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sexta-feira, 19 de abril de 2024

A atualidade do marxismo no campo jurídico

 O método materialista histórico, desenvolvido por Karl Marx e Friedrich Engels em seus mais diversos escritos, compreende que as relações sociais são determinadas por uma luta de classe em que uma, sendo dominante, exerce o poder de opressão sobre a outra, considerada dominada. Esse processo não é estanque, está sempre em movimento, já que, a partir da concepção dialética (esquematizada por Hegel, mas reelaborada pelo pensamento marxista), a síntese, formada do embate entre a  tese e a antítese, faz com que a sociedade esteja sempre na iminência de revoluções que destronem o status quo vigente.

Na área jurídica, observamos que, por exemplo, esse embate entre classes acontece acerca dos direitos e deveres da população de uma determinada sociedade. Enquanto há advogados, juízes e juristas que perpetuam, através da interpretação de leis, um viés machista, homofóbico, racista e preconceituoso sobre o ordenamento jurídico, existem aqueles que, em contraposição à logica patriarcal e capitalista, lutam para que pessoas pertencentes à classe oprimida tenham a garantia e ampliação de seus direitos. Ao entrarmos em contato com o noticiário contemporâneo, nos deparamos com uma atuação organizada e massiva do primeiro grupo, gerando a interpretação de que não há espaço para os representantes da classe operária e suas intersecções, em especial os identificados com o marxismo, mas ao ver a organização destes em debates, simpósios e demais atividades acadêmicas, compreendemos que o ideal socialista ainda está em atividade.  

A palestra do CADir (Centro Acadêmico de Direito da UNESP do campus de Franca), ocorrida no dia 11 de Abril de 2024 em comemoração aos 30 anos da agremiação, é um exemplo recente de como o marxismo está presente no âmbito jurídico. Os palestrantes, 4 pessoas que já passaram pelo centro acadêmico, compartilharam suas vivências políticas pós-vida universitária na defesa de direitos de uma população inserida, no contexto da luta de classes, no lado oprimido dentro do processo capitalista de modo de produção, desde o ativismo em favor da população LGBT até a atuação como político. Dessa forma, o encontro acadêmico propiciou um retrato de como o socialismo pode ser aplicado na atuação do jurista nos mais diversos campos de forma factível e materialista, afastando a falsa impressão ideológica do marxismo que parte da sociedade possui.


Daniel Nobre Fernandes da Silva  RA: 241221072


 A aristocracia científica e o espaço do conhecimento no âmbito social contemporâneo. (A ciência e a imaginação sociológica).

O renascimento cultural e urbano no início da Idade Moderna ressuscitou o conhecimento científico na sociedade clássica até então submersa na cultura religiosa medieval. Paradoxalmente, na era contemporânea, esse fenômeno se apresenta às avessas: uma sociedade evoluída no que tange ao progresso científico, no entanto, carente de senso crítico. Nesse viés, a curiosidade capaz de gerar revoluções da intrínseca ao ser humano foi substituída, infelizmente, pelas crendices populares largamente disseminadas nos meios sociais. Assim, o papel da ciência no mundo contemporâneo está em processo de defasagem.

Em princípio arguitivo, é nítida a relevância do progresso técnico para a sanidade do homem. No contexto da antiguidade clássica, o célebre filósofo grego Aristóteles foi um dos primeiros a executar a ciência natural em sua forma mais crua por meio da aplicação do método científico e da Teoria das Quatro Causas. Em ampliação, as heranças do anseio pelo conhecimento levaram a humanidade à evolução técnica tangível no contexto hodierno ao possibilitar, gradualmente, condições sadias de existência para o coletivo resultantes do progresso nas pesquisas das diversas áreas do conhecimento. Logo, é evidente que a ciência está no cerne da evolução antrópica.

