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sexta-feira, 4 de novembro de 2022

       A Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADO - 26, foi impetrada pelo Partido Popular Socialista a fim de criminalizar a homotransfobia, com base nos incisos XLI e XLII, art. 5° da Constituição Federal, que estatuem sobre punição de qualquer discriminação dos direitos e liberdades fundamentais, e, sobre a prática do racismo ser um crime inafiançável e imprescritível. Nesse sentido, foi afirmada a mora do Congresso Nacional no que tange à inércia de legislar sobre punições às pessoas que praticam agressões em razão de orientação sexual e identidade de gênero, além do enquadramento das práticas de homofobia e transfobia no conceito de "racismo" previsto na Lei 7.716/89. 

       À vista disso, a ADO em questão é um marco importante para a comunidade LGBTQIA+ brasileira, pois reconhece que ataques - físicos, psicológicos, morais - são perpretados constantemente a essa, de maneira histórica. Dessa forma, por seu caráter histórico e por ser  enraizada na população brasileira, que é majoritariamente cristã, há a naturalização dessas práticas infelizes, com alegações como: "é só minha opinião", "não estou sendo preconceituoso, estou seguindo minha fé", aliada ao entendimento de que não seria necessário diferenciar agressões homotransfóbicas, já que seriam "apenas mais um tipo de agressão" - posição que não leva em conta a historicidade da homofobia e transfobia no Brasil. Assim, no que tange ao campo social brasileiro, a ideia de criminalizar a homotransfobia não estaria dentro dos espaços dos possíveis, entretanto, no campo jurídico e dos movimentos sociais, ocorre o inverso, devido ao caráter contramajoritário de ambos. Portanto, há conflito na percepção do espaço dos possíveis entre os grupos supracitados, que pode ser traduzido pelo suposto embate entre criminalização da homofobia e liberdade de pregação religiosa. 

       É importante destacar que o Congresso, por ser composto por representantes do povo, traduz valores desse, como a não aceitação de orientações sexuais e identidades de gênero diversas da lógica cristã. Desta maneira, há inércia e omissão dos deputados acerca de concretizações de liberdades e direitos dos LGBTQIA+, o que inclui legislar sobre possíveis punições para quem os fere. Como contrapartida, o Direito, através da característica de magistratura do sujeito, pode assegurar essas necessidades urgentes, como, por exemplo, a ADO 26, que garantiu criminalização de atitudes homotransfóbicas até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém. Então, de fato existe o aspecto de antecipação por parte do Supremo Tribunal Federal, porém verifica-se a necessidade dessa devido à condição omissa dos deputados. 

      Ademais, houve aprofundamento do Estado Democrático de Direito Brasileiro, através da ADO 26, já que foi pautada na extensão de liberdades e direitos fundamentais a um grupo notório da sociedade brasileira. Tal ampliação iniciou-se, como citado anteriormente, pela petição do PPS, e, foi acompanhada de várias mobilizações do direito, como do Grupo Gay da Bahia, ABGLT (Associação de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais), GADVS (Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual), Grupo Dignidade e da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). No que concerne às mobilizações do direito, McCan as define como "ações de indivíduos, grupos ou organizações em busca da realização de seus interesses e valores. Isto demonstra que, apesar de terem sido os ministros do STF que votaram e decidiram favoravelmente ao enquadramento da homotransfobia como crime de racismo, isso foi possível pois os diversos grupos mencionados usaram o direito como um recurso de interação política e social, ou seja, o foco está nos sujeitos sociais, não no Tribunal. 

       Por fim, essas importantes mobilizações do Direito que foram palco da ADO também são significativas para além da Ação Direta, já que modificam o contexto imediato para lutas posteriores e a cultura social geral. A priori, pode-se explicar o porquê da modificação do contexto de lutas atuais contra a LGBTQIA+fobia: os argumentos utilizados pela comunidade LGBTQIA+ durante a ADO podem servir de exemplo de argumentação para outras pessoas da comunidade; maior facilidade da realização de um mapeamento de agressões e assassinatos homotransfóbicos, dados importantes para políticas públicas; e, maior solidez da luta. Também, modifica a cultura geral da sociedade, paulatinamente, pelo fato de ser uma decisão muito comentada na sociedade, e, então, torna-se um assunto cotidiano e, consequentemente naturalizado, o que é importante para o entendimento que a homossexualidade e transexualidade são comuns, naturais e devem ser respeitadas. 


Bárbara Canavês Domingos - 1° ano Direito Noturno