa sobre a função social da terra e é clara ao dizer que a terra deve ter um “I - aproveitamento racional e adequado” e uma “II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente”.
            Apesar da propriedade não estar cumprindo com sua função social, a jurisprudência foi favorável aos latifundiários, fato que comprova a tese da socióloga. A tendência eurocêntrica continua sendo utilizada em detrimento das fontes alternativas, ou como ela chama, Epistemologias do Sul.



Camilla Garcia - 1º ANO noturno

O enfrentamento de um Direito Monolítico


Durante o ciclo da História, o surgimento e desenvolvimento do Direito esteve sempre ligado ao modelo econômico-social vigente em tal época. Tendo em vista isso, por exemplo, o ordenamento jurídico passa por diversas transformações ao longo da evolução dos sistemas econômicos e, no contexto hodierno, não é diferente. A partir do desenvolvimento exacerbado do capitalismo liberal eurocêntrico, o aspecto jurídico moldou-se a favor de uma visão colonialista e que – inconscientemente ou não – valorizou por muito tempo apenas os interesses dos que possuem maior poderio econômico, ou seja, tomou uma parte como se fosse todo.
Diante dessa afirmação de uma “razão metonímica” – tomar uma parte pelo todo – Sara Araújo organiza sua tese a partir de uma reflexão acerca da eterna luta entre os pólos Norte e Sul, onde o norte representaria a parcela da sociedade que dita a economia e cultura mundiais, enquanto o sul englobaria a “marginalidade” cultural e social. Sob esse prisma, qualquer tipo de organização que busque fugir dessa imposição de um modelo capitalista-ocidental enfrenta diversos tipos entraves que impedem a manifestação de seus direitos, como no caso do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra.
Tal grupo seria integrante do pólo “Sul” pois foge dos padrões ocidentais impostos pela cultura nortista e busca, através da valorização do coletivo em detrimento do privado, a diminuição da pobreza e desigualdade ocupando terras improdutivas. Face a esse enfrentamento de interesses, desenvolveu-se o caso da fazenda Primavera, onde um casal de latifundiários clamou por uma reintegração de posse através de um agravo de instrumento interposto contrariamente a decisão judicial dada a favor do movimento social. Entretanto, a decisão final foi de improvimento, com base nos argumentos da Função Social da Terra, sendo esse um direito assegurado pela Constituição. Assim sendo, percebe-se uma decisão que leva em consideração as chamadas epistemologias do sul, dando relevância à aspectos que foram apagados de maneira covarde pela imposição de uma cultura que não possui uma horizontalidade jurídica.
Em contrapartida, não podemos nos esquecer que a mentalidade de exploração colonialista ainda encontra-se presente no Direito, sendo possível visualizá-la no discurso de Luiz Augusto Braga que, tentando maquiar seus preconceitos enraízados pela cultura do “norte”, acusa o MST de causar uma “insegurança” ao direito à propriedade, algo completamente desconexo levando em conta a improdutividade das terras ali presentes.
Finalmente, percebe-se que, apesar dos recentes avanços sociais presentes no âmbito jurídico de tentar equiparar os direitos dos pólos, a jurisprudência ainda possui diversos aspectos que encontram-se atracados a antigos preconceitos. Urge, portanto, o exercício de uma mentalidade que pare de pautar a Sociedade de forma dualista, ou seja, enxergar o mundo com uma visão certo/errado, progresso/atraso, norte/sul; apenas através dessa racionalização será possível a prática da chamada Ecologia dos Direitos e Justiças, desconsiderando a imposição de um Direito monolítico que seja pautado apenas por uma visão ocidental e eurocêntrica.


Lucas Perseguino Rodrigues de Araujo - Direito Matutino
 SOBRE MST E SARA ARAÙJO
       O julgado trabalhado nessa semana trata sobre a questão da função social da terra e do Movimento dos trabalhadores rurais sem terra (MST).  O MST, associação que não segue o código civil, apropriou-se de uma terra com a justificativa de ser uma fazenda improdutiva. Entretanto, apesar de o grupo agir em favor da tão necessitada reforma agraria, a principal critica sofrida é pela maneira em que o grupo age. Uma das justificativas da oposição é a violência local sofrida pelo proprietário da terra, o uso da força muitas vezes descredibiliza o movimento fazendo com que a oposição tenha cada vez mais argumentos. 
O julgado trata de uma liminar de reintegração de posse, como é trabalhado pela autora Sara Araujo. A imposição global do primado do direito é um mecanismo de expansão do projeto capitalista e colonial, ou seja, a colonialidade imita a colonialidade do saber.
Sara trata de uma maior gama de interpretações sobre o direito e a sociedade, assim, a decisão comunicada pelo acórdao mostra a tentativa de quebra de uma visão monolítica sobre tema que, por mais que esteja enumerada em uma visão constitucional, demostra um maior reconhecimento de partes que antes eram invisíveis pelo ordenamento jurídico promovendo o conceito de Ecologia dos saberes trabalhado por Sara Araújo.
Giovanna da Fonseca Lopes - Matutino

