Este é um espaço para as discussões da disciplina de Sociologia Geral e Jurídica do curso de Direito da UNESP/Franca. É um espaço dedicado à iniciação à "ciência da sociedade". Os textos e visões de mundo aqui presentes não representam a opinião do professor da disciplina e coordenador do blog. Refletem, com efeito, a diversidade de opiniões que devem caracterizar o "fazer científico" e a Universidade. (Coordenação: Prof. Dr. Agnaldo de Sousa Barbosa)
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sábado, 3 de setembro de 2011
É preciso ainda acreditar
"A justiça tarda, mas não falha"?
Percepções de justiça
Eu acredito que a frase “alguma justiça é melhor do que nenhuma” serve muito bem pra descrever o sentimento de quem foi vítima de alguma situação em que o responsável pelo ato desagradável não recebeu as devidas consequências na visão da vítima.
Entretanto a justiça de que a frase fala na minha concepção deve ser a justiça aplicada pelo Estado, ao julgar e prender o responsável pelo ato ilícito. A justiça feita pelas próprias mãos, como por exemplo, quando vemos, principalmente, em programas sensacionalistas criminosos sendo espancados pela população. Essa forma de se fazer justiça apesar de eu ser contra acho totalmente compreensível a raiva que a população sente pelo ato que o criminoso fez, não necessariamente raiva contra o criminoso, mas raiva contra a situação, contra a ação.
A partir do momento no filme em que o personagem principal começa a ir fazer justiça com as próprias mãos no calor do filme podemos até a chegar a pensar que o que ele estava fazendo era válido, mas ao começarmos a analisar o que ele fez de forma mais técnica, nos voltando novamente para um pensamento mais racional chegamos à conclusão de que ele estava errado. A justiça que seu país poderia fazer contra os dois meliantes já tinha sido tomada, não cabia mais a ele querer fazer um jogo de crimes e perseguições e assassinatos para fazer o que seria sua própria concepção de justiça. Outro ponto que também me força a pensar que essa forma de se fazer a justiça a partir de suas ideais não é correto, é que somos, por exemplo, no Brasil, para dar um exemplo numérico pequeno se considerado com o resto do mundo, cerca de 200 milhões de pessoas no país. Caso cada um desses 200 milhões de indivíduos fossem atrás de fazer a partir da sua própria concepção a sua justiça não conseguiríamos ter o que chamamos de Estado, pois é o Estado o detentor do monopólio da força, é ele que deve regrar a sociedade, e não cada um escolhendo o que e como seguir.
Assim finalizo dizendo que a frase é válida, mas que se consiga ter percepção e tato para saber de forma mais racional avaliar se a decisão do Estado, que é o responsável por julgar as ações “erradas” é a mais justa possível, a partir duma síntese dos fatos ocorridos.
O direito sempre foi uma matéria polêmica, e não seria por menos, já que ele é dele a responsabilidade de regular a vida em sociedade e de punir os que não regem sua vida de acordo com essas regras. Mas a polêmica não advém somente disso, ela advém principalmente do fato de essas regras nem sempre serem perfeitas.
O direito positivado nos códigos e na constituição de cada país, por mais que busque alcançar a perfeição, frenquentemente sofre de uma ou outra contradição. Assim surgem brechas no sistema, surgem leis que se opõem, surgem ambigüidades, interpretações distintas de uma mesma norma. Isso torna a realidade da justiça complicada de ser posta em prática, e é disso que o filme “Código de Conduta” trata.
No filme, Clyde, um pai de família, testemunhas dois bandidos adentrarem sua casa e um deles matar sua esposa e filha. Após a tragédia, ele resolve buscar refúgio no sistema judicial, esperando ali encontrar a justiça de que precisava, mas um dos bandidos acaba saindo quase que impune.
Essa é uma situação comum no dia a dia de uma sociedade, por falta de evidências concretas, ou devido às imperfeições do direito e do sistema judicial, muitos criminosos acabam não recebendo a devida punição, o direito acaba atuando como “arte do possível”, faz-se o que se pode fazer dentro da lei, e nada mais. Mas na maioria das vezes, e principalmente em se tratando de crimes que chocam a população, essa pouca punição gera uma revolta muito grande, gera um clamor por justiça, pela justiça que o sistema judicial, com toda sua racionalidade, não pôde conceder.
