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terça-feira, 20 de maio de 2025

A Ação Social de Weber e o Racismo conceituado por Silvio Almeida

   O texto “Raça e Racismo” do sociólogo Silvio Almeida, aborda a construção histórica do racismo e suas ligações com sistemas de dominação e desigualdade. Além disso, um de seus principais pontos é o racismo estrutural. Em sua obra, há um destaque para três concepções de racismo: individualista, institucional e estrutural. A primeira diz respeito a uma atitude isolada e moralmente errada de indivíduos, a segunda trata da incorporação do racismo à instituições que opera mesmo sem intenção clara, já a terceira e última  é a concepção norteadora da ideia central do autor, a estrutural; que por sua vez diz respeito a organização da sociedade como um todo pelo racismo. 
   E como o conceito de Ação Social de Weber se cruza com as ideias de Silvio Almeida?  Primeiramente,  é necessário entender que Weber destaca 4 tipos de Ações Sociais, sendo elas: racional com relação a fins, racional com relação a valores, afetiva e tradicional. A Ação Social é toda ação que tem significado e valor para si, mas que produz e gera uma reação/ ação em outra pessoa. Assim, ao falar de um racismo individualista, por exemplo, é também falar de uma ação social que teve relevância para o praticante do ato mas que gerou, de forma negativa e ilícita, uma reação ou ação em quem sofreu o ato de racismo. Em termos jurídicos, não se trata apenas de uma ação social mas de um fato jurídico com implicação de consequências jurídicas. 
   Agora, voltando para Weber, essa ação praticada- racismo individualista- pode ser tanto uma ação social afetiva quanto tradicional. A primeira seria por ódio, raiva da cor da outra pessoa e a segunda pode-se pensar numa estrutura enraizada “tradicionalmente”, historicamente na sociedade, o que faz com que os pensamentos atuais continuem seguindo a mesma lógica colonial racista.
   Os conceitos de Max Weber e Silvio Almeida- a sociologia jurídica- se entrelaçam e faz com que pensemos ativamente e criticamente, o que nos gera reflexões e a produção de uma cultura anti-racista.

Brenda Diniz, 1 ano Matutino

Racismo e dominação: uma análise werberiana

 

 O capítulo “Raça e Racismo” contido na obra “Racismo Estrutural”, de Silvio Luiz de Almeida, oferece uma análise profunda sobre as diferentes formas pelas quais as categorias raciais estão incorporadas na estrutura social e se manifestam na sociedade contemporânea. Diante esse cenário, a teoria de Max Weber sobre dominação fornece uma perspectiva teórica valiosa para compreender como o poder, a autoridade e a legitimação são exercidas, reproduzidos e naturalizados na relação racial.

 Segundo Weber, a dominação se sustenta na legitimidade das formas de poder, que podem ser vistas como racionais-legal, tradicional ou carismática. No caso do racismo estrutural, essa dominação se manifesta na lógica racional-legal, onde regras, normas e procedimentos institucionais, aparentemente neutros, são utilizados para estabelecer e manter hierarquias raciais. Essas normas, ao serem internalizadas pela sociedade, naturalizam a desigualdade racial, fazendo com que a hierarquia de privilégios que beneficia determinados grupos, principalmente os brancos, pareça uma consequência ordinária do funcionamento social.

   Sendo assim, as instituições, como o sistema judiciário, o mercado de trabalho e o sistema educacional, desempenham um papel fundamental na continuação das desigualdades raciais, visto que estabelecem e reforçam normas que consistentemente favorecem determinados grupos. Segundo a teoria Weberiana, essas instituições adquirem autoridade legítima ao conquistar a aceitação social de sua legalidade, o que assegura a continuidade do sistema de desigualdade racial sob a aparência de normalidade. Essa legitimação racional-legal, conforme Weber, é uma ferramenta poderosa de dominação, especialmente quando se torna invisível, dificultando a resistência e a transformação social.

 O racismo estrutural, assim, não se resume a ações isoladas ou a atitudes preconceituosas de indivíduos, mas se configura como uma organização sistêmica e institucionalizada da sociedade, na qual as normas e procedimentos são utilizados para perpetuar uma hierarquia racial. Nessa perspectiva, as instituições e a sociedade como um todo, funcionam como elementos de legitimação dessa dominação, naturalizando as desigualdades raciais e dificultando o reconhecimento de sua natureza social e histórica. Dessa forma, o poder se reproduz por meio de estruturas que parecem objetivas, regularizadas e legítimas, conforme a lógica de dominação racional-legal de Weber.  