A questão da concentração de terra no Brasil e o diálogo com o direito colonizador


Em 2001, um proprietário de terra entrou com um recurso na justiça visando reintegrar suas terras que foram ocupadas por integrantes do MST e pautados na função social da terra, os magistrados decidiram por 2 votos a 1 que essa reintegração de posse seria negada. Segundo a acadêmica Sara Araújo, a função social da terra é utilizá-la de uma forma economicamente sustentável, visando justa distribuição, assim como o bem-estar do coletivo através do aumento da produtividade. Além disso, a propriedade deve ser benéfica para o bem-estar não apenas do seu proprietário, mas para toda comunidade rural que vive ao redor do latifúndio.

Diante desse contexto, refletimos sobre um outro estudo da acadêmica que diz respeito ao Direito como ciência. O Direito carrega em si a mentalidade colonizadora eurocêntrica e exporta para países subdesenvolvidos (sul) essa forma de pensar, fazendo com que fiquemos ainda subordinados a vontade e sejamos impostos por regras europeias (norte), criando um grande abismo entre os dois lados do globo, sem a promoção de igualdade, justiça e bem-estar social, perpetuando constantemente a subordinação de uma classe pela outra. Ao analisarmos o julgado, vemos que são os grandes concentradores de terra, que muitas vezes são ilegais em razão do garimpo, por aqueles que resistem para ter um pequeno pedaço de terra para que possa abastecer sua família e a cidade mais próxima, alimentando a todos, a final é a propriedade familiar que abastece as mesas do cidadão urbano.

Visto que os argumentos dos juízes foram sustentados na função social da terra, não é surpresa pensarmos que esse caso foi decidido a favor do movimento. Segundo a coluna Brasil de Fato, 2 mil latifúndios ocupam área maior que 4 milhões de propriedades rurais. A partir desses dados estatísticos, vemos que milhares de famílias que necessitam apenas de uma pequena propriedade para que possam sobreviver de subsistência ou até mesmo tornar-se uma propriedade familiar ficaram de mão vazias, pois apenas um titular concentra em suas posses mais de 10 mil hectares de terra. Além disso, esses latifundiários muitas vezes expulsam os indivíduos de suas terras, causando mortes violentas, inclusive com indígenas. Claramente, uma propriedade que esteja nesses moldes são cumpre com uma função de desenvolvimento sustentável, não gerando emprego, bem-estar, renda e medidas ambientalistas.

A concentração cada vez maior de terras apenas promove mais segregação e subordinação de uma classe perante a outra, podendo causar mortes de famílias inteiras e prejudicar o abastecimento de pequenas cidades que dependem da agricultura familiar. Além disso, há o reflexo dessa mentalidade colonizadora que vemos na prática na própria ciência do direito, que ainda mantém o molde colonialista importado do norte, que causa injustiça, parcialidade e segregação.

Lucas Gomes Granero - Direito Noturno 

O MST e suas implicações sociais

É notável a divisão da sociedade, formando-se grupos à parte da civilização que, de acordo com Sara Araújo, se tornam invisíveis e separados do resto da população. Ao analisar os votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal na decisão do descumprimento ou não do preceito fundamental número 54, percebe-se a realidade da percepção de Araújo, no nível em que o Movimento Sem Terra se encontra à margem da sociedade, estando sujeito à flecha do tempo linear.
 A flecha do tempo linear trazida por Sara Araújo, classifica como atrasado tudo que é assimétrico e diferente do considerado avançado e dentro da sociedade. Assim, ao votar contra o descumprimento alegando que se deve seguir o devido processo legal da reforma agrária e que a função social não é a prioridade de uma terra, evidencia-se a invisibilidade e a assimetria com quem o movimento é visto, já que não é considerada a condição de vida que essas pessoas vivem.
Além disso, a monocultura do saber e do rigor do saber “transforma a ciência moderna e da alta cultura em princípios únicos de verdade e qualidade estética”, assim os valores definidos pela alta cultura criam preceitos em relação aos marginalizados, sendo considerados muitas vezes como descuidados e negligentes.
Contudo, evidencia-se a importância de casos como esse no ponto em que traz a visibilidade para outros parecidos.



