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domingo, 6 de outubro de 2019

Mais que judicialização, visibilidade social e de direitos

 O filme "Madame Satã" evidencia o preconceito existente no brasil tanto com relação aos negros quanto aos moradores da favela e LGBT's. Nesse sentido, João Francisco, o qual é a figura principal sobre a qual gira em torno a narrativa, sonha em se tornar uma pessoa reconhecida no meio artístico por suas apresentações. Todavia, frente ao preconceito já vigente na época, ele encontra grande dificuldade para conseguir apoio para que pudesse expor seu talento a sociedade. 

 Partindo dessa perspectiva, vale lembrar que todos esses preconceitos, os quais são retratados na obra cinematográfica, ainda perpetuam existindo e causando efeitos negativos, como pode ser esclarecido por pesquisas realizadas por movimentos sociais como o "Grupo gay da Bahia", que realiza investigações relativas a violência causada pelo preconceito, e a partir delas, divulgou a afirmação de que os casos de preconceito no Brasil alcançaram seu auge nos anos de 2011 e 2012, dado o qual é muito importante diante do fato de que o Estado brasileiro se omite de investir em análises nesse âmbito. Sob esse viés, diante das demandas emergentes da sociedade, como retratado pelo pensador Michael McCann, os tribunais ganham cada vez mais força, tendo em vista que os demais poderes sociais têm se mostrado omissos, como é o caso do Legislativo, o qual há décadas teve a oportunidade de criminalizar a homofobia, no entanto, nada fez, por motivos com viés ideológico, sendo, dessa forma, conivente com a morte e violência contra milhares de cidadãos. 

 Por essa razão, McCann concluiu que os tribunais, em meio a contextos como esse, se tornam catalizadores das ações político-sociais, uma vez que uma das suas principais funções é ser um defensor da Constituição, a qual tem como alguns de seus valores a igualdade, a seguração social e a liberdade dos indivíduos para que, desde que dentro dos princípios legais, possam se expressar livremente. Além disso, como abordado por Antonie Garapon, é importante ressaltar a desigualdade existente na suposta igualdade democrática, já que ao ignorar a necessidade de que aqueles que sofrem com a exclusão social, em razão de suas características físicas, relações amorosas e condições financeiras, os cidadãos pertencentes a esses grupos ficam rendidos a própria sorte, sem o aparato necessário tanto da sociedade quanto do Estado. 

 Sob essa ótica, no mês de setembro ocorreu a VI Semana de Sexualidade e Gênero (SSG), no campus da Unesp presente em Franca/SP, o qual realizou um "Cine debate" sobre o filme supracitado, visando trazer a temática para ser colocada em questão no meio acadêmico e quebrar tabus com relação a mesma. Ademais, vale ressaltar que o Direito é capaz de realizar grandes mudanças na sociedade, tendo em vista que quando mobilizado em conformidade com as demandas sociais, consegue criar mecanismos os quais, aos poucos, são capazes de modificar valores e atitudes as quais afligem há séculos grupos marginalizados como os representados pela figura de Madame Satã. 


Danieli Calore Lalau 1° ano - noturno 

Um século: muitos anos, poucos avanços


O filme “Madame Satã”, protagonizado por Lázaro Ramos, que interpreta João Francisco,  um homossexual que reside no Rio de Janeiro e que vive de suas apresentações como “transformista”. O enredo explora a violência de que eram alvo os transexuais no período do Estado Novo, em que houve uma tentativa de higienização da capital carioca, processo esse que contava com a eliminação das travestis e garotas de programa que trabalhavam em áreas centrais da cidade, chamada de “Operação Tarântula”. Como existia, também, o preconceito na época de que as travestis eram todas portadoras do vírus HIV, os policiais não se aproximavam delas se estas estivessem com ferimentos, por medo de contaminarem.  Dessa forma, o único meio de se protegerem da violência policial encontrado era contarem-se com pequenas navalhas, afastando, assim, a força policial.
Infelizmente, essa violência contra homossexuais e transexuais ainda é um fator alarmante na sociedade brasileira, sendo o Brasil o país que mais mata transexuais no mundo todo. Por isso, é de extrema importância a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a ADI por omissão, que deferiu a criminalização da homofobia, estendendo a interpretação da lei de racismo para crimes motivados pela orientação sexual. Dessa forma, o Tribunal tenta coibir os crimes contra essa população, uma minoria dentro da sociedade, que se mostra vulnerável frente a uma sociedade que vem se mostrando cada vez mais violenta e permeada por moralismos conservadores e preconceitos. A partir da decisão do STF podemos ver uma, mesmo que tênue, evolução dentro dos direitos da população LGBTQ+, passado quase um século do período retratado no filme, mas que não foi mera encenação, mas sim a realidade vivida pelas pessoas na época, que não tinham suas vidas resguardadas nem mesmo pelo Estado, uma vez que a mais alta instância jurídica brasileira, hoje, reconhece o dever de prezar pela segurança de todos os seus cidadãos, sem qualquer tipo de distinção, seja ela de raça, gênero ou orientação sexual.


