É tênue a linha que separa o visível do invisível. Mas, aquilo que não é visto ou ouvido, não significa ser desprovido de importância, muito pelo contrário, uma vez que a necessidade de (re)pensarmos o direito para além de uma perspectiva hegemônica, suscita ultrapassar esta linha abissal, relatada por Sara Araújo em sua obra “O primado do direito e as exclusões abissais: reconstruir velhos conceitos, desafiar o cânone”.
Muito mais do que uma perspectiva geográfica ou
territorial, a adesão de uma epistemologia de Norte e Sul inerente ao
pensamento, permite a abordagem de tudo aquilo que não é considerado
hegemônico, ou seja, oferece luz, às alteridade sociais que, apesar de ocultas,
existem e dependem de amparo. Com o avanço da ciência, principalmente no
tocante à seara da ciência jurídica, convencionaram-se paradigmas, expressões de
racionalidades universalizadas e reiteradas que já estão validadas e repassadas
globalmente. A autora presta concordância à expressão normalmente utilizada
pelo professor Boaventura de Souza Santos, “Epistemicídio”, para fazer
referência à destruição das formas de conhecimento e das culturas que não são
assimiladas pela cultura do Ocidente branco, bem como a morte das formas de
conhecimento hegemônicas e, assim, o fim de um silêncio para virar eloquência,
através do uso do direito como instrumento social e não uma prerrogativa de
bacharéis.
A prevalência da chamada “razão metonímica”, serve de
alimento às cinco formas de monocultura citadas no texto: 1. Monocultura do
saber e do rigor do saber; 2. Monocultura do universal e do global; 3. A
monocultura da produtividade; 4. Monocultura da naturalização das diferenças e,
por fim; 5. A monocultura do tempo linear, servindo de instrumento para
perpetuar pautas silenciosas, considerando alteridades como atrasadas,
improdutivas, assimétricas. Esta problemática é evidenciada na prática, como
por exemplo o que ocorre com o julgado de medida cautelar na arguição de
descumprimento de preceito fundamental 467 Minas Gerais, ajuizada pela
Procuradoria-Geral da República (PGR) em face dos artigos artigos 2°, caput, e
3°, caput, da Lei 3.491, de 28 de agosto de 2015, do Município de Ipatinga (MG),
os quais excluem da política municipal de ensino qualquer referência à
diversidade de gênero e orientação sexual.
Posteriormente, admitindo, no processo, a inclusão do
Grupo Dignidade – Pela Cidadania de Gays, Lésbicas e Transgêneros e a Aliança
Nacional LGBTI, na condição de amicus curiae, uma vez que é realmente passado o
lugar de fala a quem ele sempre pertenceu, o Ministro Gilmar Mendes decidiu por
deferir o pedido cautelar para suspender a eficácia dos artigos supracitados.
Portanto, mesmo que a referida Lei do município de Ipatinga, assemelhe-se a de
outras cidades, como argumentado no julgado, tal decisão proferida não só
contribuiu para a construção de uma sociedade mais livre, justa e solidária, mas
impactou todo o lado Norte obscuro dos pensamentos, promovendo esperança para
as próximas lutas e mostrando que nem sempre o essencial é invisível aos olhos,
como diria o Pequeno Príncipe.
Júlia Nogueira Orricco - 1° ano - Noturno
Nenhum comentário:
Postar um comentário