                                                                                                             Monique Fontes
                                                                                                   1 ano Direito Noturno

      Em 15 de outubro de 2001, Plínio Formighieri e Valéria Dreyer Formighieri tiveram sua propriedade invadida por pessoas integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, interpuseram por meio de um agravo de instrumento contra a decisão judicial que, nos autos da ação de reintegração de posse indeferiu a liminar reintegratória, postulada nos termos do art. 928 do CPC. Alegaram assim, que a propriedade invadida pelo movimento era produtiva.
     Para estabelecer os critérios da função social da propriedade, estabelecida no artigo 186 da Constituição Federal, (Art 186: A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I- Aproveitamento racional e adequado; II- utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III- observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV- exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores) os proprietários deveriam apresentar provas que suprissem a necessidade da contestação, documentos assim, que apresentassem a produtividade da área invadida. Todavia, não apresentaram documentos suficientes para a demonstração. Além disso, o relator Des. Carlos Rafael, cita em uma das provas apresentadas: “A prova mencionada, ademais, poderia ter sido obtida pelos proprietários da área muito antes do conflito instalado”.
     Também na Constituição Federal, definido pelo artigo 170 “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social", dá motivos para a não reintegração de posse, tendo em vista a administração das terras nas mãos dos integrantes do MST, favorecendo assim suas melhores condições de vida, asseguradas pela produtividade das terras, estabelecendo assim, sua existência digna. 
      De acordo com Sara Araújo, existe uma linha abissal entre o norte (definida pelo Código Civil e pelo Código de Processo Civil) e o sul (definida pela Constituição Federal e idealizada pelo MST), “ O direito moderno eurocêntrico é um instrumento poderoso de reprodução do colonialismo, provendo exclusões abissais e circunscrevendo o horizonte de possibilidades à narrativa linear do progresso. A linha abissal é, pois, tanto epistemológica como jurídica. Do outro lado da linha, múltiplos universos jurídicos são desperdiçados, invisibilizados e classificados como inferiores, primitivos, locais, residuais ou improdutivos.”. Tendo em vista a decisão dos votos a favor do MST, ela escapa da tendência típica de um direito eurocêntrico, no qual o direito a propriedade configura uma racionalidade metonímica (a priori e universal). Dessa forma, assegura-se o direito brasileiro dentro de um cenário de desigualdade social herdada da colônia.

TURMA XXXVI matutino 
Amanda Zandonaide de Araújo



Os reflexos do colonialismo e o direito emancipatório


Ao longo do tempo o colonialismo refletiu de diversas maneiras nas antigas colônias, a mais proeminente foi na cultura. Os países que sofreram da colonização hoje partilham da mesma língua de seus colonizadores, além de um pensamento extremamente eurocêntrico. Tal visão fez com que os colonizados desvalorizassem suas produções e saberes originais, em contramão valorizando o que é estrangeiro. Com o advento do imperialismo estadunidense e a consolidação do “american way of life”, é visível a desvalorização e o sufocamento dos entendimentos locais, perante a suposta superioridade do norte.

Contudo, as diferenças entre o norte e o sul persistem, e vêm sendo ignoradas em nome de uma hipossuficiência, mas este colonialismo do norte produz uma serie de exclusões, principalmente no âmbito jurídico. Isto é visto no primado do direito, uma forma de legitimação da exploração do sul e uma expressão do imperialismo. A linguagem jurídica moderna valida o modelo dominante, colonial e capitalista, esquecendo-se das diferenças abissais entre norte e sul, mas vendendo a realidade do norte como uma verdade global.

Assim, o direito instrumentaliza-se tal qual um reflexo dos interesses dos capitais do norte, a partir de uma perspectiva universal e global. Um dos maiores exemplos disso é os direitos humanos, criado a partir de somente uma perspectiva e excluindo toda uma complexidade de encontros jurídicos, e, além disso, não reconhecendo a linha abissal que divide o mundo.

A partir disso, Boaventura de Sousa Santos propõe uma epistemologia do sul, que junto com a sociologia do direito identificaria as exclusões causadas pelo pensamento colonial, reformulando e desconstruindo a partir do direito moderno, destarte á produzir um direito emancipatório. Em conjunto, Sara Araújo propõe uma ecologia de direitos, rejeitando a monocultura estabelecida pelo norte e reconhecida à multiplicidade de conhecimentos do sul, e á partir da vivencia do habitus jurídico alargar o cânone jurídico e promover um direitos dos oprimidos.

O dito acima é uma descrição do que ocorreu no agravo de instrumento referente ao caso da Fazenda Primavera do MST, ocorrido no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em 2001. No qual uma reintegração de posse colocou em conflito os interesses coletivos e os individuais, e contrapôs o recente conceito de função social da terra com o já estabelecido, e universal direito á propriedade. Este evento reconheceu que o latifúndio não deve ser resguardado, pois desafia o equilíbrio social e não possuía função social, e declara que o direito á propriedade não é absoluto, e que assegurar uma vida digna é um dever fundamental do estado.

No ano seguinte ao evento, o Código Civil de 2002 traz no art 1.228 a asseguração do direito á propriedade, mas em seu caput o vincula as finalidades econômicas e sociais; assegurando assim a tutela constitucional da função social da propriedade. Assim, gerando uma ecologia jurídica, que não ignora o legado colonial/ imperialista, mas reconhece e identifica as exclusões causadas por ela, tal qual o movimento antropofágico da década de 20; e assim faz prevalecer uma diferença que cria uma sociedade mais igualitária e coloca o direito em um espaço de transformação e diversidade.  

