Logo no início das medidas contra a pandemia da Covid-19, nos vimos em um conflito da seguinte ordem, entre os poderes federais e estaduais: o presidente da República desejava uma abordagem mais flexível das restrições sanitárias, tendo em vista também o prejuízo econômico, enquanto os governadores e prefeitos insistiram em medidas severas e restritivas.
O Supremo Tribunal Federal se manifestou, diante dessa questão, de maneira imperiosa, e sua decisão definiu os rumos da ação política durante todo o período pandêmico. O Referendo na Medida Cautelar da ADI 6.341, delimitando a esfera de competências da União, Estados e Municípios, permitiu que os decretos estaduais e municipais se sobrepusessem, na prática, aos federais. Por consequência, prevaleceram as medidas de isolamento na totalidade do país.
Michael McCann, em seu texto “Poder Judiciário e mobilização do direito: uma perspectiva dos usuários”, descreveu a influência do poder dos tribunais de duas maneiras diferentes, uma direta e outra indireta. Parece que, no caso descrito, houve interferência direta do STF na disputa entre as esferas. Segundo o autor, “eles podem deter ou parar uma disputa e declaram vencedores e perdedores. Os tribunais também podem traçar políticas que os demais devem seguir (...).”¹ Ou seja, exatamente o que aconteceu: a corte delineou a postura de todos os entes federativos enquanto durasse a pandemia, o que demonstra sua força de ação na atual conjectura nacional.
E veja-se também isto: o STF assumiu de fato uma posição disciplinadora em relação aos outros poderes, se colocando como o mais sensato que separa os outros metidos na briga e diz quem está certo e quem está errado. Numa observação final, após fazer a defesa das competências estaduais e municipais, diz o ministro Alexandre de Moraes: “Parece-me que, se deixarmos isso bem claro, evitaremos conflitos federativos.” Se é óbvio que evitar conflitos dessa proporção é algo louvável (ainda mais durante uma crise), é visível, como dito, que a corte assume para si um papel moderador que a põe acima dos demais poderes.
Se, nesse caso, o executivo federal foi prejudicado e as esferas estadual e municipal beneficiadas, isso não quer dizer nada, pois só o foram com o aval da Suprema Corte... Isso mostra seu crescente poder sobre o Brasil. Afinal, como diz McCann: “Os tribunais são reativos, mas exercem poder, e suas escolhas são muito importantes para o funcionamento de um regime político."²
Rafael. M. P. Rosa de Lima - RA 211222178 - 2º semestre, noturno.
¹ ² McCANN, Michael. “Poder Judiciário e mobilização do direito: uma perspectiva dos “usuários”. In: Anais do Seminário Nacional sobre Justiça Constitucional. Seção Especial da Revista Escola da Magistratura Regional Federal da 2a. Região/Emarf, p. 175-196.
Nenhum comentário:
Postar um comentário