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terça-feira, 29 de março de 2011

Escrito em 1637, o que tornou o Discurso do Método um texto clássico foi a apresentação que nele Descartes fez do método de raciocínio que utilizava na sua busca pelo conhecimento da verdade.

O "método" começa com o ceticismo (para superá-lo), duvidando de tudo que é então conhecido (pelo costume, pelo senso comum, pelos sentidos e pela autoridade), aceitando apenas aquilo que é indubitável. A partir dessa primeira verdade, progressivamente acumula novos conhecimentos, dos mais simples até os mais complexos e difíceis, fazendo uso, para isso, exclusivamente da razão.

Uma das coisas mais interessantes no texto é a forma inusitada, para mim, na qual ele foi escrito, em linguagem literária e não acadêmica. Descartes cria imagens e metáforas belas e as considerações que faz sobre a busca pelo conhecimento , a ciência, a relação entre corpo e mente e a razão acabam despertando mais interesse do que o método em si - nesse caso, talvez as inovações mais importantes presentes nele percam um pouco da vitalidade em uma cultura já tão influenciada pelo racionalismo e pelo progresso científico.

O matemático diz que todos homens são dotados de razão na mesma medida e que a diversidade de conclusões existente entre eles se deve apenas ao caminho percorrido por cada um na orientação de seu pensamento. Essa observação é importante, e se de fato existir uma forma de se proteger do erro e garantir a qualidade do raciocínio, e essa forma puder conduzir o pensamento de qualquer pessoa rumo uma conclusão eficaz, sem dúvida o estudo dela deve ser o campo de conhecimento primeiro e fundamental, e sem sua superação fica inviável a reflexão sobre qualquer outro assunto.

O racionalismo fundamenta a fé


Em sua obra, Discurso do Método, René Descartes inaugura o racionalismo e propõe, assim, uma maneira irreverente de conceber o conhecimento, se distanciando das formas anteriores a ele. Esse pensador teoriza um método para conhecer a realidade que não se deixa enganar ou influenciar por quaisquer pré noções ou explicações até então propostas, sejam elas religiosas, sobrenaturais ou tradicionais. Dessa forma, utiliza da dúvida para chegar à verdade, pois ao duvidar metodicamente de tudo, passaria a considerar como verdadeiro aquilo que não fosse possível duvidar. E é duvidando que Descartes chega à primeira verdade, a qual é uma das frases mais célebres do pensamento moderno, “Penso, logo existo”.

Ao seguir em frente com o seu raciocínio, Descartes considera que o conhecer é mais perfeito que duvidar, e que nós, seres humanos, somos seres que duvidam; portanto não somos totalmente perfeitos apesar de existirmos. E, então, chega a conclusão que, a meu ver, chocou e ainda choca vários pensadores céticos; a existência de uma entidade mais perfeita e superior a nós que nos concebeu, ou seja, Deus.

Acredito que essa afirmação, ou melhor, constatação gera polêmica, pois muitos pensadores acreditam que a crença na existência de Deus é falsa por não ter nenhum embasamento científico, mas Descartes por meio de um método extremamente racionalista conseguiu afirmá-la sem valer-se de explicações meramente teológicas. Penso que esse foi um grande feito do autor, pois ele conseguiu mostrar que razão e fé não se contradizem, mas, na verdade, se complementam.

Considerações Cartesianas, ou Fundamentais


A existência do império da razão e suas implicações caracterizam bem o método inovador proposto por René Descartes em sua obra Discurso do Método. Nela, ele expõe a origem, o desenvolvimento e a finalidade de seu método; porém, parece fazê-lo sem demagogia, não tendo intenção de impor o seu meio de pensamento para o leitor.


Essa postura racionalista (exemplificada pela sua célebre frase: cogito, ergo sum; ou seja, penso, logo existo) tem como fim a criação de um novo estilo de vida, sendo que somente as idéias indubitáveis habitariam a mente humana (isto é conseguido através do uso da dúvida hiperbólica, ou seja, o abandonamento de todo pensamento que possa ser questionado). Ademais, é constituinte de seu método a desconstrução de coisas complexas em outras de um grau de compreensão mais inteligível e, consequentemente, a sua reconstrução para sua total compreensão.


Dentre isso, é surpreendente como um indivíduo que aprendeu e se aprofundou em todas as disciplinas da escolástica (apesar de depois dispensá-las) conseguiu se dissociar sem maiores problemas dessa base intelectual e criar seu próprio método de construção, análise e interpretação de pensamentos. Também é notável que, apesar da extrema importância dada à razão por Descartes, ele defende a existência do primeiro-motor, ou seja, de Deus. Não há para ele, antagonismo entre Ciência e fé, sendo ambas provindas da Natureza.


Pode-se retirar da obra a importância de se estabelecer o seu próprio método de, simploriamente falando, se viver. Sendo influenciado drasticamente ou não por aspectos racionais, mas sempre buscando um caminho para se seguir com suas convicções e de existir em sua melhor forma possível.


O método de Descartes e a modernidade

Descartes apresenta em O Discurso do Método um modo de se alcançar o conhecimento baseado em uma conduto composta de regras, dentre as quais está a de que a verdade aparece sempre clara e distinta. Por isso seu grande apreço pela matemática, que teria a vantagem de apresentar-se claramente por elementos simples como números. Da intenção de estender a matemática para outras áreas do conhecimento nasce o plano cartesiano, que representa sua ambição em racionalizar tudo e fazer análises objetivas. Em seu estudo da verdade no mundo material, ele parte de uma primeira ideia:"Penso, logo existo", obtida do mais puro raciocínio lógico - todo pensamento é pensado por algo que existe, portanto o Eu é uma coisa pensante que tem seu correspondente fora da mente e é o ponto de partida do conhecimento. Essa primeira verdade resultante de procedimento metódico intelectual é uma firme base para a construção do conhecimento, já que não pode ser posta em dúvida justamente por aparecer clara e distintamente aos nossos olhos. O pensamento de Descartes serviu de base para o advento da modernidade na medida em que a busca pela verdade parte do próprio Homem sem se recorrer à verdade revelada e, para alcançá-la, haveria uma conduta de reflexão solitária marcada pela dúvida acerca de conclusões alcançadas sem o método, pelo objetivismo e pela lógica. Na modernidade, tudo deve ter uma base lógica e racional para ser crível, o que não tem é duvidoso; a subjetividade, por sua vez, perde espaço. Por outro lado, o trabalho científico ganha liberdade: é o Homem quem constrói o saber.