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segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

O abismo entre a hegemonia e aqueles que ela não abrange

Sara Araújo, em artigo publicado na revista Sociologias, sobrepõe os conceitos de colonialidade jurídica e hegemonia ideológica para definir as chamadas exclusões abissais. Através das distâncias apresentadas entre o hegemônico e o excluído percebe-se as tradições dentro do Direito que limitam o universo jurídico à ele mesmo, isto é, que buscam impedir a relação de seus âmbitos com o universo à sua volta. Ela também relaciona os parâmetros modernos - e coloniais - de progresso com a criação hegemônica do que é “correto” e exemplar dentro da epistemologia, mas principalmente dentro do Direito.

Partindo desses ideais de racionalidade e civilidade, há a criação dos limites do que é aceitável no que tange a condutas sociais e institucionais, um  horizonte de possibilidades das ações conforme as regras de conduta. A partir daí surge a divisão entre aquilo que pertence ao hegemônico e aquilo que é excluído - as exclusões abissais. 

Nessa atmosfera, a globalização nada mais é do que a perpetuação da exclusão abissal, quando o ideal globalizado se torna a expansão, a nível mundial,  da visão que já é hegemônica. Isso não só gera a falsa ideia de ampliação da conexão entre o norte e o sul (hegemônico e excluído),  como também impede toda e qualquer possibilidade de uma verdadeira emancipação dos abissalmente excluídos e da construção de pontes que os liguem intrinsecamente com a ideologia dominante.

Para Araújo, o sentido de sul global não abrange somente a separação estabelecida por ideais colonialistas entre norte e sul geográficos mundiais. Essa ideia engloba também o abismo entre visões hegemônicas e não hegemônicas na epistemologia, e a consequente necessidade de busca por mecanismos que possam diminuí-lo. 

Nesse sentido, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4275 - que reconhece a pessoas transgênero o direito de substituição do prenome pela autodeclaração - é um exemplo concreto e real da tentativa da diminuição de um conflito de idéias que se ancora nas ideologias hegemônicas e na recusa das instituições que se utilizam dessa hegemonia de participar ou mesmo abrir espaço para a existência de idéias que ultrapassem seus próprios limites. 

Com a ADI se observa o uso do  sistema jurídico para uma tentativa - inicial e pequena, mas significante - de diminuir o abismo entre a hegemonia e aqueles que por ela não são representados. 


Victoria Dote Rozallez da Costa

Turma XXXVIII Matutino

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