Total de visualizações de página (desde out/2009)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

O desinteresse pelas necessidades coletivas

     A análise a seguir baseia-se na visão de Sara Araújo sobre o desenvolvimento do direito e dos saberes jurídicos na sociedade contemporânea. Nesse sentido, é importante mencionar que ela descreve uma dicotomia sobre o direito que circunda a diferenciação geográfica e econômica dos países, sustentada pela teoria de bipolarização norte-sul do mundo. Isso significa que Araújo irá defender o desenvolvimento de diferentes formas de aplicação do jurídico para cada tipo de país e relacionar isso a sua localização geográfica e ao seu desenvolvimento (norte) ou subdesenvolvimento (sul).

    Essa dicotomia apresentada por Araújo é a base do que ela chama de pensamento abissal, ou seja, o pensamento de um dos lados é independente do outro e consegue ignorar de tal forma o seu opositor, a ponto de considerar o outro lado inexistente. Para complementar esse pensamento a autora define uma lógica de monoculturas dominantes que seriam capazes de organizar a forma como o pensamento jurídico se estabelece e a aplicação do direito nessas circunstâncias. 

    As cinco monoculturas são a do "saber e do rigor do saber" que é a definição de princípios da verdade exclusiva e da hierarquia estética, a do "universal e do global" que trata sobre a invisibilidade das formas de pensamento do lado oposto para garantir a sua individualidade, a da "produtividade" que é a desvalorização das produções do lado oposto, por meio da invisibilidade do que é produzido, a próxima é a da "naturalização das diferenças" que consiste em segregar as pessoas com base em sua classe para garantir a forma de pensamento de cada grupo e a dominação do grupo mais forte sobre o mais fraco. Por fim, temos a do "tempo linear" que é a proposta de dissolução do tempo vivido.

    Todo esse arcabouço desenvolvido por Araújo procura defender que nem sempre o estabelecimento de formas de pensamento jurídico e de ações coletivas são suficientes para garantir a melhor forma de proteção aos direitos dos cidadãos. Isso significa que o interesse coletivo não é o maior foco nessa situação, o que está em jogo é a defesa do interesse do grupo mais poderoso que é o responsável pela determinação do que é importante ou não para cada lado abissal.

    Sob essa ótica, podemos analisar a sentença dada pelo juiz Luiz Guilherme Cursino de Moura Santos em Pindamonhangaba ao ano de 2021, na qual o requerente solicitava o ressarcimento das despesas para a regularização de seu negócio. O requerente era um ambulante que transformou sua atividade econômica em uma mercearia para legalizar e garantir a legalidade de sua renda. Acontece que durante o processo a Vigilância Sanitária fechou o estabelecimento afirmando que não havia alvará de funcionamento. A defesa alega que durante a pandemia o serviço prestado pelo requerente era essencial para a sociedade e não deveria ser fechado.

    Como a decisão final é dada em razão do Estado que exigia o alvará de funcionamento e alegava que o requerente não preenchia os requisitos para tal, podemos notar que há uma aplicação das monoculturas propostas por Sara Araújo, isso porque, o impedimento de um cidadão para a realização de um trabalho honesto para garantir a sua sobrevivência por falta de requisitos burocráticos indica o desprezo da sociedade contemporânea pela vida das pessoas que estão em classes diferentes, assim fica fácil compreender que o abissal entre norte e sul é resultado de uma sociedade dividida e que valoriza apenas os interesses de quem pode defende-los. 

Álvaro Galhanone - 1˚ano Direito Noturno

Nenhum comentário:

Postar um comentário