Tomando como
início a teoria crítica de Bourdieu à respeito das dualidades presentes entre a
Sociologia e o Direito, torna-se possível observar como os antagonismos
apontados por Bourdieu podem afetar os trâmites jurídicos de um Estado – como
no caso do julgamento a respeito da não-proibição do aborto em casos de
anencefalia. Frente a tal reflexão, percebe-se como tal problema epistemológico
influencia no embate entre a ética social de defesa de determinado grupo e, por
outro lado, os limites do poder de decisão do STF.
Maior probabilidade
hemorragia, excesso de líquido amniótico, retenção da placenta, problemas
psicológicos por carregar um filho morto. Tais fatores são apenas alguns dos
perigos à saúde materna que a gravidez de um anencéfalo pode causar. Dessa
forma, a permissão legal do aborto em casos de fetos anencefálicos não
limita-se apenas a ser uma forma de garantir o direito à saúde, gestação
saudável e integridade física materna; mas impõe-se como uma manifestação de
ética frente a um grupo que historicamente é visto como inferior por uma
sociedade machista. Sob esse prisma, a decisão do STF em permitir a interrupção
da gravidez demonstra a predominância de uma visão sociológica, ou seja, que
leva em consideração parâmetros sociais para a tomada de uma decisão,
mostrando-se crítica a uma visão mais instrumentalista do Direito.
Em
contrapartida, em seu voto contrário à decisão, Lewandowski é claro em suas
palavras: Não é dado aos integrantes do Judiciário, que carecem da unção
legitimadora do voto popular, promover inovações no ordenamento normativo como
se fossem parlamentares eleitos. Ou seja, até que ponto o STF pode agir de
maneira à não levar em consideração as decisões legislativas tomadas no
Congresso? Até que ponto o STF pode desconsiderar as decisões tomadas por
parlamentares eleitos? Tendo em vista essa reflexão, é possível migrar a
crítica ao formalismo do Direito, o qual aponta a necessidade da auto-afirmação
do Direito e do desprendimento das Ciência Jurídicas de qualquer determinação
social.
Finalmente,
à luz dessa visão crítica a respeito dos poderes do STF, é necessário entender
a importância da valorização dos estudos sociológicos às decisões judiciais.
Entretanto, não podemos esquecermos dos perigos de prover poderes ininterruptos
à ministros que não representam a população, pois estes seriam a manifestação
de uma produção simbólica que utiliza-se do conformismo da sociedade para tornar-se
um instrumento de dominação.
Lucas Perseguino Rodrigues de Araujo - Direito Matutino
Lucas Perseguino Rodrigues de Araujo - Direito Matutino
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