Mariana Santos Alves de Lima - Noturno

O reconhecimento do pluralismo jurídico dentro de uma legalidade setentrional


A estrutura brasileira fora construída e consolidada em um mar de pluralidades, epistemologias que, se somadas, alcançam muito além do Sul: mostram-se versões do sudeste, sudoeste e centro-sul... Mesmo imerso em um caldo de diferenças tão múltiplas e abissais, o Brasil – adequando-se à roupagem do “Brazil” – frequentemente aparece como uno, permitindo que cânones latentes emitam desigualdades e marginalizações. Dentro dessa visão monolítica, apresenta-se a alta concentração fundiária: segundo o jornal Valor Econômico, 1% dos proprietários são responsáveis por 45% da área rural brasileira. Tal fator, não só significa uma segregação de nosso meio rural, como também uma exclusão de inúmeros brasileiros e brasileiras do contexto econômico do país, dado que suas exportações se voltam, principalmente, à agropecuária. 


“Esta cova em que estás com palmos de medida

É a conta menor que tiraste em vida (x2)

É de bom tamanho nem largo nem fundo

É a parte que te cabe deste latifúndio (x2) [...]”


A música “Funeral de um lavrador”, composta por Chico Buarque e João Cabral de Melo Neto, representa as dores da realidade agrária no Brasil. Repleto de conflitos, o meio rural do país é palco de inúmeras batalhas e, frequentemente, banhado em sangue daqueles que são, constantemente, desprotegidos pelo Estado: os agricultores sem terras, estes que têm sua realidade fadada a ser esquecida pelas forças dominantes.

Nesse ínterim, o agravo de instrumento datado em 2001, este interposto pelos donos da Fazenda Primavera em favor da reintegração de posse da mesma, denota não só o embate entre grupos abissais presentes em território brasileiro, como também a mobilização do ordenamento jurídico como ferramenta para a resolução de tal conflito. Mediante o não deferimento do pedido, o Direito demonstra a possibilidade de ser permeável diante o mapa de possibilidades: o Sul, reiteradamente excluído e segregado, mostra-se vivo no campo jurídico, vencendo o embate em solo inimigo, em solo do setentrional.

Em seu texto “O primado do direito e as exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone”, a autora Sara Araújo defende que o Direito se desvencilhe da roupagem da universalidade e da monocultura, a fim de que o mesmo seja capaz de construir pontes entre as realidades abissais quebrando com a interpretação dada por lentes unilaterais. Faz-se incongruente que, dentro de um Estado de Direito, o ordenamento jurídico seja produtor (e reprodutor) de segregacionismos.

Dentro dessa contribuição interpretativa, ao mobilizar um Direito que tem como base as epistemologias do Norte, as minorias e movimentos sociais tomam para si o direito de também dizer o Direito. Não obstante, a função social não se configura como um conceito anticapitalista, mas representa uma reação contra os desperdícios da potencialidade produtiva, denotando propriedades não só como meros bens, mas também meios. São as epistemologias do Sul apropriando-se da margem de criação jurídica proposta dentro do âmbito da legalidade imposta pelo Norte. 

Ao assumir a possibilidade de inserção de Ecologia dos Saberes, o ordenamento jurídico mostra-se apto a também reconhecer a Ecologia de Justiças: a parte que lhe cabe deste latifúndio não pode estar mais subordinada à covas com palmos de medidas, mas sim, entrelaçada ao reconhecimento de direitos daqueles que não possuem terras de serem seus possuidores, e aos deveres dos proprietários de não tornarem as terras meros instrumentos de desigualdades.



Vitória Garbelline Teloli - 1º ano Direito (noturno)



O direito global e as epistemologias do sul

Sara Araújo trata em sua obra “O primado do direito e suas exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone” sobre o direito atual e critica sua universalidade e impessoalidade. Faz importante crítica ao que chama de direito eurocêntrico e afirma que o mesmo é um mecanismo para a expansão do projeto capitalista e colonial. Argumenta que o direito moderno cria uma “linha abissal” que separa as epistemologias do norte e as sobrepõe sobre as epistemologias do Sul. Também indica uma “razão metonímica” alimentada por 5 formas de monocultura.
A principal crítica da autora gira em torno da impessoalidade do direito moderno, que ao tentar ser universal e impessoal, acaba por suprimir e ignorar os casos isolados e particulares, tornando o direito uma ferramenta desigual e injusta da manutenção da ordem. Sara propõe uma superação dessa monocultura jurídica que suprime o local em favor do global, tornando tudo que está no “Sul” seja inferior, inútil e improdutivo.
Nesse contexto, podemos analisar o Agravo de Instrumento n°7000343438870003434388 do TJRS como um avanço no trato do direito com os invisibilizados. O Julgado em questão se refere a um pedido de reintegração de posse de terras invadidas pelo MST, que foi negado em primeira instância. A turma de segunda instância reavaliou o pedido e manteve a decisão do juiz de primeira instância em negar o mandato de reintegração. Como principais argumentos, os desembargadores utilizaram o instituto da função social da terra, já que foi comprovado que as terras não estavam produzindo. Em contrapartida, foi levantado o direito de posse da propriedade, considerando que a invasão violava a liberdade dos proprietários em utilizar a propriedade privada como quiserem.
A decisão favorável ao MST demonstra uma ecologia de direitos que de acordo com Sara Araújo deve substituir e superar o direito universal, global e impessoal. Essa visão do direito garante que cada caso seja julgado de acordo com o contexto que está inserido, considerando as circunstâncias e causas, deixando de lado as injustiças causadas pela visão global do direito.