Em “Código de Conduta”, é esse clamor, é esse desejo de que a punição seja aplicada, que leva o personagem a lutar contra todo o sistema de justiça, passando por cima de todos os que se opuserem a isso. No Brasil, podemos tomar como exemplo alguns casos em que uma grande repercussão social contribuiu para manter presas pessoas sem provas concretas suficientes, é o caso da morte da menina Isabella e do assassinato de Eliza Samúdio.
No entanto, tais decisões são sempre polêmicas, pois, ao mesmo tempo em que se pode incorrer no erro de se liberar um bandido, pode ocorrer também de se deter um inocente. Tal é a responsabilidade que cabe ao sistema judicial e ao direito em si, que para poder lidar com o encargo de regular toda uma sociedade, não poderia se dar ao luxo de não encontrar pedras como essas pelo caminho.
“Meia” justiça está bom para você?
Partindo da ideia de que o injustiçado tem o direito de cobrar justiça de forma racional, isto é, utilizando o sistema jurídico; ele pode adquiri-la totalmente, não obter nada, ou conseguir parte dela.
Se conseguir, racionalmente, a justiça por inteiro: perfeito! Está satisfeito. Se, no entanto, não obter nada pelo meio racional, possivelmente, a emoção toma conta das suas atitudes a fim de conquistar a justiça anteriormente negada. Se essas ações passionais ultrapassarem o limite do direito dos outros, o autor delas deve responder pelas consequências das mesmas.
Se, em outro caso, o injustiçado conseguir, através do Direito, apenas “meia” justiça, um sentimento de ausência da plenitude desejada é inevitável. Oras, se os elementos judiciais permitem a “meia” justiça, o injustiçado sente-se duplamente lesado; já que, além de sofrer o dano, ainda é traído pela imperfeição do sistema jurídico que foi incapaz de atendê-lo da maneira esperada. Sendo assim, o indivíduo desacredita no sistema jurídico e perde a certeza de que agir racionalmente é a forma adequada de buscar justiça. A partir desse momento, quando a racionalidade (aqui representada pelo Direito) perde seu crédito, o injustiçado permite que a emoção busque a justiça que a razão não lhe proporcionou.
Vale ressaltar que, alguns pulam a etapa da racionalidade e deixam a emoção assumir, primeiramente, suas atitudes em busca daquilo que consideram justiça. Alguns, simplesmente, acreditam que a razão não lhes proporciona a justiça que almejam. No filme, Código de Conduta, por exemplo, o injustiçado (Clyde) optou, inicialmente, pela racionalidade. Contudo, o Direito, devido à prioridade que o promotor (Nick) destinava ao seu sucesso profissional, ofereceu-lhe “meia” justiça frustrando suas expectativas racionais.
Clyde diz que, independentemente do resultado, preferia seguir processando os dois criminosos (Ames e Durby) a aceitar o acordo com um deles. Ele poderia suportar a perda judicial, mas não o acordo. Ou seja, ele poderia sofrer os danos causados pelos criminosos, mas não suportaria ser lesado por aquele que deveria defendê-lo: o sistema jurídico. Não suportaria receber a “meia” justiça que o Direito lhe oferecia. Ele queria ao menos tentar conquistar uma justiça completa. Clyde, então, dá espaço para a emoção e, por meio dela, pretende, além de realizar a sua justiça, demonstrar a imperfeição do sistema jurídico.
É difícil julgar as ações guiadas pela emoção de uma pessoa que se frustrou com os meios racionais. Se estes são ineficazes ou limitados, aquela é a alternativa que resta. A pessoa, já abalada pela situação danosa, ainda é golpeada por aquele que considerou (e que deveria) ser seu suporte, seu apoio, seu “justiceiro”. Ela sofre duas vezes, sendo a segunda vez caracterizada por frustração e decepção. Claro que no filme, Clyde faz barbaridades hollywoodianas e perde todos os escrúpulos, desenvolvendo uma obsessão doentia e, portanto, deve ser responsabilizado. Mas diante do caso em questão, quem conseguiria se conformar com essa “meia” justiça que a razão oferece?