Maria da Penha. Mariana Ferrer. Ambos são nomes que ficaram conhecidos devido à violência contra a mulher. São mulheres que sofreram nas mãos de seus abusadores, de formas diferentes e em contextos diferentes, e que mesmo após tanta dor não receberam a justiça devida. Esses são dois casos que repercutiram na mídia por causa dos resultados finais de absolvição dos acusados (marido de Maria da Penha só foi condenado muito tempo depois), e mostraram como a cultura machista está tão enraizada na sociedade e presente em todos os campos, com mecanismos de opressão das mulheres, mesmo após tantos anos de luta por direitos. Dessa forma, houve um movimento muito forte de combate à essa impunidade, especialmente no caso de Mariana Ferrer, pois o uso das redes sociais facilitaram isso, mas frequentemente encontra-se vestígios de uma sociedade que segue matando mulheres, negros, e população LGBTQIA+.
Nesse
sentido, Maria da Penha Maia Fernandes sofreu duas tentativas de assassinato de
seu marido, Marco Antonio Heredia Viveros, em 1983. Um tiro atingiu sua medula
e a tornou paraplégica, e após isso houve uma tentativa de eletrocutá-la com o
chuveiro. O autor do crime não foi responsabilizado por muito tempo, e 15 anos
depois, Maria da Penha contou com a ajuda do Centro pela Justiça e o Direito
Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos
Direitos da Mulher (CLADEM), que levou seu caso até a Comissão Interamericana
de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Após isso, a
OEA condenou o Estado brasileiro por omissão e negligência, surgindo assim a
lei 11.340/06, ou Lei Maria da Penha, que “cria dispositivos para coibir a
violência doméstica e familiar contra as mulheres”.
Consoante
a isso, Michael W. McCann, em sua obra “Poder Judiciário e mobilização do
direito: uma perspectiva dos usuários” aborda o fortalecimento judicial, de
grande destaque nos últimos anos, e que foi ajudado pela mobilização do
direito, da qual é possível perceber o papel dos usuários do direito e a
participação política nas ações judiciais, alcançando assim, conquistas de
direitos das minorias e julgamentos mais “humanos”. Nesse viés, movimentos
sociais na luta pela conquista de direitos da mulher pressionaram o sistema
judiciário para transformar esse antigo direcionamento, e mais casos de
violência doméstica, após a criação da lei Maria da Penha, receberam o devido
prosseguimento.
Entretanto,
a situação foi um pouco diferente para a jovem Mariana Ferrer, que teve o seu
caso de estupro (Auto n° 0004733-33.2019.8.24.0023), ocorrido em 2018, permeado
de velhos padrões machistas e misóginos, seguindo aquela velha ótica de que a
mulher é sempre a culpada e os homens vítimas do ocorrido, comportamento muito
comum ainda em casos de abuso sexual, infelizmente. Assim, mesmo com a
mobilização do direito no caso de violência doméstica, que faz parte da luta
feminina, e que ajudou milhares de mulheres pelo Brasil após a criminalização
dessa atitude, casos como o de Mariana Ferrer que também são absurdos não
recebem a devida ação judicial, ainda, mas está cada vez mais forte o papel do
usuário e da ação política, pois isso reverberou por todos os cantos, e não de
uma forma positiva para os participantes masculinos do caso.
Dessa forma, não se descarta a importância dos tribunais como instituições, pois são capazes de mudar os conflitos sociais para melhor, e mobilizar cidadãos tanto em sua conduta em sociedade quanto na busca pelos direitos. A conquista de Maria da Penha de ter tido sua violência doméstica reconhecida pelo judiciário mudou os rumos das decisões judiciais envolvendo esse espectro, mas ainda há um longo caminho pela frente, com casos como de abuso sexual ainda recebendo afirmações retrógradas e deixando a sociedade insegura a partir dessa perspectiva. Aliás, o enfoque de mobilização e luta social precisa abranger os diversos grupos oprimidos e vítimas desse problema estrutural patriarcal, buscando por mudanças sociais, culturais e jurídicas.
Lívia Maria M. Bonifácio, turma XXXVIII, matutino
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