Boaventura de Sousa Santos tem como um dos temas principais de seu livro “Para uma revolução democrática da justiça" a universalização do acesso à justiça. Por uma perspectiva contra-hegemônica, ele estabelece a necessidade de se enxergar o Direito como ferramenta para mobilização social, disponível para o uso da população em geral e não somente como um objeto de estudo e uso de seus operadores.
A concretização da mudança na função que o Direito exerce na sociedade passa por uma série de etapas. Entre elas, a ampliação de medidas de acesso ao Direito popular, a reforma da dinâmica processual da justiça e a transformação do ensino jurídico. Essa última sendo especialmente essencial visto que o alicerce de toda e qualquer mudança no sistema jurídico começa pelo ensino de seus operadores. Transformar a forma de ensino e aprendizado do Direito, tornando-o menos exclusivo e elitista, é crucial para que esse sistema incorpore as demandas que acompanham as mudanças sociais.
Entretanto, apenas a transformação do ensino jurídico não é suficiente para uma verdadeira popularização do Direito. A aproximação do sistema jurídico como um todo da população geral, que não é inserida diretamente neste contexto, é igualmente essencial para que essa transformação ocorra. É necessário conectar o Direito a aqueles para os quais ele existe e atenuar os mecanismos que impedem essa conexão. Realizar a emancipação da ideia hegemônica de que o direito pertence apenas ao grupo seleto de pessoas que o sabem interpretar, começando pela linguagem praticamente inacessível aos que não fazem parte do dia a dia jurídico.
A popularização da justiça pode levar ao fenômeno colocado por Boaventura como juridificação da vida social, que acaba trazendo uma sobrecarga ao sistema judiciário e consequentemente afeta a velocidade com a qual a justiça é oferecida. Porém, em alguns casos e talvez no começo de um processo de institucionalização de mudanças sociais isso se faça necessário.
A exemplo de institucionalização de mudanças sociais, pode-se citar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4275, que dá a pessoas transgênero o direito de substituição de nome justificada apenas por autodeclaração. O envolvimento de parte do judiciário, neste caso o STF, na concretização de medidas que aproximam o Direito daqueles que ainda não o tem completamente é uma ilustração da popularização do sistema de justiça.
Vale frisar, porém, que muitas dessas medidas só são concretizadas pelos operadores do direito graças a mobilização social que as antecipa. É justamente a articulação de grupos de diversas origens - institucionais ou não - como movimentos sociais ou a própria Defensoria Pública, que trazem essas pautas para o sistema jurídico e possibilitam, mesmo que minimamente, a conquista de uma justiça mais democrática.
Victoria Dote Rozallez da Costa
Turma XXXVIII Matutino
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