Miguel Basílio Andrade - 1° matutino
   Atualmente, no Brasil, a questão agrária é um dos conflitos mais relevantes no cenário político, jurídico e econômico. Ademais, a economia brasileira é essencialmente balizada no modelo de agroexportação e tal produção é feita nos grandes latifúndios herdados da época colonial. Além disso, a concentração fundiária na mão de poucas famílias vem gerando muitos problemas no campo e principalmente a violência entre os detentores de terras e os pequenos trabalhadores rurais. 
  Este agravo de instrumento foi interposto por Plínio e Valéria Formighieri contra a decisão judicial que indeferiu a liminar reintegratória de posse de sua fazenda no Rio Grande do Sul, essa que em 15 de outubro de 2001 fora invadida por pessoas integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terraque é um dos principais movimentos sociais do Brasil, lutando pelas questões do trabalhador do campo e principalmente pela reforma agrária brasileira que através da invasão de terras improdutivas tenta atrair atenção ao movimento. 
  Outrossim, foi negado por 2 votos a 1 o provimento a este agravo de instrumento e mantida a decisão recorrida, os argumentos utilizados para justificar a não reintegração de posse foram, entre outros, principalmente a necessidade de demonstração da função social da propriedade e a garantia dos preceitos e objetivos constitucionais fundamentais da Republica Brasileira, como a erradicação da pobreza e da marginalização e bem como a redução das desigualdades sociais e regionais. Assim, o latifundiário que não cumpre a função social da terra desequilibra o convivo social e desafia o sentimento de justiça das populações marginalizadas campesinas. Essa posse ilegítima ameaça a ordem jurídica e configura um desrespeito a dignidade humana e o direito básico de possuir a terra do trabalhador rural.  
   De acordo com a tese de Sara Araújo, tal decisão foge da tendência típica de um direito eurocêntrico e monolítico, predominante na contemporaneidade, que é um instrumento de reprodução do colonialismo, promovendo exclusões e reduzindo as possibilidades de evolução e progresso no ambiente rural, além disso o monolitismo do direito é discutido pela autora no que ela chama de “razão metonímica”, que significa a racionalização do conhecer/normatizar própria de um local como algo que se dá de forma universal, o que acontece em outros países não deve ser aplicado como norma universal, principalmente no hemisfério sul que destoa totalmente das condições dos países desenvolvidos, e ainda mais no setor rural.
  Tal prevalência dessa razão metonímica pode ser observada na monocultura do universal e do global – tudo que é local ou particular é invisibilizado pela lógica da escala global, ou seja, a exportação prevalece sobre a agricultura familiar – e na monocultura da produtividade – todo o outro conhecimento é invisibilizado. Assim, “associada às ideias de racionalidade, neutralidade, objetividade e justiça, a linguagem jurídica moderna assume, pois, um papel fundamental na legitimação do modelo dominante, colonial e capitalista, difundindo uma alegada “ordem natural” ¹.
  Por fim, para permanência de decisões jurídicas que contrariem o cânone almejando a justiça social e a redução das desigualdades, é necessária uma ecologia de direitos e justiças que possibilitem a inclusão na discussão política universos jurídicos marginalizados e classificados como inferiores, locais, residuais ou improdutivos e que reconheça a pluralidade. “Se a justiça social global depende da justiça cognitiva global e se esse objetivo envolve um exercício de ecologia de saberes que combate o desperdício da experiência, exige, também, um exercício jurídico epistêmico que permita o reconhecimento da pluralidade jurídica e dos seus significados políticos sem sobrepor diferença e desigualdade.” ²

¹- Araújo, Sara. O primado do direito e as exclusões, abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone. Sociologias, Porto Alegre, ano 18, n°43, set/dez 2016, p. 93.  ² - Idem, p. 90. 

