Em “do
socialismo utópico ao socialismo científico”, Engels apresenta as bases da
ideologia defendida por ele e Marx no século XIX. Ele o faz com uma crítica da
dialética idealista de Hegel e uma análise muito perspicaz da sociedade de sua
época, análise essa que se adapta perfeitamente à realidade atual e põe em
relevo as condições de sujeição de uma classe a outra e os tristes resultados
da Revolução Francesa, que em tese defendeu a igualdade entre todos, mas
redundou na tão conhecida situação de exploração burguesa do proletariado.
Com seu
materialismo dialético, o autor constata que as condições do modo de produção
capitalista logo se tornariam insustentável, devido à exploração da classe
trabalhadora, que, ao chegar a seu limite, destruiria a ordem existente das
coisas, implantando o socialismo. E este, ao contrário do que pareciam pregar
os socialistas utópicos, não seria, portanto, uma verdade absoluta a ser
revelada à humanidade, mas simplesmente a consequência lógica das condições
históricas marcadas pelo capitalismo.
Nessas
condições, a imposição da competitividade entre as empresas e a ambição
constante pelo lucro levam à exploração cada vez maior da classe trabalhadora.
Parece tentador dizer que essa competitividade decorre acima de tudo da ânsia de
consumo da população em geral ( em geral porque percebe-se que até mesmo quem
não tem condições de efetivar o consumo apresenta essa ânsia). Ou seja, ninguém
precisa ter 20 pares de calçados para ter uma vida digna, mas devido a essa
ilusão tão preponderante de que é preciso possuir muito para adquirir
bem-estar, compra-se muito, e pra atender não à necessidade, mas à demanda da
sociedade, as empresas querem produzir mais, mais rapidamente e com os menores
custos, o que leva a essa superexploração. Se o próprio consumo em geral fosse
apenas o necessário, a importância dada a esse processo de produção seria
diferente; ao menos o número de fábricas com funcionários em condições
deploráveis seria menor, então a atenção dada a esse modo de produção seria
menor e a sociedade se basearia em outras fundações. Não que isso seja uma
possível solução, de forma alguma. Essa suposição serve pra demonstrar que
pode-se ver também na fraqueza de caráter da população em geral certa
responsabilidade pela realidade observada.
E essa
fraqueza de caráter leva a outra questão sobre as ideias de Marx de Engels. O
que eles propõem é a tomada do poder pelo proletariado com o objetivo de
extinguir as classes sociais, fundando uma sociedade igualitária. Acontece que
nada garante que esse proletariado, ao chegar ao poder, não se tornará a nova
classe opressora, uma “nova burguesia”. Porque em seus princípios, todas as
revoluções ocorridas, como a Revolução Francesa ou ainda que não presenciada
por esses autores, a Revolução Russa de 1917, visavam ao bem geral da
população, e acabaram instituindo novas situações de opressão. Acreditar
cegamente na boa-fé de uma classe só por ela ter sido oprimida, ignorando a
possibilidade de ela também ter um instinto opressor não seria uma certa ingenuidade?
Assim, apesar de toda essa análise impecável da sociedade capitalista feita por
Marx e Engels, o futuro que eles declaram como certo e lógico talvez não seja
assim tão óbvio, por mais que seja ainda possível que suas previsões se
concretizem e o proletariado funde uma nova ordem social no mundo.