 Portanto, para combater essa mazela, é necessário realizar uma mudança profunda nas estruturas institucionais e nos sistemas normativos, de modo a desconstruir a legitimação racional-legal do racismo. Essa mudança exige transformar as regras e procedimentos, promovendo maior inclusão, equidade e reconhecimento das desigualdades raciais como construções sociais, e não naturais. Assim, a teoria de Weber nos ajuda a entender que o racismo estrutural é sustentado por uma forma de dominação, que precisa ser questionada e desafiada para que haja uma sociedade mais justa e igualitária.

Caroline Maria Duarte 1°ano Direito matutino

A autoridade como fator central, determinante e estabilizador do racismo estrutural

  O texto “Raça e História”,de Silvio Almeida, discorre sobre a construção social do conceito de raça, dando destaque a ideia de que esta é um fenômeno moderno, do século XVI, relacionado a processos de hierarquização de parcelas humanas em relações de poder, colonialismo e expansão europeia. Analisando a consolidação do saber europeu pelo racismo cientifico e pela filosofia iluminista, o excerto encontra como o europeu justifica a dominação e exclusão dos povos considerados inferiores, explica a relação entre raça, poder e discriminação e aponta diferenças entre outros tipos de preconceitos.

Os fatores discorridos na leitura não podem ser analisados sem a interferência da palavra Autoridade, em toda a sua complexidade: poder de estabelecer classificações, impor regras e legitimar práticas sociais, políticas e científicas que determinam quem tem o direito de definir e quem será definido. A autoridade é o poder de estabelecer as sociedades evoluídas e as sociedades que ainda “estão por evoluir”, as desenvolvidas e as que estão em “processo de desenvolvimento”. A análise histórica da raça estabelece que a própria definição e utilização do termo raça é um exercício de autoridade, não é e nunca foi um termo estático; seu significado é moldado por conflito, poder e decisão. A autoridade para nomear, classificar e hierarquizar está na base da construção do conceito de raça como instrumento de dominação.


O iluminismo, que se apresentava sob a propaganda da razão universal e direitos universais, demonstra como um projeto de autoridade moral e intelectual -a Razão- foi adaptado e usado para justificar a expansão e a dominação do colonialismo. A negação da liberdade e igualdade aos haitianos revela a autoridade seletiva do universalismo liberal, que aplicava seus princípios apenas a determinadas parcelas. A raça, nesse sentido, surge como um mecanismo para sustentar a autoridade do colonizador e permitir a aplicação simultânea de ideais universais e práticas agressivas e desumanas de exploração e destruição.


A transição para o racismo científico no século XIX mostra uma mudança no setor responsável pela validação da autoridade da discriminação; agora, a filosofia toma um papel inteiramente secundário, e abre espaço para a fundamentação da autoridade da discriminação em teorias científicas variadas. Com essas teorias, busca-se uma base pseudo-objetiva para a justificação do neocolonialismo, da dominação e exploração dos “povos inferiores”, alegando as mais absurdas limitações físicas e mentais nos povos explorados.


Em suma entende-se que a raça não é apenas uma categoria, mas um campo de disputa pela autoridade: a autoridade de definir quem é humano, quem é civilizado, quem merece direitos; a autoridade de classificar e hierarquizar; a autoridade institucional para estabelecer normas e padrões que privilegiam e excluem; a autoridade estrutural de uma ordem social que reproduz desigualdades; e a autoridade política para governar e controlar populações. A luta antirracista, nesse contexto, é fundamentalmente uma luta por uma redistribuição e redefinição da autoridade na sociedade.


Racismo como Processo Político e Histórico de Normatividade Institucionalizada

 



Max Weber, sociólogo alemão, sistematiza e organiza os estudos acerca da sociedade, a qual, para o estudioso, fundamentaria-se na análise e na compreensão pragmática dos valores e das expressões coletivas que mobilizam e orientam as ações dos indivíduos na realidade social. Dessa forma, para Weber, a interpretação das ações dos indivíduos deveria basear-se, fundamentalmente, nas formações coletivas, que se encontrariam enraizadas na mente dos diferentes grupos sociais, condicionando suas ações como uma autoridade normativa.


Sob essa ótica, o pensador estabelece o conceito de autoridade como uma expressão legitimada de poder sobre as diferentes formas de pensamento e conduta sociais. Assim, de maneira a compreender a ação no contexto das relações sociais, Weber reconhece que a legitimidade da autoridade pode ser garantida em uma base puramente subjetiva, por meio de uma aceitação meramente afetiva ou emocional; por meio da obediência à autoridade guiada pela crença religiosa; por meio da validação absoluta da autoridade como expressão de valores últimos obrigatórios. Ou garantida por uma base associada ao interesse próprio, na expectativa de consequências específicas de uma espécie particular. Nesse viés, na contemporaneidade, expressão da racionalização do poder e da dominação, diante da prevalência do cenário capitalista, tem-se a instrumentalização da autoridade normativa pela elite econômica e social, que visa cultivar a crença em sua legitimidade e, com isso, exercer a dominação legal e institucionalizada, privilegiando os seus próprios interesses em detrimento da demanda dos demais grupos, marginalizados socialmente.