Gabriella Natalino - Direito Matutino 

O direito à propriedade e a interpretação humanitária das leis

     Inicialmente é de extrema importância constatar que o conceito de propriedade é amplo e interpretativo. É, segundo o sistema jurídico, o direito de usar, gozar, possuir bens e dispor deles da maneira como quiser. Entretanto, quando este assunto se refere à apropriação de terras, o contexto social utilizado acaba, muitas vezes, delimitando a definição e, até mesmo, a Constituição à mecânica básica definitiva e pouco interpretativa dos direitos legislativos dos indivíduos na sociedade contemporânea.
    No julgado relatado e discutido em aula, em que 600 famílias da Fazenda Primavera tiveram seus direitos respeitados e conseguiram se manter na propriedade territorial onde se instalaram, nota-se que, finalmente, a Constituição e os magistrados brasileiros, estão utilizando de outras formas interpretativas – levando em consideração fatores sociais, econômicos e históricos – para decisões judiciais e não somente os aspectos mecânicos e delimitados das leis e normas prescritas nos códigos legislativos do Brasil, isso demonstra uma maior evolução social, trazendo valores humanitários ao âmbito jurídico de nossa Constituição.
    Nesse contexto, é de suma importância relatar que a decisão final do caso tem um grande aspecto à superação dos valores eurocêntricos em nossa Constituição, deixando de lado o concreto das leis e apelando para a hermenêutica correta, ampla, igualitária e que visa a responsabilidade social do Estado com seus cidadãos.
    O principal fator, além da luta diária das diversas famílias brasileiras, é o entendimento de que o direito à propriedade e moradia é de responsabilidade geral no meio social e todas as pessoas devem tê-lo pois se relaciona, diretamente, ao convívio social, à economia do país e, principalmente, ao amparo que todos os cidadãos devem ter, por meio de sua legislação vigente, em seu país.


Tomás do Vale Cerqueira Barreto - 1° ano de direito noturno

A limitação do Positivismo Puro

Proprietários de uma terra impetraram com um recurso na Décima Nona Vara Cível para reaver o domínio sobre sua propriedade, que havia sido ocupada pelo Movimento sem Terra (MST). A decisão por 2 votos a 1 contra os proprietários que reclamavam a reintegração foi fortemente baseada no Artigo 186, que versa sobre a função social da propriedade (preservação, uso adequado e produtividade).
Deve-se considerar, primeiramente, que nenhuma terra considerada produtiva, ou cumpridora de sua função social, é passível de expropriação parcial ou completa. Sendo assim, vale considerar que duas instâncias julgaram que as terras do proprietário não atingiam os níveis devidos de produção e, desse modo, não eram passíveis de blindagem contra uma possível ação do INCRA.
De acordo com a acadêmica Sara Araújo, o direito moderno acabou por assumir um papel fundamental na legitimação do modelo dominante, colonial e capitalista. Nesse sentido, ao olharmos o julgado referido, pode-se notar como esses traços do colonialismo ainda estão presentes na sociedade brasileira, principalmente no contexto rural, no qual poucos proprietários possuem quantidades massivas de terra (muitas vezes inúteis, apenas alimentando o mercado especulativo), enquanto inúmeras famílias, em condições deploráveis e degradantes, não possuem nenhum assentamento para garantir a própria sobrevivência.
Desse modo, a sustentação da autora se reflete na ideia do Movimento se atrela à perspectiva da Ecologia Jurídica a qual disserta sobre o revés de uma análise puramente mecânica e inerte do magistrado. Para Sara, esse Positivismo em demasia acaba por não satisfazer as demandas da sociedade e proteger uma suposta ideia de imparcialidade, inexistente na prática. Ou seja, enquanto a legislação brasileira seguir os padrões opressores e capitalistas, cabe ao judiciário proteger direitos básicos como os que o MST buscou nessa ocupação de terras fantasmas, ao invés de ser utilizada meramente como especulação imobiliária, pode ser a nova moradia de 600 famílias, direito áureo, que vão produzir naquele terreno para subsistência e para fomentar o mercado interno brasileiro.

Mateus Ferraz (1° ano diurno)

