"Meu
Deus, por livre escolha e por Teu amor,
desejo
permanecer aqui e fazer o que a Tua vontade exige de mim.
Não!
Não voltarei atrás.
A
minha comunidade são os pobres.
A
tua segurança é a minha.
A
tua saúde é a minha.A minha casa é a casa dos pobres.
Não
apenas dos pobres, mas dos mais pobres dos pobres.
Daqueles
de quem as pessoas já não querem se aproximar,
com
medo do contágio e da sujeira,
porque
estão cobertos de micróbios e vermes.
Daqueles
que não vão rezar nos templos,
porque
não podem sair nus de casa.
Daqueles
que já não comem porque não têm forças para comer.
Daqueles
que se deixam cair pelas ruas,
conscientes
de que irão morrer e ao lado dos quais os vivos passam,
sem
lhes prestar atenção.
Daqueles
que já não choram, porque se lhes esgotaram as lágrimas.
Dos
intocáveis."
Madre
Teresa de Calcutá
No
texto “Poderá o direito ser emancipatório?”, Boaventura de Sousa Santos traz um
conceito muito interessante e peculiar, que é o conceito justamente dos não
cidadãos, segundo ele os não cidadãos são os indivíduos e grupos sociais que
pertencem à sociedade civil incivil e às zonas fronteiriças entre a sociedade
estranha e a sociedade civil incivil.
Os
indivíduos que pertencem a essa categoria tem uma experiência de vida que
corresponde a ausência de cidadania e caracterizam realmente não só as suas
relações com o estado, como ainda suas interações com os outros indivíduos ,
incluindo por vezes os que compartilham a sociedade civil incivil.
A
não cidadania é a não inclusão, dentro de todos seus pressupostos, no contrato
social, e entre outras palavras o sistema de exclusão social.
Tal
tema se encaixa perfeitamente nos marginalizados da cracolândia. Onde são pessoas que vivem como animais tentando
justamente satisfazer o seu vício, vivendo sem nenhuma perspectiva de vida, e
sem justamente vontade de reagir e tentar algo melhor para si, e é a partir
dessa realidade próxima de todos nós que analisaremos à luz das reflexões de Boaventura.
Uma
relação muito evidente entre os marginalizados da cracolândia e as reflexões de Boaventura, está no fato de
Boaventura dizer que as experiências de vida desses não cidadãos variam de acordo
com as circunstâncias, podem ser elas pelo fato de terem sido expulsos de um
determinado contrato social e é o que realmente acontece com os viciados em
craque onde suas famílias, ao saberem desse vícios, os expulsam de casa onde
eles passam a viver juntamente com seu semelhante e assim tornando a situação
ficar ainda pior. Outra relação também evidente é a seguinte: Boaventura diz
que outra circunstância que é experiência de vida desses indivíduos é o fato de
eles nunca terem passado por um processo de inclusão social, que é o caso das
crianças de rua, que não têm sequer nenhum processo de socialização e são
totalmente excluídas da sociedade o que faz com que iniciem sua vida muito cedo
nas drogas e passem a habitar a cracolândia.
Assim,
de acordo com a análise profunda sobre a realidade dessa “comunidade”,
percebe-se claramente um apartheid social
e polarizada segundo eixos econômicos, sociais, culturais e políticos. Todos os
fatores, portanto, influenciam na prática da não-cidadania dos usuários de crack.
Desse
modo, nota-se a falibilidade da Constituição e do Direito, onde estes asseguram
os direitos dos não-cidadãos, mas isso não passa do ponto de vista formal, já
que eles são atirados para um estado natural, estado este onde o único objetivo
de vida é a própria sobrevivência, seguida do vício pela droga. Em outras
palavras, é um estado que se traduz numa permanente angústia relativamente ao
presente e ao futuro, na perda iminente do controle sobre as expectativas.
A
polícia é outro elemento importante na vida desses usuários, pois são eles quem
violentam, de modo brutal e desonesto, fatiando os direitos de liberdade de ir
e vir, de permanecer onde querem, sem serem perturbados. É aí que citamos o
documentário “Dr. Marcelo – O Diário do Inferno”, onde um médico recém formado
da Faculdade de Medicina da USP se propõe a tratar os usuários de uma forma diferente,
acrescentando carinho, fidelidade e, sobretudo, dando valor à dignidade, pois
aqueles que são tratados como animais, nada mais são do que humanos.
A cidadania, para os usuários, portanto, é tida como ruína ou memória, ou seja, o
cidadão foi expulso de algum tipo de contrato social, mesmo que seja por força
da própria droga, a ineficiência de políticas públicas de saúde e segurança
social permitem que eles fiquem presos pela droga que os consumiu.
Logo,
mister se faz um questionamento que, mesmo após a discussão, pode suscitar
diversas respostas. Mesmo com a argumentação do Professor, explicitamos
novamente nossa pergunta para todos: Poderá o direito ser emancipatório, mesmo
com todos os problemas e pedras no caminho dos exclusos não apenas dos sistemas
políticos, culturais e econômicos, mas também dos sistemas sociais, como os
usuários da Cracolândia na região
metropolitana de São Paulo?
Afonso Marinho Catisti de Andrade
José Eduardo Garcia Tavares
Ricardo Juniti Akutsu Filho
Vicente da Silva Gordo Videira
(1º ano Direito Diurno)