Cumpre, inicialmente, salientar que Marx, na obra “O Capital”, em seu capítulo XIII, diferencia manufatura da grande indústria, com o objetivo de demonstrar que esta última se apresenta como base mais adequada ao processo de valorização do capital. Faz-se mister reproduzir alguns trechos da obra a fim de compreender essa diferença apresentada por Marx.
"Na manufatura os trabalhos se distribuem em conformidade com a escala hierárquica das capacidades e das forças, segundo o que exija o emprego dos instrumentos de trabalho e o maior e menor grau de virtuosismo necessário."
"Ao contrário disso, na fábrica o esqueleto do mecanismo coletivo consta de diferentes máquinas. Cada uma das quais cumpre particulares e diferentes processos produtivos que se sucedem um ao outro e são necessários em todo o processo de produção. Neste caso, não há uma força de trabalho particularmente escalonada, que utiliza, como o virtuoso, um particular instrumento de trabalho; senão que, pelo contrário, um instrumento de trabalho necessita de serventes especiais e constantemente atentos a seu trabalho. No primeiro caso, o trabalhador se serve de um particular instrumento de trabalho; no segundo, ao contrário, particulares grupos de trabalhadores estão a serviço de máquinas diferentes que desenvolvem processos particulares;".
Por isso, acrescenta Marx, "a escala hierarquia de capacidades, que em menor ou maior medida caracteriza a manufatura, não tem mais razão de ser;"
Sendo assim, prossegue Marx, o que caracteriza a produção na grande indústria "é a nivelação geral das operações, de modo que o deslocamento dos trabalhos de uma máquina a outra pode verificar-se em tempo muito breve e sem um adestramento especial;".
"Na manufatura, a divisão do trabalho exige o fato de que certos trabalhos necessários só podem ser realizados e, em conseqüência, nesse caso deve verificar-se, não somente uma distribuição, senão também uma efetiva divisão do trabalho entre grupos especialista;".
Nota-se, assim, que a manufatura e a grande indústria se apresentam como formas antagônicas de produção capitalista, haja vista que a primeira funda-se numa forma de divisão subjetiva do trabalho, enquanto que a segunda é a negação do princípio subjetivista do processo de trabalho. Este, por conseguinte, racionaliza o processo de trabalho, a fim de adequar, este processo, ao sistema de reprodução e valorização do capital.
Nessa esteira, verifica-se que, contrariamente ao que ocorria anteriormente, os meios de produção empregam o trabalhador.
Por isso, assiste-se a uma verdadeira revolução no processo de trabalho: os instrumentos simples de trabalho operados pelo trabalhador da manufatura transformam-se em máquinas.
Impende conceituar o que são máquinas para Marx, em que esta é "igual a qualquer outro desenvolvimento da força produtiva do trabalho, ela se destina a baratear mercadorias e a encurtar a parte da jornada de trabalho que o trabalhador precisa para si mesmo, a fim de encompridar a outra parte da sua jornada de trabalho que ele dá de graça para o capitalista. Ela é meio de produção de mais-valia."
Ademais, a socialização do trabalho na manufatura constituía-se por meio da combinação de distintos órgãos do trabalhador coletivo; na grande indústria, pelo contrário, especializam-se nas máquinas e seu trabalho coletivo. Na grande indústria, as atividades particulares de um dado processo de trabalho estão submetidas a uma unidade técnica baseada em princípios técnico-cientificos.
Como resultado, o capital criou uma base material adequada à sua produção-reprodução. A criação dessa base material é analisada por Marx nos seguintes termos: "com a maquinaria, o meio de trabalho adquire um modo de existência material que pressupõe a substituição da força humana por forças naturais e da falta empírica pela aplicação consciente das ciências da natureza. Na manufatura, a articulação do processo social de trabalho é puramente subjetiva, combinação de trabalhadores parciais; no sistema de máquinas, a grande indústria tem um organismo de produção inteiramente objetivo, que o operário já encontra pronto, como condição de produção material. Na cooperação simples e mesmo na especificada pela divisão do trabalho, a supressão do trabalhador individual pelo socializado aparece ainda como sendo mais ou menos casual. A maquinaria, com algumas exceções a serem aventadas posteriormente, só funciona com base no trabalho imediatamente socializado. O caráter cooperativo do processo de trabalho torna-se agora, portanto, uma necessidade técnica ditada pela própria natureza do próprio meio de trabalho".
Outro fator abordado por Marx refere-se à produção em massa, própria da grande indústria, que exige o emprego em grande escala das forças da natureza, que serão, posteriormente, transformadas em agentes do trabalho social. Assim sendo, a ciência torna-se um poderoso fator de produção de mais-valia, na medida em que o processo de trabalho é comandado pela aplicação consciente de princípios técnico-científicos. Por conseguinte, a grande indústria representa uma ruptura radical com essa forma de conhecimento.
Ressaltam-se, ainda, quais são as conseqüências da mecanização do processo de trabalho sobre a classe trabalhadora, quais sejam: o encarecimento da vida do trabalhador e sua família e o aumento intensivo e extensivo da jornada de trabalho.
A mecanização do processo de trabalho tem como contrapartida imediata a apropriação de forças de trabalho suplementares pelo capital. É o que esclarece Marx na passagem onde ele diz que "esse poderoso meio de substituir trabalho e trabalhadores transformou-se rapidamente num meio de aumentar o número de assalariados, colocando todos os membros da família dos trabalhadores, sem distinção de sexo nem idade, sob o comando imediato do capital". Como resultado desse processo de proletarização da família do trabalhador tem-se o encarecimento de sua reprodução.
A exploração direta do trabalho familiar se constitui num poderoso meio de aumento da mais-valia, pois o trabalho da família, em vez de apenas o do seu chefe, permite ao capital contar com vários dias simultâneos de trabalho em vez de apenas um, e, assim, romper com os limites naturais do dia de trabalho de um único individuo. Com relação a este fato Marx é bastante claro quando diz que, "dada a duração da jornada de trabalho, a massa de mais-valia só pode ser aumentada por meio de um aumento no número de trabalhadores".
Como consequencia da participação da família no processo produtivo, tem-se a deteriorização da qualidade de vida, haja vista as condições a que estas estavam submetidas (excessiva jornada de trabalho, má alimentação, falta de higiene, acidentes de trabalhos, etc.).
Necessário se faz, por fim, discorrer sobre as relações sociais no que concerne ao recrudescimento dos conflitos entre a burguesia, que detinha os meios de produção, e o proletariado, que detinha a força de trabalho. Inicia-se, assim, a luta entre capitalista e assalariado, que se agita por todo o período manufatureiro. Todavia, somente a partir da introdução da maquinaria é que o trabalhador combate o próprio meio de trabalho.