Era um dia comum no distrito de Civilpólis, um lugar onde todos os cidadãos que tinham aptidão para as leis e queriam se tornar grandes advogados e juristas, eram designados para aprender sobre o código jurídico, sobre o seu futuro ofício e, principalmente, sobre como deliberar sentença justas e condizentes com a realidade e a Constituição do País. Para os advogados que aspiravam se tornarem grandes juízes de prestigio e poderem compor a corte de honra de Civilpólis, julgando, assim, grandes casos, estes deveriam ser orientados pelos mais celebres juristas da cidade e passar por uma prova final, em que a disciplina de Análise de Sentenças consistia uma das matérias mais importantes.
Diferente de suas aulas cotidianas, quando disponibilizava, com antecedência, o tema e o caso discutido para os alunos refletirem e pesquisarem jurisprudências, o professor Order, naquela manhã, resolveu realizar uma dinâmica diferente com a sala, para testar a capacidade de julgamento e análise dos alunos. Ao entrar na sala, o professor cumprimentou a todos e proferiu:
- Bom dia, alunos! Espero que todos estejam bem! Hoje na aula realizaremos uma atividade prática diferente do comum. Apresentarei um caso de minha escolha e os senhores, com base em seus conhecimentos jurídicos, deverão julgar e estabelecer uma sentença para esta ocorrência. Após exporem seus vereditos, irei ler a sentença final do juiz responsável pelo caso e refletiremos sobre a decisão e o tema da aula, que também será divulgado ao fim da dinâmica.
Após realizar as devidas explicações, o professor continua:
- Alunos, o caso é o seguinte: “neste domingo de Páscoa, 20 de abril de 2025, um jovem de 23 anos foi detido após furtar itens de uma loja de conveniência no centro da nossa cidade, mais especificamente, dois sanduíches, uma coca cola e um ovo de Páscoa. O assaltante trata-se de um homem preto, morador da periferia e desempregado. Ao ser interrogado pela polícia, o jovem confessou o furto e admitiu ter roubado, pois ele e sua irmã mais nova de 6 anos, a qual vive sobre sua tutela após o falecimento de seus pais, estavam passando fome desde que o mesmo havia perdido o emprego e que a criança não ganhava um ovo de Páscoa havia muitos anos”. Alguém se voluntaria para propor uma decisão?
Nesse momento, um dos alunos mais celebres da sala, formado por uma corrente de tradição dogmática e conhecido por ser um entusiasta das normas, enxergando, assim, o ordenamento jurídico como um sistema autossuficiente, cuja lógica interna e as leis seriam capazes de responder, com precisão técnica, todas as demandas da sociedade, respondeu:
- Diante do caso exposto pelo professor e o crime se tratando de um furto simples, segundo regula o Código Penal de Civilpólis, nosso instrumento absoluto para garantir a ordem e a justiça, em seu artigo 3, o jovem deve cumprir uma pena de reclusão de 3 anos, devido a natureza e ao caráter do roubo, ademais sua irmã deve ser encaminhada a assistente social e, posteriormente, a um orfanato.
Ao finalizar a fala, outra aluna se propõe a falar:
- Considero válido o posicionamento de meu colega, no entanto, acredito que outros fatores externos como o contexto socioeconômico de marginalização desse jovem, o ambiente periférico que este abriga, como também as motivações por trás do furto, devem ser levadas em consideração e em primazia da aplicação rígida da lei como foi exposto. Acredito que a melhor alternativa seria a aplicação de uma multa ao garoto.
Com isso, a sala foi dividida entre as sentença antagônicas e o professor finalizou a dinâmica:
- Bom... posicionamentos distintos foram apresentados nesta sala: um seguindo o rigor das leis e o outro trazendo uma visão mais social ... A sentença original do caso, proferida por um membro da corte de honra, foi que o jovem deveria receber uma multa pelo furto, a qual seria paga por meio da prestação de serviços comunitários a nossa cidade, e que, ele e sua irmã seriam direcionados ao programa de auxílio renda e alimentar do governo. Segundo o juiz responsável pelo caso o direito positivo não explicava plenamente a ocorrência: “O furto, embora juridicamente configurado, apresentava nuances sociais, econômicas e culturais que escapavam a lógica puramente normativa”. Desse modo, o jurista, conduzido pelo campo das ciências sociais, principalmente pelo ideal da “imaginação sociológica” de Wright Mills, foi responsável por olhar além do que o direito dita em sua integra, considerando as raízes socioeconômicos por trás do fato e aplicando uma pena mais condizente com a realidade.
- Assim revelo que o intuito da dinâmica e o tema da aula de hoje consiste em demonstrar a importância das ciências sociais para o futuro jurista, visto que, elas fornecem uma lente através da qual as complexidades humanas podem ser vistas e entendidas, permitindo que o direito não seja apenas uma ferramenta de controle, mas uma forma de criar uma sociedade mais justa e reflexiva. Um bom jurista não deve se limitar à reprodução técnica da norma, mas sim, a uma interpretação crítica, situada à luz das condições reais da sociedade. Desse modo, encerro, portanto, a aula de hoje! Estão liberados e reflitam sobre o tema!