Segundo Boaventura de Sousa Santos, a aplicabilidade e a eficácia da sociologia das ausências estariam atreladas, predominantemente, ao papel desempenhado pela Defensoria Pública e à capacitação jurídica dos membros das localidades econômica e socialmente mais desfavorecidas. Por meio dessa experiência de justiça comunitária, esses membros locais seriam capazes de interpretar juridicamente os litígios de seus cotidianos e levar à esfera judicial suas pretensões e tornar visíveis as violações aos seus direitos fundamentais.
A experiência da justiça comunitária seria responsável por consolidar a sociologia das ausências nas resoluções de conflitos judiciais e por, estando em consonância com os princípios democráticos, tornar plenamente eficazes os direitos constitucionais, como o acesso à justiça. Essa premissa é ilustrada pelo caso denominado Pinheirinho, em que a juíza Márcia Loureiro concedeu a liminar de ação de reintegração de posse pela massa falida da empresa Selecta, violando o direito fundamental à moradia (art. 6º da Constituição Federal), das famílias que ali residiam. A decisão foi objeto de agravo, mas nota-se que, sem esse aparato jurídico desenvolvido por órgãos jurídicos como a Defensoria Pública e o Ministério Público, esses indivíduos não teriam seus direitos de acesso à justiça contemplados.
Sem qualquer experiência de justiça comunitária, não apenas o direito de acesso à justiça dessas famílias seria violado, mas também não seria possível evidenciar as violações de direitos humanos a que foram submetidas. No caso em tela, por meio da atuação do CONDEPE, foram ouvidos 507 relatos de casos de violência física, moral, violação de direitos e danos materiais que serviram como base para a instrução de inquéritos no âmbito da Defensoria Pública. Ou seja, por meio da atuação de órgãos que possibilitam e ampliar o espaço de acesso à justiça, que essas famílias puderam ser ouvidas e terem as pretensões de sua luta levadas ao poder judiciário, podendo questionar a perspectiva contra-hegemônica.
Como evidencia Boaventura de Sousa, a luta democrática é, antes de mais, a luta pela construção de alternativas democráticas, e, no caso exposto, a luta para que a sociologia das ausências seja evidenciada nas decisões judiciais.
REFERÊNCIAS
SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. 3. Ed. São Paulo: Cortez, 2011. [Cap. 2: “O acesso à justiça”, p. 31-47; Cap. 3 “O ensino do direito e a formação profissional”, p. 54-66”]
Camila Marcelo de Toledo
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