Ecologia de direitos e de saberes: Universo de perspectivas


Bruna Araújo identifica duas características latentes do direito contemporâneo. Um forte eurocentrismo e um sentido colonizador que relembra os tempos em que os europeus saiam com suas caravelas pelo mundo, para impor seu modo de pensar, viver e ver o mundo aos demais. Assim, esses são os dois grandes problemas do direito contemporâneo no mundo, o forte modelo eurocêntrico do direito e a imposição desse modelo para todos os países e nações do globo terrestre.
A autora é claramente influenciada pelo livro Epistemologias do Sul, escrito por Boaventura de Sousa Santos. Nesse livro, é proposto um modelo de interpretação onde o Norte teria subordinado o Sul impondo a sua maneira de produzir conhecimento e enxergar o mundo. Grosseiramente, daria para afirmar que a Epistemologia do Norte funcionaria como um Fato Social na visão de Durkheim, onde Fato Social é tudo aquilo que pela maneira que as coisas estão dispostas na sociedade se impõe aos indivíduos sob pena deles ficarem de fora de um conjunto. Embora, Durkheim não se encaixe perfeitamente para explicar a imposição de uma Epistemologia do Norte, a pena para quem não aderir a ela é ser taxado de atrasado e ficar de fora do conjunto dos países desenvolvidos.
Portanto, a Epistemologia do Norte é imposta praticamente a todos os indivíduos que vivem sob a influência ocidental, mesmo os que acham estar completamente imune a ela. Um exemplo simples e prático é que muitos historiadores da USP comemoram a introdução de cota para indígena no vestibular da FUVEST, com o argumento de que agora os índios poderão ser sujeitos ativos na escrita de sua história. Evidentemente, que a cota é justa e necessária, mas comemorar e argumentar que os indígenas só poderiam escrever sua história a partir do ponto de vista que eles adentrem em uma faculdade de matriz francesa, é impor a cultura do ocidente sobre a dele, é afirmar que se quiserem ter a cultura deles valorizada é necessário que se submetam as instituições ocidentais.
Sara Araújo, analisa um movimento parecido que ocorreu com o direito. Se a cultura indígena é valorizada dentro da visão ocidental, apenas se seguir a Epistemologia do Norte. Como a história indígena ser feita por indígenas formados em história pela USP, ou os saberes “medicinais” indígenas só serem validados após serem avalizados pela ANVISA e validado por uma importante universidade pública, com o direito ocorre a mesma coisa.  A autora chama atenção para o conceito de pluralismo jurídico que foi instrumentalizado por instituições ocidentais e perdeu sua pluralidade. O que ocorre é uma subordinação de saberes jurídicos, onde os saberes jurídicos não ocidentais só serão utilizados para servir de instrumento do acessório principal que é o direito europeu.
Para romper com essa subordinação, a autora lança mão do termo ecologia de direitos, que no âmbito geral poderia ser denominado de ecologia de saberes. Onde agora não é mais o Sul subordinado ao Norte, e sim ambos nos mesmos níveis com saberes jurídicos lado a lado, sempre somando um ao outro. No lugar de toda produção material e "intelectual" ser examinada a partir da perspectiva europeia e, eventualmente, um conhecimento “marginalizado” servir de instrumento, agora todo produção é analisada a partir de várias perspectivas e nenhuma se sobrepõem a outra.
No julgamento da reintegração de posse da fazenda está posto este debate, não há uma negação absoluta do direito do proprietário a rever a sua propriedade. Mas há um debate maior que isso, seria o modo de produção empregado por ele o único válido? O MST tem o direito de ocupar todas as fazendas? O direito do proprietário se sobrepõe aos dos demais? O direito dos demais se sobrepõe ao do proprietário? Assim, pode haver uma ditadura de uma maioria? A resposta para todas as questões é não. Sara Araújo não propõe a destruição do latifúndio. Mas ela propõe uma nova maneira para o mundo, não é só latifúndio, é também a pequena propriedade, outros modos de produção que não somente o intensivo. É o Sul mais o Norte, e não um excluindo o outro, é abarcar todos os pensamentos e mostrar que não há somente uma verdade e um jeito de se viver em mundo em que predomine a ecologia de saberes. Assim, é compreensível que exista votos divergentes no julgamento, e devemos analisar cada um em sua perspectiva sem descartar nenhuma, mas defendendo as perspectivas que acreditamos serem mais justas. É isso que os desembargadores fazem em seus votos, tantos os dois que votaram contra a reintegração de posse e trazem argumentos constitucionais e humanitários favoráveis aos sem-terras em seus votos, quanto o desembargador que vota a favor da reintegração de posse alegando que o proprietário teve suas posses invadidas e assim, consequentemente,  seus direitos violados.  

Ricardo da Silva Soares-Noturno.

A DERROGAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS


  É imprescindível entender como a conjuntura jurídica moderna, através da linguagem e pelo discurso modernizado, demonstrado e explanado por Sara Araújo legitima e consolida os moldes sociais visíveis no mundo atual, ou pelo menos na realidade brasileira, estes moldes configuram-se num contexto dominante colonial e capitalista que derroga grande parte dos direitos individuais, traduzindo um sistema que torna primário o conteúdo técnico, em aversão às pretensões políticas e serve mais ao mercado capitalista que ao povo. Tal fato torna-se evidente pelo recurso de reintegração de posse julgado pelos desembargadores em corte de Passo Fundo – RS, do CRSJ. Embora a decisão dos desembargadores privilegia as perspectivas sociais, é importante notar a natureza do recurso e o voto do Des. Luís Augusto Coelho Braga que foi favorável ao deferimento do recurso.
O recurso foi movido pelo desejo da parte proprietária da Fazenda Primavera de reaver a posse desta, em razão da ocupação do Movimento Sem-Terra, que alegou a ausência de provas de utilização do território seja para agricultura ou qualquer atividade que tornasse clara a efetivação da função social da propriedade. Embora o ônus da prova não coubesse ao autor do recurso, nada foi entregue, o que legitimou a improdutividade da terra, e a falha quanto ao cumprimento da função social. Tal perspectiva é analisada sob um viés legal constitucional, de negligência quanto ao papel e a obrigação que tal propriedade deveria ceder à sociedade. O outro ponto a ser observado, não de menos importância, tange o fato de que este recurso demonstra o abismo social existente principalmente no que diz respeito a posse de terras. A proprietária do latifúndio é uma grande empresa agroexportadora, o MST é composto por pequenos agricultores familiares, o absurdo confronto judicial retrata uma realidade brasileira de desigualdade de classes e o predomínio imperialista que grandes negócios têm em detrimento de “meros mortais” pequenos agricultores.
Uma decisão favorável ao recurso representaria um grande descaso com relação a obrigatoriedade do direito de atendimento às demandas sociais e traduziria claramente a epistemologia do norte, evidenciada pela obra de Sara Araújo, sendo então uma corrente que privilegia o individualismo. Além do descaso já dito, não decidir à luz das observações sociais seria ceder a uma exegese da norma, retratado por uma interpretação frágil e estéril das normas jurídicas, que tornaria limitado o alcance da justiça. Estava confessa a inconstitucionalidade da posse da propriedade por parte dos autores do recurso, a justiça decidiu acertadamente, denegrindo e contrariando uma imagem individualista do direito moderno, garantindo que o clamor social fosse ouvido, ainda que isso dificilmente aconteça quando uma das partes é favorecida financeiramente.


