Quando se fala em Direito, é comum que logo se pense na figura de um juiz batendo o martelo no tribunal. É que existe um certo estigma historicamente construído em torno do Direito que o retrata como algo distante da sociedade e da vida cotidiana – o que não poderia estar mais equivocado. A ideia de mobilização do Direito, de acordo com Michael McCann, consiste justamente no deslocamento do enfoque dos tribunais para os usuários. Segundo o autor, essa mobilização constitui-se nas “ações de indivíduos, grupos ou organizações em busca da realização de seus interesses e valores”. Em outras palavras, os próprios setores sociais organizam-se para reivindicar a efetivação de direitos, sendo os tribunais um dos muitos atores nesse cenário de disputa política.
Essa concepção pode ser observada no processo de criminalização da LGBTQIA+fobia no Brasil. Diante da omissão do poder Legislativo em relação a essa questão, houve uma movimentação de grupos sociais para reivindicar tal demanda ao Judiciário. A Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros – ABGLT – protocolou o Mandado de Injunção 4.733, o qual requeria o reconhecimento da mora inconstitucional do Congresso Nacional e a aplicação da Lei 7.716/89 para os casos de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero. Entre os argumentos apresentados, constava que “dessume-se da leitura do texto da Carta de 1988 um mandado constitucional de criminalização no que pertine a toda e qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. Outra organização que atuou nessa mobilização foi o PPS – Partido Popular Socialista – que protocolou a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) nº 26, a qual também denunciava a omissão do legislativo frente a esse tema, bem como reivindicava a criminalização da discriminação contra a comunidade LGBTQIA+.
Sendo assim, percebe-se que a própria sociedade mobilizou-se e reivindicou suas demandas ao poder Judiciário. Além disso, também é possível observar as diferentes formas como se deram as influências do tribunal. O STF (Supremo Tribunal Federal), ao reconhecer e efetivar a criminalização da LGBTQIA+fobia, em 2019, exerceu o que McCann chama de influência direta. No entanto, também observa-se uma influência indireta dessa decisão na sociedade, relacionada ao que o autor denomina “nível de poder constitutivo da autoridade social”. Segundo McCann, esse poder consiste em legitimar certas visões, de modo a encorajar sua aceitação. Em 2021, por exemplo, o jogador de vôlei Maurício Souza foi demitido de seu clube e cortado da Seleção Brasileira após publicar postagem homofóbica em sua rede social. Tais punições recebidas pelo atleta estão relacionadas a uma concepção adotada por diversos grupos sociais de que a discriminação contra a comunidade LGBTQIA+ não deve ser tolerada. A adoção desse ponto de vista pode ser considerada efeito da decisão do STF.
Com isso, é evidente que o processo de mobilização do Direito é protagonizado por grupos sociais os quais buscam defender seus interesses e reivindicar direitos. Contudo, também não se pode ignorar o poder dos tribunais, os quais exercem influência de maneira direta e indireta.
Johann de Oliveira Plath - 1° ano - Direito Matutino
Nenhum comentário:
Postar um comentário