Total de visualizações de página (desde out/2009)

sexta-feira, 20 de maio de 2022

A coercitividade e o fato social condicionados ao contexto social

   No poema “ Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa” do heterônimo Álvaro de Campos de Fernando Pessoa, destacam-se os seguintes versos:

“Não me queiram converter a convicção: sou lúcido.

    Já disse: Sou lúcido.”

   Tais versos elucidam a capacidade do autor de vislumbrar o fato social. A teoria do fato social foi elaborada pelo filósofo francês Émile Durkheim no final do século XIX. Segundo Durkheim, os fatos sociais moldam a maneira de agir das pessoas pela influência que exercem sobre elas, tanto pelas leis ou por meio dos costumes e tradições. Dessa forma, apesar de Álvaro de Campos ter a plena consciência de que é submetido a certas convicções não pode escapar delas uma vez que, involuntariamente, desde o momento do nascimento desse indivíduo ele já está cercado de inúmeras influências que exercem um certo tipo de coerção para que a moral seja preservada (teoria da coercitividade). Um exemplo disso é a coerção da sociedade perante aos indivíduos para que andem vestidos. Embora alguns indivíduos tenham a lucidez de visualizar que tal ação não passa de uma regra de efeito moral, sua quebra indica penalidade, configurando-se, desse modo, como uma coerção.

    Portanto, é nítida a influência da coercitividade e do fato social na sociedade contemporânea, visto que ambos são regulados pela conduta moral vigente da sociedade de um determinado contexto. Ainda hoje, o andar nu é visto com maus olhos, no entanto, com o desenvolvimento da sociedade, condutas morais aceitáveis no passado passaram a ser condenadas e até mesmo penalizadas, um exemplo disso é a escravidão. Dessa forma, pode-se concluir que a determinação do modo de agir das pessoas e a coerção da sociedade giram em torno dos padrões aceitos em determinados contextos.


Pai da Sociologia e suas análises


 

Émile Durkheim é considerado o “pai da sociologia”, por complementar a essa ciência elementos como a pesquisa quantitativa que embasa os estudos. Para tanto divide sua metodologia sociológica em: primeiramente analisar os fatos sociais como coisas e posteriormente reconhecê-los em razão da coerção que exercem sobre os indivíduos, ou seja, separação entre pensamento e realidade.

Crítico à análise ideológica, parte das ideias para as coisas, considerando que pré-noções obstaculizam a busca pela verdade científica. O conceito de fato social como “coisa”, remonta a Comte, entretanto para Durkheim Comte apela para uma noção metafísica, visto que este se distancia da verdade sociológica por valorizar a ideia sobre a história e não a história em si.

O fato social para Durkheim se caracteriza por ser todo aquele que independe do indivíduo e tem como substrato o agir do homem em sociedade, de acordo com as regras sociais.  De tal modo para manter a norma social se utiliza a resistência seguida pela reação punitiva, para evitar que o equilíbrio se rompa e evitar a anomia (ausência de lei ou regra). Para tanto é papel da educação forjar o ser social, lhe incutindo regras que aos poucos de forma resignada são incorporadas tornando-se natural para o indivíduo; considerando que para Durkheim, o homem seria um animal bestial e que só se tornou humano na medida em que se tornou sociável.

Por isso há uma “causalidade eficiente” que explica qualquer fato, assim determinado fenômeno social cumpre determinada função dependendo da sociedade que analisamos. Sentimentos e pensamentos comuns não são frutos de percepções gerais, mas sim de uma dinâmica social que orienta e os predispõem – reprodução de um modelo coletivo.

Os fatos sociais não se vinculam exclusivamente à satisfação de necessidades sociais imediatas, assim pode considerar que instituições e/ou práticas sociais não surgem do nada, mas sim da necessidade de causas eficientes que se vinculam ao ordenamento geral do organismo social. A exemplo disso pode-se considerar o crime como sendo necessário à vida social por possuir uma causa eficiente, que é a aplicação de normas a atos que parecem nocivos ao grupo social. De tal modo pode-se conceber a normatividade, esta que “não consiste em servir, mas em não prejudicar”.

Durkheim também caracteriza a solidariedade mecânica e orgânica; a primeira caracteriza sociedades pré-capitalistas, nas quais há um baixo grau de consciência uma vez que predomina em termos de coesão social, uma consciência coletiva que controla a sociedade, baseada nas tradições, nos hábitos e na moral. Já a segunda é aquela que resulta de uma alta divisão social do trabalho, nestas diferenças se impõem, interdependência gerada pela especialização do trabalho no modo de produção capitalista.


Clara Letícia Zamparo 

1° ano direito - matutino