As bases do pensamento moderno, estabelecidas pelas revoluções racionais de pensadores como Descartes e Bacon, foram de extrema importância para o avanço da ciência e da sociedade. O desenvolvimento do método científico permitiu sistematizar a produção de conhecimento, um conhecimento comprovado experimentalmente e feito útil para a sociedade.
No entanto, hoje em dia não é difícil encontrar profissionais e especialistas, supostos homens e mulheres da ciência, expelindo opiniões e teorias insanas, ora de seus próprios campos, ora de outrem. Teorias que seriam facilmente contestadas com a mínima aplicação de um rigor científico, ou identificando os tropeços lógicos em seu desenvolvimento, ou com a simples observação de que as implicações de tais teorias não se sustentam no mundo real.
Como pode isso acontecer tanto nos tempos modernos? Tempos em que muitos dispõem de incríveis ferramentas para a obtenção de informações, para a comunicação com pessoas tão diversas quanto desejarem? A simplística resposta de acusar todas essas pessoas de estarem agindo em má-fé ou serem ignorantes to método científico não me satisfaz. Suspeito que essa "doença" que está infectando todas as áreas da ciência e da sociedade hoje, seja causada por novos fenômenos sociais, e de uma possível obsolescência do método científico, enquanto guia prático da razão do homem contemporâneo.
A adesão de sistemas democráticos em muito do mundo ocidental veio com a implícita responsabilidade de que o bom cidadão deveria estar tão bem informado quanto possível em todos os assuntos que afetam sua sociedade, enquanto isso, os avanços científicos tornaram várias áreas do conhecimento tão complexas que seu avanço agora requeria uma hiperespecialização. Finalmente, com a implementação de uma organização global, todas as sociedades estavam diretamente relacionadas através de sistemas tão complexos como eram diversos, sistemas que o bom cidadão agora deveria entender de forma a poder exercer seu papel democrático.
Então, o homem moderno, envergonhado, exausto e frustrado por tentar e não conseguir ter um conhecimento especializado de tudo (tal oximoro só ressalta a natureza herculeana da tarefa), se viu bombardeado por informações que ele não mais conseguia analisar racionalmente ou comprovar experimentalmente. Desprovido das proteções do rigor científico, mas ainda pressionado a ter que entender tudo para poder ser um bom cidadão e não ser responsabilizado pelas falhas de seu governo, o homem moderno se vê tentado pelos conhecimentos "fáceis", de natureza reveladora e de apelo emocional e psicológico, daí o sensacionalismo, as fake news, as inanidades produzidas por "falar o que o povo quer ouvir".
Enfim, acredito que as bases epistemológicas do conhecimento precisem de renovação, mas não de caráter filosófico e racional, mas de caráter social. Estamos chegando a um ponto em que até o próprio pensamento do homem precisa ser colaborativo para ser efetivo, mas podemos ser muito incompetentes em como colaborar, nos falta a educação e a técnica social para efetivamente distinguir fontes confiáveis de conhecimento, encontrar colaboradores de confiança e competência. E não só no papel de ouvintes, mas também de falantes, quantas vezes já adulteramos a enunciação de nosso conhecimento só para soar mais agradável ao nosso ouvinte?
Proponho que passemos menos tempo minuciosamente analisando o mar de conhecimentos em que estamos mergulhados, e mais tempo analisando seus afluentes, quais estão límpidos, e quais estão envenenados. Afinal, se Bacon zombou da noção de se tentar erguer um obelisco sem as ferramentas apropriadas para demonstrar a necessidade do método científico, eu me permito zombar da noção de se tentar erguer um arranha-céu sozinho, independente de quão bem equipado se acredita estar, para demonstrar a necessidade de uma melhor colaboração social, mesmo que essa ainda implique alguma perda de rigidez e purismo racional (pelo menos até o advento do transhumanismo, mas isso é um assunto para o futuro).
Thiago de Oliveira Lopes - 1º ano de Direito - Noturno