Incrivelmente, apesar da passagem de quatro séculos após o florescimento do pensamento científico moderno, seus preceitos fundamentais encontram-se tão vivos na sociedade contemporânea quanto no século XVII. A sobreposição da razão frente às paixões e ideologias ao se pensar e produzir ciência, da objetividade sobre a subjetividade tornaram-se requisitos básicos da comunidade científica e da chamada "boa ciência", e englobam o novo senso comum científico das sociedades humanas, baseado em uma ciência multilateral, plural e democrática.
Sendo os principais diferenciais do ser humano a sua capacidade cognitiva, comunicativa e ontológica com base no uso da razão, Descartes e Bacon criticam em suas obras sobretudo a filosofia antiga e a utilização da razão pela razão, ou seja, o seu caráter especulativo e contemplativo, incapaz de promover inovações e o progresso da civilização humana, sendo este último obtido graças à finalidade prática do saber científico, a fim de garantir o bem-estar e o desenvolvimento das potencialidades humanas.
A reflexão que deve ser feita por todos é a necessidade atual de se mudar o mundo e a interpretação da realidade que nos cerca, a partir de uma revolução do próprio olhar, ou seja, deve se implementar o uso de lentes sobretudo científicas para se enxergar o mundo, sem a influência de nossos ídolos baconianos, responsáveis por deturpar nossa visão. Deve haver uma ruptura com o senso comum baseado em costumes e hábitos pretéritos. Devemos vencer nossas próprias convicções.
Como Bacon dizia, devemos "olhar mais de perto", inibindo a nossa própria antecipação da mente, formadora das mais terríveis pré-noções, sendo estas últimas os grandes males da contemporaneidade. Nos aproximamos da verdade quando conseguimos fazer uma conexão entre a razão e a experiência, sem fazer algum juízo de valor ou afirmação categórica sem embasamento naquilo que é real, concreto.
No entanto, seria a ciência um mero motor do sistema capitalista? Sendo sua função exclusivamente a produção de conhecimento, que levaria portanto ao surgimento de novas tecnologias e bens de consumo, que por sua vez seriam responsáveis pela escassez dos recursos naturais? É para se pensar.
A valorização da ciência empreendedora e transformadora já feita lá atrás por Descartes tem efeito, portanto, no modo de produzir conhecimento e sua finalidade prática na sociedade capitalista, sendo também responsável pelo consumismo desenfreado realizado por todos nós.
Indubitavelmente, a elite político-econômica desde sempre dedicou-se a pensar, enquanto o operariado a trabalhar, portanto, pode se afirmar que há uma alienação contínua dos trabalhadores, para que assim a manutenção do status quo seja feita e a hegemonia da classe burguesa se concretize, além de o conhecimento e o progresso técnico-científico continuem sendo realizados no mundo globalizado.
Para que nossos pensamentos não sejam limitados pelo senso comum e pela manipulação da mídia atualmente, devemos negar a realidade tal como ela nos é imposta, questionar a realidade, a ordem natural das coisas e assim começar a pensar em possíveis caminhos de mudança a fim de se amenizar as mazelas de tantos séculos, sobretudo na sociedade brasileira, devido à assustadora desigualdade sócio-econômica.
O Direito seria portanto um instrumento de manutenção da ordem capitalista ou de mudança da conjuntura atual? Cabe a nós respondermos, e como futuros operadores do Direito, fazer valer a segunda opção.
Juliana Beatriz de Paula Guida - 1° ano - Direito Matutino