Jonathan Toshio Maciel da Silva - 1° (Noturno)


É melhor morrer na luta do que morrer de fome. Essa é a frase mais famosa de Margarida Alves, trabalhadora rural e sindicalista assassinada a mando de latifundiários por lutar pelos direitos trabalhistas em plena ditadura militar. Oras, ela morreu em 1983, 5 anos antes da promulgação da nossa Magna Carta de 1988, poderíamos dizer que fazia parte de um contexto que não pertence mais ao nosso cenário de Estado Democrático de Direito, não é mesmo? Não, não podemos de forma alguma dizer isso, pois em Junho de 2019, Carlos Cabral Pereira, mais um trabalhador rural sindicalista, foi assassinado perto de sua residência. E não, não é um caso isolado, pois em 2017, a cada 6 dias, um ativista do campo era assassinado.
Veja bem, se lutar por direitos trabalhistas pode ser letal, imagina então ocupar a terra de quem muitas vezes é quem paga a bala que dá o tiro. É isso que o MST faz há décadas, ocupando, resistindo e acima de tudo, produzindo. Mas essa produção não interessa a grande máquina do sistema, porque o Brasil sempre serviu pra ser sugado até secar, primeiro no ouro, agora na terra e na água. Pra mandar tudo pro Hemisfério Norte, pros  países desenvolvidos, pra quem sabe, talvez, um dia, conseguirmos chegar a evolução deles, porque eles são a meta, claro.
Enquanto uma pessoa é dona de milhares de hectares de terra, pra exportar tudo que nela produz, milhares de famílias poderiam estar ali, cada uma no seu pedacinho, produzindo pra vender na cidade. Em qual das duas situações você enxerga patriotismo, meu caro? Poderíamos, inclusive, pensar: "coitado do fazendeiro, trabalhou tanto pra ter o dinheiro que tem, aí vem essas pessoas e roubam?" Vamos ignorar que provavelmente ele não trabalhou foi nada, herdou a terra do pai, que por sua vez herdou do avô e assim por diante... Vamos considerar que ele é muito esforçado e com o esforço conseguiu ficar rico, muito rico. Não é como se o MST fosse tirar ele da casinha dele, jogar ele na lama e deixar ele morrer de fome. 
Não é nenhuma Escolha de Sofia por parte do Estado, onde qualquer um que perder morre, pois o latifundiário pode até perder um pedaço dos seus milhares de milhares de metros quadrados de terra, que ás vezes ele nem usa, e, quando usa, usa mal, mas, quando você olha pro outro lado, aquelas famílias sem a terra, sem moradia, sem trabalho, estão sujeitas a fome e à criminalidade. O Estado, por décadas de “democracia”, nunca teve a coragem de enfrentar a questão por vias legais, mesmo que a Constituição preveja a reforma agrária, nem mesmo nas mãos de governos no quais a classe popular depositou esperanças de transformações, o porquê disso é evidente: trabalhador rural não financia campanha, latifundiário sim. O MST está buscando essa transformação com as próprias mãos, sendo demonizado e criminalizado, pois se ele esperar ação do Estado, ele vai ter que esperar sentado e com fome.
Os que argumentam contra os métodos do MST, devem acreditar muito que a Justiça é igual para todos, e por isso, não é necessário usar a força, a luta, o enfrentamento, pois só o Direito é suficiente. Então me digam: se o Direito é suficiente e serve a todos, quem matou Margarida Alves e Carlos Cabral Pereira? Em uma sociedade heterogênea, marcadas por injustiças históricas sangrentas que são legitimadas pelo poder judicial conservador que se curva aos interesses dos poderosos, os movimentos sociais têm que se fazerem vistos, têm que provar que nossa realidade não é a mesma da Europa e dos Estados Unidos e que temos que construir nossa própria história. O Direito até pode ser emancipatório, mas não é por natureza, para que ele seja emancipatório tem que ser moldado.


Lauriene Ellen Borges de Bem ( Noturno)