Diante desse cenário, em sua obra “O que é racismo estrutural”, Silvio Almeida estende o conceito de autoridade, segundo Weber, para as relações contemporâneas. Por conseguinte, ao definir a característica determinista da sociedade moderna, na qual a noção de raça, ainda utilizada como fator político, serve para naturalizar desigualdades e legitimar a segregação e o genocídio de grupos minoritários, o autor da obra reafirma o caráter institucional dos conflitos raciais, visto que se trata não apenas de ações de grupos isolados, mas sim de mecanismos políticos e econômicos aplicados pelas instituições, governadas para manter a hegemonia do grupo racial composto pela classe dominante -branca- no poder. Logo, para isso, através de sua autoridade normativa, legitimada socialmente, as instituições, por meio de seus autores, perpetuam conhecimentos, valores, práticas e normas os quais materializam o racismo como uma prática natural em toda a sociedade, tornando-o um componente orgânico e necessário à limitação de pessoas negras em espaços de poder e de decisão- fato comprovado pelo estudo da Diversitera, segundo o qual apenas 1% dos negros ocupam cargos de alta liderança- privando-as de seus direitos, bem como de ascender socialmente, ocupando lugares sociais restritos a uma pequena parcela da população- branca e heteronormativa- que exerce a dominação do quadro administrativo burocrático através da autoridade exercida sobre a ação social da coletividade.


É perceptível, portanto, que as estruturas sociais são historicamente marcadas pela legitimação popular de autoridades institucionais excludentes e discriminatórias, que conduzem políticas segregacionistas mediante a racionalização administrativa e a naturalização de comportamentos desiguais.


O conceito weberiano de "Legitimidade" como instrumento de desmantelamento do Racismo

    Acredito que, de fato, deva ser duro para uma mãe dizer, sem eufemismos, para seu filho de apenas onze anos, a seguinte frase: "Filho, para você ter a mesma coisa que as outras crianças, você vai precisar se esforçar duas vezes mais". Lembro-me nitidamente das inúmeras situações vivenciadas durante meu ensino infantil e o início de meu ensino fundamental que me colocaram frente a frente a um monstro atroz, do qual ainda sinto medo. Nunca entendi porque a grande maioria dos meus professores ou coordenadores tratavam-me ou com ausência, como quando eu, assim como as outras crianças pretas da sala, ficava relegado a segundo plano, enquanto as crianças brancas recebiam, muito perceptivelmente, toda a atenção; ou com atenção exacerbada, como se eu, por ser preto, fosse mais frágil ou menos capaz do que as outras crianças. Ao relatar situações como essas para meus pais, pude então, ao ouvir a frase proferida pela minha mãe, entender, ainda muito novo, que o monstro que eu tanto temia, e certamente ainda o temo, tem nome: Racismo.

    Na adolescência cultivei um interesse por conhecimentos literários, filosóficos, políticos e sociológicos acerca do racismo, assim como de suas expressões perceptíveis e não perceptíveis, e passei a ler livros como o "Pequeno Manual Antirracista", da filósofa brasileira, ativista e escritora, Djamila Ribeiro, "O Avesso da Pele, do escritor brasileiro Jeferson Tenório, e "Racismo Estrutural", do jurista e escritor Sílvio Almeida. Decerto, todo o conhecimento apreendido com tais livros contribuiu expressivamente para uma compreensão dos fenômenos sociais muito mais atenta à relevância que as etnias, a cor da pele, a cultura e a história de cada indivíduo têm nas relações sociais. E no que diz respeito à compreensão de como a "raça" foi fundada e posteriormente mantida pelas classes dominantes ao longo da história, pilar central para a compreensão do Racismo in se, o conhecimento teórico mais apropriado é, sem dúvidas, o contido no livro "Racismo Estrutural".

    Para a exposição dos principais conhecimentos abstraídos com sua leitura, proponho uma análise sociológica de um caso de Racismo ocorrido no ano de 2019, no qual, em um show realizado pela cantora de etnia branca, Luísa Sonza  - e aqui enfatizo sua etnia não porque apenas os brancos têm pensamentos de cunho racista, mas sim porque apenas os brancos podem ser efetivamente racistas - em uma pousada em Fernando de Noronha, uma mulher negra que foi assistir a esse show, Isabel Macedo de Jesus, recebeu ordens pela cantora para a entrega de um copo de água a esta, como se fosse uma funcionária do evento; ao negar a ordem dada pela cantora, Luísa mostrou-se surpresa por Isabel não trabalhar no local. Em razão do ocorrido, uma ação por danos morais foi aberta em 2019 contra a cantora e a pousada na qual ocorreu o evento.