Júlia Veríssimo Barbosa - Direito (noturno)

Madame Satã, a luta LGBTQI+ e outras dissonâncias

Sob os auspícios do Centro Acadêmico de Direito "André Franco Montoro", foi realizada a semana da sexualidade, a qual trouxe um debate baseado na obra cinematográfica "Madame Satã". Por si só, a obra já retrata muito de uma realidade pouco visada nos meios midiáticos: a de pessoas marginalizadas, pobres, pretas e homossexuais.
Dito isso, há muito o que ser dito sobre o Rio de Janeiro, mais especificamente a Lapa, na década de 30. Como por muitos classificado, "o berço da boemia" é retratado como palco de malandros e prostitutas, além de cenário de um difícil lugar para se viver quando se é um homem tão marginalizado e pertencente a tantas minorias como o protagonista, João Francisco, o "Madame Satã".
Contextualizada a obra, nota-se que o quão interessante pode ser uma comparação entre a "luta" realizada no filme com a luta dos movimentos LGBTQI+ da atualidade, algo que pode ser muito bem explorado. 
João Francisco, pelo simples fato de ser efeminado, já luta diariamente pela causa dos direitos das minorias. Sua incompatibilidade com os padrões impostos pela sociedade já o torna destoante no meio e, portanto, sua mera existência gera desconforto naqueles cujo preconceito é algo ainda presente. Essa forma de luta, ainda presente nos meios atuais, pode ser julgada como um dos meios mais efetivos: as travestis, os transexuais e os homossexuais efeminados estão na linha de frente do confronto contra o preconceito, já que lidam diretamente com o foco dele: a ignorância dos seres humanos em sua individualidade.
Porém, em complemento à essa luta, há também aquela dos que, mesmo estando na condição inferiorizada de homossexuais, ainda possuem formas de defesa diversas das do grupo marginalizado: a mobilização judicial. Como exemplo dessas pessoas, há o advogado Paulo Iotti, mestre em doutor em Direito Constitucional, que fez uma ótima sustentação oral no Supremo Tribunal Federal em defesa da criminalização da LGBTQI+fobia através de sua analogia com a Lei do Racismo.
Assim, percebe-se a variedade, complementariedade e diversidade das formas de luta contra o preconceito, o que é extremamente importante e necessário quando se percebe a dificuldade e resistência do preconceito ainda tão presente.

Leonardo de Paula Barbieri
1º Ano - Matutino
     A vida para aqueles que destoam do que é socialmente aceito no Brasil não é fácil. O filme "Madame Satã" retrata tal situação com precisão, dando luz a uma realidade brasileira que, até então, era posta de lado. A obra cinematográfica trata sobre a vida de João Francisco dos Santos, mais conhecido pelo nome que leva o título do filme, que era um homossexual transformista que viveu no Rio de Janeiro décadas atrás e que lutou contra uma sociedade extremamente retrógrada e conservadora, resistindo com seu estilo de vida em meio a tanta repressão.
   Apesar dessa figura tão marcante ter vivido num período anterior ao nosso, sua história ainda pode ser muito relacionada com a vivência de todos aqueles e aquelas que ainda passam por dificuldades semelhantes. como foi tratado na Semana de Sexualidade e Gênero na UNESP, o Brasil permanece preconceituoso e segregador.
   Assim como Madame Satã lidou com a falta de oportunidades, o racismo estrutural, a homofobia e o sistema carcerário desumano no passado, hoje, negros e todos aqueles que fazem parte dessa diversidade marginalizada também enfrentam tais desafios. Para lidar com isso, como foi dito durante o evento da universidade, é necessário "ser muitas" para sobreviver nessa sociedade. A união e a consciência de classe é algo imprescindível nesse cenário, seja para enfrentar os perigos de ser diferente ou até mesmo para lidar com a solidão que vem como consequência disso. 
  Entretanto, essa segregação adquire uma nova configuração na contemporaneidade, ela não tem mais só uma forma violenta e direta. Ela também pode ser sutil e indireta, acontecendo, por exemplo, como foi citado durante a palestra na universidade paulista, da manipulação das narrativas de protagonismo de LGBTQ+, de negros, para silenciá-los. Um exemplo claro disso é a cantora Madonna sendo uma referência mundial de Vogue, um símbolo de resistência e cultura, enquanto os verdadeiros protagonistas desse movimento são esquecidos.
  Dessa forma, é necessário, parafraseando uma das palestrantes, trazer o debate para os diversos tipos de público, adaptando-o a cada um delas para torná-lo afetivo e acessível. Todos nós precisamos entender a realidade e as dificuldades vividas por esses grupos, mesmo que não façamos parte deles. A amplitude do discurso é o que possibilita que ele se torne politizado e algo construtivo.


Victor A. Lopes de Menezes - 1° Ano (Noturno)
O Filme Madame Satã, de Karim Ainouz, 2002, retrata algo ainda muito presente na sociedade que, em meio a igualdades, expõe grande preconceito, intolerância e violência com os diferentes, como que não se encaixam no pré-definido, a exemplo dos homossexuais. Na obra, que é baseada em uma história verdadeira e se passa no século 20, sobre João Francisco dos Santos incide a exemplificação do sofrimento que os fogem a heteronormatividade tem que passar, sendo ainda negro e pobre, tendo que aguentar humilhações, preconceitos e estereótipos. Como resposta a isso, João usa de violência, tendo orgulho do que é, por ser gay.
A história traz reflexão, que é muito importante para a situação das minorias e sua luta diária, que é ainda muito mais intensa a João, que apesar de tudo não se encaixa em estereótipos, tendo personalidade forte  ao querer se encaixar na sociedade.
Ademais, partindo de toda violência e intolerância existentes no Brasil, que segundo o grupo gay da Bahia o coloca entre os países que mais matam homossexuais, o Judiciário colocou em pauta criminalização da homofobia, que foi aprovada apesar das críticas de que deveria ser ação do Legislativo, tendo como conclusão que houve omissão do congresso nacional com relação à segurança dos LGBTs. Assim, se enquadrando na lei do racismo, a criminalização da homofobia vem como uma grande vitória em uma sociedade tão julgadora e cruel.
Conclui-se que a garantia de segurança, principalmente a legal, para os LGBTs é essencial, na medida em que os números alarmantes se juntam com um cenário desestimulador, em uma sociedade que vê nas singularidades motivo para diferenciações, deixando a humanidade de cada um de lado.
Julia Rocha Luciano
1° de direito noturno

Olhar autêntico sobre as realidades sociais


O filme Madame Satã, o qual o célebre ator Lázaro Ramos interpreta João Francisco dos Santos, traz na atualidade uma reflexão acerca de um importante episódio do sistema jurisdicional brasileiro: a inclusão, por parte do Supremo Tribunal Federal, da homofobia e a transfobia como um crime de racismo, previsto nos incisos XLI, XLII e LIV do art. 5º da Constituição Federal.