No entanto, a alienação social resultante da precarização do alcance da ciência no mundo contemporâneo denota o caráter quase aristocrático do acesso ao conhecimento. Tal fenômeno é ilustrado na célebre obra “Campo Geral” de João Guimarães Rosa, na qual o protagonista, Miguilim, é constantemente discriminado durante o enredo e considerado “abobado” e “imprestável” devido às suas limitações de caráter corporal. Fora da ficção, muitos, assim como Miguilim, são vítimas das crenças populares e valem-se de informações equivocadas para solucionar questões de caráter científico; infelizmente, em muitos casos, essas fontes disseminam falácias prejudiciais ao bem coletivo, ocasionando uma crise informacional decorrente do apagamento do conhecimento sistematizado no âmbito social.

Portanto, fica claro que a ciência exerce um papel ambivalente na esfera coletiva porque, ao passo que ela é vital para o bem-estar da humanidade, o acesso a ela se restringe às elites intelectuais. Por conseguinte, infere-se que a Filosofia Aristotélica está fadada ao apagamento no momento em que os “Miguilins” são privados do saber científico. Dessa forma, a humanidade urge por um renascimento da ótica científica.


Existe lugar para o Marxismo na formação e atuação do jurista?

Existe lugar para o marxismo na formação e atuação do jurista e este é de extrema importância. Isso, porque é inegável a relevância da perspectiva marxista para a reflexão sobre as desigualdades sociais e econômicas, assim como para identificar formas de combatê-las, destacando a influência da luta de classes na vida de toda a sociedade. A busca pela igualdade deve ser o foco do que é fazer justiça e, por isso, está ligada à formação e à atuação jurídica. Além disso, essa mentalidade se associa de forma intrínseca à área de formação e atuação do jurista, pois, segundo Marx, cabe ao método a compreensão da realidade para que seja possível transformá-la, refletindo um pensamento prático e empirista, assim como a ciência do direito, que também possui um caráter prático.


Essa relação entre o jurista e o pensamento marxista pode encontrar espaço nos movimentos estudantis, os quais lutam por maior representatividade e, principalmente, por igualdade, muitas vezes sob a influência do marxismo, que enxerga a realidade como um movimento permanente. Grupos como o CADir, a União Estudantil e o Afronte levantam questões extremamente relevantes para a vida do estudante, incluindo a do jurista. São movimentos que visam à transformação e à melhoria das condições de vida, estimulando a crítica e a não conformidade. Esse caráter transformador fica evidente na palestra organizada pelo CADir, que trouxe representantes de diversos caminhos possíveis a serem seguidos pelos juristas, demonstrando na prática essa busca por mudança através do próprio direito, do ativismo e da política.


Vale ressaltar que o caráter transformador e marxista do pensamento que se pode ter nesses movimentos citados não precisa se limitar ao ambiente universitário, mas também pode e deve ser aplicado no campo profissional do jurista. A luta de classes e as condições materiais de existência devem ser levadas em conta como princípios da sociedade em que vivemos e, portanto, devem ter lugar nas considerações e reflexões na área do direito. 

 

Raquel Freitas Colaço- 1º ano noturno

 

EXISTE LUGAR PARA O MARXISMO NA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DO JURISTA?

        As contradições da sociedade capitalista são de conhecimento geral e as consequências desse sistema econômico colocam em evidência a necessidade de um pensamento crítico, sendo de viés marxista ou não. Tais contradições foram expostas na Semana Inaugural de Direito, na qual temas como acesso a terra, direitos de minorias representativas e violência – de gênero até da abordagem policial – contribuíram para pensar o Direito como instrumento de justiça social e defesa das classes menos favorecidas.

      Dessa forma, o Marxismo pode se colocar como base teórica para o jurista fundamentar-se, uma vez que ela é uma corrente teórica que tenta promover uma sociedade mais igualitária e justa. No entanto, sendo o Direito um campo muito diversificado, as aplicações da teoria marxista devem ser tratadas em questões que afetam diretamente a sociedade – como direito do trabalho, direitos humanos, direito ambiental e direito de propriedade –, buscando, dessa forma, uma mudança social.

