Antes de partir para uma análise que vise situar o caso ocorrido no plano de protagonismo dos tribunais, é importante entender o mérito da ação ajuizada contra o decreto do prefeito de Franca.
Em março de 2021 – mês em que o decreto do prefeito foi efetuado – o Brasil perdeu 66.573 vidas. Em uma reportagem da BBC News, dados mostravam que a cada cinco mortos por Covid em nosso país desde o início da pandemia, um deles tinha vindo a óbito no mês de março. Tendo isso em mente, surge a questão: Por que um juiz interiorano efetuaria uma decisão destilando desinformação no auge de um dos momentos mais trágicos da história de um país?
A resposta para tal
questão não é simples e passa pelo plano histórico da cidade de Franca. Um
local que certo dia foi o pólo industrial de sua região, hoje assiste
efetivamente aos efeitos da desindustrialização do país, sendo diretamente
afetada em uma situação constante de insegurança econômica e aumento
substancial da pobreza. Daí, surgem os efeitos observados na decisão de Carlos
Bonemer Junior, que utiliza dos mais vulneráveis como escudo para um discurso
negacionista e que, até certo ponto, deve ser analisado com cuidado pelo o que ele representa.
Em plena verdade, há de
fato um problema grave do ponto de vista administrativo em fechar
estabelecimentos bancários do dia para noite, uma vez que milhares de pessoas
possuem compromissos graves a serem cumpridos no pagamento de suas faturas e,
caso não os cumpram, sofrerão as conseqüências absurdas dos juros imorais dos
bancos brasileiros. Contudo, o debate acerca disso deve ser feito na
problematização da autonomia do setor financeiro em fazer o que bem quiser, não
em cima de uma decisão prudente que visa apenas salvar vidas.
Segundo Garapon, a
judicialização é um fenômeno político-social, e tal afirmativa pode facilmente
ser analisada no caso em questão. Quando um assunto de viés econômico e que
afeta diretamente o dono de um determinado negócio e todos aqueles que dependem
dele chega aos tribunais em um momento de crise, é escancarado o reflexo
político de um país em situação caótica de “nós e eles”.
Por fim, cabe salientar que até certa medida, Carlos Bonemer Junior efetuou em sua decisão a Magistratura do Sujeito, colocando-se no local de indivíduos que sofreram com a crise econômica que o país atravessou durante a pandemia. Utilizando de um discurso anti-ciência e propagando opiniões conservadoras, o juiz francano de fato efetua a defesa de um ponto e de um determinado grupo que seria colocado em situação de vulnerabilidade com a decisão da prefeitura. Com isso, mais do que evidente a questão do protagonismo dos tribunais em barrar até mesmo a voz do executivo, é colocada em perspectiva a questão complexa de nossa nação, que em pleno momento de crise é colocada contra a parede quando entre seus cidadãos existem aqueles que devem escolher entre se proteger e se alimentar. Quando se trata de Brasil, o buraco é sempre bem mais fundo.
Pedro Basaglia - Direito, Noturno.