O personagem principal, conhecido por se transvestir, representa o motivo da necessidade dessa garantia de direitos, por sofrer, ao longo da trama, os efeitos negativos da pratica da exclusão e do preconceito diante do seu processo de crescimento e transformação, alcançando o seu meio de trabalho e seu círculo social. Além disso, João espelha o pobre e negro marginal do Rio de Janeiro, expondo – ainda – maiores dificuldades de inclusão e aceitação. Por esses motivos, vê-se como a obra nos permite entender e conhecer a realidade frequente desse grupo na sociedade, a qual padece não somente de discriminações, como muito demonstrado no filme, mas também de constante violência e intolerância.

A inserção desse significativo aparato normativo transpassa uma realização meramente integrativa no conceito de racismo, porém expressa uma representação fundamental para a população semelhante a João, a qual experimenta uma histórica e nociva marginalização. Ademais, o STF pode alcançar laboriosas demandas do nosso sistema legislativo, que não consegue concretizar de maneira efetiva mecanismos essenciais para resguardar à sociedade de tais mazelas. Dessa forma, constata-se como a ação do judiciário pode expandir e reconhecer garantias relevantes, mobilizando direitos que não se encontravam no cotidiano interpretado pelo filme em questão.

Em suma, conclui-se como um olhar autêntico sobre os fatos e realidades sociais, como exibido em Madame Satã, pode trazer a compreensão das reivindicações de direitos e refletir sobre suas abrangências no ordenamento jurídico. O STF pode contribuir para o combate das inúmeras práticas preconceituosas e asseverar direitos vitais não efetivados.

Pedro José Taveira Bachur - 1º Ano Direito Diurno

A luta LGBT e o papel do Judiciário na garantia de dignidade e humanidade.

Em vista dos altíssimos índices de violência contra a comunidade LGBT no Brasil, se torna cada vez mais necessário, tanto que medidas sejam tomadas para proteção do grupo, quanto que o assunto receba maior visibilidade, de modo que a realidade, sem preconceitos e estereótipos, traga consciência. E é uma abordagem como essa que o Filme Madame Satã, de 2002, traz.
A obra, que se baseia em fatos reais, se passa no início da década de 30, no Rio de Janeiro, e tem como personagem principal João Francisco dos Santos, que é descrito como preto pobre e de pouca inteligência, e que além das características descritas é homossexual. No filme, o personagem não esconde sua orientação e tem orgulho, indo contra os estereótipos, em um momento anterior à qualquer movimento de luta contra a discriminação, preconceito e crimes contra o grupo, tornando clara, na história, a luta desses, que é três vezes maior para João, que também carrega o peso colocado sobre os negros e os que fazem parte dos socioeconomicamente desprivilegiado.
O personagem principal, assim, muitas vezes é humilhado, indevidamente acusado, passando por inúmeras situações difíceis, tendo a agressividade como resposta, para sua sobrevivência.
Hoje, décadas depois, a realidade não é muito diferente e os alarmantes números de casos de violência levaram judiciário votar a Criminalização da homofobia e da transfobia, enquadrados na lei do racismo, ao determinarem que houve omissão do Legislativo diante da gravidade do caso. Com a decisão, concluiu-se que o conceito de racismo ultrapassa o biológico e o fenotípico, alcançando violações a dignidade a humanidade de vulneráveis, sendo necessária a equidade de direitos e proteção estatal das minorias.
Assim, a decisão do Judiciário, apesar de ter recebido críticas como a de que haveria atropelado o legislativo, se faz, no entanto, indispensável em um país onde a intolerância e a discriminação são fortes e reforçadas por estereótipos, sendo ainda mais fácil entender sua necessidade após ver o filme, onde sem nenhuma proteção, o personagem se vê obrigado a agir com violência por sua sobrevivência e direito de ser quem é em uma sociedade que julga as singularidades.
Monica C. dos Anjos Bueno.
1°ano de direito noturno.