     Somado a isso, o pensamento marxista deve servir de estímulo não só para que mudanças sociais realmente se concretizem, mas também para evitarmos utilizar a dogmática jurídica a todo o tempo. As interpretações da realidade não devem ser baseadas unicamente nos padrões da norma jurídica, mas sim no pensamento crítico do jurista, que deve relacionar a compreensão da realidade social e os preceitos jurídicos. No entanto, é preciso ressaltar a dificuldade do acontecimento de mudanças realmente radicais por meio das instituições jurídicas se não houver uma seleção mais eficaz dos magistrados. Os juristas devem, necessariamente, conhecer o contexto histórico-social do meio no qual se insere, pois, todo fenômeno jurídico está ligado às relações de classes. Nada está imune à dinâmica social e, assim afirma Karl Marx em "Contribuição para a Crítica da Economia Política": "A produção das ideias, das representações e da consciência está inicialmente entrelaçada com a produção material."

Marxismo e a esfera jurídica

Em primeiro lugar, é necessário compreender de que modo a sociologia marxista interpreta a posição do homem no mundo e a sua intrínseca relação com o desenvolvimento social e a contribuição para o progresso da sociedade civil em âmbitos político e econômico. Para Karl Marx, a ciência sociológica estaria ligada a uma concepção materialista da história, de modo que a dialética materialista, ou seja, as condições materiais de existência, seria o ponto de partida da humanidade. Assim, em contraposição ao idealismo alemão, o marxismo possibilita a ascensão da óptica do indivíduo como único ser vivo capaz de produzir e aprimorar os meios de produção.

Diante disso, as contradições engendradas pelos meios de produção, como a relação entre capital e trabalho, teriam como plano de fundo o Direito: reflexo da condição dos meios de produção e expressão das relações de produção anteriores. A ascensão dos direitos pós-abolicionistas, por exemplo, refletiu não apenas a transição do modo de produção escravista colonial para o capitalismo, mas também a recém mudança de pensamento no plano jurídico. Ainda que não houvesse grandes avanços que garantissem, na realidade, segurança jurídica, a substituição da legislação que amparava e constitucionalizava a escravidão pela garantia de direitos fundamentais ao ser humano aniquilou a legitimação de um sistema retrógrado e bárbaro.

Sob esse prisma, o jurista encontra, na utilização da lógica marxista, a missão de construir uma formação profissional que esteja comprometida com a realidade social e o contexto histórico que nela está inserido. Para Karl Marx, o Estado é uma expressão apenas da classe burguesa, que detém a perpetuação do poder nas mãos da elite e a ilusória representação universal do interesse coletivo. Assim, o papel do jurista, que deve manter a consciência de atingir o objetivo máximo do Direito, que é a justiça e a harmonia social, é de transformação, a partir da visão crítica, racional, acessível e objetiva, distanciando-se do idealismo que perpetua estruturas opressivas, excludentes e desiguais.

Portanto, a visão marxista no meio jurídico é de grande relevância, na medida em que proporciona a compatibilidade entre realidade social e o estudo do Direito, impondo a necessidade da conquista da emancipação humana e o fim da exploração entre indivíduos e da miserabilidade engendradas pelo capitalismo. Desse modo, o mundo igualitário presente no discurso burguês seria verdadeiramente atingido, quebrando-se a utopia e a alienação com a inovação de um Direito que visa o estudo da realidade e, consequentemente, a formulação de leis que atendam o desejo da coletividade e visem o bem comum.


Caroline Garrido Portella / 1°Ano Direito Noturno / RA: 241224391

O capitalismo flexível - uma análise crítica do trabalho a partir de Marx e Sennett

    Karl Marx em “A ideologia alemã” destaca a fixação da atividade social como um tipo de dominação presente no desenvolvimento do capitalismo, e como um aspecto fundamental que marca a vida do indivíduo. Para Marx, a divisão do trabalho acentua a diferença/contradição entre interesse particular e interesse coletivo. É visível que o sociólogo destaca a “cooperação” forçada, não voluntária do indivíduo. Além disso, na visão de Marx, cada um tem uma atividade exclusiva que lhe é imposta, que limita a sua atuação, sua criatividade e suas percepções individuais em prol do interesse coletivo. Dessa forma, há um sacrifício por parte do homem enquanto “ser social”. Marx destaca:

