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segunda-feira, 19 de agosto de 2019

A ótica de Bourdieu dentro do sistema jurídico brasileiro


A análise do sociólogo acerca dos fenômenos jurídicos e de tudo o que os ronda, nos elucida de vários aspectos de como funciona as engrenagens do sistema jurídico. O campo jurídico brasileiro, de origem romano-germânico, possui várias características que condizem com a teoria de Bourdieu. E para efeitos comparativos, faremos a análise da ADPF 54 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) demonstrando como os preceitos de Pierre atuam na prática.
Todo o processo exige uma formalidade, que caracteriza até mesmo o “habitus” do campo jurídico, trazer ao STF a questão do aborto de anencéfalos, através do relator Marco Aurélio Mello põe em voga vários fatores controversos em julgamento. A partir daí podemos ver uma questão em que Bourdieu foi contra Hans Kelsen, para o jurista o direito é completamente independente dos constrangimentos e das pressões sociais, sendo apenas o direito capaz de moldar o direito. Porém isso não condiz, exemplarmente demonstrada na ADPF 54, pois quaisquer que sejam os valores discutidos dentro do julgado, eles advêm de fora, da sociedade. E muitas dos argumentos que causam controvérsias no caso provem dos campos da religião e da ciência. Tese essa sustentada por Pierre, para ele a sociedade é composta por vários campos diferentes que interagem entre si, e quanto mais capital o indivíduo possui em distintos campos, mais poder ele pode exercer. Desse modo, cabe aos ministros, pessoas de excelentíssima capacidade julgar qual escolha será benéfica para a sociedade.
Consequentemente, o próprio direito adotou um rumo de racionalização para que as escolhas feitas pelos ministros não tenham caráter arbitrário, e sim um apuramento acurado dos fatos analisados. Fatores esses esclarecidos nas escolhas gramaticais, como a neutralização (que adota vocabulários de neutralidade diante do assunto) e universalização (que dá o efeito de que a escolha não é feita única e exclusivamente mediante a própria consciência, e sim para toda a sociedade). Somando o fato de que o veredito é uma maneira de assinalar o ponto final de toda uma lógica racional própria, mas que é plenamente aceita por ser acompanhada de toda uma seguridade jurídica de que aquilo é justo para a sociedade. Além disso, outra característica do caso que tem muito a nos demonstrar os aspectos do judiciário brasileiro é quem conseguiu levar tal processo ao STF, que foi a CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde).
A questão do aborto é amplamente debatida como um direito da mulher. Mas tal processo só pode chegar a tal instancia devido os processos que os agentes da saúde sofrem quando praticam a antecipação terapêutica da gravidez. Um outro grupo de grande poder simbólico (o campo médico) utiliza do direito para conseguir “privilégios” e não sofram mais processos por conta disso. Tal fato caracteriza outro fato abordado por Bourdieu, o instrumentalismo do direito, que nada mais é do que o uso do direito para a garantia de benefícios para um grupo de poderosos.
Apesar da superficialidade da abordagem das teorias de Bourdieu, já se é capaz de compreender o quanto ela realmente se enquadra nos moldes do direito atual. O caso do aborto de anencéfalos também é palco de muitas controvérsias e debates prolongados e profundos sobre até onde se pode definir a vida. Apesar de toda as análises e críticas, o sistema judiciário continua assim como a vida, seguidamente protocoladas.

Marcelo de Meirelles Filho - Turma XXXVI noturno

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