A expressão artística como instrumento de resistência

O filme "Madame Satã" é protagonizado pelo importante ator brasileiro Lázaro Ramos, que nesse longa representou João Francisco dos Santos, um conhecido artista que enfeitou os palcos da Lapa e região na primeira metade do século XX.  
João Francisco era homossexual, negro e pobre, marginalizado em todos os âmbitos da sua vida viu na expressão artística um lugar de refúgio onde poderia alcançar seu êxito existencial e ainda superar os limites impostos por suas condições de vida. 
Um dos momentos mais impactantes do filme é quando, em suas últimas cenas, João resolve depois de anos ocupando os bastidores, enfrentar o palco e viver seu sonho. É nesse contexto que, após um espetáculo, o artista é confrontado por um homem que frequentava o local, cujo qual direcionou a ele um discurso homofóbico e agressivo. Dono de uma personalidade forte, João Francisco se revolta e bate de frente com o autor dessas frases preconceituosas, afirmando com tom de orgulho sua sexualidade e alegando que isso não o desqualifica como homem, pois o mesmo apesar de em noites de apresentações se vestir com roupas femininas, continua sendo homem cis. 
O debate acerca dessa filme realizado no Campus da unesp teve como convidadas duas transsexuais que discorreram sobre a importância do filme como símbolo da luta lgbt em lugares suburbanos e principalmente como objeto de representatividade. Analisando a obra cinematográfica é possível perceber que apesar de passados quase 90 anos o discurso direcionado a população LGBT e os preconceitos por eles sofridos continuam praticamente a mesma coisa, caminho esse de discussão utilizada pelas palestrantes quando afirmam sobre a constante onda de violência que atinge as pessoas trans. 
Outro caminho seguido no debate foi a importância da expressão artística na vida de muitos LGBTs, pois a mesma permite que através da expressão corporal e outros meios artifícios esses indivíduos encontrem conforto ao mesmo tempo que confrontam a sociedade preconceituosa a qual estão inseridos. Ainda sobre o mesmo assunto, encerra-se o debate com uma oficina sobre o vogue, uma importante dança utilizada majoritariamente pelo movimento lgbt como instrumento de empoderamento e resistência. 
Unindo a experiência proporcionada pelo filme com a reflexão do mesmo oferecida pelo debate fica evidente o como a vida daqueles que questionam e violam os comportamentos hétero normativos é vulnerável a todo tipo de agressão e preconceito, sendo de suma importância materiais cinematográficos, literários e afins, que tenham como intuito divulgar a causa além de dar força e empoderar aqueles que se sentem reprimidos pelo sistema. 
Barbara Medeiros (Direito noturno)

Madame Satã e a luta contra a LGBTIfobia
Entre os dias 16 e 18 de setembro de 2019 ocorreu a VI Semana de Sexualidade e Gênero (SSG) no campus Unesp-Franca sob organização do Centro Acadêmico de Direito "André Franco Montoro". Dentre as atividades desenvolvidas, ocorreu um “Cine Debate” acerca do filme "Madame Satã" com mesa composta por integrantes do Coletivo Casixtranha de Araraquara. Após a conversa sobre o filme ocorreu uma oficina de Dança Vogue.
O filme de 2002 conta uma parte da história de Madame Satã, alcunha de João Francisco dos Santos, e sua paixão pela vida artística como transformista. Por ser negro, pobre e homossexual, Madame Satã enfrentou (quase sempre com capoeira) os preconceitos (ainda vigentes) da sociedade brasileira referente aos três adjetivos que o descrevem. Morador e frequentador da Lapa, bairro carioca até hoje marcado pelo estigma da boêmia e da vadiagem, Madame Satã figura como um dos personagens mais representativos da luta contra a homofobia e a transfobia.
Infelizmente, não havia ficado claro para os ouvintes da SSG que o filme não seria exibido, que apenas ocorreria o debate, o que prejudicou a discussão. Por isso, não houve um debate em si, apenas uma roda de conversa em que a palestrante Vita Pereira discorreu sobre como a LGBTIfobia é ainda presente em nosso país tanto quanto na época de Madame Satã. Os travestis sempre foram perseguidos, seja por dispositivos legais como a Lei da Vadiagem de 1941, que era uma forma de violência sobre as populações mais vulneráveis e sem recursos, ou operações especiais como a Operação Tarântula, que foi uma onda de caça às travestis que passaram a ser brutalmente assassinadas durante os anos 1970 e 80. Com a sociedade brasileira apoiando esse processo de gentrificação de espaços urbanos LGBTI, as travestis acabam por recorrer a meios pouco convencionais para se defender, como se cortar com navalhas para evitar serem tocadas pela polícia. Na contramão do preconceito e buscando se sentir incluídos socialmente, surgiu, no final dos anos de 1980 em Nova York, o estilo de dança Vogue, que representa uma forma de empoderamento das travestis e drag queens que dançavam com muita pose e “carão” a fim de se consolidar e enfrentar a marginalização.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, seguindo princípios fundamentais dos direitos humanos, prevê a igualdade e a não discriminação em qualquer sentido - artigo 5º, inciso XLI. Entretanto, ainda vemos na sociedade brasileira o mesmo preconceito LGBTIfóbico que marcou a vida de Madame Satã com violência e discriminação. Em uma tentativa de reverter essa situação social de exclusão e preconceito, já que nenhum avanço ocorreu por meio legislativo, foi ajuizada a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26), na qual se demanda a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia. Na tese final da ADO 26, o colegiado entendeu que a homofobia e a transfobia se enquadram no artigo 20 da Lei 7.716/1989, que criminaliza o racismo.
A busca dos LGBTIs por meios legais de efetiva proteção física e emocional (ADO 26) e de representação (figuras reais como Madame Satã) é um grito em direção à inserção desses grupos e pessoas à sociedade. Um clamor pelo fim do preconceito e marginalização. Algo que o Coletivo Casixtranha realiza através da busca por diálogo e difusão da cultura Vogue.

