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segunda-feira, 2 de julho de 2018

O Eco da Voz das Minorias


Em 2011, a ADPF 4.277 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, a qual concedia aos casais homoafetivos o direito a uma união formal com as mesmas garantias dadas aos casais heterossexuais. Por mais que tal decisão tenha causado uma grande repercussão nacional, além de representar um significativo avanço para a comunidade LGBT, ela não foi bem aceita pela população brasileira que, majoritariamente, denota-se muito ligada à religião e seus dogmas. As mudanças estruturais na sociedade estão cada vez mais evidentes, principalmente quando analisadas na esfera familiar e, por isso, a falta de direitos que acompanhem essas alterações sociais acaba pesando muito. De fato, na época, mesmo a população brasileira não se apresentando socialmente adepta a tais mudanças por cultivarem costumes e vidas conservadoras, não houve impedimento ao direito em acompanhar as alterações e atender a reivindicação de uma minoria depois de um longo período vivendo à margem na sociedade. Assim, é necessário compreender que os movimentos sociais são a melhor maneira dos indivíduos que não se reconhecem representativamente no direito alcançarem a verdadeira justiça pela igualdade, se baseando no meio material em que vivem para atingirem o meio formal, objetivando a redução progressiva dos abismos e preconceitos sociais.
Na extraordinária obra “A Luta por Reconhecimento” de Axel Honneth – filósofo e sociólogo alemão reconhecido por compor a terceira geração da insigne Escola de Frankfurt – se vê explanado de forma bastante minuciosa as imperiosas questões de caráter primordial no que concerne as garantias que se voltam para a dignidade moral dos indivíduos dentro de uma sociedade. Honneth, no decorrer de seus estudos, considera que os movimentos sociais, as lutas factuais que seriam responsáveis pela incessante busca por reconhecimento na esfera do amor e da honra privada, seriam os motivos imbuídos de uma caráter verídico e efetivo no concerne ao conflito pelo reconhecimento frente ao todo, ao social. Sua principal realização, a chamada “Teoria do Reconhecimento”, embasada, essencialmente, nos escritos da primeira fase de Hegel, enquanto este ainda era jovem, se relacionam, portanto, com a emergente necessidade de compreender que reconhecimento significaria um meio essencial, utilizado para conceder identidade ao indivíduo que teria, em si, o sentido de liberdade individual e autonomia.
Axel Honneth aborda uma discussão acerca da luta pelo reconhecimento iniciada por indivíduos lesados socialmente e que, ao encontrarem outros sujeitos que sofrem com a mesma lesão, obtêm a base para um movimento de luta social. Tal reconhecimento é composto por três dimensões: primeiramente pelo amor, que advém da relação amorosa com os pais e que possibilita o desenvolvimento da autoconfiança do ser (esta dimensão é a base para o reconhecimento individual, porém, caso seja desrespeitada unicamente, não levará a uma luta por reconhecimento); a segunda dimensão é pelo direito que promove o autorrespeito, uma vez que o indivíduo se vê como igual aos outros por estar submetido a uma mesma lei aplicável à toda sociedade; por fim, mas não menos importante, a terceira dimensão é pela solidariedade, na qual o indivíduo adquire a autoestima por meio do reconhecimento de suas características pessoais por seus pares. As duas últimas dimensões, quando desrespeitadas, levam a um profundo problema de reconhecimento individual que pode impulsionar uma luta por reconhecimento, caso seja colocado em coletivo.
O movimento LGBT é um exímio exemplar das lutas pelo reconhecimento. Muitos de seus participantes não têm sua moral e modo de vida aceitos, justamente por destoarem dos padrões de relacionamentos estabelecidos. O corpo social não reconhece o que é ser homossexual, agindo por isso de forma preconceituosa, não atendendo as demandas do grupo e não fazendo valer os direitos comuns a qualquer cidadão, como a liberdade. 
O julgado da união homoafetiva é outra exemplificação prática e positiva dessa luta por reconhecimento. Como o ministro Marco Aurélio abordou em seu discurso, o Brasil é considerado um dos países com maior número de casos de violência ligado à homofobia, de forma a proporcionar mais de 100 casos de homicídios anuais de homossexuais. Esse dado demonstra a ocorrência de um desrespeito tanto pelo direito, que é evidenciado pelo avanço do conservadorismo, que tem como porta-vozes representantes religiosos e pastores (como Marco Feliciano), que mesmo emitindo opiniões preconceituosas, assumem cargos importantes que impedem a tramitação de propostas de avanços dos direitos sexuais e reprodutivos (ou seja, não asseguram proteção legal aos homossexuais); quanto pela solidariedade, uma vez que a sociedade brasileira se mostra extremamente homofóbica de modo a desrespeitar os homossexuais por sua orientação sexual (ou seja, por uma característica pessoal).
          O reconhecimento visa a igualdade, gozando dos mesmos direitos que os demais, independentemente de sua orientação sexual, os homossexuais se sentem integrados em sociedade. Quando o Estado não reconhece a União Homoafetiva, priva os homossexuais de direitos, menosprezando a identidade dos mesmos e desrespeitando a segunda esfera do reconhecimento. A sociedade, ao insultá-los e os violentarem física ou psicologicamente, também desrespeita o amor e a solidariedade, diminuindo a autoconfiança e autoestima deles. O desrespeito inicia essa luta social, que ocasiona em mudanças sociais, como o reconhecimento da União Homoafetiva.
Destarte, a luta por reconhecimento nesse caso resultou na devolução da dignidade ao indivíduo e no aumento da liberdade do sujeito social, nivelando o direito a todos os cidadãos. As lesões individuais então, são capazes de formar um movimento e, para além disso, de conquistar garantias e reivindicações. Ademais, esse fato demonstra como é necessária a atuação dos movimentos sociais na aquisição e efetivação de direitos à população historicamente desrespeitada, sendo imprescindível e impreterível o engajamento na luta em busca do respeito.

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