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segunda-feira, 2 de julho de 2018

Negar as diferenças é negar o que temos de mais humano

O eminente sociólogo e filósofo alemão Axel Honneth traz em seu livro "Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais" conceitos acerca da relação existente entre o reconhecimento, auto-realização e o surgimento dos conflitos socias. Nesse sentido, com o intuito de elucidar os conceitos do autor, é válido propor uma análise de tais conceitos à luz da ADPF 4.277, que reconheceu a união homoafetiva, expandido os direitos já resguardados aos casais heterossexuais para os homossexuais. Para tal, proponho, de início, uma análise pura dos conceitos do autor para, em seguida, interpela-los ao julgado.

Axel Honneth, no decorrer de seus estudos, elabora a teoria do reconhecimento.Essa teoria é baseada na deia da intersubjetividade como premissa necessária para a auto-realização individual, isto é  para o indivíduo ser pleno autônomo e se identificar com seus objetivos e desejos ele deve ser reconhecido em três esferas: amor, direito e solidariedade. Isso ocorre, pois essas três esferas do reconhecimento têm uma auto-relação prática com sujeito, uma vez que a partir delas ele desenvolverá, respectivamente, a autoconfiança, o autorrespeito e a autoestima. O amor é considerado a primeira dimensão do reconhecimento. Tal dimensão diz respeito à relação primária entre mãe e filho a qual desenvolve na criança a consciência de que é amada e isso a permite ter confiança para ficar só (autoconfiança). O direito, como segunda dimensão do reconhecimento, parte do que é universal e igualitário, pois só dessa forma o indivíduo poderá depositar nas normas obediência  e respeito (autorrespeito). A solidariedade, como terceira dimensão do reconhecimento, diz respeito à aceitação recíproca das qualidades individuais julgadas a partir dos valores existentes na comunidade. Por meio dessa esfera, gera-se a autoestima, ou seja, uma confiança nas realizações pessoais e na posse de capacidade reconhecida pelos membros da comunidade. Além disso, Honneth traz que a ruptura dessas auto-relações, pelo desrespeito, gera as lutas sociais. Quando não há o reconhecimento ou esse é falso, ocorre uma luta em que os indivíduos não reconhecidos almejam as relações feridas.O desrespeito ao amor são os maus tratos;ao direito, a exclusão;à solidariedade, as ofensas e degradações.

Agora, interpelando tais conceitos à questão homoafetiva. Não é segredo que, não só no Brasil, mas no mundo todo, os homossexuais sofrem preconceito e discriminação pela sociedade. Ofensas, xingamentos e até mesmo agressões físicas são rotineiros em suas vidas. Como consequência, a terceira dimensão do reconhecimento -Solidariedade- é desrespeitada o que leva a um grave problema de autoestima e aceitação pessoal. O indivíduo, temendo as represálias sociais, tem medo de se assumir como realmente é e passa a viver uma vida de mentiras e aparências apenas para ser aceito socialmente. Além disso, até a ADPF 4277 o casamento homoafetivo não era reconhecido o que causava um evidente desrespeito à segunda dimensão do reconhecimento-Direito. Como um homosexual pode respeitar e dar obediência a um ordenamento jurídico que o marginalizava da sociedade civil. Dessa forma, com o claro desrespeito a duas dimensões do reconhecimento, vários movimentos sociais, em prol da causa homoafetiva, eclodiram e a lentos passos têm conquistados os direitos negados a esse setor social. É possível representar essa situação pela fala da eminente ministra Ellen Gracie: “responder a um grupo de pessoas que durante longo tempo foram humilhadas, cujos direitos foram ignorados, cuja dignidade foi ofendida, cuja identidade foi denegada e cuja liberdade foi oprimida. As sociedades se aperfeiçoam através de inúmeros mecanismos e um deles é a atuação do Poder Judiciário”.

Por fim, concluo que a teoria do reconhecimento, aplicada à questão homoafetiva, encontra perfeito respaldo. O desrespeito às dimensões do reconhecimento engendram lutas sociais e essas promovem mudanças.Não reconhecer as diferenças e singularidades do próximo é negar o que temos de mais humano, isto é a nossa empatia. Afinal, amar é deixar as pessoas serem elas mesmas, com suas crenças e costumes.

Alexandre Bolzani Morello-XXXV- Direito Noturno.

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