Raquel Rinaldi Russo – 1º ano Direito Matutino

Madame satã nos dias atuais


Madame satã é um filme escrito e dirigido por Karim Aïnouz, inspirado na história real do pernambucano João Francisco dos Santos, o qual usava “madame satã” como nome artístico em suas performances transformistas realizadas em casas noturnas na Lapa, Rio de Janeiro, na década de 30. O filme aborda o universo de prostitutas, bêbados, artistas, gays e pequenos golpistas, sendo o próprio João homossexual negro. Uma questão também explícita é a estrutura social excludente do Rio, onde a violência e o preconceito contra os negros e gays é extremamente forte. Nesse sentido, o filme aborda bem os métodos usados como resistência pelos marginalizados e excluídos da sociedade, como a capoeira, além de costumes, religião de origem africana. O filme já inicia com a leitura de uma sentença proferida contra João, condenado por homicídio doloso, e na qual exprime muito bem como a sociedade da época o enxergava, julgando-o simplesmente como um desordeiro, um “torto” e devasso que praticava atos repulsivos, e por isso ele mesmo se vê nessa vida malandra, mesmo querendo uma vida profissional artística. Mas o filme nos mostra um lado de João que cuida e protege os seus sempre que necessário, até se envolvendo em brigas, e que luta para ganhar seu dinheiro e se “endireitar”, como ele mesmo diz, nessa sociedade tão segregacionista e trans-homofóbica.
É fato que o Brasil é um país de grande diversidade cultural, devido às inúmeras influências que recebeu. A evolução dos direitos dos negros foi um caminho árduo e conflituoso, no entanto, principalmente pela atuação de movimentos sociais, teve-se, gradativamente, um olhar voltado a essas minorias. Posto isso, cabe igualmente falar dos homossexuais, uma vez que João era e também sofria com a homofobia. Fazendo um paralelo com a criminalização da homofobia e transfobia, que se concretizou somente em 2019 com a ADO 26, nota-se como essa é uma luta colossal e intensa. Nesse sentido, retomando a teoria do autor Antoine Garapon, que diz que a judicialização do Direito vem acontecendo desde anos 90, o protagonismo dos tribunais nesses assuntos só se dá justamente por terem sido provocados, como por movimentos sociais e indivíduos, que demandam justiça e reivindicam a efetivação de seus direitos. Assim, o magistrado, apesar de atuar em temas que não são de sua devida competência, acaba intervindo em questões morais emergentes que cabem ao legislativo, mas que por fim são de extrema importância para a sociedade, pois garantem cada vez mais uma maior harmonia e igualdade, dando voz, espaço e força às minorias. O Direito é um recurso à disposição de quaisquer autores e faz parte da vida social; ele precisa ser mobilizado, como sustenta o autor Michael McCann.
O filme passa longe de ser uma mera espetacularização, pois mostra a realidade e trajetória nua e crua que madame satã teve que enfrentar, tanto no cortiço em que morava quanto nos lugares que frequentava, até sua primeira apresentação no bar do Amador. Ademais, por mais que inúmeros avanços tenham sido alcançados, como muitos direitos que foram positivados especificamente para proteger e tutelar essas minorias marginalizadas e sem voz (negros e LGBT), o preconceito, a intolerância e a violência ainda são intensos e preocupantes até hoje. Atitudes vexatórias e discriminatórias, xingamentos e desrespeito (como ocorre no filme: “você está vestido de homem ou de mulher?”/“maricagem”), infelizmente são enfrentados diariamente por incontáveis cidadãos brasileiros, que se veem à mercê da sociedade e da justiça. No fim do filme é dito que, em janeiro de 1942, João é posto em liberdade após cumprir pena de 10 anos, e no carnaval do mesmo ano ganha o concurso do bloco caçadores de veados com sua fantasia madame satã, além de ganhar outros carnavais, obtendo a notoriedade e o reconhecimento como sempre sonhou. João não teve uma vida fácil, e muito menos segura, e foi isso que fora discutido no cine-debate realizado durante a VI semana de sexualidade e gênero realizada na Unesp, contando com a presença de duas integrantes transexuais do coletivo Casixtranha. Ambas relataram a dura realidade de como é ser transexual no Brasil, todos os preconceitos, medos e adversidades que enfrentam por simplesmente serem quem são, mas, ao mesmo passo em que também mostraram como recebem muito apoio e força daqueles que simpatizam com suas causas e com o movimento LGBT em si. Por fim, apesar do notório crescimento de pensamentos extremistas e conservadores no país e o no mundo, acontecimentos como a criação da lei do racismo no7.716 e da atual criminalização da homofobia demonstram que, apesar da morosidade, essas minorias estão sendo vistas pelo Direito, mas a luta está longe de ter um fim.
Raquel Colózio Zanardi – 1o ano Direito (matutino)

