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segunda-feira, 2 de julho de 2018

O direito como representatividade


O campo jurídico é um espaço de conflito entre dois Direitos coexistentes e antagônicos, a norma preeminente e que atua na ordem social é a representante dos interesses dos 1 % da sociedade brasileira que suprime a possibilidade de ascensão de um direito mais democrático e subversivo que pertence aos 99% da população que está sujeita a esse cenário de desigualdades e injustiças no ineficiente Estado de direito brasileiro. Boaventura de Souza Santos parte da análise dessa realidade material para compreender as possibilidades de efetivação e transformação de direitos do plano normativo através de um direito emancipatório.
O acesso a justiça toma protagonismo em sua análise ao ser reconhecido sua importância nesse cenário conflituoso, a justiça passa a representar uma possibilidade de revolução democrática nessa estrutura em que a indignação predomina, assim Boaventura (2016, p.357) reconhece a possibilidade de ocupação do Direito por uma visão dos 99%:
“Uma das características principais desta teoria é a ideia de que, em determinadas condições, o direito pode ser usado para promover a transformação social progressista, aquilo que tenho vindo a designar por uso contra-hegemônico do direito.”
            Essa visão emancipatória se dá pela consideração de um sistema semiautônomo do Direito que não se restringe somente a reparar e resolver conflitos advindos da desigualdade material mas também se propõe a criar novas perspectivas sociais no âmago normativo do nosso Direito ao incluir um novo rol de jurisprudência composto por soluções novas e favoráveis a causas sociais. Um exemplo de surgimento cada vez mais constante de um jurisprudência emancipatória é o caso da Fazenda Primavera no Rio Grande do Sul em que o grupo MST ocupou legitimando seu ato por meio da ferramenta jurídica de maior destaque e respeito, a Constituição Federal.
            O que decorreu na Fazenda Primavera não se tratou de uma usurpação de patrimônio mas um conflito de direitos, de um lado um terreno ocioso que não cumpre sua função social e de outro um possível local de residência de inúmeras famílias carentes, tal gesto político e jurídico criou uma porta de entrada na atuação dos 99% no campo jurídico ao reclamar um direito reconfigurativo que demanda a reparação de danos por uma relação desigual de poder, essa atitude provocou uma postura proativa na defesa de interesses sociais suprimindo a visão hegemônica de um direito individualista como o próprio relator Des. Carlos Rafael dos Santos Junior admite:  “Nessa atividade, muitas vezes, de há de buscar novos rumos, não nos satisfazendo com a interpretação jurídica tradicional”.
            Ao final do caso prevaleceram os direitos humanos sobre os direitos de propriedade, a ocupação do Direito tradicional reconheceu os direitos fundamentais como prioritários perante os direitos patrimoniais reafirmando a possiblidade emancipatória discorrida por Boaventura e defendida pelo seu discurso de proatividade social nessa conquista.

Referências:
SANTOS, Boaventura de Sousa. As Bifurcações da Ordem: Revolução, Cidade, Campo e Indignação. São Paulo: Cortez, 2016. (Cap. 6 – “O MST e as suas estratégias jurídico-políticas de acesso ao direito e à justiça no Brasil”, p. 305-339; Cap. 7 – “Para uma teoria sociojurídica da indignação: é possível ocupar o direito?”, p. 343-373)

Carlos Alberto Lopes Lima – Turma XXXV – Direito Noturno

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