Total de visualizações de página (desde out/2009)

quinta-feira, 2 de maio de 2019

O berço da cegueira.

Friedrich Nietzsche, em sua obra "O Nascimento da Tragédia", analisa a gênese de um mundo frio , racional e cego para os sentimentos: o mundo grego. Nesse denominado "berço da cultura ocidental", filófos comtemplavam a "razão" como o único mecanismo próprio para a evolução humana (Nietzsche usa a alegoria do deus grego da razão: Apolo.). Ao passar dos anos, Apolo não sofre danos, mas ganha forças compatíveis às mitológicas, isto é , a modernidade comtemplou o racional para longe do imagiável daqueles pensadores. Não por acaso, durante a efervescência científica das Revoluções Industriais, Émile Durkheim  ,filho de seu tempo, leva Apolo ao campo social. Assim sendo, analisa que fenômenos sociais são passíveis de justificativas racionais a partir de regras universalizadas , ideial esse compatével com o pensamento de Aristóteles em "Ética a Nicômaco":"Cada uma das regras de justiça se relaciona com as coisas justas e legítimas como o universal se relaciona com os seus casos particulares, pois as coisas praticadas são muitas, ao passo que cada regra é universal”. Ao que tange a teoria em si, Durkheim julga que acontecimentos dentro da esfera social e até mesmo individual (exemplicação possível é o entendimento do pensador sobre o suicídio) transfigura um "fato social" , ou seja, uma lei cujo valor é útil em qualquer ocasião.Semelhante ao pensador positivismo progrediu o direito, sobretudo o penal. Abarcando regras minuciosamente orquestrada, o direito e o próprio entendimento de justiça moldou-se em prol da razão. Nesse sentido, ao instrumentalizar o entendimento sobre o social, simplificou-se o agir perante a lei, pois um "fato social" não seria nada mais que fruto de um conjunto de acontecimentos catalogados e o instinto de punir o culpado  supera o anseio por acabar com a cadeia de eventos. Não por acaso, o desejo por justiça cresce, pois seria esse também um fato social , uma vez que a própria insegurança é factível à coletividade, atua coercitivamento  no psicológico do todo e sempre tende a ser exterior ao particular. Assim sendo , casos como do "Mecânico desempregado, sem passagem pela polícia, Cledenilson Pereira da Silva, de 29 anos, tentou assaltar um bar no bairro Jardim São Cristóvão, na capital maranhense. Foi submetido a socos, pedradas e garrafadas até a morte – seu corpo nu foi amarrado a um poste." tornam-se comuns e banais. Um digno fenômeno prático da teoria de Èmile Durkheim que cristaliza um deus Apolo tornando cego nossa compaixão e sentimentos próximos da humanidade.
Resultado de imagem para Deus apolo
Resultado de imagem para linchamento maranhao seu corpo nu foi amarrado a um poste
(Mateus Sartor Chauvin, Direito matutino)

A violência da virtude comunitária

  Durkheim dizia que todos os seres humanos fazem parte de um conjunto total, que todos somos peças de um grande organismo, palavras que remetem tanto a Descartes quanto Aguste Comte, talvez por isso que seja por muitos considerado positivista e conservador, mas para mim ele é o inicio do que podemos chamar de sociologia, já que ele tenta ao máximo coisificar as coisas para que ele mantenha a compostura de suas ideias e consiga retratar a realidade de modo fiel.
  Hoje em dia os tempos mudaram e nos encontramos em uma modernidade liquida e volúvel dominada pelas novas tecnologias e o alienamento, dentro disso também é o espaço para criar grupos sociais elitistas que seguem ideais comuns, enquanto excluem outros e nessas ocasiões surge grupos que criam seus próprios direitos e leis e sendo assim sua própria maneira de coerção, muitas vezes pela violência, membros desse grupo tendem a querer manter a funcionalidade do grupo e seguindo assim mantem uma postura extrema as ideias de sua sociedade particular, mas isso não está longe da realidade em que vivemos já que o grupo que comento é o próprio Brasil, onde o direito que deveria defender o povo, agride o povo, a pedido do povo. Punição no âmbito de melhorar ou de garantir segurança ao grupo, já é um conceito ultrapassado, a punição hoje em dia se tornou um capricho e controlado por ideias que são feitas pelos mais fortes.
  Não há organismo que sobreviva caso suas engrenagens girem para sentidos desconexos, não é atoa que nossa sociedade consta com um aumento estratosférico de suicídios, pois como Durkheim inferia é comum o suicídio quando o ser não se encaixa a sociedade. Como o brasileiro sobreviveria a sociedade se ele mesmo exclui os próximos e consequentemente se exclui?