Os problemas sociais e a intervenção do Direito


         O racismo é um problema histórico-social-cultural, que possui suas raízes no colonialismo, e afeta, até os dias de hoje, uma grande parcela da população negra brasileira. Após a abolição da escravatura, que já tinha sido tardia em comparação a outras nações, o Estado brasileiro não ofereceu nenhum suporte aos ex-escravos.
Ainda, com a política de “embranquecimento”, no final do século XIX, na época da imigração europeia, principalmente no Rio de Janeiro, que era capital do país nesse período, a população negra foi “realocada” dos grandes centros, onde já viviam em condições precárias, para a periferia; e é onde grande parte dessas pessoas se encontram até a contemporaneidade.
Analogamente, a questão da homofobia e transfobia também é um problema construído culturalmente. Desde a disseminação da cultura judaico-cristã, com a assimilação da ideia de que as práticas sexuais serviam estritamente para procriação, o ato homossexual foi ganhando novas feições e sendo reprimido pela igreja, que tratava como pecado.  
A homotransfobia é classificada como aversão, repugnância, medo, ou ódio à população da comunidade LGBT a qual, muitas vezes, gera violência contra as pessoas que se identificam com essa comunidade.
Em ambos os problemas, essas populações são marginalizadas, postas à mercê de uma sociedade que as oprime, física e psiquicamente; e até recentemente, não possuíam nem amparo do Direito.
Foi apenas com a Constituição de 1988, considerada a “Constituição Cidadã”, onde um dos principais pilares é a garantia dos Direitos Fundamentais individuais, que incluem o direito de liberdade, de dignidade da pessoa humana e de igualdade, foi possível a busca pela criminalização dessas questões.
A Lei do Racismo, nº 7.716, surgiu apenas em 1989 e dita, em seu primeiro parágrafo, que “serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”, obtendo assim, uma vitória importantíssima quanto às questões sociais.
Entretanto, a criminalização da homofobia ocorreu apenas em junho de 2019, e depois do longo processo de julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 26 e do Mandado de Injunção (MI) nº 4733, tendo o primeiro o Ministro Celso Mello como relator, e a participação de diversos amicus curiae.
Foi decidido, por maioria do Supremo Tribunal Federal (STF), que os crimes de homofobia e transfobia seriam enquadrados na Lei do Racismo, além de reconhecerem que havia mora legislativa quanto ao tema.
Se dentro dessa realidade, ainda é uma luta diária para se poder exercer os direitos de liberdade, igualdade e dignidade, há de se imaginar a realidade dessas populações minoritárias na sociedade do século XX.
Sendo uma forma de ilustrar essa realidade, “Madame Satã” é um filme de 2002 que retrata a vida do transformista brasileiro João Francisco dos Santos, negro, pobre e homossexual. Sob a alcunha de Madame Satã, ele tornou-se um dos personagens mais representativos da vida boêmia e marginal do bairro da Lapa, no Rio de Janeiro, na década de 30.
João se prostituía e vivia em um cortiço com Laurita, prostituta e sua “esposa”, e a filha dela; no mesmo ambiente, vivia também Tabu, seu amante infiel. A obra perpassa pelo seu cotidiano violento e cheio de conflito, culminando em sua carreira como artista, onde ganhou seu apelido, retirado do filme homônimo dirigido pelo cineasta americano Cecil B. deMille.
A violência imposta diariamente sobre ele, aliada ao seu temperamento, fez com que fosse preso diversas vezes durante a vida. Um dos casos mais emblemáticos, foi o homicídio de um dos homens que frequentava a casa noturna em que ele se apresentava, depois de uma discussão entre os dois; gerando uma reclusão de dez anos ao artista.
            Essa obra biográfica retrata de forma bastante concisa a realidade dos negros homossexuais na sociedade da década de 30, tendo o pensamento dessa sociedade, refletido ainda nos ideais conservadores que nos últimos anos ressurgiram com mais força, concomitantemente com os movimentos sociais em prol desses grupos.
         Para trazer essa pauta, foi organizado um cine-debate pelo Centro Acadêmico de Direito na UNESP/Franca, em que foram convidadas duas integrantes transsexuais do coletivo Casixtranha.
Por mais que o filme não tivesse sido abordado como elemento principal, elas conseguiram trazer uma visão de quem, no dia-a-dia, sente na pele a violência contra as populações negra e homotranssexual, além de terem trazido dados concretos e assustadores sobre o tema.
Ademais, foi possível perceber que elas demonstram um "cansaço" em relação a isso, e em muito, elas lembram Madame Satã, como a forma de se expressarem artisticamente, e a linguagem, de certa maneira, violenta. Isso demonstra, mesmo que de forma implícita, uma resposta às violências sofridas e pode ser o único jeito que elas vêem de serem ouvidas nessa realidade.    
Destarte, é possível a reflexão de como essa população, mesmo com as vitórias quanto as criminalizações, ainda sofre bastante, apenas por serem quem são. Isso demonstra que ainda há muitas ideologias que devem ser desconstruídas, para que haja o abarcamento da pluralidade que são os humanos.
Sendo assim, nós, como estudantes de Direito, devemos buscar sempre, seguindo os preceitos da Constituição, estar melhorando a qualidade de vida dessas populações vulneráveis, com a garantia do exercício de seus direitos, gerando assim, nas palavras de McCain, uma mobilização do Direito.
Como afirma Audre Lorde escritora caribenha-americana, negra, feminista e ativista dos direitos civis: "quando falamos, temos medo de que as nossas palavras não vão ser ouvidas ou bem-vindas. Mas quando estamos em silêncio, ainda temos medo. Por isso é melhor falar.". Assim, devemos dar vozes a esses grupos, pois o medo é o princípio da opressão. E quem realmente somos, não pode ser oprimido.