[...] O trabalhador só se sente, por conseguinte e em primeiro lugar, junto a si [quando] fora do trabalho e fora de si [quando] no trabalho. Está em casa quando não trabalha e, quando trabalha, não está em casa. O seu trabalho não é portanto voluntário, mas forçado, trabalho obrigatório. [...] (MARX, 2004, p. 82-83)

    Sob esse viés, a obra “A corrosão do caráter” de Richard Sennett denuncia muito bem a visão do trabalho em uma sociedade capitalista cujo labor tem o objetivo de “servir à família”, ascender socialmente, conquistar status – objetivos esses que somos coagidos a alcançar e em decorrência, fazemos o próprio sistema capitalista perpetuar-se. Em contraposição a Marx, Sennett destaca a flexibilização do trabalho, no que se refere a falta de fixação da tarefa, ao dizer que “Rico não tem um papel fixo que lhe permita dizer aos outros: “É isto que eu faço, é por isso que sou responsável”. No entanto, essa flexibilização, não só do trabalho, mas também do tempo, leva a corrosão do caráter pois este também é flexibilizado. Rico é um homem que vê os valores de confiança, solidariedade e lealdade serem corroídos pelo capitalismo flexível.

    Assim, o sacrifício do “ser social” indicado por Marx é representado nos dias de hoje não só pela exigência do mercado nas tarefas de curto-prazo – que se traduzem com o ataque a burocracia e a disciplina do tempo (esta também apontada por Sennett) –, mas também pela renúncia a criação de laços fortes com as pessoas. A “liberdade” promovida pelos patrões, através da flexibilidade, e sentida com o tempo pelo trabalhador, logo faz este notar que os vínculos duradouros com os colegas de trabalho não são relevantes ao sistema capitalista. As tarefas devem ser realizadas apenas em prol da coletividade, dos ganhos do próprio capitalismo – não há espaço para o desenvolvimento de relações emocionais e sim para a superficialidade.

     Com isso, podemos concluir que a valorização da flexibilidade, aliada a perda de caráter dos homens, representa a decadência do sucesso profissional e pessoal a longo prazo. A “liberdade” sentida é uma ilusão criada para movimentarem as empresas e beneficiar a ordem capitalista, em prejuízo do trabalhador, o qual reconhece a falta de objetivo em suas ações no trabalho, além do constante pensamento de insucesso no ambiente corporativo e no pessoal.

Influência do meio material sobre o indivíduo.

    Ao relacionar o livro "A ideologia alemã" de Marx e Engels com a situação de Rico na obra "A corrosão do caráter" de Richard Sennett, observa-se que Enrico, com a acumulação física e material, adquiria sentido à sua vida. Além disso, o ambiente, o próprio meio em que estava inserido regia sua personalidade, caráter, comportamento, forma de agir e seus costumes, ou seja, o modo de vida citado por Marx. 

   No âmbito capitalista, o indivíduo cria uma intensa relação entre sua produção e sua vida, e com o acelerado mercado contemporâneo, é nítida a perca da individualidade e confiança causada pela constante movimentação e instabilidade das relações do mercado. Nesse cenário, Sennett cita a impaciente condição de capital, na qual o retorno do investimento é o que importa, e nada mais, criando assim, um cenário de insegurança em todos os âmbitos. Sendo assim, a lealdade e o compromisso mútuo demoram para se estabelecer no caráter dos indivíduos, o que quebra os laços pessoais.    

   Ademais, em um ambiente transitório e diverso, a alienação vinda da classe superior, enunciada pelo marxismo, afeta todos do meio ali presente, criando padrões de comportamento incoerentes com a realidade em que estão inseridos, incluindo preconceito, intolerância e opressão. Aquilo que era pertinente à personalidade individual se tornou estático, preso a uma afirmação de valores impostos num cenário capitalista globalizado e estabelecido. De tal modo, cria-se uma contraposição entre caráter e experiência temporal, a qual é muito válida.

   Portanto, a atividade dos homens no capitalismo são uma verdadeira manifestação de suas vidas, ligados a como são produzidas e os meios utilizados são intrinsecamente correlacionados ao modo de vida em todos os aspectos no contexto capitalista.

Autor: Arthur Fernando Bento Costa          1º Ano - Noturno

RA: 241224659