Carlos Eduardo Trigo Nasser Felix- Matutino
   

PowerRangers brasileiros do séc. XXI


Durkheim determina que os comportamentos sociais são coletivos, mesmo sendo praticados individualmente são reflexos dos hábitos forjados na sociedade. É nesse princípio que os linchamentos tanto por um individuo (episódio do tatuador que tatuou em um homem “Sou um ladrão vacilão”) quanto por um grupo (episódio de Cleidenilson da Silva, de 29 anos, que morreu de joelhos após ser espancado até a morte por um grupo de moradores após um assalto frustrado a um bar no Jardim São Cristóvão, um bairro pobre de São Luís, no Maranhão) é um fato social a ser analisado pela óptica desse sociólogo.


                No momento que há a consolidação do fundamento de solidariedade de Durkheim, o qual cada pessoa cumpre o seu papel para o funcionamento geral, ganha ênfase coercitiva, ela tende a se tornar uma ordem jurídica. E assim, os membros do todo acabam tornando-se os vigilantes e aplicadores das penas, com base na ordem jurídica social (coerção a atos que são nocivos a sociedade), pois a sociedade quer manter sua coesão.
            Em suma, o início da música “Nunca Serão” do Gabriel O Pensador é um grande retrato do cenário de linchamento: “Eu caminhava no meu Rio de Janeiro quando alguém me parou e falou: ’Aê parceiro, me dá tua mão que eu quero ver se tá com cheiro. Porque eu sou um cara honesto e detesto maconheiro’”. Ou seja, o cidadão honesto, do bem, para manter a coesão da sociedade ideal, cria uma coerção a qualquer ato nocivo a ela.
           

Lugar do ser humano no positivismo

Uma célula, uma peça e um ser humano. Seriam esses três elementos passíveis de comparação? Estaria o humano para o corpo social, assim como a célula está para o organismo e a peça para a engrenagem? A resposta da filosofia funcionalista defendida por Durkheim é de que sim, mas acredito que a resposta genuína de cada mente pensante e de cada coração pulsante não seja assim tão reducionista. 
As ideias positivistas impulsionaram a humanidade para uma categorização simplista daquilo que o ser humano é. Ou seja, se só se é diante do desempenho da função social, quem seriam aqueles que não cumprem tal tarefa, ou que dedicam suas vidas a funções sociais não legitimadas pela comunidade em que vivem? De certo o sentimento de identidade dessas pessoas é afetado pela ideia funcionalista, que as reduziria àquilo que não tem relevância ao todo, e que, portanto, deveria ser refuncionalizado para pertencer ao grande organismo social. Como uma peça quebrada ou uma célula doente, o indivíduo que não cumpre satisfatoriamente o desempenho de seu papel social obstaculiza o funcionamento equilibrado do meio em que está inserido. A grande questão é se realmente existe tal equilíbrio, quando se trata das relações humanas. A visão positivista da sociedade pressupõe o alcance de uma harmonia em um contexto em que o conflito é constante, por se tratar da vivência em conjunto de pessoas que carregam singularidades infinitas. 
Volto então à questão de que o indivíduo não necessariamente se sente uma peça de uma engrenagem ou a célula de um organismo. Mesmo aquele que dedica sua vida ao cumprimento de suas funções sociais, e não pretende de forma alguma subverter a isso, pois nisso reside sua satisfação pessoal, ainda assim esse indivíduo não poderia ser reduzido a isso. E é justamente esse fenômeno que, oriundo de uma interpretação cartesiana do positivismo, colabora para uma visão míope do ser humano acerca de si mesmo e do outro. Por muitas vezes não conseguir se ver além do que representa ou deixa de representar à sociedade, o indivíduo também reduz o outro a tais categorizações. Neste processo, abandonam-se os caráteres de subjetividade humana, tais como a afetividade, a empatia e a capacidade de reconhecer valores humanos que transcendem as funções práticas. 
As consequências do enraizamento de tal ideologia na consciência coletiva se expressam em um crescente medo do homem de estabelecer relações interpessoais sólidas e genuínas, já que o aspecto da funcionalidade está presente de maneira tão forte que é aterrorizante a ideia de se mostrar ao outro além daquilo que se vê no desempenho de sua função social. Além disso, existe uma insegurança própria de cada indivíduo em relação àquilo que se é no que transcende ao funcionalismo, ou seja, no que o torna de fato humano. Inseguro de si e com medo do estabelecimento de uma proximidade que ameace mostrar sua real personalidade, o sujeito tem cada vez mais facilidade em se desvencilhar de pessoas que se apresentem “inúteis” ou “desfuncionais” às suas vidas. Nisso reside a sociedade que Zigmund Bauman chamaria de líquida, ou seja, aquela incapaz de consolidar relações verdadeiras e duradouras. 
Assim, a filosofia positiva, apesar de ter importância para o desenvolvimento das ciências, mostra-se muito nociva ao caráter humanitário da sociedade, e por isso sua potencialização caminha em contramão com a real harmonia das relações humanas.

Carolina Juabre Camarinha.1º ano Direito matutino