    Analisemos, então, o caso à luz dos conhecimentos expostos no livro de Sílvio Almeida. Podemos, primeiramente, nos perguntar a razão pela qual a cantora imaginou que Isabel estaria trabalhando no evento, imaginando se havia algo nas roupas, ou ainda nas ações desta no evento que remetessem ao trabalho. De fato, nada em Isabel remetia ao trabalho no evento, senão, sua cor, seus traços fenotípicos analisados sob a perspectiva racista da cantora. E a razão pela qual a cantora enquadrou Isabel apenas como uma trabalhadora do evento com base em sua cor de pele reside nos impactos que o racismo estrutural criou historicamente no imaginário de cada indivíduo.

    Destrinchemos o termo "racismo estrutal" para uma compreensão completa do fenômeno. Por Racismo, entendemos-no como um sistema histórico de opressão e dominação, gerador de discriminação, ao passo que é um sistema de discriminação indireta, isto é, "Já a discriminação indireta é um processo em que a situação específica de grupos minoritários é ignorada" (Almeida, 2009, p.27). O racismo opera com base nos traços étnicos, e portanto, é etnocêntrico, e seu modus operandi é o de excluir, segregar e discriminar toda e qualquer pessoa elencada como passível destes; a violência, seja ela direta ou não, institucional ou não, é um instrumento, um meio para a discriminação efetiva. Ao discriminar exclusivamente Isabel por sua cor, Luísa Sonza fez uso de sua autoridade, indissociável de sua pretenciosa legitimidade de mulher branca, em um sistema histórico de dominação, e agiu indiscutivelmente de maneira racista.

    Já o termo "estrutural" diz respeito a toda a construção histórica que o Racismo teve ao longo dos anos, engendrando-se nos costumes, na cultura, na motivação dos atos individuais de cada um, nas instituições sociais e, sobretudo, no imaginário individual, e portanto, no imaginário coletivo. A construção histórica do Racismo no país se deu devido à dominação imposta pelos europeus aos negros africanos para cá trazidos, no contexto colonial de escravidão; mesmo após o fim legal da escravidão, o esquecimento progressivo que foi dado à população negra no país culminou em uma segregação efetiva desta, relegando-os a papeis secundários e terciários na ordem social. Por conseguinte, a manutenção a tal situação dada pelas classes dominantes brancas engendrou e estruturou ainda mais o racismo na sociedade contemporânea, principalmente nas instituições sociais, já que "os conflitos raciais também são parte das instituições" (Almeida, 2009, p.30).

    Na busca de conceder maior cientificismo e atenção á realidade, o fenômeno do Racismo deve ser observado mediante lentes sociológicas, sobretudo, mediante as perspectivas que centralizam as motivações que levaram a tais ações, e a forma como ações dominam outras ações por meio de uma pretensa legitimidade, já que o Racismo não é apenas um fenômeno social de ordem estritamente coletiva, mas sim um fenômeno que individualmente reflete características da totalidade. Dentre tais perspectivas, a mais fértil é a teoria sociológica de Max Weber, sociólogo alemão do século XIX, segundo a qual, se utilizada para analisar o Racismo quanto ação social, exporia que a ação social do Racismo é motivada por expressões históricas da cultura, e figura-se como uma forma histórica de dominação, originada pela utilização do poder pelas classes dominantes de etnia branca, que o exercem por meio de sua autoridade, originada de sua legitimidade. Aqui daremos mais atenção ao conceito de legitimidade por relacionar-se ao principal gargalo no combate ao racismo: a falsa argumentação de inércia histórica. Para Weber, a legitimidade é um motivo pretenciosamente válido para cada indivíduo exercer sua autoridade por meio do poder, objetivando uma possível dominação. No caso do Racismo, a legitimidade que o legitima não é de ordem legal desde o ano de 1951, com a criminalização do Racismo, mas sim de ordem histórica e tradicional, ou seja, o que legitima o Racismo é sua estruturação e seu engendramento histórico, e o que legitima a irresponsabilização dos atos racistas cometidos pelas pessoas é a falsa argumentação de uma inércia histórica, ou seja, de que as coisas sempre foram assim historicamente e portanto, tardam a mudar, ressaltando que o conceito weberiano de "legitimidade" tem papel central no combate ao Racismo, por impossibilitar, se rompido, o exercício da autoridade pelas classes dominantes por meio da força, e consequentemente, impossibilitar a instauração de uma dominação racial, isto é, clara e distintivamente, o Racismo.

Teodoro Susi Alves
1 Ano - Noturno