Em
2019, a Presidência do TJRJ com o apoio do prefeito Crivella, permitiu uma ação
que buscava recolher da Bienal do Livro qualquer conteúdo que tivesse temáticas
homoafetivas publicamente exposto. Esse trágico caso expressa o conceito de
linha abissal, proposto por Sara Araújo.
De
acordo com a autora, a linha representa uma divisão entre o Norte e o Sul;
entretanto, essa divisão não é necessariamente geográfica; ou seja, esse é um
Sul que diz respeito de tudo aquilo que não é hegemônico, aquilo que não está
necessariamente no sul geográfico, mas no “sul de pensamento”. Em outras
palavras, falar de Sul é falar de grupos e discursos os quais sofrem apagamento,
silenciamento e opressão do sistema.
Essa
ideia se apresenta no caso da Bienal de 2019 pois, de acordo com a autora, esse
Norte não apenas dita e padroniza o “normal”, como também é averso a qualquer
expressão do Sul. A manifestação do Sul é sempre uma ameaça à ordem do Norte.
Ou, nas palavras da autora: “O que acontece do lado de lá não conta (outros
conhecimentos, outros direitos), é invisível, não existe ou pelo menos não
existe numa lógica de simultaneidade”. (p. 96, 2016).
Sendo
assim, a sexualidade ou a identidade de gênero fora do parâmetro definido pelo
Norte é mal vista e tratada com aversão. No caso da Bienal, vemos na prática como
essa divergência é retribuída com um esforço para que haja repressão e censura,
e consequentemente, não ameace ordem do Norte.
Entretanto,
nesse caso tivemos uma espécie de final feliz, no qual a decisão foi suspensa
pelo STF, que decidiu que a proibição era absurda. Além liberar ordens para que
os fiscais cessassem as procuras e apreensões.
Dessa
forma, consequentemente há um cruzamento momentâneo da linha abissal, e uma
visão otimista de que, talvez, gradualmente haverá mais espaço para o Sul.
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