Injuria racial classifica-se como todo e qualquer crime que vise ofender a honra de alguém sob preceitos de condições raciais, de cor, de etnia, religião ou origem, estabelecendo, de acordo com o Senado, o uso de palavras degradantes em face da vítima a fim de acomete-la de acusação e submissão. Nesse sentido, o STF realizou o julgamento do processo no qual a injúria racial deveria ser submetida à uma forma de racismo, alcançando status de pena inafiançável e também imprescritível. Sob esse viés, o principal argumento dos ministros teve como o base o Habeas Corpus 154.248, uma vez que estabeleceu-se de forma contrária à ADI 6.987 que vinha a colocar a injúria como forma de racismo, da mesma maneira que colocava-se de forma negativa à extinção de punibilidade da paciente em questão que havia sido condenada pela prática de injúria a vista do preconceito racial.
Sob esse viés, ao entender a maneira como os diferentes pensadores do direito colocariam seus ideias a vista desse constante estabelecimento do ativismo judicial e a maneira como o STF tem se colocado de maneira sobreposta ao legislativo, Bourdieu contribuirá essencialmente ao tratar da historicização da norma, uma vez que, não se pode separar o crime de injúria do contexto racista no qual a sociedade brasileira é findada. O Brasil não só consagra-se como o último país a abolir a escravatura, como também contou com 0 políticas para a integração do povo negro após sua emancipação, gerando no meio social brasileiro um constante pensamento de que os negros estão abaixo dos brancos e que cabe a eles o papel de servidão. Ademais, Bourdieu virá a complementar também ao expor sobre o espaço dos possíveis, considerando que para o pensador, algo que afeta o individual, tende a promover consequências também no coletivo, desse modo, a maneira como os negros são discriminados e tratados socialmente atualmente, reflete diretamente na forma como o corpo social atua e mostra-se atuante, evidenciando a real necessidade da promoção de um local no qual os direitos dos negros sejam reconhecidos e devidamente aplicados, trazendo muito a questão de tratar os desiguais de forma desigual a fim de encontrar a igualdade.
Passando para Garapon, sua composição de magistratura do sujeito é fundamental, considerando que evidencia a necessidade o indivíduo em por a prova suas reinvindicações e lutar na aquisição de seus direitos dessa forma, estabelecendo também um ponto muito importante pleiteado na questão de uma forte atuação do poder judiciário ao que tange a consagração e efetivação de diversos direitos que acabam apenas sendo possíveis com a participação do mesmo. Nesse sentido, Jane Reis completa o pensamento de Garapon ao tratar da maneira como a mobilização do direito por meio daqueles que sofrem sua falta de efetivação como ponto principal na movimentação da norma, entendendo também a maneira como as mudanças sociais acabam por sempre advir de lutas sociais que visem de fato o alcance de novos direitos sociais para o grupos mais marginalizados da sociedade. Jane ainda expõe, sobre essa mesma perspectiva, a condição portanto da ecologia dos saberes, garantindo integralmente uma maior busca por visibilidade e horizontalidade dentro dos conceitos fundamentais da norma.
Por fim, Mbembe virá a contribuir em certa parte com a questão histórica de Bourdieu ao estabelecer a maneira como a ideia de raça foi desde do começo um maquinário para o povo negro fosse discriminado, logo, a acepção da injúria como racismo por parte da ação do STF, torna-se vital ao trabalhar na superação e colocação totalmente contrária dos meios normativos à qualquer crime de racismo praticado.
Feito todos os apontamentos, é válido colocar que o STF de fato atingiu a injúria como um crime de racismo, logo, a decisão do judiciário atuou diretamente na composição de uma extensa luta que se arrasta por anos, mas que vem de forma gradual e lenta encontrando mais apoio normativo dentro de uma sociedade que constantemente tende a oprimir e negar sua legitimação e condição de existência, seja a vista de ofensas, degradações físicas, seja sob o argumento de que a Constituição já regula os instrumentos necessários para que a igualdade ocorra, fato que sabe-se difere-se totalmente da prática verdadeira, ou até mesmo em atos de uma falsa e estúpida superioridade que o homem branco colocou-se para si desde os primórdios da humanidade.
Vitória Santos da Silva
Direito Noturno