Daiana Li Zhao - 1º ano - Direito Matutino

Madame Satã e sua relação com a ADO 26 e os crimes contra membros LGBTQ+

O filme “Madame Satã”, abordado na VI Semana de Sexualidade e Gênero, que se passa nas favelas do Rio de Janeiro da década de 1930, aborda a trajetória de João Francisco dos Santos, um “preto, pobre, pederasta e de pouca inteligência”, conforme lido em um dos inquéritos a ele dirigidos. Nessa conjuntura, vemos como desde tempos atrás os homossexuais e os moradores dos morros sofrem nas mãos das autoridades e são negligenciadas pelo Estado. O nome do filme advém de uma passagem da vida de João, quando ele desfila no carnaval de 1938 em uma fantasia dourada, garantindo o primeiro lugar no concurso de fantasias. O personagem foi uma figura muito contraditória, sendo, nessa sociedade, tido como um “anormal” ou um “desviado”, rompendo com a coesão social de Émile Durkheim, de um grupo padronizado e heteronormativo. Assumidamente homossexual, tendo um orgulho de o sê-lo em uma época que esse contingente era muito mais marginalizado do que é hoje, João reitera esse orgulho em uma frase muito marcante do filme: Eu sou bicha porque eu quero, mas não deixo de ser homem por isso não”, passando por vários conflitos e realizando apresentações transformistas em boates das favelas do Rio de Janeiro.
Tendo em vista esse breve resumo, nos voltemos à ADO 26, ajuizado pelo PPS (partido popular socialista) contra o Congresso Nacional, havendo como Amicus Curiae o Grupo Gay da Bahia. Nessa ação, que em muito reflete o filme citado, à medida que ambos são uma forma de protesto contra a marginalização dos LGBTQ+, tendo em vista que a primeira é uma contestação e uma medida para se criminalizar os delitos contra esses tipos de crimes (tendo em vista sua não tipificação no código penal) sendo estes punidos como crime de racismo. A ADO foi deferida pelos ministros do Supremo Tribunal Federal e houve provimento de se punir crimes contra os LGBTQ+ de acordo com a tipificação de crimes de racismo. Dessa forma, qualquer desses crimes não mais será tido como crime comum, mas sim será tido como crime de racismo e será punível com reclusão de um a cinco anos. Essa foi uma decisão histórica cujo acontecimento marca a luta por igualdade que esses grupos buscam, assim, aumentando a relação de pertencimento que esse grupo possui para com a sociedade brasileira.

Dentre os votos dos ministros do STF, houve uma ressalva feita por Ricardo Lewandowski, que afirmou que ao legislar dessa forma, eles estariam entrando numa competência somente competida ao poder legislativo. No entanto, por ineficácia ou por falta de interesse para com seu povo, este não se move para realizar políticas públicas nem normas para que haja algum tipo de pena para crimes contra aquela população, assim, o STF, exerceu seu papel de salvaguardar o que está presente no inciso XLI do artigo 5º da Constituição Federal, atingindo a finalidade de se diminuírem paulatinamente os crimes contra esses grupos, tais como os frequentemente demonstrados no filme supracitado.

Theodoro Antonio de Arruda Mazzotti Busulin 1ºano Direito matutino

Madame Satã
O filme madame satã traz uma importante discussão acerca da homofobia no Brasil e a condição do negro na sociedade. João Francisco dos Santos era homem, negro, analfabeto, homossexual e defensor dos oprimidos. Se hoje o seu estereótipo é motivo de retaliação, quem dirá em 1900. Ser “outside the box” sempre traz consequências e sofrimentos, principalmente para quem vive, porém é de pessoas fora do seu tempo que a sociedade se constrói.
E foi essa a discussão que tivemos na semana de sexualidade e gênero. Sobre um homem fora do seu tempo, que criou 6 filhos, casou-se com uma mulher, navalhou policiais, foi preso, trabalhou em bordeis e criou fantasias que ganharam prêmios. Não é, de forma alguma, romantizar o sofrimento desse homem, mas trazer uma esperança sobre pessoas que não tem medo de falar o que elas são. E nesse diapasão, a criminalização da homofobia traz consigo uma carga de histórias como a de João.
Apesar das críticas sobre a homofobia ser inclusa no crime de racismo, a importância desse assunto estar sendo discutido e gerar comoção social demonstra de certa forma uma maior representação da comunidade LGBTQI+, legitimando discursos emergentes na sociedade. O filme é um reflexo do pensamento da época, onde “viado apanha e policial bate”, e parece que quase 100 anos depois do nascimento de Madame Satã, o estado continua como opressor.
Por fim, a história parece mais atual do que nunca. A discriminação do estereótipo e a permanência da violência contra as minorias são chega ao fim. A pergunta deveria ser “até quando” ou “por que ainda?”

Maria Júlia Fontes Fávero - 1° ano Diurno
























































Madame Satã e a atualidade da luta LGBT


Madame Satã foi um dos filmes inspirados na figura emblemática de João Francisco dos Santos, pessoa real nascida em Pernambuco em 1900. A obra cinematográfica em questão, dirigida por Karim Aïnouz retrata a vida de João como sujeito “preto, pobre, pederasta e de pouca inteligência”, dizeres presentes na cena de abertura do filme. Destacava-se pela coragem e inconformidade, uma vez que não escondia sua opção sexual e frequentemente utilizava-se da violência como meio de defesa em uma sociedade que o estereotipava como marginal- fora preso e autuado inúmeras vezes por desacato e violência física. Como meio de ganhar a vida, entre pequenos furtos e golpes, ainda se apresentava, travestido de Madame Satã, em cabarés na década de 30. O aspecto mais relevante da figura de Madame Satã é a desconstrução de paradigmas e o enfrentamento, utilizando-se dos meios acessíveis, do preconceito e marginalização social da homossexualidade. É lembrado até hoje diante da atualidade da luta LGBT.

Nos últimos anos, coube à esfera jurídica um fato relevante à essa luta: a criminalização dos crimes de homo e transfobia pelo Supremo Tribunal Federal. Por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 26 (DF), os ministros reconheceram parcialmente a ação, enquadrando os crimes ao quadro de racismo já tipificado no Código Penal, além de sinalizar ao Congresso e ao Senado a necessidade urgente de legislação específica sobre o tema.
 Aqui, portanto, é possível fazer um paralelo da situação LGBT nos anos de Madame Satã e atualmente. É inegável que muito se avançou, já que Satã, como bem retratado no filme, utilizava-se da força e da violência para defender seu direito de liberdade sexual. Hoje, já se tem algum respaldo jurídico sobre o assunto, porém a caminhada ainda é longa. Em 2019, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB), o Brasil registra uma morte a cada 23 horas motivada pela homofobia.
Cabe ao Direito, como recurso de interação política e social e mobilização como ato político (Mccainn) o papel de, dentro dos limites da sua atuação, promover cada vez mais a inserção e a proteção das minorias. A forma de enfrentamento da exclusão social protagonizada por Madame Satã não é nada mais que o preenchimento de uma grande lacuna diante do cumprimento do preceito fundamental da constituição Federal: o direito à liberdade, à igualdade e à segurança.




Julia Martins Rodrigues- 1º ano (diurno)

Madame Satã, preconceito e vida.

Em setembro de 2019, realizou-se no campus da Unesp Franca um cine-debate acerca do filme "Madame Satã", sendo um debate inteiramente ministrado por transexuais, que debateram acerca da posição social desse grupo de indivíduos, e as formas de combate a qualquer tipo de opressão ou preconceito recebido. No filme, Madame Satã, interpretada por Lázaro Ramos, é também João Francisco, um homossexual negro, no Rio de Janeiro dos anos 1930. Madame Satã deseja inserir-se na sociedade, com sua personalidade forte e características divergentes das que os "costumes" consideravam certas. Atualmente, quase 90 anos depois, os transexuais brasileiros ainda enfrentam uma longa lista de desafios para uma inserção realmente digna na sociedade. Como se foi falado no debate, a expectativa de vida de um transexual no Brasil contemporâneo é de 35 anos, um número ridiculamente baixo em comparação com a do homem cis, que no momento é de aproximadamente 76 anos, mais que o dobro. Uma das maiores causas dessa expectativa é o homicídio da população trans, sendo motivado puramente pelo preconceito e com casos extremamente brutais. 
É digno de nota, no entanto, as formas encontradas pela comunidade transexual para ocupar seu lugar de fala e representar seu povo. Após o debate, foi realizada uma oficina que demonstrou uma pequena amostra do Vogue, uma dança praticada por essa comunidade como forma de expressão. O Vogue é basicamente composto por muita expressividade, seja com as mãos, pés ou simplesmente o rosto. Trata-se de uma forma de demonstrar toda a personalidade e vida da população trans, que não se deixa abater pelo preconceito imposto por inúmeros agentes sociais, e cada vez revive mais e mais forte.
Em suma, em um país tão preconceituoso quanto o Brasil, a simples permanência da luta trans é uma vitória que deve ser comemorada dia a dia. Segundo o artigo 5º da Constituição Federal, XLI, " a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades individuais". Assim como todos, os transexuais possuem o direito de segurança, o direito de ir e vir, o direito à liberdade e, acima de todos, o direito à vida. É tarefa do Estado assegurar tais garantias, que, embora constitucionais, estão longe de serem realidade. 
Letícia Killer Tomazela 
Direito Noturno

Reflexão e ação.

O filme brasileiro Madame Satã, de 2002, dirigido por Karim Ainouz, retrata a vida de João Francisco dos Santos, um homem pobre, negro e gay, e, de acordo com uma ficha policial retratada na primeira cena do filme, “sujeito de pouca inteligência”.
É possível perceber nessa obra cinematográfica que João não é apresentado como um “anormal” ou como um “desviado”, já que não é comparado a uma bicha histérica, feminina e fragilizada, que é como os indivíduos mais intolerantes acerca da opção sexual imaginam um homem gay. Muito pelo contrario, durante o longa, o personagem principal aparece defendendo seus amigos que moram com ele, mostrando seu lado masculino apesar de sua opção sexual.
Por apresentar personalidade forte, o personagem encontra problemas durante a tentativa de se inserir na sociedade, pois queria sempre fazer parte e além disso, entrar pela porta da frente. A ausência de um clímax conclusivo, e o fato de o personagem despertar mais sentimentos de simpatia e admiração do que de pena ou compaixão fazem com que Madame Satã não busque a cumplicidade pela lágrima fácil, e sim pela reflexão. 
Hodiernamente, é possível notar a mesma dificuldade de inserção de indivíduos negros e homossexuais na sociedade. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 26, o Deputado Federal Roberto João Pereira Freire alega que a homofobia e a transfobia constituem espécies do gênero racismo e, além disso, se enquadram no conceito de discriminação atentatória a direitos e liberdades fundamentais. Ele assegura ainda que a segurança é um direito fundamental de todos os indivíduos. 
Primeiramente é necessário notar a importância da mobilização do direito dos indivíduos homossexuais e transexuais, que, através de sua luta e de seu reconhecimento próprio de obter certos direitos que são fundamentais na vida de qualquer indivíduo. No entanto, é necessário afirmar que só há essa luta se houver criminalização da homofobia, porque esse grupo social sofre ofensas, homicídios, agressões, ameaças e discriminações motivadas pela orientação social e/ou identidade de gênero, real ou suposta. De acordo com o artigo 5º, XLII, “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;” e, segundo o artigo 5º, XLI,” a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;”. Desse modo, pode-se perceber que os indivíduos que sofrem com a homofobia diariamente são discriminados e, de acordo com a Constituição Federal de 1988, os indivíduos homofóbicos deverão ser punidos.
De acordo com Michael McCann, professor de “Avanço da Cidadania”, na Universidade de Washington, a mobilização do direito é uma forma de lutar para a democratização da sociedade, assim como é necessário que os Tribunais ajam para que a desigualdade de direitos não ocorram, os grupos discriminados devem lutar para que seus direitos fundamentais sejam respeitados. Dessa forma, além de refletirmos sobre a mensagem que é transmitida pelo filme brasileiro, é necessário que a sociedade e o direito atuem para a atenuação dessa séria problemática que é o preconceito.

Julia Pontelli Capaldi, turma XXXVI de Direito noturno.